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3 IMPREVISIBILIDADE E INCOMPLETUDE CONTRATUAL 1 Teoria jurídica versus teoria econômica

3.3 Teoria econômica dos contratos incompletos versus contratos completos

A Teoria dos Contratos Incompletos, tem como precursor o professor Oliver Simon D’Arcy Hart, economista naturalizado estadunidense (porém, nascido no Reino Unido), o qual ganhou em 2016 o Prémio de Ciências Económicas em Memória de Alfred Nobel, pela sua brilhante contribuição para a Teoria dos contratos, prêmio este partilhado pelo seu amigo e colega de trabalho Bengt Holmstrom. Seus estudos são corolário da obras de Ronald Coase e Oliver Williamson, estes conhecidos na área da economia, por seus trabalhos com custos de transação e teoria da firma .

Seus estudos foram iniciados desde 1975, com a obra "On the Optimality of Equilibrium when the Market Structure is Incomplete", Journal of Economic Theory, no

entanto , os trabalhos que foram o propulsores aos seus estudos e trouxe contribuição significativa para a Teoria dos contratos incompletos são o The Costs and Benefits of Ownership: A Theory of Vertical and Lateral Integration", publicado no Journal of Political Economy em 1986, esta obra teve a contribuição de Sanford J. Grossman. Neste artigo, eles desenvolvem a teoria formal de contratos incompletos e, com ela, introduzem as noções de controle e poder que tiveram grande impacto em muitos campos além da teoria da empresa , além desta, a obra Incomplete Contracts and Renegotiation, que teve participação de John Hardman Moore , em 1988, também foi muito importante para a teoria .

Como pode-se observar o contrato incompleto é analisado por uma das ramificações de estudo da escola do Law and Economics. Mas, antes de se concentrar nos estudos sobre a teoria dos contratos incompletos, é necessário ressaltar, considerando a possibilidade de sua existência, o que vem a ser contratos completos.

[..] contratos completos seriam aqueles capazes de especificar, em tese, todas as características físicas de uma transação, como data, localização, preço e quantidades, para cada estado da natureza futuro. Em um contrato completo, a princípio, não haveria necessidade de verificação ou determinação adicional dos direitos e obrigações das partes durante sua execução, já que o instrumento delinearia todas as possibilidades de eventos futuros envolvidos com o objeto da contratação. (CATEB E GALLO, 2009, p. 2).

Apesar disso, quando em um ambiente de incerteza, o custo e a complexidade de se especificar os prováveis incidentes que possam advir em um contrato completo, pode se apresentar excessivo e impeditivo de execução. Pois nestas circunstâncias, a necessidade de fiscalização, gestão e a busca por solução de disputas no campo jurídico, em caso de inobservância legal, seriam expressivamente aumentados.

A realização de um contrato mais próximo do completo demandaria um maior desembolso para a sua elaboração e execução, permanecendo, mesmo assim, “fora do contrato os cenários, que, no momento da conclusão, parecem altamente improváveis ou mesmo inimagináveis” (BELLANTUONO apud CAMINHA E LIMA, 2014).

potenciais da transação irrealizados, face às informações disponíveis para os agentes e para as cortes de justiça no momento em que o desempenho ocorre, seriam denominados contratos incompletos. (CATEB E GALLO, 2009).

Com base no fato de que o desenho do contrato que considerem todas às contingências possíveis é custoso, a teoria considera que os agentes deixam lacunas contratuais que serão preenchidas a posteriori. Tais teorias são fundamentadas pelo pressuposto da racionalidade limitada, que impede o desenho de contratos completos e consideram que existe uma lógica de eficiência para a definição dos direitos pós-contratuais.(SZTAJN e ZYLBERSTAJN, 2005).

Desta forma, quando os agentes entendem, em sua natureza, que os contratos têm a sua incompletude e estes devem ser elaborados não de forma rígida a fim de esgotar todas às particularidades que possam surgir na contratação, mas sim de forma flexível, com a possibilidade de acionamento, quando necessário, dos agentes envolvidos.

Segundo Pinheiro e Carvalho (2010, p. 497) para uma corrente da Economia, os contratos são efetivamente incompletos, uma vez que não existe a capacidade para antecipar todas as contingências futuras. Para alguns operadores do Direito, essa incompletude se origina a partir do acontecimento de fatos extraordinários.

Com o passar dos tempos, o modelo de contrato baseado somente no pacta sunt

servanda (do latim “Acordos devem ser mantidos) mostrou-se superado, não

atendendo mais às necessidades da sociedade. O acontecimento de fatos extraordinários e imprevisíveis, ou até mesmo previsíveis, mas não antevistos pelas partes, podem alterar a conjuntura em que se havia firmado o pacto, e então as circunstâncias de antes podem sofrer modificações e, por conseguinte, o contrato torna-se difícil ou mesmo impossível de ser cumprido, demandando uma saída, que não seja necessariamente o rompimento do mesmo (grifo nosso). (PINHEIRO E CARVALHO, 2010, p. 498) .

Esta teoria propõe que ao se pactuar o contrato, geralmente este de longo prazo, e diante da impossibilidade de antever (nas cláusulas) todos eventos que possam ocorrer futuramente, surgindo lacunosidade contratual, possa se recorrer à Cortes Judiciárias (para elucidar os direitos pactuados diante dos conflitos de interpretação) ou ainda instrumentos de mediação (para a busca pela máxima satisfação das partes), com objetivo de garantir economia dos custos de transação e eficiência da relação.

Vários foram os casos em que os contratos, ao longo de sua execução, tiveram, principalmente, o substrato econômico afetado, passando as partes a clamarem por uma solução justa, o que muitas vezes nem era o caso de resolução de contrato, mas tão apenas revisão. Foi, então, que se percebeu que o clausulado contratual deixava a desejar, pois não dispunha de todas as previsões necessárias, mas que isso seria apenas uma lacuna e não um obstáculo intransponível. (PINHEIRO E CARVALHO, 2010, p. 498).

Complementando o entendimento, segundo Caminha e Lima, (2014, n. p.), as balizas que envolvem a teoria do contrato incompleto são destinadas aos contratos de longa duração ou de execução diferida, não sendo aplicáveis, por despiciendo, àqueles de execução imediata, de lapso temporal quase que imperceptível. Esses mesmos autores ainda fazem uma distinção entre o conceito de contratos incompletos no campo jurídico e econômico:

Conhecer a distinção jurídica e econômica da incompletude contratual é de suma importância para uma melhor compreensão da teoria dos contratos incompletos, já que possuem conotações distintas, pois, para o Direito, a incompletude é associada à ideia de insuficiência, no sentido de que os integrantes da relação contratual não estipularam adequadamente todas as obrigações dela oriundas, favorecendo o nascimento de litígios. De outro lado, como já analisado, a Economia, apesar de reconhecer esse sentido jurídico, também faz referência à incompletude deliberada, atrelada a vontade das partes, em preservar inacabado o acordo é a incompletude estrutural. (CAMINHA E LIMA, 2014, n. p.).

De forma breve, cabe destacar que da conceituação de contratos incompletos, é possível perceber que alguns autores, citam diversas formas de classificação desta incompletude. Dos estudos, ainda não consolidado na doutrina, sobre esta classificação assunto é possível extrair, que estas formas estão organizadas da seguinte maneira: a) Incompletude súbita e Incompletude Deliberada (ou estratégica), b) Incompletude inicial e sucessiva (estas derivadas da “incompletude deliberada”), c) Incompletude jurídica e Incompletude econômica.

Sobre a distinção entre incompletude súbita e incompletude deliberada (ou estratégica), é possível destacar que estas dependerão do nível de intenção dos contratantes quanto a lacuna existente ou que venha a surgir no contrato. Pois, além da incerteza da completude das cláusulas que possa surgir ao longo da execução do contrato (conceituação da incompletude súbita), é possível que, de forma proposital (estratégica), os contratantes permitam certas lacunas no contrato para que estas permitam certa flexibilidade na tomada

de decisão, gerenciamento de riscos ou mesmo como forma de redução do custo de transação (neste caso, é a incompletude deliberada).

[..] a distinção entre incompletude súbita e incompletude deliberada, [...] nesta última os contraentes são conscientes de que, no ato de conclusão do contrato, uma parcela do seu conteúdo deve ser determinada posteriormente e que a lacuna será preenchida, alternativamente, por um outro acordo, pela determinação de apenas uma das partes, ou pela decisão de um terceiro. Situação diversa da incompletude súbita ou involuntária, em que as partes não tiveram a intenção de deixar lacunas no contrato, preferindo que o contrato incompleto venha disciplinado pelas normas legais (mediante o procedimento de integração ou interpretação). (CARMINHA E LIMA, 2014, n. p.)

Então, se houver elevados custos de transação ex ante (antes da execução contratual , a melhor solução seria uma incompletude deliberada, caracterizando um cotejamento entre os benefícios e os custos marginais do complemento do contrato. Essa postura, vai postergar para o momento ex post (durante a execução contratual) a tentativa de minimizar esses custos. (NÓBREGA, 2009).

Nas palavras de Pinheiro e Carvalho (2010, p. 497), a incompletude contratual, durante muito tempo, foi refutada nas relações contratuais, porém hoje, numa ótica econômica aplicada ao Direito, admite-se a relevância da falta de plena previsão nas cláusulas contratuais, o que permite uma maior eficiência tanto na elaboração, quanto na execução do contrato.

De acordo com Bandeira (2014, p. 2699), a solução mais eficiente consiste em firmar contratos lacunosos, que estabeleçam apenas determinados aspectos da relação contratual, como forma de diminuir os custos de transação e superar a reduzida previsibilidade das partes contratantes, bem como sua capacidade limitada em processar grande volume de informação.

Já partindo para a conclusão deste tópico, cabe destacar que o aparecimento destas lacunas não pode se tornar uma barreira intransponível para o contrato em si ou para os contratante, mas deve permitir conhecer alternativas que solucionem os entraves que venham emergir, escolhendo a melhor alternativa que maximiza às expectativas de cada uma das partes envolvidas, em prol de um equilíbrio mútuo.

Portanto, parafraseando às palavras de Pinheiro e Carvalho (2010, p. 499), é fato que logo de início, os contratantes não podem ter certeza se as cláusulas pactuadas serão efetivadas, porém perseguindo uma lógica de eficiência, partilhando direitos e obrigações entre os contratantes, aliada a cooperação das partes e uma política de incentivos, pode-se, ao menos, minimizar os referidos custos, para então, definir os direitos pós-contratuais, ao menos atingindo um nível ótimo, ou seja, deixando os contratos mais completos.

Contudo, é possível inferir que a teoria de contratos incompletos não se isola de outras teorias ou mesmo às abole substituindo-as, por outro lado, expande o conhecimento dentro da teoria econômica e jurídica.

Não obstante as teorias jurídicas, tais como: da resolução do contrato por onerosidade excessiva [...], da teoria da imprevisão [...], sejam criticadas por sua imprecisão e por isso não consigam compreender, em muitos casos, as lacunas que venham a surgir em um contrato, é válido enfatizar que por muitos anos a utilização destas foi a melhor alternativa. Não extirpando todo o seu valor, até mesmo porque há casos em que cabe perfeitamente a sua aplicação, é também justo reconhecer a tamanha contribuição das teorias econômicas, o que permite decisões baseadas em critérios objetivos, fruto de estudos amplamente experimentados, que por sua vez representam um grande passo para tão sonhada busca da segurança jurídica. Assim, constata-se que resta ao Poder Judiciário ampliar seus horizontes para melhor abalizar suas decisões e chegar a soluções coerentes, seja com os próprios meios e instrumentos já ofertados pelo Direito, seja socorrendo-se de ciências afins, através de interdisciplinaridade. (PINHEIRO E CARVALHO, 2010, p. 502)

Sobre isso, Caminha e Lima (2014, n. p.) destacam em seu trabalho que a teoria econômica do contrato incompleto amplia a hipótese de revisão, que se baseia na teoria da imprevisão, inovando, portanto, a ordem jurídica.

Então, a Teoria dos Contratos Incompletos é instrumento utilizado para completar as lacunas decorrentes de contingências futuras, a quais são causadas por problemas tais como: da assimetria de informação, da racionalidade limitada, quando a obrigação objeto do contrato estiver incompleta, ou mesmo pela vontade proposital das partes ou oportunismo destas, cujo objetivo é a busca pela maximização das utilidades, alocação eficiente de recursos e minimizar os custos, seja para possibilitar o total cumprimento do contrato, ou mesmo, decidir sobre o seu rompimento. (PINHEIRO E CARVALHO, 2010)