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Transtorno do ritmo circadiano

No documento Manual prático de geriatria (páginas 115-118)

No idoso, o transtorno do ritmo circadiano apresenta­se com sintomas de avanço do ciclo sono­vigília (avanço de fase). O paciente adormece mais cedo, no início da noite (entre 19 e 20 horas), acorda entre 3 e 4 horas da madrugada e demonstra sonolência  diurna  com  cochilos  longos.  A  luz  é  o  mais  importante  sincronizador  do  ritmo  circadiano,  o  que  leva  nesses casos a estimular idoso a se expor ao sol durante a manhã.12­14

Insônia

De acordo com a Classificação Internacional de Transtornos do Sono,15,16 a insônia é definida como uma queixa subjetiva

de  dificuldade  em  iniciar  e/ou  manter  o  sono  por,  pelo  menos,  3  noites  por  semana,  durante  3  meses,  apesar  da oportunidade  adequada  para  dormir.  É  acompanhada  de  consequências  significativas  durante  o  dia  como:  dificuldade  de concentração,  transtornos  do  humor,  fadiga  e  sonolência.  Ocorre  frequentemente  em  associação  com  outras  doenças, especialmente  em  idosos.  A  prevalência  tende  a  ser  maior  em  mulheres  idosas,  principalmente  com  múltiplas  condições físicas  e  psiquiátricas  (60%  ou  mais).  Alguns  questionários  de  autorrelato,  como  o  Insomnia  Severity  Index,  foram validados em idosos. Esses questionários podem ser difíceis para uso em idosos. Um diário do sono pode ajudar a obter informações  sobre  tempo,  quantidade  e  qualidade  do  sono  durante  dias  consecutivos.  O  uso  desse  tipo  de  diário  é recomendado no diagnóstico clínico de insônia no fim da vida.

A  insônia  pode  ser  secundária  a  diversas  condições  médicas,17  como:  doença  pulmonar  obstrutiva  crônica,  asma,

insuficiência  cardíaca  congestiva  (ICC),  cardiopatia  isquêmica,  doenças  reumatológicas,  doenças  neurológicas,  doenças urológicas  (associadas  a  poliúria  e  noctúria),  doenças  endócrinas,  demência,  doença  do  refluxo  gastresofágico,  doenças dermatológicas, menopausa e dor crônica. Na área de cuidados paliativos, a insônia também é um problema.

A Tabela 9.7 mostra as opções de tratamento não farmacológico da insônia.

A educação sobre o sono, a terapia cognitivo­comportamental para a insônia (da sigla em inglês CBTi) e a higiene do sono têm pouca evidência para apoiar sua adoção como medidas de tratamento isoladas para insônia em idosos. Estas três técnicas são mais úteis em combinação com outras estratégias psicológicas. Embora as recomendações de higiene do sono sejam as mais frequentes para a insônia, não há evidências de seu uso isolado para gestão da mesma.

Em  relação  à  terapia  farmacológica,  sempre  que  se  optar  pelo  uso  de  fármacos  devem  ser  considerados  diversos aspectos:  objetivos  do  tratamento,  expectativas  do  paciente,  perfil  de  segurança  do  fármaco,  efeitos  colaterais,  interações medicamentosas, possibilidade de titulação da dose, custo, comorbidades e contraindicações. O tratamento medicamentoso da  insônia  tardia  deve  ser  feito  na  minoria  dos  pacientes.  Apesar  dos  riscos  associados  (interações  medicamentosas, tolerância,  dependência  e  ausência  de  evidências  empíricas  que  apoiem  o  uso  por  longo  prazo  em  pacientes  idosos),  os medicamentos sedativos hipnóticos são os mais comumente prescritos em pacientes idosos. O tratamento farmacológico de curto prazo pode ser indicado em situações de insônia aguda, com a menor dose possível e por curto período.

Tabela 9.7 Tratamento não farmacológico da insônia no idoso.

Técnica Descrição

Terapia de controle de estímulo O idoso não deve car mais de 20 min na cama tentando dormir. Se o sono não chegar, deve sair do quarto e fazer outra atividade relaxante (música suave, leitura) e só voltar para cama quando sentir sono. O processo pode ser repetido depois de 20 min. Deve-se evitar fazer atividades prazerosas neste período (ver televisão, comer, adiantar o trabalho do dia seguinte)

Relaxamento Diversas técnicas, como alternar movimentos de contração e relaxamento dos diversos grupos musculares, controle da respiração e meditação

Cronoterapia Útil nos transtornos do ciclo circadiano. Consiste em atrasar em 2 a 3 h o horário de ir para a cama durante alguns dias seguidos até ajuste do horário de sono

Biofeedback Sensores na pele que medem a tensão e a contração muscular, além dos ritmos cerebrais. Faz uso de técnicas de respiração para ajudar a reduzir a tensão

Terapia de restrição de sono É uma estratégia comportamental desenvolvida para aumentar o sono homeostático, conduzir e reforçar o sinal circadiano por meio de alinhamento mais próximo do tempo gasto na cama com o tempo gasto adormecido. Há forte evidência em apoio da restrição de sono para insônia em idosos. Nesta terapia deve-se calcular o tempo médio de horas que a pessoa dorme e a pessoa não deve car na cama mais do que essa média (mantendo um mínimo de 4 h de sono). O horário de dormir e acordar são rígidos e as sonecas são proibidas. Quando o sono tiver melhorado, o tempo de sono vai sendo aumentado até que que confortável ao paciente

Terapia cognitivo-comportamental da insônia18–20

É um programa de treinamento dado em 8 a 10 semanas, envolvendo diversos aspectos discutidos anteriormente

Fototerapia com luz brilhante21 Parece e caz nos casos de insônia com atraso na fase de sono, porém não há grandes estudos que con rmem sua

e cácia. Pessoas com esse tipo de insônia (notívagas) só costumam sentir sono muito tarde, prejudicando o dia seguinte. Nesta terapêutica, o paciente acorda e ca 30 a 40 min sentado em frente a uma caixa com luz branca (10.000 lux), visando ao reajuste do relógio biológico

Exercício físico22 Há diversos trabalhos mostrando que exercícios físicos regulares podem melhorar o sono do idoso, mas estes precisam

ser individualizados. O objetivo é tentar diminuir o uso de hipnóticos nesta população, muito sujeita a seus efeitos colaterais. Mais estudos são necessários para de nir os melhores programas de exercício a serem realizados

Medicamentos  sedativos  hipnóticos. 23,24  Agem  no  cérebro  induzindo  o  sono.  A  diferença  entre  os  diversos

medicamentos  é  o  tempo  de  ação  e  a  duração  do  efeito.  Os  estudos  com  hipnóticos  em  idosos  são  limitados  e  não  há trabalhos  consistentes  que  viabilizem  a  indicação  de  hipnóticos  por  longo  prazo  em  idosos.  Além  disso,  com  o  uso prolongado, o paciente começa a apresentar tolerância ao medicamento, necessitando­se de doses cada vez mais altas para manter o mesmo efeito ou, então, se faz um rodízio entre os diversos medicamentos.

Benzodiazepínicos.  Devido  às  características  farmacológicas  desta  classe  de  medicamentos,  devem  ser  usados  com muito  critério  nos  idosos  (de  preferência  evitados),  pois  estão  associados  a  maior  risco  de  quedas,  alteração  cognitiva, delirium, dependência e aumento de mortalidade.

Não benzodiazepínicos (zolpidem, zopiclona).  São  substâncias  de  ação  similiar  à  dos  benzodiazepínicos,  porém com  tempo  de  efeito  mais  curto.  Atuam  nos  receptores  GABA.  Seus  efeitos  colaterais  mais  comuns  são:  sonolência, tontura, desequilíbrio e gosto ruim na boca. Devem ser evitados em pacientes com déficit cognitivo e instabilidade postural significativa.  Sedativos  antidepressivos  (como  trazodona  e  tricíclicos)  são  frequentemente  administrados;  entretanto, poucas  evidências  empíricas  apoiam  o  uso  de  antidepressivos  como  agentes  hipnóticos  em  idosos.  Fármacos  com  ação anticolinérgica devem ser evitados (p. ex., difenidramina).

Antidepressivos. Não são a primeira indicação para o tratamento da insônia (a não ser quando secundária à depressão), mas  alguns  deles  têm  o  sono  como  paraefeito  e  podem  servir  como  adjuvantes.  Vale  lembrar  que  os  antidepressivos também  têm  potenciais  efeitos  colaterais  (alteração  da  cognição,  delirium,  quedas).  Há  classes  de  antidepressivos  que podem, inclusive, atrapalhar o sono se tomados à noite, como os inibidores de recaptação de serotonina.25

Antidepressivos  sedativos.  Considerados  uma  opção  de  tratamento  para  pacientes  com  insônia,  particularmente quando  a  insônia  sobrepõe­se  à  depressão.  Os  antidepressivos  tricíclicos  são  frequentemente  usados  para  esse  fim. Entretanto, na população idosa, essa classe de medicação tem efeitos colaterais que incluem boca seca, hipotensão postural, arritmias cardíacas, ganho de peso e sonolência. A mirtazapina produz melhora na eficiência do sono e no tempo total de sono em pacientes deprimidos, entretanto, falta evidência para seu uso no tratamento de transtornos do sono em pacientes não deprimidos.

Trazodona.  É  um  agente  comumente  usado  no  tratamento  da  insônia  em  pacientes  deprimidos  e  não  deprimidos.  Os efeitos colaterais de particular importância no idoso incluem sedação, tontura, hipotensão ortostática, arritmias, priapismo e comprometimento  psicomotor.  A  trazodona  geralmente  é  mais  bem  tolerada  na  população  idosa  do  que  algumas  outras estratégias  de  tratamento  (como  antidepressivos  tricíclicos),  em  virtude  do  menor  risco  de  efeitos  colaterais  cardíacos  e menor ação anticolinérgica.

Agomelatina.  Aprovada  no  Brasil,  sendo  um  agonista  potente  dos  receptores  MT1  e  MT2,  além  de  antagonista  dos receptores da serotonina­2C (5­HT2C), tendo menos efeitos colaterais (como cefaleia) que outros medicamentos da mesma classe.

Neurolépticos.  Tanto  os  típicos  como  os  atípicos  receberam  um  alerta  da  Food  and  Drug  Administration  (FDA)  em relação  ao  seu  uso  para  o  tratamento  de  psicose  na  demência,  porque  aumentam  o  risco  de  mortalidade  por  eventos cardiovasculares e infecção. De maneira geral, seu uso deve ser desencorajado, reservando­os para os casos de alucinações e delírios graves, sendo usados com cautela e em doses baixas: olanzapina 2,5 a 5 mg/dia, risperidona no máximo 1 mg/dia e quetiapina de 25 a 75 mg/dia. O paciente e a família devem ser informados sobre os riscos.

Melatonina.  É  um  hormônio  sintetizado  e  excretado  pela  glândula  pineal  durante  a  noite,  que  se  liga  a  receptores  do SNC.  Sua  produção  é  estimulada  pela  escuridão  e  inibida  pela  luz.  Com  o  envelhecimento,  sua  produção  é  reduzida  e estudos mostraram uma correlação entre transtornos do sono em idosos associados a picos ineficientes de melatonina. Na maior parte dos estudos as doses variam de 0,5 a 6 mg, tomados de 30 a 120 minutos antes de ir para a a cama. Alguns estudos sugerem que o uso da substância pode reduzir a incidência de delirium em idosos.26­28 Extrato de raiz de valeriana (Valeriana officinalis). Uma revisão sistemática nos EUA mostrou que o extrato desta planta tem sido cada vez mais usado visando, ao controle dos transtornos do sono. Mais estudos precisam ser realizados para definir concentração e dose adequadas, mas o perfil de segurança abre mais uma possibilidade de tratamento.29

Ronco

O ronco é mais comum nos homens e torna­se mais frequente com o avançar da idade. Ele ocorre pela vibração dos tecidos moles da faringe localizados entre o palato e a língua. Reflete a dificuldade da passagem do ar por essa região. Várias são as  causas  que  levam  a  esse  fenômeno:  relaxamento  excessivo  da  musculatura  da  faringe  (uso  de  álcool,  sedativos,  sono muito  profundo),  excesso  de  tecido  na  região  (hipertrofia  de  adenoide  e  amígdalas,  palato  alongado,  língua  volumosa, cistos e tumores de faringe), obesidade (acúmulo de tecido gorduroso em torno da faringe) e obstrução nasal.

Alguns  estudos  sugerem  que  o  ronco  seja  um  fator  de  risco  para  hipertensão  arterial  e  doenças  cardiovasculares.  A dúvida  é  se  ele  é  um  fator  de  risco  independente,  pois  muitos  idosos  que  roncam  também  apresentam  outros  fatores  de risco  para  doenças  cardiovasculares  (obesidade,  sexo  masculino,  idade  avançada).  Todos  os  pacientes  que  roncam  devem ser questionados sobre SDE. Esses são sinais que devem levantar a suspeita de apneia do sono.

No documento Manual prático de geriatria (páginas 115-118)