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Trombolíticos

No documento Manual prático de geriatria (páginas 104-107)

Os fármacos trombolíticos eram usados para pacientes com AVE desde a década de 1950, com resultados ruins. Não havia padronização  do  tempo  de  início  de  tratamento,  e  a  ausência  de  métodos  de  neuroimagem  dificultava  a  seleção  dos pacientes.  Desde  1995,  porém,  houve  uma  mudança  nesse  quadro  e  os  trombolíticos  vêm  sendo  administrados  na  fase aguda  do  AVE  isquêmico.  O  estudo  NINDS  demonstrou  benefício  do  uso  do  ativador  do  plasminogênio  tissular recombinante (rt­PA) na dose de 0,9 mg/kg até o máximo de 90 mg (10% em bolus e o restante em infusão intravenosa por 60  minutos),  nas  primeiras  3  horas  de  instalação  do  AVE  isquêmico,  independentemente  do  seu  subtipo  e  da  idade  do paciente. Nesse estudo, observou­se uma diferença em, pelo menos, 30% dos pacientes, com mínima incapacidade ou sem qualquer  incapacidade,  após  3  meses  do  tratamento,  em  comparação  com  o  grupo  placebo.  Não  houve  diferença estatisticamente  significativa  na  letalidade  precoce  ou  tardia  entre  os  grupos,  embora  tenha  havido  6,4%  de  hemorragia

intracraniana  precoce  no  grupo  que  recebeu  rt­PA,  em  comparação  com  0,6%  no  grupo  placebo.12  Já  estão  estabelecidas

algumas  normas  para  aperfeiçoar  os  critérios  para  o  uso  do  rt­PA,  excluindo  os  pacientes  com  maior  risco  de  eventos hemorrágicos, como aqueles com sinais precoces de infarto extenso à TC de crânio e com maior gravidade clínica (avaliada por escalas neurológicas objetivas).5

Em  2008,  o  estudo  ECASS  III  ampliou  a  janela  terapêutica  do  rt­PA  para  até  4  horas  e  30  minutos  de  instalação  do AVE isquêmico. No entanto, quanto mais precoce for a trombólise, maior sua chance de sucesso.13

Pelos parâmetros já estabelecidos atualmente, rígidos critérios devem ser seguidos para o uso do rt­PA na fase aguda do  AVE  isquêmico,  visando  excluir  os  pacientes  com  maior  risco  de  complicações  hemorrágicas.  Em  princípio,  os indivíduos  com  sintomas  muito  leves  também  costumam  ser  excluídos,  em  decorrência  da  evolução  favorável independentemente  do  uso  de  trombolíticos.  Os  critérios  de  inclusão  são:  insulto  isquêmico  persistindo  por  mais  de  30 minutos,  com  até  4  h  e  30  minutos  da  sua  instalação,  e  pacientes  com  mais  de  18  anos.  Já  os  principais  critérios  de exclusão são: pacientes cujo tempo da instalação do quadro neurológico não possa ser determinado (como AVE reconhecido ao  despertar  ou  sem  testemunhas  confiáveis);  sintomas  menores  ou  em  regressão;  sintomas  isolados  (como  déficit sensitivo,  ataxia  etc.);  convulsão  no  início  do  quadro;  AVE  moderado  ou  grave  ou  traumatismo  cranioencefálico  nos últimos 3 meses; cirurgia nos últimos 14 dias; história de hemorragia intracraniana; infarto agudo do miocárdio recente; PA sistólica  maior  que  185  mmHg  ou  diastólica  maior  que  110  mmHg,  mantida  apesar  de  medicação  inicial;  sintomas sugestivos de hemorragia subaracnóidea; hemorragia gastrintestinal ou de trato geniturinário nos últimos 21 dias; punção arterial  em  sítio  não  compressível  nos  últimos  7  dias;  uso  de  anticoagulante  nas  últimas  48  horas  ou  tempo  de tromboplastina  parcial  (PTT)  elevado;  tempo  de  ativação  da  protrombina  (TAP)  maior  que  15  segundos  ou  padrão normatizado internacional (INR) maior que 1,7; plaquetometria menor que 100.000/mm3; e glicemia menor que 50 mg/dℓ

ou maior que 400 mg/dℓ.5 Embora não seja uma contraindicação absoluta, o rt­PA deve ser aplicado com maior cautela nos

pacientes com mais de 80 anos, devido ao maior risco de hemorragia.5

Pacientes  que  tenham  feito  uso  das  novos  antitrombóticos  (dabigatrana,  rivaroxabano  ou  apixabano)  nas  últimas  48 horas também têm contraindicação aos trombolíticos.14

Caso não seja possível a aplicação de rt­PA intravenoso nas primeiras 4,5 horas de instalação do AVE isquêmico, pode­ se  fazer  uso  da  infusão  de  rt­PA  intra­arterial,  até  6  horas  de  evolução  do  AVE.  O  ensaio  clínico  que  determinou  esses resultados (Proact II), usou uroquinase intra­arterial. Como essa substância não está mais disponível, vem sendo realizada a infusão intra­arterial de rt­PA em seu lugar, embora não haja ensaios clínicos que corroborem o tratamento.15

O  uso  de  equipamentos  de  desobstrução  arterial  mecânica  (trombólise  mecânica)  vem  crescendo  bastante  nos  últimos anos  e,  finalmente,  alguns  ensaios  clínicos  bem  estruturados  mostram  a  sua  eficácia  na  fase  aguda  do  AVE  isquêmico, merecendo  inclusive  a  publicação  de  um  consenso  internacional  específico.8  Os  chamados  stent  retrievers  são  os

instrumentos mais modernos e com maior eficácia comprovada. Os principais exemplos são o Solitaire® e o Trevo®, que retiram mecanicamente o trombo do interior das artérias intracranianas, promovendo sua recanalização. Os critérios para o uso  de  stent  retrievers  são:  escala  de  Rankin  0  ou  1  (pacientes  previamente  hígidos);  oclusão  de  carótida  interna  ou segmento M1 da artéria cerebral média; mais de 18 anos, escala do NIHSS > 6 (pacientes mais graves); escala radiológica ASPECTS  ≥  6;e  início  do  cateterismo  até  6  horas  após  o  início  dos  sintomas.  É  importante  salientar  que  a  trombólise intravenosa  continua  indicada  até  4,5  horas  de  instalação  do  AVE  isquêmico.  A  trombólise  mecânica  deve  ser  feita  nos casos  de  insucesso  do  rt­PA  ou  contraindicação  ao  seu  uso.8  A  combinação  de  trombólise  venosa  e  arterial  pode  ser

realizada  em  situações  especiais,  como  oclusão  de  segmentos  proximais  das  grandes  artérias  cerebrais.  O  uso  de estreptoquinase intravenosa é contraindicado a qualquer tempo, bem como o rt­PA venoso após 4,5 horas de instalação do AVE, pelo considerável aumento da incidência de hemorragia intracraniana sintomática.5

Anticoagulantes

O  uso  indiscriminado  de  anticoagulantes  na  fase  aguda  do  AVE  isquêmico  não  está  indicado  e  aumenta  o  risco  de complicações  hemorrágicas.  A  única  indicação  claramente  definida  para  a  anticoagulação  é  fibrilação  atrial  em  pacientes com histórico de AIT ou AVE, visando à profilaxia secundária, além da já citada prevenção de trombose venosa profunda e embolia  pulmonar.  É  importante  lembrar  que  a  fibrilação  atrial  é  mais  prevalente  em  idosos,  com  maior  risco  de embolização cerebral nessa população.16

Por outro lado, há forte indicação quanto ao início precoce de anticoagulantes nos pacientes com fontes emboligênicas detectadas,  embora  não  haja  evidências  com  base  em  ensaios  clínicos  para  esse  fim.  Busca­se  a  prevenção  secundária nesses casos, já que há alta incidência de reembolização precoce. Entretanto, em caso de infarto isquêmico extenso, o início da anticoagulação deve ser postergado por, pelo menos, 48 horas e uma TC de crânio deve ser realizada antes de seu início, a fim de afastar a possibilidade de transformação hemorrágica, mais comum nesses pacientes. Nos indivíduos com mais de

75 anos, embora não haja contraindicação absoluta, a anticoagulação deve ser monitorada com maior rigor, pois também há maior risco de complicações hemorrágicas. Nesses pacientes, o INR alvo deve ser mais baixo (entre 1,5 e 2,5), comparado ao  alvo  para  pacientes  mais  jovens  (2  e  3).5  Quando  houver  coagulopatias  (síndrome  de  anticorpo  antifosfolipídio,

deficiência  de  proteína  C,  proteína  S,  antitrombina  III,  fator  V  de  Leiden  ou  outras  alterações  genéticas  dos  fatores  de coagulação),  a  anticoagulação  deve  ser  o  tratamento  de  escolha.  Além  disso,  há  alto  grau  de  recomendação  para  a anticoagulação  plena  em  caso  de  infarto  venoso  cerebral  (mesmo  com  transformação  hemorrágica)  e  dissecção  arterial carotídea.  A  conduta  em  todas  essas  situações  é  individual,  até  que  estejam  disponíveis  ensaios  clínicos  específicos.  No entanto, a grande variedade e peculiaridade de situações dificulta a obtenção de amostras adequadas para a realização de tais estudos.5

Caso se opte por iniciar anticoagulação plena, ela deve ser feita com infusão contínua de heparina 1.000 UI/h, ajustando conforme a necessidade, com o objetivo de manter o PTT em 2 vezes o valor padrão. A alternativa de aplicação de doses em bolus  intravenoso  não  é  recomendada,  pois  está  relacionada  com  maior  risco  de  complicações  hemorrágicas.  Como alternativa, pode­se fazer uso de heparinas de baixo peso molecular pela via subcutânea (p. ex., enoxaparina 1 mg/kg a cada 12 horas). Nesse caso, não há necessidade de controle hematológico. Se a anticoagulação persistir por tempo prolongado, deve­se  iniciar  varfarina  via  oral,  objetivando  INR  entre  2,0  e  3,0  para  a  maioria  das  condições,  com  a  suspensão  da heparina  assim  que  esse  objetivo  seja  alcançado.  Novos  antitrombóticos  foram  recentemente  aprovados.  São  eles: dabigatrana (inibidor direto da trombina), rivaroxabano e apixabano (inibidores do fator Xa) e são alternativas à varfarina para prevenção primária e secundária de AVE e tromboembolismo sistêmico em pacientes com fibrilação atrial paroxística ou crônica. A vantagem desses fármacos é a maior estabilidade, sem necessidade de controle hematológico e menor risco de complicações hemorrágicas, quando comparadas à varfarina. Por outro lado, a reversão de seus efeitos, caso necessário, é mais difícil; e seu uso contraindica a trombólise venosa se houver um AVE isquêmico.14

Antiagregantes plaquetários

Embora  o  benefício  dos  antiagregantes  plaquetários  esteja  claramente  demonstrado  para  a  prevenção  secundária  das doenças  cerebrovasculares,  são  poucas  as  evidências  de  sua  ação  no  tratamento  da  fase  aguda.  O  único  antiagregante plaquetário objetivamente testado na fase aguda do AVE isquêmico é o ácido acetilsalicílico (AAS). Dois grandes estudos mostraram  o  benefício  do  uso  de  AAS,  nas  doses  de  160  e  300  mg/dia,  respectivamente,  nas  primeiras  48  horas  de instalação  do  AVE.  O  uso  de  AAS  na  fase  aguda  do  AVE  isquêmico  evita  9  mortes  ou  AVE  recorrentes  nas  primeiras semanas do evento inicial e 13 mortes ou incapacitações ao fim de 6 meses.17,18 Analisando os dados disponíveis, o AAS está indicado na fase aguda do AVE isquêmico em pacientes de todas as faixas etárias, desde que não haja indicação para trombólise ou uso de anticoagulantes. Se o paciente for submetido à trombólise, o início de AAS deve ser postergado até 24 horas após o uso do trombolítico.5

Neuroprotetores

Diversos fármacos foram testados com o intuito de reduzir a extensão do infarto cerebral, recuperando a lesão em áreas de penumbra isquêmica; são os chamados neuroprotetores. Como a fisiopatologia da isquemia cerebral é bastante complexa, há  tentativas  do  uso  de  fármacos  com  diferentes  mecanismos  de  ação,  sempre  com  o  objetivo  final  de  preservar  a integridade  neuronal  na  região  de  isquemia.  Todavia,  nenhum  dos  estudos  com  esses  fármacos  foi  capaz  de  demonstrar benefício  neuroprotetor  convincente  até  o  momento,  apesar  dos  resultados  promissores  in  vitro.  Como  exemplos  dos diversos  medicamentos  testados,  têm­se:  bloqueadores  do  canal  de  cálcio  (nimodipino  e  S­emopamil);  inibidores  da liberação de glutamato (lubeluzol, lifarizina, nalmepene e dexametasona); antagonistas do canal de sódio (lamotrigina, di­ fenil­hidantoína e riluzol); inibidores do óxido nítrico (7­nitroindazol e lubeluzol); varredores de radicais livres (tocoferol, selênio,  betacaroteno,  tirilazade  e  citilcolina);  agonistas  do  ácido  gama­aminobutírico  (muscimol  e  clometiazol);  além  de diversos outros fármacos.

O  único  fármaco  considerado  possivelmente  eficaz  para  neuroproteção  na  fase  aguda  do  AVE  isquêmico  moderado  a grave  foi  a  citicolina,  administrada  nas  primeiras  24  horas  de  instalação  do  quadro,  principalmente  na  dose  de  2.000 mg/dia. No entanto, há ainda controvérsia quanto à sua eficácia.19

É  provável  que  o  fracasso  de  grande  parte  dos  trabalhos  relativos  a  esses  fármacos  tenha  ocorrido  por  problemas metodológicos, e não por real ineficácia dos medicamentos testados. É provável que o aperfeiçoamento da metodologia dos ensaios  clínicos  com  essas  medicações  traga  bons  resultados  no  futuro.  Há,  no  momento,  alguns  ensaios  clínicos  em andamento,  testando  diversas  medicações,  com  a  finalidade  de  neuroproteção  na  fase  aguda  do  AVE  isquêmico.19  A

aguda e subaguda do AVE isquêmico estão em andamento, porém ainda sem resultados concretos que viabilizem seu uso na prática clínica por ora.

No documento Manual prático de geriatria (páginas 104-107)