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Variáveis de registo e respetivas metafunções linguísticas (Adaptado de Eggins e Martin 1997: 242)

Parte I Enquadramento teórico

Diagrama 1.3. Variáveis de registo e respetivas metafunções linguísticas (Adaptado de Eggins e Martin 1997: 242)

Segundo se representa no Diagrama 1.3, a relação de realização entre o registo e a linguagem é concebida numa perspetiva tripartida. De acordo com esta perspetiva, afirmar que as variáveis de registo se realizam nas metafunções equivale a dizer que a lı́ngua serve37 para: (i) construir

36 A justificação pelo termo “metafunção” encontra-se explicada, em português, em Gouveia (2009) ou

Martins (2008). Confira-se também a seguintes palavras de Halliday e Matthiessen (2004): Why this rather unwieldly term “metafunction”? We could have called them simply “functions”; however, there is a long tradition of talking about the functions of language in contexts where “function” simply means purpose or way of using language, and has no significance for the analysis of language itself (cf. Halliday and Hasan 1985: Chapter 1; Martin, 1990). But the systemic analysis shows that functionality is intrinsic to language, that is to say, the entire architecture of language is arranged along functional lines. Language is as it is because of the functions in which it has evolved in the human species. The term “metafunction” was adopted to suggest that function was a component within the overall theory. (Halliday e Matthiessen 2004: 30-1; negrito original)

37 No que respeita, em particular, à organização da lı́ngua em metafunções contextualmente motivadas,

Halliday defende uma visão evolutiva condicionada pelo uso, como se pode ler em “foram os usos linguı́sticos que, ao longo de milhares de gerações, deram forma ao sistema”, “[a] linguagem desenvolveu-se para satisfazer necessidades humanas” e “o modo como a lı́ngua está organizada é funcional relativamente a essas necessidades” (1994 apud Gouveia 2009: 17).

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atividades sociais, (ii) encenar relações sociais e (ii) organizar essas interações (que necessariamente envolvem participantes e as suas atividades) em unidades de significado coerentes e coesos (Halliday e Matthiessen 2004: 29-31, Martin e Rose 2008: 11). Mais correto ainda é afirmar que as metafunções codificam três ordens de realidade complementares e intrı́nsecas à vivência do ser humano, respeitantes respetivamente: (i) à sua relação com o mundo, seja este o real ou o da sua consciência (realidade natural), (ii) à sua relação com os seus pares (realidade social) e (iii) à sua relação com a linguagem (realidade semiótica) (Martin 2009). A Tabela 1.2, adiante, resume o papel das metafunções face às variáveis de registo e às dimensões da realidade por elas codificadas.

Metafunção Registo Realidade codificada

ideacional ® construir atividades sociais (campo) Natural interpessoal ® encenar relações sociais (relações) Social textual ® organizar significados (modo) Semiótica

Tabela 1.2. Metafunções, variáveis de registo e tipo de realidade codificada (A partir de Martin e Rose 2008: 11, Martin 1997: 159)

Note-se que a metafunção ideacional se divide, adicionalmente, em duas submetafunções: a experiencial e a lógica (Halliday e Matthiessen 2004: 29). Destas submetafunções, a primeira assegura a construção da experiência per se e a segunda corresponde à sua organização lógica38.

Conforme enunciado anteriormente, o registo é concebido como um sistema semiótico. Esta conceptualização envolve um aprofundamento dos conceitos de campo, modo e relações, inicialmente propostos por Halliday, a fim de contemplar as variações sistémicas dentro de cada uma das variáveis. No caso da presente investigação, são particularmente pertinentes as definições alargadas das variáveis de campo e de modo39, seja para melhor se descrever os textos

de CN numa perspetiva genológica, seja para melhor se dar conta da forma como esses textos podem ser desconstruı́dos na disciplina de PLNM com recurso à Pedagogia de Género.

No que diz respeito ao campo, Martin (e.g. 2002, 2007a, b, Martin e Rose 2008) define-o como um conjunto de sequências de atividades orientadas para um propósito institucional global. Neste sentido, postula-se que as instituições podem ter um âmbito social mais restrito (e.g. famı́lia) ou um âmbito mais genérico/público (e.g. indústria, burocracia, academia) e que, neste segundo caso, podem organizar-se em (sub)campos progressivamente mais especı́ficos. Veja-se, a tı́tulo ilustrativo, a forma como Coffin (2006) decompõe o campo geral da História, enquanto

38 Como explica Gouveia (2009: 16), a componente experiencial é equiparável à fotografia, entendida como

representação instantânea da realidade, sendo a componente lógica equiparável ao filme, ao proporcionar uma sequência interligada de representações instantâneas.

27 disciplina do saber, em diferentes subcampos:

At a broad level, we can talk about the field of history. (…) within the broad field of history, there are, of course, many more narrowly defined fields such as military history, the history of film, constitutional history, heritage, and so on, and within each of these there are specific topics, such as the War of Roses, the development of talking movies, democratic government, Aboriginal artefacts, etc. (Coffin 2006: 30; itálicos no original)40

Na variável de campo incluem-se, ainda, na proposta de Martin (2002), as pessoas, coisas, processos, lugares e qualidades envolvidas nas sequências de processos. Segundo defende este autor, os intervenientes encontram-se organizados em taxonomias, que incidem sobretudo sobre pessoas e coisas e, de forma mais marginal, sobre processos. Os campos definem-se, então, com base na articulação entre as sequências de atividades, relacionadas por nexos temporais e/ou lógicos, e com base nas taxonomias, assentes em relações de meronı́mia ou de hiponı́mia).

Em consequência desta definição alargada de campo, as principais variações de campo refletidas nos textos são duas: (i) o facto de os textos se organizarem em torno de processos por oposição a entidades e (ii) o facto de as entidades serem genéricas/abstratas por oposição a particulares/concretas. Como veremos no Capı́tulo 2, adiante, esta definição alargada é fundamental para a forma como, em LSF, se teoriza a construção genológica, discursiva, gramatical e lexical do conhecimento cientı́fico e, ainda, da sua recontextualização pedagógica em manuais escolares.

No que diz respeito à variável de modo, Martin e Rose (2003/2007: 298-302) identificam três variáveis que afetam de forma fundamental a textualização da informação: (i) o grau de abstração (lı́ngua em ação vs. lı́ngua enquanto reflexão), (ii) o grau de interação (monólogo vs. diálogo) e (iii) a modalidade semiótica (texto verbal, visual, multimodal, …).

Para o efeito do presente estudo, é especialmente relevante a variação do grau de abstração. Uma vez que diz respeito ao papel desempenhado pela lı́ngua na interação, esta variável permite distinguir entre situações onde a lı́ngua tem uma função reduzida, acompanhando (ou sendo acompanhada por) informação maioritariamente contextual (i.e. extralinguı́stica) e situações onde a lı́ngua constitui a principal, senão mesmo a única, forma de comunicação. Estas duas situações, que podem ser parafraseadas como “lı́ngua em ação” e “lı́ngua enquanto reflexão” (Martin e Rose 2003/2007: 300), são teorizadas em Martin (1984/2010) como os extremos de um contínuo de modo. Este contı́nuo, que pode ser representado multimodalmente conforme se ilustra no Diagrama 1.4, adiante, permite identificar e interrelacionar quaisquer situações

40 Como se depreende deste exemplo, a noção de (sub)campo está fortemente dependente da própria

(sub)classificação das atividades institucionais e, no caso, do presente trabalho da classificação das ciências e, em particular da subclassificação das Ciências Naturais (para uma discussão mais alargada deste tema, veja-se Alexandre 2012). Significa também que a determinação do campo de um determinado texto pode ser complexa ou contestável.

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interacionais do ponto de vista da sua abstração contextual.

Lı́ngua em ação Lı́ngua enquanto reflexão

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