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CAPÍTULO 1 – DELIMITANDO O OBJETO: POR QUE BRASIL, ESPANHA E

1.2 A Espanha no CSNU e seus principais aspectos sócio-históricos

Três fatos foram levados em consideração para selecionarmos a Espanha. O primeiro foi o fato de esse país ter sido eleito membro não permanente do CSNU para o período de 2015-2016, como explicaremos mais adiante. O segundo fato foi a diferença de status que a Espanha, juntamente com o Brasil, tem no âmbito desse órgão (membro não permanente), distinguindo-se, assim, da França (membro permanente). O último dado que justifica essa escolha foi a diversidade de tipos de governo, quando comparamos Brasil, Espanha e França. Esses três aspectos direcionaram parte de nossa pesquisa, uma vez que trabalhamos com a hipótese de que eles poderiam se revelar de diferentes maneiras no gênero de discurso intervenções de representantes permanentes no CSNU.

Focar o período de 2015-2016, a fim de constituir o corpus da presente pesquisa foi relevante pelo fato de selecionarmos textos da atualidade. Além disso, os 193 países que compõem a Assembléia Geral das Nações Unidas decidiram, em 2014, que a Espanha seria um dos membros não permanentes do Conselho durante esse período. A partir dessa decisão, a Espanha pôde comemorar, tendo em vista que sua última participação no CSNU tinha sido dez anos antes. Ressaltamos que a Espanha concorreu com a Nova Zelândia e a Turquia para ocupar uma das duas vagas destinadas ao grupo Europa Ocidental e outros Estados. Tal concorrência deveu-se ao fato de um dos critérios de seleção dos membros não permanentes ser o de distribuir a alocação de assentos desse tipo entre os diferentes grupos regionais que compõem a Assembléia Geral: África, América Latina e Caribe (GRULAC), Ásia e Europa Ocidental e Outros (WEOG).

À justificativa de selecionar textos atuais aliam-se outros fatores relevantes. Por um lado, isso nos permitiu comparar, por exemplo, os temas das intervenções referentes a 2015 com aqueles de 2011, período em que o Brasil cumpriu o seu último mandato no Conselho. Também nos possibilitou indagar se a Espanha tomaria alguma atitude similar à do Brasil em relação ao gesto comemorativo de participar do CSNU por um determinado período. Vimos, na seção anterior, que o Brasil lançou um livro com a recopilação das intervenções realizadas durante o mandato de 2010-2011, em que se comemorava a décima participação do Brasil no órgão. No caso da Espanha, 2015-2016 foi o quinto mandato desse

Estado enquanto membro não permanente do CSNU, após um intervalo de dez anos, como já foi dito.

Se haverá (ou não) uma publicação similar à obra brasileira, será um fato que ainda precisaremos aguardar, visto que o mandato da Espanha encerrou-se em 2016. No caso do Brasil, o livro foi lançado em 2014, isto é, três anos após o fim do seu mandato. Porém, mesmo antes de haver finalizado o seu mandato, a Espanha já havia encontrado uma forma de comemorar a sua participação no Conselho durante o período de 2015-2016. Os “Correos” lançaram dois selos: o primeiro (figura 1) em comemoração aos 70 anos da ONU e aos 60 anos da Espanha enquanto membro dessa organização internacional; o segundo (figura 2) em comemoração ao mandato de membro não permanente do Conselho de Segurança da ONU no período de 2015-2016:

Figura 1 - 70 anos da ONU e 60 anos da Espanha na ONU

Figura 2 - Espanha 2015-2016 - Membro não permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas

Além desses selos, encontramos a obra Las Naciones Unidas desde España: 70 aniversario de las Naciones Unidas. 60 aniversario del ingreso de España en las Naciones Unidas (PONS RAFOLS, 2015). Ainda que ela não tenha contemplado as intervenções de representantes permanentes no CSNU, destacamos que nela foram encontrados alguns artigos que contribuíram para o nosso estudo. Em seções subsequentes, retomaremos tais textos de

forma mais pontual. Por ora, sublinhamos o fato de se reunirem no referido livro tanto as intervenções do Rei da Espanha quanto as do Presidente do Governo do Reino da Espanha em seções/ debates da Assembléia Geral das Nações Unidas (PONS RAFOLS, 2015, p. 635-703). Isso, por um lado, reforça a nossa opção pelo emprego do termo “intervenção” e, por outro, exemplifica a importância de havermos estabelecido como critério de seleção dos Estados Brasil, Espanha e França a diferença de governo entre eles, como já foi dito na Introdução.

Vale ressaltar que nos deparamos com outras possibilidades igualmente relevantes de organização do corpus. Não obstante, consideramos esta que ora apresentamos como a mais produtiva, principalmente tendo em vista os objetivos da pesquisa. Por exemplo, o estudo de Novosselloff (2016) apresenta um quadro, listando todos os membros não permanentes do CSNU entre 1989 e 2015. A partir dele, verificamos que Brasil e Espanha foram, concomitantemente, membros não permanentes desse órgão em 1993-1994 e em 2004 (NOVOSSELOFF, 2016, p. 403-406). Nesse sentido, seria possível formar um corpus abarcando um desses períodos, de modo a verificar o posicionamento dos dois Estados sobre temas abordados em reuniões do CSNU em uma mesma época. A título de exemplo, poderíamos selecionar textos referentes ao mandato completo de 1993-1994. Porém, tal opção não contemplaria mandatos comemorativos, nem textos atuais, dois critérios que julgamos relevantes para a formação do corpus. Além do mais, nos depararíamos com a questão do acesso a esses textos, fato que problematizamos, sobretudo, a partir da análise do médium que vem sendo utilizado na constituição e na transposição das intervenções de representantes permanentes no CSNU enquanto gênero de discurso institucional.

A segunda razão de havermos selecionado a Espanha partiu da nossa hipótese em torno de uma semelhança e de uma diferença entre o status do Brasil e o da Espanha. Embora os dois países tenham sido eleitos membros não permanentes do CSNU em diferentes ocasiões, destacamos, como já foi anunciado na Introdução, que o Brasil é frequentemente mencionado como um dos principais candidatos a ser membro semipermanente do CSNU. Em geral, não se menciona a Espanha entre esses candidatos, mas sim a Alemanha, o Japão, a Índia, a África do Sul ou a Nigéria. Portanto, essa diferença poderia manifestar-se de duas formas. Na primeira, haveria um comportamento similar dos enunciadores dos textos de Brasil e Espanha, uma vez que os dois assumem o status de membro não permanente no CSNU. Na segunda, haveria diferença nesses comportamentos devido à pretensão do Brasil de ser membro semipermanente do CSNU.

O último aspecto que consideramos, ao selecionar a Espanha, foi a sua particular forma de governo. Pecequilo (2012, p. 48) lembra-nos que há duas principais formas de governo: o autoritário e o democrático. Nesse último caso, a autora cita três casos diferentes de governos cujos Estados são democracias: repúblicas presidencialistas, como é o caso do Brasil e dos Estados Unidos; república presidencialista e parlamentarista, caso da França; monarquias parlamentaristas, como ocorre com a Espanha e a Inglaterra. Essas diferenças, a nosso ver, são plausíveis para a constituição do corpus, uma vez que acreditamos que elas também poderiam interferir no discurso diplomático, tanto por traços de cada estrutura governamental que poderiam estar presentes nos textos selecionados, quanto pela própria ausência dessas referências.

Além do critério de status de membro permanente, de membro não permanente e, nesse último caso, a pretensão (ou não) de ser membro semipermanente no CSNU, tomamos a característica de tipo de governo como um dos elementos culturais que podem ser refletidos (ou refratados) nos discursos dos representantes permanentes. É por essa razão que decidimos trabalhar com categorias de análise como temas, figuras, formação discursiva, intertexto e intertextualidade. A partir delas, buscamos descrever os textos do corpus com o objetivo de evidenciar (ou não) se uma das particularidades do gênero de discurso intervenções de representantes permanentes no CSNU é permitir projeções identitárias, diferentemente de documentos oficiais desse órgão, como as Resoluções, as Declarações Presidenciais e as atas resumidas das reuniões do CSNU. No que diz respeito às atas literais dos encontros/ debates do CSNU, problematizaremos alguns aspectos desse gênero de discurso com o fim de ressaltar o papel que as intervenções possuem na sua constituição e também na constituição do próprio debate. Não obstante, defendemos a tese de que cada um desses gêneros deve ser tomado como um objeto de estudo diferente, sobretudo a partir dos objetivos que orientam a presente pesquisa.