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A interoperabilidade entre os sistemas informáticos

No documento Governo eletrônico e direito administrativo (páginas 181-193)

CAPÍTULO 2 – BASES JURÍDICAS DO GOVERNO ELETRÔNICO

2.5. A interoperabilidade entre os sistemas informáticos

Na linha do tradicional isolamento entre os diversos órgãos e entidades públicas843, a introdução da informática na Administração Pública iniciou-se com a utiliza- ção da tecnologia em setores específicos, para o aperfeiçoamento de rotinas de trabalho relativamente circunscritas. Nesse modelo, os dados eram de acesso restrito, em diferentes sistemas departamentais, sem que houvesse uma visão global das informações detidas pelo Poder Público844.

Com o progressivo desenvolvimento da telemática, passou a ficar cada vez mais claro que a verdadeira utilidade de um sistema informático não reside em seu uso isolado, mas em sua capacidade de compartilhar a informação com outros aplicativos e sistemas, aumentando de modo exponencial seus resultados845. Nesse sentido, ganhos sig- nificativos de eficiência só podem ser alcançados mediante um maior compartilhamento de dados846, o que depende da superação do modelo de atuação fragmentado e da melhoria do relacionamento entre os diversos órgãos e entidades públicas847. Essa integração é uma das características mais inovadoras do governo eletrônico848.

Na atividade administrativa tradicional, a remessa de dados entre órgãos e entidades administrativas é necessária849 e frequente, porém resta limitada em razão da dependência de uma comunicação intermediada por seres humanos. Com efeito, cabe ao órgão interessado solicitar a outro a remessa de uma informação, devendo este analisar a

843 Sobre tal isolamento, cf. M

ARTÍNEZ GUTIÉRREZ, Rubén, Administración Pública Electrónica, cit., p. 219. 844 Cf. H

OLMES, Douglas, op. cit., p. 59. 845

Cf. GAMERO CASADO, Eduardo, Interoperabilidad y administración electrónica: conéctense, por favor, in Revista de Administración Pública, n. 179, Madrid, Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, mai.- ago. 2009, pp. 292-293.

846 Cf. OCDE, op. cit., p. 24. Por essa razão, o impulso em favor do governo eletrônico vem geralmente das estruturas que dependem de maior integração horizontal das entidades públicas, as quais encontram dificul- dades devido à falta de diálogo entre os diversos atores envolvidos (cf. BOMBARDELLI, Marco, op. cit., p. 1009).

847

Cf. CERRILLO I MARTÍNEZ, La interoperabilidad y la protección de datos. La interconexión de los regis- tros de protección de datos, in VVAA, La protección de datos en la Administración Electrónica, Pamplona, Aranzadi, 2009, p. 24 e CANTERO, Anne, op. cit., p. 405.

848 Cf. A

RENA, Gregorio, op. cit., p. 429. 849 Cf. V

possibilidade de atendimento ao pedido; em caso positivo, envia-se a informação. Em vista dessas limitações práticas, e dada a divisão de responsabilidades entre os diversos órgãos administrativos, gera-se um considerável ônus para os administrados, por vezes obrigados a realizar uma série de solicitações sucessivas em diferentes repartições públicas, com o propósito de obter resultados materialmente únicos850, como é o caso de construir uma edi- ficação ou abrir uma empresa.

No governo eletrônico, o compartilhamento de informação – que pode referir-se a uma informação específica ou a um amplo conjunto de dados – ocorre de modo automatizado, ou seja, por meio do relacionamento entre os sistemas informatizados, devi- damente programados de acordo com critérios de compartilhamento das informações, pe- los quais estas são tornadas disponíveis851. Com a melhoria na coordenação entre os sujei- tos públicos envolvidos, a atuação administrativa torna-se mais eficiente852, o que se reflete na qualidade do atendimento ao administrado.

Nesse contexto é que surge como essencial, para a Administração Públi- ca, o conceito de interoperabilidade. Tal conceito corresponde à capacidade dos sistemas informáticos de se relacionar mutuamente, o que lhes permite compartilhar e trocar infor-

850 Cf. B

ERNADÍ GIL, Xavier, op. cit., p. 225. 851

Cf. DUNI, Giovanni, L'amministrazione digitale, cit., p. 66. Assim, deve ocorrer o acesso remoto, por um sistema, à informação residente em outro, sem efetuar uma cópia de tal informação, diferentemente do que ocorreria se houvesse uma troca de mensagens entre os órgãos. A cópia das informações contidas em siste- mas públicos – especialmente por meio de correio eletrônico – pode ser feita facultativamente, até mesmo em papel, mas não deve fazer parte do expediente eletrônico, por não constituir uma boa prática de gestão (cf. DUNI, Giovanni, I "viaggi telematici" dell'atto informatico, cit., p. 3). A informação copiada é inútil e serve apenas para provocar confusão e dificuldade de gestão nos procedimentos (cf. ibidem, p. 1), podendo ocorrer até mesmo que a informação copiada seja inexata, pelo fato de não ser atualizada cotidianamente, como ocor- re com a base de dados originária. A mesma razão recomenda evitar a duplicação de todo o banco de dados para entrega a outra entidade administrativa, mera usuária e não produtora de informações, solução adotada com frequência (cf. DUNI, Giovanni, L'amministrazione digitale, cit., p. 66). Além disso, deve-se considerar que, em regra, o acesso pontual à informação está menos sujeito a questionamento quanto à violação da pro- porcionalidade, ao passo que a cessão completa de uma base de dados muitas vezes extrapola os limites da possibilidade informativas do Estado, pela transferência de informação além do que seria necessário (cf. supra, item 2.4.5.1).

852 Cf. B

mações de forma útil853. A interoperabilidade é o desafio mais importante que se apresenta para a gestão administrativa na atualidade854, podendo ser considerada uma das pedras an- gulares do êxito do governo eletrônico855. Por meio dela, é possível economizar quantida- des incalculáveis de tempo e dinheiro para a Administração Pública e para os cidadãos856, ao permitir a utilização da informação e de aplicativos para diferentes finalidades857, a tra- mitação de processos complexos e a integração de serviços em que intervenham vários órgãos ou entidades858. Com a interoperabilidade entre os sistemas, a tecnologia passa a ser vista como um instrumento que serve para unificar, e não para desconectar, as estruturas organizacionais do governo859.

Trata-se, contudo, de um grande desafio, que exige esforços em três dife- rentes níveis conhecidos como dimensões da interoperabilidade860, que se encontram inevi- tavelmente entrelaçadas e devem realizar-se de modo simultâneo para atingir a interopera- bilidade plena861. A interoperabilidade organizativa está relacionada à coordenação e ao alinhamento dos processos administrativos ou empresariais e das estruturas de informação que ultrapassam os limites das organizações envolvidas, de forma a permitir a obtenção de resultados mutuamente acordados, tais como a fusão dos processos das diferentes organi- zações862. A interoperabilidade técnica envolve os aspectos próprios da relação entre sis- temas informáticos, que se articulam, por exemplo, por meio da fixação de tecnologias,

853

Sobre o conceito de interoperabilidade, cf., entre muitos, CERRILLO I MARTÍNEZ, La interoperabilidad y la protección de datos, cit., pp. 30-31; GAMERO CASADO, Eduardo, Interoperabilidad y administración electró- nica, cit., p. 292;IASELLI, Michele, op. cit., p. 60; MARTÍN DELGADO,Isaac, Identificación y autenticación de los ciudadanos, in GAMERO CASADO, Eduardo, VALERO TORRIJOS, Julián (coord.), Comentarios a la Ley de Administración electrónica - Ley 11/2007, de 22 de junio, de acceso electrónico de los ciudadanos a los servicios públicos, 1.ª ed., 2.ª imp., Cizur Menor (Navarra), Thomson-Civitas, 2009, p. 356.

854 Cf. G

AMERO CASADO, Eduardo, Interoperabilidad y administración electrónica, cit., p. 294. 855 Cf. C

ANTERO, Anne, op. cit., p. 404. No mesmo sentido, OLLER RUBERT, Marta, op .cit., p. 57. Falando em integração, cf. AIBAR PUENTES, Eduard, op. cit., p. 29. Vale observar que a interoperabilidade não é um atributo exclusivo dos sistemas informáticos da Administração Pública, sendo também um objetivo nas orga- nizações privadas.

856 Cf. G

AMERO CASADO, Eduardo, Interoperabilidad y administración electrónica, cit., p. 293. 857 Mencionando a economia de escala, cf. L

A COSTE, Pierre de, BÉNARD, Vincent, op. cit., p. 24. 858

Cf. CERRILLO I MARTÍNEZ, La interoperabilidad y la protección de datos, cit., pp. 30-31 e CHISSICK, Mi- chael, HARRINGTON, Justin, op. cit., p. 10.

859 Cf. H

OLMES, Douglas, op. cit., p. 60. 860

Cf. GAMERO CASADO, Eduardo, Interoperabilidad y administración electrónica, cit., p. 295.

861 Cf. ibidem, p. 299. O autor observa que a interoperabilidade referente a sistemas e aplicativos já implanta- dos é muito complexa, de maneira que o verdadeiro objetivo é observá-la no futuro (ibidem, pp. 299-300). 862 Cf. C

ERRILLO I MARTÍNEZ, La interoperabilidad y la protección de datos, cit., p. 33 e GAMERO CASADO, Eduardo, Interoperabilidad y administración electrónica, cit., p. 296.

interfaces, padrões e protocolos de comunicações863. Por meio da interoperabilidade se-

mântica, a informação trocada pode ser interpretada de modo automatizado e reutilizada

por outro aplicativo que não tenha sido desenvolvido inicialmente com esse objetivo, o que exige um acordo sobre o formato ou estrutura da informação trocada e sobre seu contexto ou conteúdo preciso864.

Em um estágio máximo de interoperabilidade, que ainda não existe, os sistemas dos diversos sujeitos públicos poderiam interagir entre si de modo pleno, permi- tindo não somente a troca de informações, mas a realização de atividades em caráter cola- borativo865. O governo poderia apresentar-se ao usuário por meio de um balcão único, um único interlocutor respaldado por sistemas informatizados inteiramente compatíveis, coe- rentes e integrados, proporcionando uma atuação administrativa unificada, ainda que a necessidade do usuário estivesse sujeita à competência de diferentes órgãos públicos866. Esse estágio constituiria um aperfeiçoamento considerável na qualidade da prestação de

863 Cf. C

ERRILLO I MARTÍNEZ, La interoperabilidad y la protección de datos, cit., p. 33 e GAMERO CASADO, Eduardo, Interoperabilidad y administración electrónica, cit., p. 297.

864 Cf. C

ERRILLO I MARTÍNEZ, La interoperabilidad y la protección de datos, cit., p. 34 e GAMERO CASADO, Eduardo, Interoperabilidad y administración electrónica, cit., p. 296. Segundo o último autor, a principal dificuldade que encontra a interoperabilidade semântica é a diversidade de linguagens de programação, que podem tornar ininteligíveis para um sistema informático os dados existentes no outro. Outro problema é a diversidade linguística no plano jurídico, pois os mesmos institutos jurídicos recebem denominações diferen- tes em cada idioma. Assim, caberia falar também em uma interoperabilidade jurídica, referente à compatbi- lização da legislação de um ente político para que os dados eletrônicos dele originados sejam reconhecíveis de acordo com o direito aplicável em outros âmbitos (pp. 296-297). Parece tratar-se, contudo, de um aspecto específico da interoperabilidade semântica, especialmente relevante para a estrututração jurídica do governo eletrônico.

865 M

ARONGIU refere-se a graus sucessivos da interconexão (ligação física entre as máquinas), da interopera- libilidade (capacidade de trocar dados, pelo uso de formatos reciprocamente compatíveis) e da cooperação aplicativa (possibilidade de interagir à distância com um software que permita conduzir os trabalhos co- muns). A cooperação aplicativa, grau mais avançado, representaria a solução para a realização do processo administrativo telemático, implicando mudança substancial do processo de implantação do governo eletrôni- co, que poderia ser sintetizado como a passagem da informatização por órgão a uma informatização por pro- cedimento (cf. Il governo dell’informatica pubblica, cit., p. 37). No presente texto, a interoperabilidade é considerada em sentido amplo, de forma a alcançar os três graus referidos.

866 Com isso, seria possível o modelo do federalismo informático, que entende a Administração, mesmo na sua articulação de entes e competências, como um só complexo, formado por uma série de estruturas e apara- tos estreitamente ligados e coordenados entre si, capazes de se apresentar ao cidadão de modo unitário. Nesse modelo, a Administração local é o front office de todo o sistema público e qualquer entidade pública do front line pode acessar serviços de back office fornecidos por todo o setor público, o que pressupõe uma forte dire- ção central para a coordenação e a interação de partes potencialmente diversas, evitando a incomunicabilida- de entre elas (cf. CARLONI, Enrico, Le difficoltà per una visione organica dell’e-government, cit., p. 40). Sobre a questão do governo inteiramente integrado, por meio da interoperabilidade, cf. CERRILLO I MARTÍ- NEZ, La interoperabilidad y la protección de datos, cit., p. 31; ALLI ARANGUREN, Juan-Cruz, op. cit., p. 61; BERNADÍ GIL, Xavier, op. cit., p. 225 e DE TERWANGNE,Cécile,LOBET-MARIS,Claire,POULLET,Yves,op. cit.,p.23.

serviços públicos, pois os usuários tendem a não diferenciar os vários níveis de governo867, o que sempre constitui um problema para o atendimento das suas necessidades.

Embora pareça, à primeira vista, um tema eminentemente relacionado à informática, a interoperabilidade não constitui uma questão meramente técnica868. Trata-se de um tema que apresenta um considerável componente jurídico, não sendo poucos os pon- tos de contato que possui com importantes questões relacionadas ao direito.

O primeiro ponto a ser considerado é que a interoperabilidade tem base constitucional. Isso pode ser revelado por meio de uma releitura, no atual contexto tecno- lógico, do dispositivo que veda ao Poder Público recusar fé aos documentos públicos (art. 19, II). Com efeito, tal preceito sempre teve uma função essencial para a atuação da admi- nistração em papel, efetuando, por meio de um documento físico, a articulação entre as diversas atividades burocráticas da Administração. O dispositivo referido invoca, pois, a ideia do usuário que, interessado em uma determinada prestação da Administração, formu- la um requerimento instruído com um documento anterior, legitimamente obtido a partir de outra atividade administrativa, que não pode ser recusado pelo Poder Público nessa atuação sucessiva.

Com o advento das novas tecnologias, o preceito constitucional exige uma reinterpretação, porquanto o documento eletrônico – juridicamente equivalente ao documento em papel – não tem a mesma vocação para ser expedido em suporte tangível, devendo apenas estar disponível para consulta telemática e para constituir eventual ele- mento instrutório de outro processo869. Além disso, com a utilização de meios eletrônicos, tende a não haver mais a figura da pessoa responsável pelo recebimento do documento, a quem seria vedada sua recusa. No contexto do governo eletrônico, a vedação à recusa me- rece ser entendida como o dever de reconhecimento mútuo de documentos públicos eletrô- nicos870, nos quais se incluem as informações constantes de bases de dados estatais a serem

867 Cf. H

OLMES, Douglas, op. cit., p. 67. 868

Cf. CERRILLO I MARTÍNEZ, La interoperabilidad y la protección de datos, cit., p. 32. 869 Cf. D

UNI, Giovanni, I "viaggi telematici" dell'atto informatico, cit., p. 1. 870 Sobre o reconhecimento recíproco de documentos públicos eletrônicos, cf. G

AMERO CASADO,Eduardo, Objeto, ámbito de aplicación y principios generales de la ley de administración electrónica, cit., p. 106 e JINESTA LOBO, Ernesto, op. cit., p. 10.

compartilhadas. A interoperabilidade é, assim, o meio pelo qual cada órgão da Administra- ção pode dar fé a tais documentos públicos eletrônicos produzidos por outros órgãos e en- tidades, cumprindo com o referido preceito constitucional.

Por outro lado, a interoperabilidade apresenta uma relevância jurídica especial em razão do fato de que grande parte dos direitos dos cidadãos, na atualidade, passa inevitavelmente pela interconexão entre os diversos órgãos públicos871. Essa integra- ção informativa traz novos contornos a uma relevante questão, relativa à legitimidade da exigência, por parte da Administração, de documentos ou informações que já estejam em poder dos órgãos estatais. Com efeito, tal exigência sempre comportou algum questiona- mento à luz do princípio da proporcionalidade, por importar em um ônus para o adminis- trado, questionável à luz da necessidade. No contexto da administração em papel, o tema nunca trouxe maiores discussões: de fato, em vista do volume absurdo de documentos ar- quivados, nem sempre com os devidos cuidados e métodos, bem como em razão das difi- culdades operacionais relativas à remessa física dos papéis, seria razoável entender-se co- mo necessária a exigência documental. Ademais, na prática, o próprio cidadão muitas ve- zes prefere trazer o documento que obteve em outra repartição pública, ao invés de insistir no desafio de exigir da Administração o cumprimento do dever de ela própria promover a instrução do expediente872. O interessado, assim, sempre assumiu a função de intermediá- rio da informação, armazenando consigo uma quantidade considerável de documentos pú- blicos que poderiam ser necessários para um requerimento administrativo.

A situação muda quando as informações exigidas passam a estar em uma base de dados informatizada pública. Quando isso ocorre, a exigência documental passa a ser juridicamente insustentável, pois já não é possível considerá-la necessária com base nas dificuldades atinentes à localização da informação no âmbito do próprio Poder Público. Tendo em conta a facilidade proporcionada pela remessa por meios eletrônicos, não parece justificado que o interessado deva continuar a realizar o trabalho de intermediação entre os órgãos públicos a fim de obter a informação de que um deles precisa para exercer suas

871 Cf. V

ALERO TORRIJOS, Julián, El régimen jurídico de la e-Administración, cit., p. 204. 872 Sobre essa preferência do cidadão, cf. V

ALERO TORRIJOS, Julián, El régimen jurídico de la e- Administración, cit., p. 15.

competências873. Para suprimir as solicitações repetidas da mesma informação, é preciso um compartilhamento dessa informação entre as entidades públicas interessadas874. Cabe ao órgão solicitante, pois, providenciar o acesso à base de dados que contém a informação que se mostra necessária para a atuação administrativa, livrando o interessado de tal ônus. Para tanto, a solução que se impõe, pois, é tornar interoperáveis os sistemas dos órgãos públicos, compartilhando-se referida informação875.

Vale considerar, ainda, que a interoperabilidade tem um forte componen- te jurídico por ter uma expressão normativa876. A interoperabilidade é garantida mediante um marco institucional, correspondente à definição de padrões que permitam adotar os critérios comuns de atuação para a interação entre os diversos entes envolvidos, o que se conhece como a governança da interoperabilidade877.

873 Cf. V

ALERO TORRIJOS, Julián, El régimen jurídico de la e-Administración, cit., p. 206. Entendendo que a Administração não deve oferecer tais informações em vista de razões de proteção à vida privada e outras liberdades, cf. BROUSSEAU, Eric, op. cit., p. 255 e MARCOU, Gérard, op. cit., p. 85.

874

Cf. DE TERWANGNE,Cécile,LOBET-MARIS,Claire,POULLET,Yves,op. cit.,p.24.

875 O direito a não juntar documentos que estejam em poder da Administração Pública é previsto expressa- mente pela legislação espanhola e pode ser entendido como decorrente, por exemplo, do art. 37 da Lei Fede- ral n. 9.784/99 e do art. 31 da Lei n. 14.141/06, do Município de São Paulo. Segundo o texto da lei federal, “[q]uando o interessado declarar que fatos e dados estão registrados em documentos existentes na própria Administração responsável pelo processo ou em outro órgão administrativo, o órgão competente para a ins- trução proverá, de ofício, à obtenção dos documentos ou das respectivas cópias”. No mesmo sentido, com referência apenas ao Poder Executivo Federal, os artigos 2º e 3º do Decreto n. 6.932/09. Todavia, tal direito não é simples de ser posto em prática, especialmente em função da falta de coordenação interadministrativa (cf.BLASCO DÍAZ, José Luis, Los derechos de los ciudadanos en su relación electrónica con la Administraci- ón, cit., p. 816). Conforme tem sido entendido, ele necessita de uma administração mais aperfeiçoada, ágil e eficaz, que tenha meios para conhecer e transmitir os documentos que possui (cf. COTINO HUESO, Lorenzo, Derechos del ciudadano administrado e igualdad ante la implantación de la Administración electrónica, cit., p. 134). Sob este aspecto, vale ressaltar que “o processo de modernização tecnológica da gestão documental da Administração Pública passa em grande medida pela consolidação de uma nova forma de relações admi- nistrativas em que o cidadão já não faz a função de mero intermediário, isto é, de portador de documentos emitidos por uma delas com destino a outra; ao contrário, o pedido e a obtenção dos dados necessários ao exercício das competências administrativas acontecerão – e, de fato, já acontecem em muitos casos – median- te os acessos e as interconexões automatizadas de bases de dados, sem intervenção direta dos servidores públicos” (VALERO TORRIJOS, Julián, La gestión y conservación del documento administrativo electrónico, cit., p. 66, tradução livre).

876 Tratando da necessidade de uma articulação jurídica da interoperabilidade, cf. C

ERRILLO I MARTÍNEZ, La interoperabilidad y la protección de datos, cit., p. 32.

877 Cf. C

Os instrumentos normativos variam conforme o modelo de interoperabi- lidade utilizado878. Caso seja adotado um modelo centralizado, as normas de interoperabi- lidade são editadas por uma autoridade superior, ao passo que a adoção de um modelo des- centralizado ocorre mediante acordo entre as instituições que detêm os sistemas a serem relacionados879. Por outro lado, conforme se estabeleçam recomendações ou normas co- gentes, pode-se falar em modelos voluntários ou vinculantes. Por fim, em função do grau de concreção das normas sobre interoperabilidade – mais precisas ou mais genéricas –, é possível falar em modelos rígidos ou flexíveis. Em qualquer caso, a escolha de um modelo e dos instrumentos para materializá-lo deverá ocorrer com fundamento no ordenamento jurídico880.

Na condição de regras jurídicas, os padrões de interoperabilidade adota- dos pela Administração Pública sujeitam-se à compatibilização com outras normas inte- grantes do ordenamento881. Isso envolve, em primeiro lugar, o respeito às normas jurídicas

No documento Governo eletrônico e direito administrativo (páginas 181-193)

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