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A relevância das novas tecnologias para o direito administrativo

A ciência do direito não pode perder de vista temas atuais, muito menos deixar escapar à sua consideração a revolução decorrente das tecnologias do mundo con- temporâneo256. As mudanças radicais trazidas pela informática e pela telemática já não constituem um futurismo imaginativo, mas realidades – novos hábitos, novas formas de atuar, novas expectativas das pessoas – em relação às quais o jurista não pode ficar inerte, limitando-se a ignorá-las257. Elas se refletem de modo global sobre as relações humanas,

255

Cf. BARNÉS VÁZQUEZ, Javier, Una reflexión introductoria sobre el Derecho Administrativo y la Adminis- tración Pública de la Sociedad de la Información y del Conocimiento, cit., pp. 42-43; CARLONI,Enrico,I servizi in rete delle pubbliche amministrazioni, cit., p. 204 e MARTÍNEZ GUTIÉRREZ, Rubén, Administración Pública Electrónica, cit., p. 231. Neste caso, teria caráter transacional a realização de atividades que envol- vem a produção de algum efeito jurídico. Pode-se falar, pois, em uma tipologia: (a) informação, como ativi- dade unilateral; (b) comunicação, como atividade bilateral e (c) transação, como atividade bilateral dotada de efeitos jurídicos.

256

Segundo BARNÉS VÁZQUEZ,os efeitos e consequências da internet afetam o Estado-nação e o conceito de soberania, a cultura administrativa, as garantias dos direitos fundamentais ou as relações entre o Estado e a sociedade, entre outras partes do direito público (cf. Una reflexión introductoria sobre el Derecho Adminis- trativo y la Administración Pública de la Sociedad de la Información y del Conocimiento, cit., p. 28).Vale transcrever as fortes palavras do autor: “Sem embargo, e valha o exagero, enquanto nos ocupamos do passa- do, enchem-se bibliotecas inteiras nos Estados Unidos e na Europa sobre o futuro da Administração Pública e do Direito Administrativo. Enquanto debatemos se a Administração Pública é filha legítima da Revolução francesa ou sua filiação remonta muito além do Antigo Regime, constrói-se a Administração virtual, a Prefei- tura virtual ou o non-stop-Government. No tempo em que nos detemos ao estudo das peças clássicas do pro- cesso administrativo, recobertas, no mais, por uma densa dogmática processualista e arraigadas em uma con- cepção um tanto reducionista das funções que cabe a ela cumprir, descobrem-se novas dimensões do proces- so administrativo como instrumento de informação, direção política e ponderação de interesses contrapostos, ou se instaura o governo eletrônico. E enquanto observamos o documento escrito, base de toda a filosofia que subjaz ao ato e ao procedimento administrativo ou à teoria da organização, aguarda-nos o documento eletrô- nico, com todos seus efeitos multiplicadores sobre tantas parcelas da vida administrativa (procedimento, organização, registros, etc.). Ou enquanto nos esforçamos por buscar um conceito geométrico de Administra- ção Pública, forja-se uma Administração com uma nova face, na qual a transparência, a abertura e a partici- pação da sociedade, a eficácia, a estrutura reticular e desconcentrada, não piramidal, ou as relações de coope- ração, etc., emergem como renovadas marcas de identidade” (op. cit., p. 40, tradução livre).

257 Cf. V

ILLAR PALASÍ, José Luis, op. cit., p. 501 e OCHOA MONZÓ, Josep, Hacia la ciberadministración y el ciberprocedimiento?, cit., p. 171.

exigindo a adaptação do direito, para que possa garantir sua finalidade258. O direito tem a capacidade de disciplinar a vida social, mas certamente não pode imobilizá-la259, sobretudo quando a nova realidade pode trazer resultados que correspondem aos maiores anseios do respectivo sistema constitucional260. A realidade tecnológica, além de exigir uma normati- zação, abre novas possibilidades para a atuação do direito261. Nesse sentido, a tecnologia não é algo que se impõe ao jurista; ao contrário, é uma ferramenta flexível, objeto de op- ções de desenvolvimento e, portanto, de escolha262.

A informação sempre foi um elemento fundamental para o direito, na condição de meio de transmissão dos símbolos normativos do comportamento, refletidos e definidos nas palavras da lei263. Por isso, todo aperfeiçoamento no trato das informações tende a provocar efeitos significativos sobre o mundo jurídico. Nesse sentido, como veícu- lo destinado ao suporte de informações juridicamente relevantes, o documento escrito re- presentou uma revolução também para o mundo jurídico. Atualmente ocorre outra revolu-

258 Cf. G

ÓMEZ PUENTE, Marcos, op. cit., p. 149; DAVARA RODRÍGUEZ, Miguel Ángel, op. cit., p. 463; FERNÁNDEZ SALMERÓN, Manuel, VALERO TORRIJOS, Julián, La publicidad de la información administrativa en internet: implicaciones para el derecho a la protección de los datos personales, in Revista Aragonesa de Administración Pública, n. 26, Zaragoza, Instituto Aragonés de Administración Pública, jun. 2005, p. 79. 259 Cf. P

ALOMAR OLMEDA, Alberto, La utilización de las nuevas tecnologías en la actuación administrativa, cit., p. 366.

260

Os problemas jurídicos ou organizativos decorrentes da novidade dos meios usados, neste caso, não po- dem impedir a continuidade da modernização administrativa, pois os objetivos e resultados atingíveis por meio do uso da telemática no desempenho da função administrativa são de segura importância e capazes de recompensar os esforços realizados (cf. OROFINO, Angelo Giuseppe, Telematica ed azione amministrativa, in Quaderni del DAE – Rivista di Diritto Amministrativo Elettronico, jul. 2004, disponível em http://www.cesda.it/quadernidae/index.php, acesso em 15.12.2010, p. 2). O tema é tratado, com grande ex- pressividade, pela exposição de motivos da Lei espanhola n. 30/1992, de 26 de novembro: “El extraordinario avance experimentado en nuestras Administraciones Públicas en la tecnificación de sus medios operativos, a través de su cada vez mayor parque informático y telemático, se ha limitado al funcionamiento interno, sin correspondencia relevante con la producción jurídica de su actividad relacionada con los ciudadanos. Las técnicas burocráticas formalistas, supuestamente garantistas, han caducado, por más que a algunos les parez- can inamovibles, y la Ley se abre decididamente a la tecnificación y modernización de la actuación adminis- trativa en su vertiente de producción jurídica y a la adaptación permanente al ritmo de las innovaciones tec- nológicas” (texto disponível em http://www.boe.es/aeboe/consultas/bases_datos/act.php?id=BOE-A-1992- 26318, acesso em 24.02.2011).

261 “Os avanços da ciência e da técnica têm sido, ao longo da história, determinantes na conformação das regras jurídicas e de sua transformação e desenvolvimento. É evidente a dependência do Direito em relação às inovações técnicas produzidas nos diversos ramos do saber humano, e em especial as geradas no mundo da ciência”(MESTRE DELGADO, Juan Francisco, op. cit., p. 117). Essa influência das mudanças tecnológicas é particularmente significativa no caso da Administração Pública e do direito administrativo (cf. OCHOA MON- ZÓ, Josep, Hacia la ciberadministración y el ciberprocedimiento?, cit., p. 152).

262 Cf. P

OULLET, Yves, La technologie et le droit: du défi à l’alliance, in VVAA, Mélanges G. Horsmans, Bruxelles, Bruylant, 2004, p. 966.

263 Cf. F

ção, em razão do uso das novas tecnologias para a aplicação das normas jurídicas264, tor- nando-se a informação cada vez mais importante para o direito, considerada a possibilida- de de seu processamento e transmissão automática para tal finalidade265.

Assim como o direito não pode deixar de levar em conta a sociedade da informação, o direito administrativo não tem como ignorar o governo eletrônico, com todas as inúmeras consequências por ele trazidas, inclusive em relação a institutos jurídicos fun- damentais266. Com efeito, o direito administrativo é marcado pelo contato com a realida- de267, sendo fortemente condicionado pelo contexto temporal, social e tecnológico268, transformando-se rápida e continuamente segundo a realidade existente269. Neste caso es- pecífico, cabe ao direito administrativo regular, de acordo com a realidade atual, o funcio- namento da máquina informacional que é a Administração Pública. No modelo anterior de regulação, as atividades da Administração sempre tiveram como elemento básico e angular o documento escrito em papel270, reservando as tarefas de processamento da informação apenas aos seres humanos. A atualização desse modelo deve levar em conta utilização da tecnologia para suporte e processamento da informação, reconhecendo a sua importância para o direito.

264 Cf. O

CHOA MONZÓ, Josep, Hacia la ciberadministración y el ciberprocedimiento?, cit., p. 153. 265

Com esas posibilidades, “[a] informação se converteu em objeto do direito” (GARCÍA MACHO, Ricardo, op. cit., p. 193).

266 Cf. M

ARTÍN DELGADO, Isaac, La administración electrónica como problema actual para la investigación y la docencia en el derecho administrativo, cit., p. 355. Segundo o mesmo autor, “A aparição de novas tecno- logias acarretou uma revolução tecnológica de indubitáveis consequências no âmbito econômico e social, que está afetando a Administração e, com isto, a própria forma de entender o Direito administrativo” (cf. Natura- leza, Concepto y Régimen Jurídico de la Actuación Administrativa Automatizada, in Revista de Administra- ción Pública, n. 180, Madrid, Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, set.-dez. 2009, p. 354). Muito antes da chamada sociedade da informação, ZEIDLER já apontava que o uso de máquinas no exercício da função administrativa trazia problemas que forçavam a considerar as bases do direito administrativo (cf. Über die Technisierung der Verwaltung (Eine Einführung in die juristische Beurteilung der modernen ver- waltung), 1959, trad. esp. de Manuel Heredero Higueras, Implicaciones jurídicas de la mecanización admi- nistrativa, Madrid, Centro de Formación y Perfeccionamiento de Funcionarios, 1963, p. 13).

267

Assim já se reconheceu: “A atenção principal do jurista deve estar (ou deveria estar) dirigida sempre ao direito vigente. Mas ele também está obrigado a observar os fatos reais, para não perder nunca o contato com a realidade. O especial encanto do direito administrativo e, sobretudo, de sua parte não codificada, está em sua capacidade de adaptação a tal realidade” (ZEIDLER, Karl, op. cit., p. 71).

268 Cf. M

ARTÍN DELGADO, Isaac, La administración electrónica como reto del derecho administrativo en el siglo XXI, cit., p. 326.

269Cf. ibidem, p. 309. 270 Cf. M

Da mesma maneira como a tecnologia tem chegado progressivamente à Administração Pública, as consequências sobre o direito administrativo seguem uma linha evolutiva. No momento em que os computadores eram usados apenas para o armazena- mento de dados, de maneira isolada e estática, não havia efeitos significativos sobre o di- reito administrativo: de fato, toda a atividade administrativa era realizada pelos meios tra- dicionais e depois registrada em meio eletrônico, cabendo ao computador uma função au- xiliar, sendo os efeitos jurídicos sempre intermediados por documentos em papel. O ofere- cimento dessa informação ao público trouxe a possibilidade de produção de consequências jurídicas, levando a discussões, em especial, quanto aos limites de acesso. Questões ainda mais relevantes surgem no plano das chamadas transações realizadas por meio da tecnolo- gia, ou seja, operações com efeitos jurídicos processadas diretamente no computador – sobretudo aquelas que substituem funcionalmente a atuação humana271. Por fim, o desen- volvimento da telemática traz um maior potencial para discussões jurídicas, especialmente no tocante a problemas relacionados à interação entre o usuário e o aparato administrativo, por meio da internet, fazendo surgir questões relevantes a respeito de portais institucionais, assinaturas eletrônicas e notificações por meio de sistemas informatizados272.

No momento atual da evolução da incorporação das novas tecnologias na Administração Pública, essas consequências sobre o direito administrativo chegaram a um elevado nível de importância. Tal como ocorreu em relação às revoluções constitucionalis- tas ocidentais do final do século XVIII, que transformaram o mundo e deram origem ao direito administrativo, a transformação hoje em curso deve levar a mudanças relevantes nesse ramo do direito, que por certo não equivalem a simples retoques superficiais273. É claro que as novas tecnologias não mudarão a essência da Administração Pública e do di-

271

Desde os anos 60 as possibilidades de tratamento automático de informações passaram a ser aceitas por juristas “práticos” e pelos operadores do direito (cf. CARIDI, Gianfranco, op. cit., p. 15). Realmente, desde então, muitas operações juridicamente relevantes, especialmente em matéria contábil e de recursos humanos, têm sido desempenhadas por meio de sistemas informatizados, com efeitos jurídicos plenos, sem que isso gere perplexidades ou questionamentos relevantes. O baixo nível de contenciosidade talvez explique o fato de esses milhões de operações juridicamente relevantes serem pouco levadas em conta sob a ótica do direito. 272 Há quem considere o direito do governo eletrônico uma consequência da internet (cf. G

ARCÍA MEXÍA, Pablo, op. cit., p. 88). Essa perspectiva, contudo, equivale a restringir um âmbito temático maior, que inclui não somente a rede mundial de computadores, mas a aplicação de regras jurídicas no plano interno da Admi- nistração, por meio de sistemas informatizados. A internet atualmente é um elemento essencial para o gover- no eletrônico, porém ambos não se confundem.

273 Cf. G

reito administrativo, ou seja, a sua natureza, objetivos e limites274, bem como seus princí- pios fundamentais275. Todavia, em vista da necessidade de repensar o direito administrati- vo com a mesma intensidade com que se transforma a realidade, não é despropositado falar em um novo direito administrativo, decorrente da incorporação das novas tecnologias na Administração Pública276.

Esse novo direito administrativo pode ser considerado sob duas perspec- tivas diversas: a do direito positivo e a da ciência do direito. Sob a primeira perspectiva, a nova realidade social gerada pelas tecnologias da informação e da comunicação exige uma resposta eficaz por meio de regras que a disciplinem e, assim, garantam a validade jurídica das operações realizadas com seu auxílio, de forma a alcançar os objetivos constitucionais de prestação de melhores serviços277. Com aplicação das novas tecnologias à atividade

274 Cf. G

ÓMEZ PUENTE, Marcos, op. cit., pp. 117-118). Segundo o autor, por mais novos que sejam, estes problemas e questões não se afastam do objeto clássico do direito administrativo: a dialética entre poder estatal e liberdade individual, a eficácia da ação administrativa, o controle da legalidade e o conflito entre o interesse geral e os interesses particulares. Por isso, o desenvolvimento da administração eletrônica não vai necessitar refundação ou reinvenção da Administração e do direito administrativo, ainda que sem dúvida tenhamos que revisar seus procedimentos e métodos (pp. 118-119). Em sentido contrário, falando em recon- siderar o conceito mesmo de Direito Administrativo e Administração, cf.PIÑAR MAÑAS, José Luis, op. cit., p. 51.

275 Cf. M

ARTÍN DELGADO, Isaac, La administración electrónica como problema actual para la investigación y la docencia en el derecho administrativo, cit., pp. 359-360. Segundo GROSS,a estruturação constitucional da organização administrativa é responsável pelo fato de o governo eletrônico não levar, na prática, a uma transformação generalizada da Administração Pública, tendo apenas como efeito facilitar a colaboração e a coordenação entre os órgãos públicos, mas não causando o desaparecimento dos atores individuais ou a trans- ferência de responsabilidades (cf. op. cit., p. 72).

276

Cf. BARNÉS VÁZQUEZ, Javier, Sobre el procedimiento administrativo, cit., p. 302. Segundo o autor, esse novo direito administrativo teria como pontos centrais a a informação e a comunicação, e nele a internet e as novas tecnologias não constituiriam um setor especial, uma política pública ou um simples método de traba- lho da Administração, mas teriam um papel central (cf. Sobre el procedimiento administrativo: evolución y perspectivas, in VVAA, Innovación y reforma en el Derecho Administrativo, Global Law Press – Editorial Derecho Global, Sevilla, 2006, p. 303). Para DUNI,o uso da telemática na ação administrativa constitui um princípio geral do novo direito administrativo (cf. L'amministrazione digitale, cit., p. 12). Segundo LUIS

CARLOS CANCELLIER DE OLIVO,“[u]ma nova sociedade exige a constituição de um novo Estado que se orien-

ta por normas jurídicas de um novo Direito. No presente caso, de um novo Direito Administrativo, sintoniza- do com as demandas e os desafios contemporâneos” Segundo o autor, “este é o desafio do novo milênio: construir um Direito Administrativo da Era Digital, da sociedade do conhecimento, do Estado em rede” (De- safios do direito administrativo diante do Estado em rede, Florianópolis, UFSC, 2000, p. 27).

277

Cf. MARTÍN DELGADO, Isaac, La administración electrónica como problema actual para la investigación y la docencia en el derecho administrativo, cit., p. 375 e La administración electrónica como reto del dere- cho administrativo en el siglo XXI, cit., p. 332). Segundo o autor, variam as formas, pois a organização admi- nistrativa e o exercício da função administrativa são marcadas pelo emprego de novas tecnologias, porém o procedimento administrativo eletrônico não é diferente do procedimento administrativo comum (cf. MARTÍN

DELGADO, Isaac, Naturaleza, Concepto y Régimen Jurídico de la Actuación Administrativa Automatizada, in Revista de Administración Pública, n. 180, Madrid, Centro de Estudios Políticos y Constitucionales, set.-dez. 2009, p. 355).

administrativa, deve-se reconsiderar a regulação em função da existência dos suportes in- formáticos, adaptação que normalmente ocorre com mais antecedência em outros ramos do direito, como é o caso do direito privado278.

Já a ciência do direito não pode deixar de reconhecer a existência de uma realidade a ser estudada e compreendida, de acordo com uma base conceitual279 que permi- ta encontrar as grandes diretrizes de transformação e as consequências produzidas pelas referidas tecnologias em relação aos institutos jurídicos fundamentais280. De fato, a dogmá- tica tradicional do direito público tende a não ser suficiente para explicar as novas estrutu- ras internas, as formas de cooperação interadministrativa e o novo paradigma de relacio- namento com o usuário que caracterizam o governo eletrônico281. Os princípios constitu- cionais da Administração Pública encontram, nessa realidade, novas formas de serem apli- cados, para dar conta das várias situações novas emergentes. É necessário rever vários as- pectos da doutrina do direito administrativo segundo o contexto tecnológico atual282, sendo necessário conceber categorias dogmáticas ainda não tratadas pela doutrina ou até mesmo reavaliar algumas das existentes283.

Os meios para a realização de atividades administrativas, sobretudo as a- tividades burocráticas, nunca foram considerados um tema de estudo relevante. A ciência do direito administrativo sempre teve pouco interesse pelos temas relacionados à atuação material realizada pela Administração, que normalmente obedece a determinações técnicas

278 Cf. M

ARTÍNEZ GUTIÉRREZ, Rubén, Administración Pública Electrónica, cit., p. 210. 279

Ressaltando a necessidade de uma base conceitual que analise com profundidade os efeitos do desenvol- vimento da era digital sobre o direito, cf. PIÑAR MAÑAS, José Luis, op. cit., p. 61.

280 Cf. F

ANTIGROSSI, Umberto, op. cit., p. 9.

281 Dessa forma, “[a] dogmática tradicional do direito público, afirma-se, resulta insuficiente, pelo menos nos âmbitos da informação e do conhecimento. A ideia de subsunção da hipótese de fato de uma norma estável deve ser complementada ou substituída por sistemas operativos e procedimentos adequados, por instrumentos de direção capazes de adaptar-se ao ritmo vertiginoso dos tempos, quando as normas atemporais se mostrem ineficazes” (BARNÉS VÁZQUEZ, Javier, Una reflexión introductoria sobre el Derecho Administrativo y la Administración Pública de la Sociedad de la Información y del Conocimiento, cit., p. 38, tradução livre). Muito antes da chamada sociedade da informação, ZEIDLER já apontava que o uso de máquinas no exercício da função administrativa trazia problemas que forçavam a considerar as bases do direito administrativo (cf. op. cit., p. 13).

282 Falando em reelaborar a teoria do direito administrativo com vistas à implantação da teleadministração na Administração Pública brasileira, com foco no ato administrativo praticado por meio da informática, cf. FIL- GUEIRAS JÚNIOR, Marcus Vinicius, Ato administrativo eletrônico e teleadministração, cit., p. 244.

283 Cf. J

e não a postulados jurídicos. No passado, essa abstenção por parte do direito administrativo não tinha efeitos significativos, pois o poder político fixava de modo taxativo os fins pró- prios da ação administrativa e reconhecia à Administração alguma liberdade para definir como atingi-los. A partir do desenvolvimento tecnológico, é imprescindível rever a liber- dade relativa aos meios de atuação, pois estes passaram a ter a possibilidade de influir dire- tamente nas finalidades perseguidas, havendo o risco de a Administração manipulá-los conforme seus interesses284.

De fato, na tradição do direito administrativo, dificilmente se cogitaria elaborar uma tese de doutorado em direito sobre a técnica de juntada de papéis, o uso de colchetes e clipes, as dimensões e densidades dos papéis, as cores de impressão e escrita ou o posicionamento, em cada folha, de elementos gráficos como timbres, carimbos e assina- turas. Cada um desses temas pode comportar regras técnicas de trabalho destinadas a trazer ganhos de eficiência, mas os meios tradicionais realmente não trazem complexas questões jurídicas. Para realizar atividades administrativas pelos meios tradicionais, basta adotar como aplicáveis alguns postulados universais, de fácil compreensão e aplicação, geralmen- te regulados de modo expresso pelo direito privado, como é o caso do documento em papel e da assinatura manuscrita. Rompendo com tais ideias de simplicidade, neutralidade e esta- bilidade, os complexos mecanismos informáticos e telemáticos podem proporcionar novas questões jurídicas, pois dependem da intermediação por um equipamento, podem ser usa- dos de modo muito mais direcionado285 e estão em contínua transformação, trazendo novos

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