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A terminologia: governo eletrônico, administração eletrônica e democracia ele trônica

1.4. O alcance do governo eletrônico

1.4.1. A terminologia: governo eletrônico, administração eletrônica e democracia ele trônica

A utilização das tecnologias da informação e da comunicação no âmbito do Estado, como fenômeno novo, tem trazido uma considerável confusão terminológica193. O prefixo “e” está cada vez mais ligado a aspectos do governo194, levando ao emprego de vocábulos estrangeiros como e-government, e-governance e e-democracy, bem como de formas aportuguesadas, tais como e-administração, e-governo, e-governança e e- democracia, ou, como adotado neste estudo, governo eletrônico, administração eletrônica e

193 Cf. B

ENYEKHLEF, Karim, op. cit., pp. 268-269. 194 Cf. O

LIVER, E. Lynn, SANDERS, Larry, Introduction, in OLIVER, E. Lynn, SANDERS, Larry (ed.), E- Government Reconsidered: Renewal of Governance for the Knowledge Age, Regina, Canadian Plains Re- search Center, 2004, p. xii.

democracia eletrônica195. Dada a profusão desses novos vocábulos e expressões, é necessá- rio realizar algum esforço dogmático para encontrar certo rigor conceitual em sua utiliza- ção196, até com o propósito de definir com a precisão devida os limites do presente estudo.

Não parece haver dúvida de que, na maioria das vezes, tais vocábulos procuram referir-se, em linhas gerais, a duas grandes realidades: a utilização de meios ele- trônicos nas atividades próprias da Administração Pública e o emprego de meios eletrôni- cos em relação ao processo democrático. No entanto, a distinção entre tais atividades não tem sido suficiente para a adoção de uma terminologia unívoca, especialmente em razão da ampla difusão mundial da expressão e-government e sua delicada tradução para o sistema político-administrativo europeu.

Na Europa, tem-se entendido que a expressão inglesa e-government não poderia ser traduzida como governo eletrônico, e sim como administração eletrônica, uma vez que se refere, de forma mais estrita, ao uso das tecnologias da informação e da comu- nicação pelas Administrações Públicas quando desempenham suas atividades burocráticas.

Governo eletrônico seria um conceito mais amplo que o de administração eletrônica, al-

cançando a utilização das tecnologias da informação e da comunicação nas tarefas de go-

195 Analisando o sistema italiano, D

UNI usa indistintamente os vocábulos eletrônico, digital, informático ou desmaterializado, porque a linguagem comum e legislativa não adota uma relação precisa entre terminolgia e conceitos (L'amministrazione digitale, cit., p. 11). MARCUS VINICIUS FILGUEIRAS JÚNIOR evita o vocábulo virtual, por considerar que os dados digitais são concretos (cf. Ato administrativo eletrônico e teleadminis- tração. Perspectivas de investigação, in Revista de Direito Administrativo, n. 237, jul. /set. 2004, Rio de Janeiro, Renovar, p. 248. FOUILLEUL apresenta a origem do conceito de desmaterialização na França, rela- cionada à supressão dos suportes fisicamente palpáveis no caso dos valores mobiliários, esclarecendo que não se pode falar em desmaterialização quando o registro e a circulação da informação se utilizam da maté- ria. Nesse sentido, o emprego da eletrônica não seria imaterial, mas incorpóreo (cf. Le contrat administratif electronique – L’exemple des marchés publics, Aix-en-Provence, PUAM, 2007, pp. 37-38). O conjunto des- sas observações leva este estudo a usar de modo equivalente os vocábulos eletrônico, digital e informático, evitando-se a terminologia desmaterializado e virtual. Sobre a distinção conceitual entre meios eletrônicos, informáticos e digitais, cf. supra, nota 13. Sobre a diferença entre os adjetivos eletrônico e digital para quali- ficar as assinaturas, cf. infra, nota 434.

196 Cf. V

ALERO TORRIJOS, Julián, La nueva regulación legal del uso de las tecnologías de la información y las comunicaciones en el ámbito administrativo, cit., p. 223 e CURTIN, Gregory G., SOMMER, Michael H., VIS-SOMMER, Veronika, op. cit., pp. 1-2.

verno em toda sua extensão197. Como grande parte da doutrina jurídica anglo-saxã faz refe- rência ao e-government apenas como equivalente a administração eletrônica198, foi neces- sário criar uma expressão, e-governance, para referir-se à aplicação das tecnologias da in- formação e da comunicação em quaisquer tarefas de governo199. Assim, no sistema institu- cional político-administrativo europeu, seriam equivalentes as expressões e-government, administração eletrônica e e-administração, todas elas referentes à aplicação das tecnologi- as pela Administração Pública, sendo o governo eletrônico equivalente ao anglo-saxão e-

governance200. A expressão administração eletrônica é a preferida das instituições comu- nitárias europeias, ainda que internacionalmente se encontre mais difundida a expressão e-

government201.

Contudo, a identificação da principal causa para a confusão terminológi- ca não é capaz de solucionar a questão terminológica e conceitual, havendo uma vasta va- riação de conceitos, nem sempre tão precisos. Há quem entenda como sinônimos adminis-

197 Cf. M

ARTÍNEZ GUTIÉRREZ, Rubén, Instrumentos para el acceso de los ciudadanos a la administración electrónica, in GALINDO AYUDA, Fernando, ROVER, Aires José (coord.), Derecho, gobernanza y tecnologías de la información en la sociedad del conocimiento, Zaragoza, Prensas Universitarias de Zaragoza, 2009, pp. 193-194. Adotando a mesma conceituação, cf. DELPIAZZO, Carlos E., Las nuevas telecomunicaciones y el tránsito de la administración prestacional a la administración electrónica, in Anuario da Facultade de Dere- ito da Universidade de A Coruña, n. 11, A Coruña, Universidade da Coruña, 2007, p. 190. Ainda sobre o tema, com uma análise parcialmente diversa, cf. BENYEKHLEF, Karim, op. cit., p. 272.

198 Segundo observaB

ENYEKHLEF,na definição do E-government Act estadunidense não se inclui a democra- cia eletrônica (parágrafo 36) (cf. op. cit., p. 271). Segundo o referido texto normativo, “„electronic Govern- ment‟ means the use by the Government of web-based Internet applications and other information technolo- gies, combined with processes that implement these technologies, to (A) enhance the access to and delivery of Government information and services to the public, other agencies, and other Government entities; or „„(B) bring about improvements in Government operations that may include effectiveness, efficiency, service quality, or transformation” (§ 3601, 3, texto disponível em http://www.gpo.gov/fdsys/pkg/PLAW-

107publ347/pdf/PLAW-107publ347.pdf).

199 Cf. M

ARTÍNEZ GUTIÉRREZ, Rubén, Instrumentos para el acceso de los ciudadanos a la administración electrónica, cit., p. 194.

200

Cf. ibidem, pp. 195-196. O texto cita o Boletim terminológico 45, editado em 12.09.2002 pela União Eu- ropeia (http://www.europarl.europa.eu/transl_es/plataforma/pagina/celter/bol45.htm), segundo o qual as expressões inglesas eGovernment ou Government on line não se referem a governo, mas a administração, de forma que são errôneas as traduções e-Gobierno, Gobierno electrónico ou Gobierno en línea. De acordo com o texto, a expressão e-Government seria equivalente à expressão castelhana administración electrónica. 201 Cf. G

AMERO CASADO, Objeto y ámbito de aplicación de la Lei 11/07, in VVAA, La protección de datos en la Administración Electrónica, Pamplona, Aranzadi, 2009, p. 111 e GUILLÉN CARAMÉS, Javier, op. cit., p. 252.

tração eletrônica e governo eletrônico202. Por outro lado, não faltam aqueles que compre- endem e-government de maneira mais ampla, designando tanto a administração eletrônica quanto à democracia eletrônica203. Há também os que consideram o e-government como realidade ampla, incluindo a prestação de serviços eletrônicos, o e-service delivery e a e-

governance, referente ao compartilhamento de informações e o engajamento dos cida-

dãos204.

202 Cf. G

AMERO CASADO,Eduardo, Objeto, ámbito de aplicación y principios generales de la ley de adminis- tración electrónica; su posición en el sistema de fuentes, in GAMERO CASADO, Eduardo, VALERO TORRIJOS, Julián (coord.), Comentarios a la Ley de Administración electrónica - Ley 11/2007, de 22 de junio, de acceso electrónico de los ciudadanos a los servicios públicos, 1.ª ed., 2.ª imp., Cizur Menor (Navarra), Thomson- Civitas, 2009, p. 59. Entre nós, há quem entenda administração pública eletrônica como uma tradução ade- quada de electronic government, em função da terminologia própria do direito administrativo (cf. QUADROS, Jaqueline Maria, op. cit., pp. 242-243).

203 Cf. M

ERLONI, Francesco, Sviluppo dell’e-government e riforma delle amministrazioni, cit., p. 4. 204 Cf. M

ITCHINSON, Tom, RATNER, Mark, Promoting Transparency Through the Electronic Dissemination

of Information, in OLIVER, E. Lynn, SANDERS, Larry (ed.), E-Government Reconsidered: Renewal of Gover-

nance for the Knowledge Age, Regina, Canadian Plains Research Center, 2004, p. 89. Na verdade, a confusão terminológica aumenta em relação à e-governance, em relação à qual é muito mais difícil encontrar conceitos que possam ser considerados minimamente universais, tarefa que certamente foge aos propósitos do presente estudo. De fato, além dos sentidos mencionados no texto (e-governance como equivalente de governo eletrô- nico, em sentido amplo, ou parte deste), o conceito de e-governance poderia referir-se à governança (como conjunto de instituições e relacionamentos envolvidos no processo de governar, os processos e instituições, formais e informais, envolvidos na tomada de decisões coletivas) realizada em ambiente eletrônico, por meio de ferramentas eletrônicas (cf. SMITH, Peter Jay, New Information Technologies and Empowerment: The Implications for Politics and Governance, in OLIVER, E. Lynn, SANDERS, Larry (ed.), E-Government Recon- sidered: Renewal of Governance for the Knowledge Age, Regina, Canadian Plains Research Center, 2004, p. 135), ou seja, “como utilização das tecnologias para a good governance de um certo território” (cf. PALMI- RANI, Monica, Prefazione, in PALMIRANI, Monica, MARTONI, Michele, Il cittadino elettronico e l’identità digitale nell’e-governance, Bologna, Gedit, 2006, p. 8), bem como poderia ser aplicado às situações em que os serviços públicos e processos de decisão envolvem diferentes atores, alguns deles de fora da própria esfera governamental, de forma que o poder e os mecanismos do Governo estejam distribuídos em redes das quais participa não unicamente a Administração Pública e nas quais às vezes esta nem sequer é o ator mais impor- tante (cf. AIBAR PUENTES, Eduard, Gobernanza electrónica: innovación tecnológica y cambio organizativo en las burocracias públicas, in FABRA VALLS, Modesto, BLASCO DÍAZ, José Luis (org.), La administración electrónica em España: experiencias y perspectivas de futuro, Castelló de la Plana, Universitat Jaume I, 2007, p. 22). Entre nós, entendendo a governança eletrônica como caracterizada pela interatividade entre governantes e cidadãos, relacionada à participação na tomada de decisões de interesse geral, cf. PEREIRA

JÚNIOR, Jessé Torres, DOTTI, Marinês Restelatto, As licitações e contratações públicas no cenário da gover- nança eletrônica, in Interesse Público, n. 50, Belo Horizonte, Fórum, 2008, p. 47. Adotando a expressão governo eletrônico, sob o argumento de que a governança eletrônica poderia não estar relacionada à Admi- nistração Pública, cf. SANTOLIM,Cesar, Aspectos jurídicos do governo eletrônico: as tecnologias da infor- mação na Administração Pública, in Revista de Direito de Informática e Telecomunicações – RDIT, Belo Horizonte, Fórum, n. 2, jan.-jun. 2007, p. 89.

No Brasil, a terminologia não parece alinhada com as diretrizes europei- as, encontrando-se mais difundida a expressão governo eletrônico para referir-se à incorpo- ração das tecnologias da informação e da comunicação nas atividades administrativas, so- bretudo no tocante ao relacionamento com o usuário. Nesse sentido, o Decreto de 18 de outubro de 2000 prevê que o governo eletrônico está voltado para “a prestação de serviços e informações ao cidadão” (art. 1º). Da mesma maneira, governo eletrônico é a expressão mais frequente em portais eletrônicos oficiais205, bem como nas discussões relativas ao tema, em âmbito político ou científico206.

Nesse sentido, procurando alguma sistematização terminológica em lín- gua portuguesa, sem desprezar a designação corrente no Brasil e as diversas contribuições doutrinárias para a devida precisão conceitual, este estudo considera a utilização das tecno- logias da informação e da comunicação no âmbito do Poder Público sob o conceito de go-

verno eletrônico em sentido amplo. Este incluiria tanto a democracia eletrônica quanto o governo eletrônico em sentido estrito ou administração eletrônica207-208.

A democracia eletrônica compreende todos os mecanismos que permitem ao cidadão, utilizando as tecnologias informáticas, participar ativamente da vida pública, tais como o voto eletrônico, o envio de propostas e a participação em procedimentos de decisão política e administrativa209. Dentro da democracia eletrônica está ainda incluído o relacionamento direto com as instituições públicas e representantes políticos (diálogo com

205

Cf., por exemplo, o portal federal http://www.governoeletronico.gov.br, acesso em 01.02.2011. 206 Vale mencionar, por exemplo, a obra organizada por F

LORENCIA FERRER e PAULA SANTOS, E- government: o governo eletrônico no Brasil (São Paulo, Saraiva, 2004), cujo título já ilustra a adoção da terminologia diante do quadro acima exposto, que faz um relato sobre a utilização da expressão governo eletrônico pelo governo federal brasileiro (cf. Introdução, de autoria das organizadoras, p. XIII).

207 Ciberadministração, e-Administração, Administração on line, Administração virtual ou digital e telead- ministração são outros vocábulos e expressões que podem ser usados como sinônimos de administração eletrônica (cf. SANZ LARRUGA, Francisco Javier, Las bases jurídicas de la 'administración electrónica' en España, cit., p. 714). Distinguindo a p-administração (a administração tradicional, que manipula o papel) e a e-administração, ou administração eletrônica, cf. CHATILLON, Georges, Préface, cit., p. 7.

208 A concepção aqui adotada não considera integrante do governo eletrônico a utilização das novas tecnolo- gias no âmbito do Poder Judiciário, que vem sendo, entre nós, tratada no âmbito do direito processual. En- tendendo que o e-governo incluiria não somente o Poder Executivo, mas o Legislativo e o Judiciário, cf. GAROT,Marie José, De la administración electrónica a uma democracia digital, in Revista Direito GV, v. 2, n. 1, São Paulo, FGV, jan-jun. 2006, p. 91.

209 Cf. M

os partidos políticos, correio eletrônico de deputados, enquetes por meio da internet, foros de discussão, jornadas virtuais dos partidos, etc.), conhecido com e-politics210.

A administração eletrônica, ou governo eletrônico em sentido estrito, objeto do presente estudo, pode ser definida como o fenômeno, situado no contexto da chamada sociedade da informação, consistente no uso das tecnologias da informação e da comunicação, especialmente da internet, no âmbito da Administração Pública211, em subs- tituição aos instrumentos tradicionais, baseados no documento em papel. Por meio da utili- zação dos meios eletrônicos, surge a oportunidade para melhorar a circulação da informa- ção nas relações administrativas internas e externas, de forma a obter mais eficácia, efici- ência, rapidez e transparência na atuação administrativa e na prestação de serviços212-213.

210 Cf. P

ITSCHAS, Raines, op. cit., p. 258. 211 Cf. T

INTÓ GIMBERNAT, Montserrat, Administración electrónica y ciberprocedimiento, cit., p. 10. 212

Cf. BOMBARDELLI, Marco, op. cit., p. 992. São inúmeros os textos que trazem definições de administração eletrônica, entre eles: AIBAR PUENTES, Eduard, op. cit., p. 22; COMISSÃO EUROPEIA,Papel da Administração em linha (eGoverno) no futuro da Europa, COM (2003) 567, 26.09.2003, disponível em http://eur-

lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=COM:2003:0567:FIN:PT:PDF, acesso em 12.02.2011; DEL-

GADO GARCÍA, Ana María, OLIVER CUELLO, Rafael, op. cit., p. 3; GAMERO CASADO,Eduardo, Objeto, ámbi- to de aplicación y principios generales de la ley de administración electrónica, cit., p. 60 e Objeto y ámbito de aplicación de la Lei 11/07, cit., p. 109; HOLMES, Douglas, op. cit., p. 2; JINESTA LOBO, Ernesto, Admini- straciones públicas electrónicas: retos y desafíos para su regulación, in Ivstitia, n. 261-262, São José, Vip Tax, set.-out. 2008, p. 6, disponível em www.ernestojinesta.com/ADMINISTRACIONES_PUBLICAS.pdf, acesso em 22.10.2010; MARTÍN DELGADO, Isaac, La administración electrónica como problema actual para la investigación y la docencia en el derecho administrativo, cit., p. 356; MERLONI, Francesco, Sviluppo dell’e-government e riforma delle amministrazioni, cit., p. 4; OLLER RUBERT, Marta, La administración elec- trónica en Europa, in FABRA VALLS, Modesto, BLASCO DÍAZ, José Luis (org.), La administración electróni- ca en España: experiencias y perspectivas de futuro, Castelló de la Plana, Universitat Jaume I, 2007, p. 50; SANZ LARRUGA, Francisco Javier, Las bases jurídicas de la 'administración electrónica' en España, cit., p. 714; VALERO TORRIJOS, Julián, Protecção de datos personales y administración electrónica, in CERRILLO I

MARTÍNEZ, Agustí e oo., La administración y la información, Madrid, Marcial Pons, 2007, p. 44; WORLD

BANK, Definition of e-government, disponível em http://go.worldbank.org/M1JHE0Z280, acesso em 10.02.2011.

213 A alusão aos fins pode ser considerada algo não essencial na conceituação da administração eletrônica. De fato, como mostra GARCÍA MARCO, a administração poderia servir, em tese, até para aumentar o poder do Estado e das elites que o governam, não sendo desprezível, outrossim, a utilização de meios eletrônicos, por exemplo, para os fins estritos de aumento da arrecadação tributária (cf. Administración electrónica: el acceso electrónico de los ciudadanos a los servicios públicos, cit., p. 186). Segundo o autor, no mesmo trecho, “[p]romover o acesso e a comunicação entre o cidadão e a Administração é um bem instrumental, o impor- tante é o que se consegue com esses meios”. Sem dúvida, a incorporação de tecnologias da informação e comunicação em um Estado autoritário poderia também ser chamada de administração eletrônica. Entretanto, no caso da utilização de tais tecnologias em um Estado de Direito, não há como pretender alguma neutralida- de em relação aos valores constitucionais adotados. Dessa maneira, qualquer novo instrumento deve ser visto em seu potencial para a realização dos preceitos constitucionais em vigor. Nesse sentido, é inevitável a alusão aos fins da administração eletrônica já em sua conceituação, embora a análise de seu relacionamento com o sistema constitucional brasileiro seja enfrentada somente mais adiante (cf. Capítulo 2).

A distinção entre administração eletrônica e democracia eletrônica, po- rém, não pode ser considerada absolutamente precisa. Exige-se atualmente que a Adminis- tração – e não só o Parlamento – seja também democrática, prevendo-se inúmeros meca- nismos participativos associados à atuação administrativa, não somente para fins de exercí- cios de direitos democráticos como para o próprio aperfeiçoamento da atividade adminis- trativa. Alguns desses mecanismos podem ser realizados com o auxílio das tecnologias da informação e da comunicação (por exemplo, as consultas públicas eletrônicas e os fóruns de debate eletrônicos). Tais mecanismos podem ser validamente enquadrados tanto como integrantes da administração eletrônica quanto da democracia eletrônica.

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