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A natureza da relação mãe/filho

No documento Vinculação e adopção (páginas 181-184)

CUIDADOS PARENTAIS

I. Cuidados Parentais e Vinculação

1. A natureza da relação mãe/filho

Bowlby (1969/1982) considerou que a relação de vinculação pais/criança era uma relação recíproca: as crianças vinculam-se aos pais e os pais ligam-se afectivamente aos filhos.

O desenvolvimento de uma relação de vinculação com a mãe na infância é considerado um fenómeno normativo. Quase todas as crianças desenvolvem um vínculo com o seu prestador de cuidados, usando-o como fonte de conforto e de segurança face aos perigos e ameaças do meio ambiente. No entanto, a natureza desse vínculo e a eficácia com que o prestador de cuidados é usado face a essas situações de perigo diferem de díade para díade, consoante a qualidade da relação de vinculação estabelecida, como já desenvolvemos em capítulos anteriores.

“A young child’s experience of an encouraging, supportive and co-operative mother, and a little later father, gives him a sense of worth, a belief in the helpfulness of others, and a favourable model on which to build future relationships. Furthermore, by enabling him to explore his environment with confidence and to deal with it effectively, such experience also promotes his sense of competence.

Thenceforward, provided family relationships continue favourably, not only to these early patterns of thought, feeling and behaviour persist, but personality becomes increasingly structured to operate in moderately controlled and resilient ways, and increasingly capable of continuing so despite adverse circumstances. Other types of early childhood and later experience have effects of other kinds, leading usually to personality structures of lowered resilience and defective control, vulnerable structures which also are apt to persist.” (Bowlby, 1982, p. 378)

Construir vínculos faz parte do repertório humano. Os pais têm claramente uma vantagem relativamente aos filhos, quanto à construção dessa relação afectiva, pois mesmo antes de a criança nascer os pais mostram a sua aptidão para se ligarem afectivamente a ela, falando demoradamente sobre o bebé, construindo grandes planos para ele, expressando prazer pelo seu desenvolvimento, ainda na barriga, ouvindo o seu batimento cardíaco e sentindo os seus movimentos. Logo após o nascimento, o contacto físico da mãe com o recém-nascido pode intensificar os sentimentos positivos que já possui pelo seu bebé (Klaus & Kennell, 1982). Contudo, é preciso dizer que a relação de vinculação que o bebé vai construindo nos primeiros anos de vida pode ocorrer mesmo que não exista esse contacto precoce entre os pais e o recém-nascido (Brockington, 1996). Só as crianças que não têm a presença contínua e estável de um prestador de cuidados não criam vínculos. É o caso de crianças criadas em certo tipo de instituições. Todas as outras crianças, mesmo aquelas que são maltratadas, constituem uma vinculação com os pais maltratantes. No entanto, a qualidade das relações de vinculação reflecte a história da relação e está dependente dos cuidados parentais recebidos (Weinfield, N. S., Soufre, A., Egeland, B. & Carlson, E., 1999).

Um importante contributo para o desenvolvimento da relação mãe/filho é a existência das rotinas sincronizadas, estabelecidas nos primeiros meses de vida do bebé (Stern, 1977; Tronick, 1989). Esta interacção coordenada existe se a mãe estiver atenta ao estado do bebé, proporcionando brincadeiras, quando o bebé está alerta e atento, e evitando-as, quando o bebé está sobreexcitado ou cansado. Deve existir uma interacção suave entre a díade, que se ajusta e corrige, tendo em conta o bem-estar dos intervenientes na interacção.

Stern (1977) considera que interacções sincronizadas, entre as crianças e os seus prestadores de cuidados, podem ocorrer várias vezes ao dia e são muito importantes para a criação dos laços afectivos. As interacções continuadas entre a criança e um prestador de cuidados em particular vão permitir-lhe aprender como regular a interacção, nomeadamente como captar a atenção. O prestador de cuidados será melhor na interpretação dos sinais do bebé e a ajustar o seu comportamento na interacção.

Sabe-se hoje que a qualidade dos cuidados parentais que uma criança recebe nos seus primeiros anos de vida é de importância vital para o seu desenvolvimento futuro. É fundamental que o bebé e a criança pequena vivenciem uma relação calorosa, íntima com a mãe (ou substituto materno permanente), na qual ambos encontrem satisfação e prazer. É esta relação complexa, rica e gratificante com a mãe, enriquecida de várias formas pelas relações com o pai e os irmãos, que se pensa estar na base do desenvolvimento da personalidade e saúde mental (Bowlby, 1976).

O que é verdadeiramente importante na relação mãe/filho é que ambos experimentem uma relação afectuosa, íntima e contínua, na qual encontrem satisfação e prazer. A criança precisa de sentir que é objecto de prazer e orgulho para a mãe, tal como a mãe precisa de sentir uma expansão da sua própria personalidade na personalidade do seu filho, isto é, ambos precisam de se sentir identificados. Assim, a prestação de cuidados maternos não pode ser considerada em termos de horas por dia, mas sim da qualidade desse tempo, do prazer que mãe e filho obtêm da companhia um do outro. A continuidade da relação é essencial, quer para a criança, quer para a mãe. Uma mãe só será capaz de dedicar atenção constante ao seu filho se sentir uma profunda satisfação por vê-lo crescer, desenvolver-se e autonomizar-se, se souber que foram os seus cuidados que tornaram, de certa forma, isso possível.

Uma das principais finalidades da família é o exercício da parentalidade. É, sem dúvida, no seio de uma família que mais facilmente podemos encontrar uma relação de qualidade, apesar de haver famílias que falham nesta prestação de cuidados aos filhos. Porém, a retirada de uma criança à sua família deve ser o último recurso a ser considerado e só quando ela de facto corre riscos para o seu desenvolvimento.

No documento Vinculação e adopção (páginas 181-184)