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A necessidade de múltiplos critérios em avaliação de produtos

2. O ESTADO DA ARTE DA GESTÃO OPERACIONAL

2.1. A CONTRIBUIÇÃO DA CONTABILIDADE GERENCIAL

2.1.2. A evolução da Contabilidade Gerencial

2.1.2.2. A necessidade de múltiplos critérios em avaliação de produtos

Pode-se definir a Contabilidade Gerencial, num sentido amplo, como um sistema composto de técnicas e métodos para planejamento, avaliação e controle de produtos e do fluxo das atividades que envolvem o processo produtivo de uma empresa, cuja finalidade básica é fornecer as informações necessárias para o processo de tomada de decisão.

Assim, não se pode analisar os produtos nas empresas exclusivamente sob o enfoque econômico dos sistemas de apropriação de custos como o centro das atenções. Muitos outros aspectos devem ser considerados em termos de desenvolvimento de modelos de gestão, como por exemplo: a qualidade, o mercado, a satisfação dos clientes, os objetivos estratégicos, a competitividade etc.

Entretanto, o que se observa na prática é que os sistemas contábeis, regra geral, resumem-se na análise de valor (volume, custo e lucro) dos produtos quando da tomada de decisão. Os sistemas são desenvolvidos de tal modo que as informações importantes possam ser traduzidas em alguma escala financeira de valor, para que as decisões possam ser justificadas.

Conforme ressaltado, o mundo moderno está mais complexo. Os problemas empresariais já não são simples. Sistemas baseados em “caixa preta” já não atendem as necessidades dos administradores. Johnson e Kaplan (1993, p. 224) ressaltam que “a necessidade de expandir os indicadores sintéticos para além dos utilizados na medição da eficiência de conversão reflete a maior complexidade da tecnologia de produtos e processos, nas organizações contemporâneas”.

A própria forma de administrar uma empresa, ao abandonar o conceito de centralização para basear-se em centros de resultado subentende a existência de múltiplos valores e interesses dos seus gestores, com uma abordagem mais qualitativa do que quantitativa. Na concepção moderna de uma grande corporação, as conseqüências no âmbito da avaliação dos produtos tomam outras proporções, mais complexas ainda. Como determinar, por exemplo, do conjunto de acionistas e diferentes categorias de diretores, quais os aspectos que se deve privilegiar por ocasião do lançamento de um novo produto no mercado? E o preço de venda versus o custo deste produto? Como fica a imagem da empresa frente a isso?

As principais críticas à Contabilidade Gerencial relacionam-se, conseqüentemente, ao fato de que esta não oferece subsídios para a tomada de decisão, quando existe a necessidade de extrapolação das questões financeiras, como no exemplo acima. Por isso, é grande o número de sugestões quanto ao uso de múltiplos indicadores de desempenho de produtos relacionados com o fluxo dos processos empresariais. Assim, Johnson e Kaplan (1993) dizem que mais importante do que tentar apurar lucros

periódicos é calcular e informar uma variedade de indicadores não-financeiros.

“Os indicadores devem se basear na estratégia da companhia, e incluir parâmetros chave de sucesso na fabricação, comercialização e P&D. Por exemplo, uma companhia enfatizando a qualidade poderia apurar indicadores internos de falhas − refugos, reparos, índice de peças defeituosas em um milhão, paralisações não-programadas de máquinas − e também externos − queixas dos clientes, despesas de garantia e pedidos de manutenção. Companhias querendo produzir a custos mais baixos poderão desenvolver indicadores de produtividade, exibindo a tendência de sua capacidade de produzir mais com menos. No curto prazo, lucros mais elevados poderiam decorrer mais da recuperação dos preços do que da maior produtividade, com os preços de seus produtos aumentando mais que os custos dos insumos. Num prazo mais longo, porém, produtores de baixo custo precisam ter sucesso através de g anhos de produtividade, e não somente da exploração de situações favoráveis de preços, provavelmente logo também acessíveis aos competidores” (p. 222).

Uma outra crítica importante aos tradicionais sistemas contábeis de avaliação é a de Shank e Govi ndarajan (1995, p. 175-6):

“Os relatórios convencionais do desempenho de uma empresa, tanto internos (relatórios de orçamento ou de variação) quanto externos (demonstração de resultados ou relatórios de fluxo de caixa) são muito parecidos com o placar em um jogo de beisebol. O placar informa a um jogador se ele está ganhando ou perdendo o jogo, mas diz-lhe pouco se ele está jogando bem ou mal dentro das regras do beisebol. Se ele tentar jogar beisebol olhando o placar, não terá êxito no jogo. Tradicionalmente, uma abordagem de placar tem sido um papel aceitável para os relatórios financeiros, tanto internos quanto externos. O papel dos relatórios contábeis tem sido limitado no sentido de fornecer demonstrativos de desempenho financeiro periódicos, ex post

que provocam este desempenho. Os registros contábeis tradicionais têm a mesma função do placar. O êxito contudo, é uma função da ação − não apenas da observância do placar”.

Este exemplo citado mostra que as medidas financeiras refletem os resultados das decisões passadas e não os passos necessários para a sobrevivência no ambiente competitivo da atualidade, cuja necessidade se faz presente cada vez mais.

Contudo, a necessidade de múltiplas dimensões em gestão operacional não é recente. Isto já foi percebido, mesmo de forma sutil, antes da década de 80, quando a Contabilidade se encontrava às voltas com o desenvolvimento de modelos oriundos da matemática e estatística, refletidos dos desenvolvimentos acadêmicos da Pesquisa Operacional e aplicados aos problemas financeiros da Contabilidade Gerencial. Num dos trabalhos clássicos da época − com enfoque eminentemente quantitativo e voltado para a análise de problemas simples e estruturados do âmbito financeiro e que serviu, posteriormente, de referência para os cursos de Contabilidade Gerencial no Brasil, Kaplan (1982) ressalta a importância do uso de medidas não-financeiras para a avaliação do desempenho das empresas, ao descrever um programa desenvolvido pela General Electric, baseado em oito áreas chaves, como um bom exemplo do uso de múltiplos fatores para a avaliação do desempenho das divisões da empresa12. O autor destaca que “embora seja algo antigo, o sistema de múltiplos fatores da GE ainda é representativo dos esforços das companhias de hoje para avaliar os gerentes dos centros de lucro em outros fatores do que o propalado lucro anual” (p. 501). As oito áreas chaves são:

i. Lucratividade − o primeiro e mais importante índice de desempenho é, ainda, a lucratividade como o resultado do negócio;

ii. Produtividade − esta variável representa a razão entre output e input. O mais comum é medir a lucratividade através do montante de produtos (output) por alguma unidade de input (normalmente mão-de-obra), mas qualquer outro fator de insumo pode ser usado para o cálculo da produtividade. Muitos problemas surgiram na construção de índices de produtividade, incluindo-se o controle nas mudanças relativas no nível de preços e agregação de diversos outputs e inputs físicos;

iii. Posição no mercado a General Electric mensurava esta variável como a participação numa categoria de mercado apropriadamente definida. A empresa pode decidir qual a abrangência da linha de produto e qual a abrangência de mercado, por exemplo: competir diretamente com produtos idênticos ou com produtos substitutos; ou ainda, em fronteiras geográficas do mercado etc.; iv. Liderança de produto − um painel, por divisão, avaliava cada um dos seus

produtos principais através de: a) percentagem de produtos superiores, iguais ou inferiores aos dos concorrentes; b) onde o produto foi desenvolvido na companhia; e c) quem introduziu o produto com melhorias subseqüentes, a

12

Este sistema já havia sido abordado em 1961 por Jerome, em 1955 por Lewis e sumariado no Capítulo VIII de Solomons em 1965 (apud Kaplan, 1982, p. 501).

GE ou os concorrentes;

v. Desenvolvimento do pessoal três medidas foram desenvolvidas para avaliar os resultados dos programas de desenvolvimento dos empregados: a) a taxa de pessoas promovidas do número considerado de promoções e também o número de pessoas promovidas do número total de empregados; b) a proporção de empregados cujo desempenho é considerado melhorado, inalterado ou piorado; e c) a percentagem de empregados que estão satisfeitos ou ins atisfeitos com o desenvolvimento das suas carreiras;

vi. Atitudes dos empregados − esta área era medida por pesquisas periódicas de atitudes de empregados em fatores como satisfação no trabalho, política de pagamento e possibilidade de promoção. A percentagem de respostas favoráveis era anotada e comparada com os resultados anteriores. Outros fatores também eram coletados como: absenteísmo, atrasos, acidentes etc. vii. Responsabilidade pública esta área era menos específica. Pesquisas de

fornecedores, clientes e da comunidade local eram feitas para analisar o impacto de uma divisão na clientela externa; e

viii. Equilíbrio entre objetivos de curto e longo prazos − este fator indicava que em cada um dos sete aspectos anteriores, existem componentes de curta e de longa duração. Os resultados de cada um desses fatores deveria ser analisado pelas conseqüências de curto e longo prazos, de forma que os gerentes tivessem atenção para as conseqüências a longo prazo das ações atuais, que poderiam não ter impactos imediatos sobre a lucratividade atual.

No que diz respeito à conciliação de múltiplos fatores para a avaliação do desempenho, Kaplan (1982) destaca que é problemático atribuir peso a cada uma das várias medidas usadas em conjunto, sobretudo quando da avaliação de gerentes ou divisões em mais que uma dimensão. Percebe-se, portanto, que apesar da importância dada a utilização de múltiplas variáveis, ainda não se encontra uma fórmula explícita para a utilização nas empresas da época, mesmo com o já existente suporte da Pesquisa Operacional. Ao reunir aqueles múltiplos fatores citados, num único modelo de avaliação, os autores ainda têm a preocupação central de como transformá-los em alguma medida financeira, em termos de lucro para a empresa, para fins de mensuração do resultado final do processo.