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2. O ESTADO DA ARTE DA GESTÃO OPERACIONAL

2.1. A CONTRIBUIÇÃO DA CONTABILIDADE GERENCIAL

2.1.1. Os métodos de custeio

2.1.1.3. Custeio baseado em atividades

Com o avanço tecnológico e a crescente complexidade dos sistemas de produção, os custos fixos vêm aumentando continuamente, tanto em termos absolutos quanto em valores relativos. Por outro lado, a diversidade de produtos e de modelos fabricados numa mesma planta fabril que vem ocorrendo nos últimos tempos passaram a exigir melhores sistemas de alocação e avaliação de desempenho de produtos. Em resposta a esta necessidade, surgiu o Custeio Baseado em Atividades – ABC9 como alternativa aos sistemas tradicionais de custeio, cujo objetivo é o de reduzir as distorções causadas pelo rateio arbitrário dos custos fixos aos produtos.

De acordo com Nakagawa (1994), registros históricos indicam que o custeio baseado em atividades já era conhecido e utilizado na década de 60. Entretanto, foi principalmente a partir dos anos 80, nos Estados Unidos, que ela teve seu desenvolvimento, como uma alternativa para o descontentamento existente com os métodos tradicionais de custeio, disponíveis até então.

Num primeiro momento, com o objetivo de melhorar a mensuração do valor dos produtos e a determinação do seu preço de venda, o ABC desenvolveu-se como um sistema estruturado de alocação de custos, através de uma abordagem estratégica, com a identificação das atividades relevantes, denominado “primeira geração do ABC”.

“A primeira versão do ABC preocupava-se em como melhor apropriar o consumo de recursos da empresa aos diversos grupos de atividades, que, por sua vez, eram, aproximadamente da mesma forma, consumidos pelos produtos. Exemplos de grupos de atividades: atividades de setup, atividades de emitir uma ordem de compra, atividades de receb e r e conferir materiais, atividades da mão-de-obra direta, atividades de administração de partes e componentes etc.” (Nakagawa, 1994, p. 68).

O custeio baseado em atividades assume que os recursos de uma empresa são consumidos por suas atividades e não pelos produtos fabricados, os quais surgem como conseqüência das atividades necessárias para produzi-los e comercializá-los. Contudo, ele tem contribuído para a melhoria das sistemáticas tradicionais de análise de

desempenho dos produtos apesar de focar exclusivamente na dimensão econômica-

financeira − cujo objetivo é o rastreamento do fluxo produtivo através da identificação

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das atividades relevantes.

Para Nakagawa (1994), o uso do custeio baseado em atividades, na prática, permitiu a sua ampliação, com a consideração, por exemplo, da análise da rentabilidade de clientes, mercados e canais de distribuição, bem como a gestão de atividades. À medida que isto ocorreu, percebeu-se que a primeira versão do ABC não atendia adequadamente às outras necessidades surgidas, em decorrência das vantagens deste em relação aos métodos tradicionais baseados em volume de produção. Entretanto, como o custeio baseado em atividades possibilita o surgimento de oportunidades para a melhoria dos processos empresariais, os gestores começaram a utilizá-lo, também, para o aperfeiçoamento das atividades sob sua responsabilidade, embora sem grandes sucessos. Uma das suas deficiências é, por exemplo, a falta de condições para separar, do conjunto das atividades, aquelas mais relevantes com o propósito de identificar desempenhos.

Após a divulgação dos resultados práticos da aplicação desta primeira abordagem, aproximadamente no início da década de 90, concomitantemente com a melhoria no entendimento dos conceitos envolvidos, surgiu a segunda geração do ABC, que pode ser caracterizada pelo aumento da sua aplicação a níveis conceitual e prático. Nessa época, criaram-se os sistemas informatizados10 e os métodos de desenvolvimento e implantação do ABC.

A segunda geração ou versão do custeio baseado em atividades, conforme Martins (1996), foi concebida de modo a possibilitar a análise de custos sob duas óticas:

a) a abordagem econômica de custeio, que é uma visão vertical, no sentido de que apropria os custos aos objetos de custeio através das atividades realizadas; e

b) a ótica de aperfeiçoamento dos processos empresariais, que é uma visão

horizontal, na medida em que capta os custos dos processos através das atividades realizadas nos vários departamentos funcionais.

De acordo com o autor, a visão vertical de custeio fornece os mesmos dados que já estavam contemplados na primeira geração do ABC enquanto que a visão horizontal reconhece que um processo é formado por um conjunto de atividades encadeadas, exercidas através dos vários departamentos da empresa, de modo que os processos sejam analisados, custeados e aperfeiçoados através da melhoria de desempenho na execução das atividades.

As principais questões conceituais do custeio baseado em atividades se relacionam, por um lado, à definição do conjunto de atividades relevantes que devem ser objeto de controle e, de outro, à nova dimensão atribuída ao custo direto (nas abordagens tradicionais, os custos diretos são associados aos produtos). Nesta nova abordagem, os custos diretos tornam-se características essenciais das atividades desenvolvidas pela empresa, as quais passam a ser a base de controle dos recursos aplicados no processo.

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Um dos requisitos básicos para a aplicação do custeio baseado em atividades é a informática. Como este método sugere o uso de múltiplos direcionadores de custos, torna-se elevado o volume de cálculos e procedimentos necessários para a coleta e processamento das informações.

Segundo Cooper (apud Gantzel Gantzel, Zani e Allora, 1996, p. 609), no ABC

“as atividades são o foco do processo de custeio. Os custos são investigados, relacionando-se as atividades aos produtos, com base na demanda por tais atividades pelo produto durante o processo de produção. Portanto, as bases de alocação usadas no custeio baseado na atividade são medições das atividades executadas, que podem incluir horas do tempo de ajuste de máquina ou número de vezes em que isso foi feito”.

A forma de identificar os custos pelo método ABC envolve a relação entre os recursos consumidos (o que foi gasto) as atividades executadas (onde foi gasto) e os produtos (para quem foi gasto). Enquanto os métodos tradicionais custeio por absorção e custeio variável − enfocam os produtos através de alocações baseadas em critérios de rateio limitados (normalmente com base no volume de produção), o custeio por atividades utiliza-se de múltiplos direcionadores de custos, cada qual relacionado com uma atividade específica.

Na sua implementação, o ABC envolve a análise de processos, e as informações geradas servem de auxílio na gestão dos respectivos processos. Assim, o ABC pode propiciar uma espécie de reengenharia do fluxo produtivo dentro de uma empresa. De acordo com Martins (1996), a análise de custos propiciada por esta metodologia pode ser complementada pela análise de valor das atividades em conjunto com os processos. Tal análise deve ser realizada sob a ótica do cliente, interno ou externo, isto é, daqueles que recebem e utilizam o bem ou serviço gerado pelas diversas atividades. Neste sentido, propõe-se que os custos sejam segregados por atividades, classificando-se estas em atividades que adicionam ou não valor aos produtos.

As atividades que não adicionam valor, sob a ótica do cliente, são aquelas que podem ser eliminadas sem afetar os atributos dos produtos ou serviços. Para Martins (1996, p. 306), “esse julgamento é um tanto quanto subjetivo; porém, há certo consenso com relação a algumas atividades que não agregam valor, como por exemplo: inspecionar, conferir, retrabalhar, armazenar, movimentar materiais etc.”.

Dentro do ABC, o conceito de atividade ganha importância, na medida em que se torna o foco central de análise. Assim,

“... em sentido restrito, a atividade pode ser definida como um proce sso que combina, de forma adequada, pessoas, tecnologia, materiais, métodos e seu ambiente, tendo como objetivo a produção de produtos. Em sentido mais amplo, entretanto, a atividade não se refere apenas a processos de manufatura, mas também à produção de projetos, serviços etc., bem como às inúmeras ações de suporte a esses processos”

(Nakagawa, 1994, p. 42).

Além disso, a atividade descreve, basicamente, a maneira como uma empresa utiliza o seu tempo e os seus recursos para cumprir objetivos e metas, representado pela execução das atividades em termos de conversão de recursos (materiais, mão-de-obra, tecnologia, informações etc.) em produtos.

Para Brimson (1996, p. 27), “uma atividade descreve o que uma empresa faz a forma como o tempo é gasto e os produtos do processo. A principal função de uma atividade é converter recursos (material, mão-de-obra e tecnologia) em produtos”.

Este conceito de atividade relaciona-se diretamente com a utilização de ins umos (inputs) para a obtenção de produtos (outputs). Portanto, pode-se comparar uma atividade a um processo ou sistema aberto no qual as entradas são os recursos, cujo processamento representa a própria atividade, e as saídas são os produtos.

Uma das vantagens do ABC, ressaltada na literatura, em comparação aos outros métodos de custeio, é que esta permite uma “análise que não se restringe ao custo do produto, sua lucratividade ou não, sua continuidade ou não etc., mas permite que os

processos que ocorrem dentro da empresa também sejam custeados. Aliás, talvez aqui

estejam seus maiores méritos” (Martins, 1996, p. 313). Uma vez que os processos são compostos por atividades, de acordo com o autor, “tal análise permite uma visualização das atividades que podem ser melhoradas, reestruturadas ou até mesmo eliminadas dentro de um processo, de forma a melhorar o desempenho competitivo da empresa” (p. 313). A abordagem de processos é diferente da visão verticalizada dos departamentos, uma vez que os processos são compostos por atividades que não são, necessariamente, desenvolvidas dentro de um único departamento.

Apesar das vantagens conferidas ao custeio baseado em atividades, em relação às metodologias tradicionais de mensuração/avaliação de produtos, mesmo entre os autores da área, não há um consenso sobre a sua efetiva superioridade.

“Todavia, continuam a existir, mesmo dentro do ABC, critérios ou direcionadores de custos que muito comumente contêm variadas doses de subjetivismo; além disso, continuam em pauta todos os problemas derivados da existência da variação nos volumes de produção. Com isso, mesmo no ABC existe aquele velho problema: a companhia aumenta a quantidade de produção do produto B e, por causa disso, automaticamente cai a soma de custo + despesa do produto A; afinal, muitos custos e despesas continuam fixos dentro da empresa (em mu itas delas até tem aumentado, recentemente, a proporção dos custos e despesas indiretos com relação aos custos e despesas diretos de cada produto). Por isso, normalmente a rentabilidade de um produto medida pelo ABC, pelo Custeio por Absorção normal e pelo RKW possuem o

mesmo defeito: os custos fixos criam problema na alocação aos produtos e a variação nos volumes de produção também” (Martins, 1996, p. 237).

Mesmo que alguns autores diferenciem o ABC das metodologias tradicionais como mais moderno, e portanto superior, a existência dos custos fixos acaba por causar algum tipo de problema quando há variação no volume de produção. Além disso, de acordo com o autor, no caso de a empresa lançar um produto novo no mercado, por exemplo, já aparece o primeiro problema: como estimar o volume a ser vendido para, daí então, chegar ao custo unitário global, incluindo-se os custos fixos de produção e as despesas de vendas, administração e financiamento?

Este problema não é, todavia, solucionado por qualquer forma de custeamento em um mercado competitivo. Assim, o custeio baseado em atividades sofre, praticamente, dos mesmos problemas que as demais metodologias apresentadas. Mesmo com a melhoria do entendimento dos custos, através da análise das atividades que compõem o fluxo do processo produtivo, a etapa de alocação de custos aos produtos com base em direcionadores (critérios) sensíveis ao volume de produção resulta, igualmente, em distorções nos valores monetários para fins de tomada de decisão.

Johnson (1994) vai mais longe nas críticas a este método, ao comentar que os custos pelo ABC mudam simplesmente as decisões, não o pensamento gerencial.

“Muitas pessoas discordam da afirmativa de que as informações do ABC não abrem portas para a competitividade. Elas argumentam que as novas ferramentas de custeio baseado em atividades na verdade vão além das sombras e possibilitam que os gerentes controlem melhor os determinantes da competitividade do que fariam com as informações tradicionais sobre custo padrão. De fato os custos do ABC, por focalizarem os recursos, produzem uma melhor compreensão dos custos do que aquela obtida pelo estudo das sombras da contabilidade. Mas acredito firmemente que o uso de informações sobre os direcionadores de custos, baseados em atividades, para controlar as atividades operacionais − não apenas para reconfigurar custos de produtos e outros objetos − leva as empresas a tomar decisões tão danosas à sua competitividade a longo prazo quanto o foram as informações tradicionais sobre custo padrão nos últimos trinta anos” (p. 151).

Para o autor, as empresas não necessitam de melhores decisões mercadológicas e de compras, baseadas em informações do ABC. Para melhorar o desempenho a longo prazo, numa economia global, as empresas competitivas precisam mudar a maneira pela

qual organizam pessoas e trabalho para se tornarem sensíveis e flexíveis. “O caminho para a excelência competitiva global não é atingido fazendo-se melhor aquilo que nem deveria ser feito” (Johnson, 1994, p. 151).