• Nenhum resultado encontrado

2. O ESTADO DA ARTE DA GESTÃO OPERACIONAL

2.1. A CONTRIBUIÇÃO DA CONTABILIDADE GERENCIAL

2.1.3. A perda da relevância da Contabilidade Gerencial

Constantemente, as informações prestadas pela Contabilidade Gerencial são objeto de críticas dos pesquisadores e profissionais das mais diversas áreas do conhecimento. Segundo Clarke (1997) tais críticas podem ser divididas em três grupos:

a) há os que argumentam que o método tradicional de embutir os custos indiretos nos produtos (usando-se, geralmente, as horas diretamente consumidas em mão-de-obra) distorce os custos dos produtos.

Alternativamente, recomenda-se o uso do custeio baseado em atividades que oferece informações mais precisas sobre o custo. Além disso, este também proporciona informações de custo sobre diversas atividades, tornando-se uma ferramenta útil para o gerenciamento de custo e reengenharia da empresa; b) uma segunda crítica à Contabilidade Gerencial é a sua excessiva preocupação

com as medidas de desempenho financeiro. Os defensores da mudança argumentam que deve-se dar maior atenção às medidas de desempenho não- financeiro, porque se a empresa melhora suas medidas operacionais como qualidade, prazos de entrega etc. − o s resultados financeiros certamente aparecem como conseqüência; e

c) por fim, os defensores da mudança sugerem que a Contabilidade Gerencial deve ampliar a sua faixa de orientação, no intuito de incluir informações relevantes sobre o ambiente (inclusive concorrentes) em que a empresa opera.

Sobre estas considerações, pode-se enfatizar que a alta gerência das empresas deve se preocupar não somente com o desempenho interno mas, sobretudo, com as informações externas sobre o ambiente operacional da companhia porque é ali o lugar de competição mercadológica e de sobrevivência das organizações. E isto é diferente da perspectiva contábil tradicional de focalizar medidas internas e de caráter financeiro como o grande objetivo da Contabilidade Gerencial, até porque as decisões, mesmo na área de custos, não são tomadas em cima de base única de dados. Por exemplo, uma estratégia de penetração no mercado, através do lançamento de um novo produto, pode resultar, intencionalmente, em lucros baixos nos primeiros períodos. Caso tal estratégia seja avaliada em base financeira, unicamente, pode parecer um fracasso sob a ótica da Contabilidade. Contudo, o acesso ao mercado, o aprendizado, o reconhecimento da marca, a confiança do cliente etc. podem resultar a longo prazo, mesmo em bases financeiras, como uma decisão de sucesso.

Nesta linha de pensamento, apresenta-se algumas críticas dirigidas à Contabilidade tradicional no que diz respeito ao seu método e, em especial, a sua abrangência como sistema de apoio à decisão, enquanto centrada exclusivamente na dimensão econômica- financeira.

Um dos trabalhos mais polêmicos e, talvez, o que tenha causado maior impacto entre os contadores, relac ionado com a perda da relevância da Contabilidade Gerencial, foi o livro publicado por Johnson e Kaplan (1993). Para os autores,

“Os sistemas de contabilidade gerencial das corporações são inadequados para a realidade atual. Nesta era de rápida mudança tecnológica, de vigorosa competição global e doméstica e uma enorme expansão da capacidade de processamento das informações, os sistemas de contabilidade gerencial estão deixando de fornecer informações úteis e oportunas para as atividades de controle de processos, avaliação do custo dos produtos e avaliação de desempenho

dos gerentes. Predomina uma concepção equivocada de que o uso de informações contábeis para as atividades gerenciais internas de planejamento e controle é um fenômeno novo, proposto pela primeira vez pela análise microeconômica e de decisão dos compêndios, cursos e pesquisas de contabilidade de custos posteriores à Segunda Guerra Mundial. De acordo com esse ponto de vista, a inadequação dos atuais sistemas resulta do retardamento na substituição dos sistemas de contabilidade de custos de antes da guerra − projetados para os informes financeiros e pagamento de impostos − por sistemas de informações e contábeis modernos” (Trecho extraído do Prefácio do Livro).

Entretanto, é o declínio da importância dos sistemas tradicionais de Contabilidade Gerencial que, atualmente, se constitui num fenômeno de críticas e busca por soluções alternativas. As mais importantes contribuições chamam a atenção para o uso de indicadores não-financeiros como medida do desempenho empresarial, conforme ressaltado neste trabalho.

Atualmente, as informações prestadas pela Contabilidade Gerencial, baseada em procedimentos padrões (voltados para fins externos) e ciclos do sistema produtivo (períodos) traduzidos em termos financeiros já não atendem às decisões de planejamento e controle a longo prazo. Com ênfase na realização de objetivos de curto prazo e na lucratividade, os sistemas contábeis internos não respondem à questão de avaliação global da competitividade exigida das organizações no mundo moderno.

Segundo Johnson e Kaplan (1993), essas deficiências têm três conseqüências importantes para as empresas:

i. As informações da Contabilidade Gerencial são de pouca valia para os gerentes em nível operacional, no seu empenho de redução de custos e melhoria da produtividade. Tais informações afetam, freqüentemente, a produtividade, por exigirem dos gerentes operacionais tempo para entender e explicar possíveis divergências ocorridas, e ainda, com pouco relacionamento com a realidade econômica e tecnológica de suas operações. O sistema de Contabilidade Gerencial não apenas deixa de fornecer informação relevante para os gerentes, como também desvia sua atenção de fatores críticos para o desempenho da produção, na medida em que não oferece informações oportunas e detalhadas sobre o rendimento dos processos ou, ainda, ao enfatizar demasiadamente os insumos de produção, como por exemplo, a mão-de-obra direta, cuja importância no sistema produtivo já é secundária; ii. Os sistemas contábeis tampouco conseguem fornecer custos precisos dos

produtos, na medida em que a distribuição dos custos realiza-se através de medidas simplistas e arbitrárias, normalmente baseadas na mão-de-obra

direta, e que não representam as demandas de cada produto sobre os recursos da empresa. Mesmo que os métodos de avaliação do custo de produtos sirvam para fins de informes financeiros, tais métodos condicionam e distorcem os custos dos produtos individualmente. Se as informações distorcidas representam os dados disponíveis sobre os custos dos produtos, as decisões podem resultar equivocadas em termos de fixação do preço de venda, no suprimento de produtos, no mix de produtos e nas respostas aos produtos dos concorrentes; e

iii. Os horizontes dos gerentes se restringem ao ciclo de curto prazo dos demonstrativos periódicos de lucros e perdas. O sistema da contabilidade financeira tradicional trata muitos desembolsos de caixa como despesas do período em que foram efetuados, ainda que tais desembolsos venham a beneficiar períodos futuros. Alguns desembolsos, como por exemplo, em desenvolvimento de novos produtos ou melhoria de processos, em manutenção preventiva, em treinamento e motivação dos empregados, em desenvolvimento de novos sistemas etc. podem produzir influxos de caixa para o futuro. Assim, gerentes pressionados para cumprir metas de lucratividade a curto prazo podem, em certas circunstâncias, alcançar suas metas ao deixar de fazer tais investimentos, e o que é pior, comprometer o longo prazo da empresa tanto em termos de investimentos como de lucratividade, apesar de resultados aparentemente atrativos a curto prazo. Resumidamente, sobre as implicações expostas acima, Johnson e Kaplan (1993, p. 2-3) ressaltam que:

“Os sistemas de contabilidade gerencial atuais fornecem um objetivo enganoso para a atenção gerencial e deixam de propiciar o co njunto relevante de indicadores que reflita adequadamente a tecnologia, os produtos, os processos e o ambiente competitivo em que opera a organização. Concebidos originalmente no início deste século, para ajudar a coordenar as diversas atividades das emergentes empresas verticalmente integradas, os indicadores financeiros, tais como a taxa de retorno sobre o investimento (ROI) tornaram-se para muitas organizações o único indicador de sucesso. Gerentes financeiros, confiando exclusivamente nos demonstrativos financeiros periódicos na avaliação da firma, isolam-se das operações da organização realmente criadoras de valor, e não conseguem reconhecer quando os valores contábeis deixam de fornecer indicadores relevantes ou apropriados das operações da organização”.

Contabilidade, tradicionalmente, não tem dedicado grande importância − exceto no que se refere ao montante das vendas é o relativo ao relacionamento da empresa com os clientes, princ ipalmente sobre o grau de satisfação ou confiabilidade na empresa ou produto. E isto se torna mais preocupante, na medida em que este tipo de relacionamento não pode ser medido em bases financeiras, como de praxe a Contabilidade está acostumada.

Num trabalho posterior, Johnson (1994, p. 106-7) chama a atenção para este assunto, quando comenta o seguinte:

“Uma deficiência básica das informações gerenciais contábeis tradici onais é sua incapacidade para promover a construção de relacionamentos com os clientes. Com exceção de dados sobre receitas, os sistemas contábeis não fornecem quase nenhuma informação a respeito dos cl ientes. E esses dados dizem simplesmente quanto os clientes pagaram pelos itens recebidos. Eles não dizem se os clientes queriam ou gostaram daquilo que receberam. Os dados sobre receitas nunca indicam se os clientes teriam preferido outra coisa, caso estivesse disponível, nem informam a respeito da importância da empresa para eles. Não é de surpreender que os usuários de informações gerenciais contábeis nada digam quando perguntados sobre o que sabem de seus clientes ... O catalisador dos relacionamentos duradouros com os clientes não será constituído por pesquisas de satisfação, mas pelas expressões, por parte da alta gerência, de um forte compromisso com a importância do atendimento ao cliente. Todos na empresa devem projetar a idéia do ponto central que os clientes ocupam na missão da organização”.

De outro lado, mas não tão distante da problemática contábil, Drucker (1990), um autor voltado à escola clássica da administração, também apresenta algumas observações a respeito da Contabilidade. Para o autor, quatro fatores são particularmente importantes no que diz respeito às limitações da Contabilidade Gerencial:

i) a contabilidade de custos é baseada na realidade dos anos de 1920, quando a mão-de-obra direta respondia pela maior parte dos custos industriais de produtos. Hoje, com a inversão proporcional dos custos, isto é, os custos indiretos representam a maior parcela do montante dos esforços de produção, os sistemas de custos ainda utilizam-se de regras arbitrárias para alocação de custos indiretos/fixos aos produtos, como por exemplo: alocação de custos indiretos na exata proporção dos custos de mão-de-obra

de um produto ou no número de horas de trabalho consumidas pelo mesmo;

ii) para a contabilidade de custos, os benefícios de uma mudança no processo ou no método são principalmente definidos em termos de economia de mão-de-obra. Se outros valores são considerados, usualmente é com base na mesma alocação arbitrária na qual os outros custos não decorrentes da mão-de-obra são contabilizados;

iii) comparada a um relógio de sol que mostra as horas quando o sol brilha, mas que não fornece nenhuma informação num dia nublado, a contabilidade tradicional de custos avalia apenas os custos da produção e ignora os custos da não produção, sejam estes resultado de uma máquina parada ou de um defeito de fabricação. A contabilidade de custos-padrão considera que o processo de produção proporciona bons produtos na maior parte do tempo. Mas sabe-se, hoje, que mesmo com a implantação do melhor controle estatístico de qualidade, o tempo não produtivo consome uma grande parte, chegando a 50% em algumas fábricas. O tempo não produtivo custa tanto quanto o tempo em que há produção, entretanto, o sistema tradicional não leva em conta isso; e

iv) finalmente, a contabilidade de custos industriais considera a fábrica como uma entidade isolada a economia de custos na fábrica é ‘real’; o resto é ‘especulação’. A contabilidade de custos tradicional dificilmente pode justificar uma melhoria no produto e, mais dificilmente ainda, uma inovação no processo ou no produto. A automação, por exemplo, é vista como custo, mas quase nunca como benefício.

Vale ressaltar que estas críticas, na maioria, já foram mencionadas há décadas (obviamente, não com tanta ênfase como agora) e mesmo assim, segundo Drucker (1990), estudiosos de contabilidade, contadores profissionais, indústrias, escritórios de perícia e consultoria e gerentes financeiros ainda continuam a utilizar relatórios da contabilidade tradicional nos seus modelos de decisão, como se o poder de aprovação de um projeto residisse exclusivamente no seu retorno financeiro.