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METODOLOGIAS MULTICRITÉRIO

3.1. O PROCESSO DECISÓRIO

3.1.4. A tomada de decisão multicritério

A tomada de decisão é, de fato, parte integrante da vida quotidiana. Mas é uma atividade intrinsecamente complexa e potencialmente das mais controversas, em que se tem de escolher não apenas entre possíveis alternativas de ação, mas também entre pontos de vista e formas de avaliar essas ações, enfim, de considerar uma multiplicidade de fatores direta ou indiretamente relacionados com a decisão a tomar. Por exemplo, o processo de decidir qual processo (ou produto) terceirizar envolve não só a pré- definição, face aos objetivos da compra, de um conjunto de fornecedores entre as marcas presentes no mercado, para a subseqüente avaliação e escolha final, mas também a seleção de critérios como: economia, preço, custos esperados de reposição, atendimento, garantia contra falhas, consumo de energia, potência, qualidade, aparência e tantos outros.

A relevância da tomada de decisão multicritério resulta do fato de que na maioria das situações decisionais, no campo da gestão de empresas, do mundo dos negócios, dos vários níveis do setor público administrativo e empresarial do Estado etc., estão presentes e devem ser ponderados vários objetivos geralmente conflituosos entre si. Conflituosos no sentido de que o aumento do nível de performance em um deles pode estar acompanhado por um decréscimo em algum dos outros, como por exemplo, entre a “minimização do custo” e a “maximização da qualidade do serviço”.

Ressalte-se que a própria relação custo/beneficio, ainda que utilizada como critério único de avaliação de negócios, estabelece implicitamente uma ponderação, uma forma de compensação (trade-off) entre a maximização dos benefícios e a minimização dos custos.

Segundo Zeleny (1982), a tomada de decisão pode ser definida como um esforço para resolver o dilema de objetivos conflituosos, cuja presença impede a existência da “solução ótima” e conduz para a procura da “solução de melhor compromisso”. Daí, a grande importância dos métodos multicritério (ou multiobjetivo) como instrumentos de apoio à tomada de decisão.

Em resumo, um problema de decisão é um problema em que, face a um conjunto de objetivos, há que se considerar um conjunto de soluções possíveis, ou alternativas, as quais são chamadas de ações potenciais, explícita ou implicitamente definidas, dentre as quais pretende-se escolher a ação mais conveniente para um ou vários decisores, ou delimitar o subconjunto das boas, ou ordená-las de forma decrescente de preferência global. Ou, tão somente, descrever as ações e caracterizar as suas múltiplas conseqüências, de forma a facilitar a avaliação e a comparação dos méritos e desvantagens de cada uma delas.

3.1.4.1. O que é um critério

De acordo com Roy (1985), chama-se de critério uma ferramenta que permite comparar alternativas de acordo com um particular “eixo de significância” ou um “Ponto de Vista”. Mais precisamente, um critério é uma função de valor real sobre um conjunto “A” de alternativas, tal que permita comparar duas alternativas “a” e “b”, pertencentes a A, de acordo com um Ponto de Vista particular sobre uma base única entre dois números g(a) e g(b).

Em multicritério, procura-se construir vários critérios com o uso de vários pontos de vista. Estes pontos de vista representam os diferentes eixos ao longo dos quais os diversos atores do processo de decisão justificam, transformam e argumentam as suas preferências. As comparações de cada um desses critérios devem, então, ser interpretadas como preferências parciais, isto é, preferências restritas aos aspectos baseados no Ponto de Vista básico da definição do critério. Enfim, um critério representa um modelo que permite comparar as relações de preferência entre as alternativas em uma determinada dimensão.

3.1.4.2. O processo decisório e os sistemas de gestão

No apoio à decisão, como parte do processo decisório, há um sistema de relações entre os elementos de natureza objetiva (próprias das ações) e os elementos de natureza subjetiva (originárias dos sistemas de valor dos atores envolvidos). Existe, subjacente a estas relações, o predomínio da influência dos valores dos decisores, o que é visto como o elemento motivador da decisão. Na prática não existem decisões isentas de julgamento de valor. E esta é uma das principais preocupações da metodologia MCDA, cujo enfoque é contemplado neste trabalho através da Gestão Multicritério de Produtos.

Para que o facilitador possa gerar comunicação entre os atores e a elaboração adequada dos seus juízos de valor, a sua intervenção não pode ficar delimitada por uma atitude eminentemente tecnocrática, de descoberta ou de descrição de uma realidade objetiva, supostamente desligada dos sistemas de valor dos atores envolvidos. A adoção da via da objetividade, herdada das ciências exatas, repousa sobre a convicção errônea de que deve-se expurgar das tomadas de decisão qualquer atitude subjetiva pela procura da

objetividade (Bana e Costa, 1993).

Os objetivos dos atores são traduzidos em ações que, segundo os seus julgamentos, fazem alcançar uma situação desejável para a situação que a princípio percebe-se como problemática. Estas ações devem atender a complexidade das preferências dos atores. A abstração destes elementos em um processo decisório não pode levar a um conhecimento completo sobre o problema e tampouco pode tornar factível o atendimento das expectativas dos decisores.

Alheio a sua vontade explícita, os consultores têm direcionado esforços sobre sistemas de Contabilidade Gerencial segundo as suas formações e convicções. Como resultado, as organizações têm se esforçado para adaptar as suas necessidades de acordo com as metodologias existentes, uma vez que as questões relacionadas a gestão de informações sobre produtos necessitam de especialização, ou no mínimo de um certo conhecimento acerca do assunto.

Conforme ressaltado neste trabalho, o desenvolvimento e a implantação de sistemas de gestão deve seguir a abordagem construtivista e de apoio à decisão. Isto não significa uma ruptura com os modelos existentes e já amplamente aplicados nas organizações atuais. Muito pelo contrário, o conhecimento adquirido e as teorias que embasam os modelos existentes servem como parâmetros para o desenvolvimento de novos modelos.

A diferença está na forma como pode-se estabelecê-los, através da prescrição de modelos normativos ou, através da construção segundo os valores/interesses dos decisores e os objetivos da organização. O mais importante, no desenvolvimento de modelos construtivistas, é a necessidade de se extrapolar a análise de valor − que privilegia os aspectos econômicos e financeiros e considerar os interesses e os objetivos dos decisores e da organização com a contemplação de vários aspectos do ambiente organizacional.

Como fornecedores de informações para o processo de tomada de decisão, os sistemas de gestão contábil devem observar a perspectiva do apoio à decisão para não se transformarem num fim em si mesmos. Isto é muito comum quando da implantação de modelos normativos para uma realidade empresarial voltada apenas para os aspectos econômico-financeiros. Portanto, sistemas de gestão de produtos devem ser construídos, e não adaptados.

3.1.4.3. Considerações sobre gestão contábil e MCDA

A metodologia Multicritério de Apoio à Decisão direciona os esforços para a construção de modelos de processo decisório segundo os juízos de valor dos decisores, para então, proceder a avaliação. Tais modelos devem permitir aos atores observar os resultados das suas preferências, anseios, percepções e julgamentos em relação ao contexto decisório. Outro aspecto importante é a possibilidade de um ator rever seus juízos e avaliar os resultados globais em função do seu aprendizado com o problema, que a metodologia propicia, e das alterações que podem ocorrer no meio externo e modificar

as circunstâncias do mesmo.

A construção de um modelo que represente as preferências dos decisores e permita uma recursividade, tanto na avaliação como na construção do mesmo, fica limitada pela utilização de axiomas, postulados, ou estruturação de modelos matemáticos mono ou multicritério. Portanto, a construção de modelos de avaliação, baseados na Gestão Multicritério de Produtos, através da abordagem construtivista, tem maiores chances de levar a organização ao sucesso. Nenhum modelo, por mais que já tenha sido testado e utilizado em vários lugares pode oferecer bases mais consistentes para a análise do que aqueles desenvolvidos dentro da realidade da própria organização.

Conforme assinalado, durante o processo de apoio à decisão alguns dados levantados inicialmente podem deixar de ser pertinentes, outros podem aparecer como relevantes e novas questões podem substituir as originais mesmo que a situação não tenha sido fundamentalmente modificada. Os sistemas de gestão e análise precisam incorporar e articular toda esta complexidade. Neste sentido, as abordagens multicritério de apoio à decisão mostram-se adequadas por tratar de sistemas na perspectiva do apoio à decisão, característica essencial da Contabilidade Gerencial, que tem como objetivo servir de instrumento de análise para o processo de tomada de decisão.

É consensual a idéia de que o diferencial competitivo das organizações está na agregação de experiência, criatividade e conhecimento. A utilização e o fomento destes elementos em todas as fases de um processo de apoio à decisão é essencial para a eficácia da construção ou estruturação de um modelo de Gestão Multicritério de Produtos, bem como das decisões decorrentes da sua aplicação. Obviamente, não é tarefa fácil reunir uma multiplicidade de variáveis num único modelo de decisão. Prova disso, é que muitos sistemas de gestão contábil se baseiam exclusivamente em aspectos econômico-financeiros, quanto a forma de mensuração dos resultados18.

A incorporação de múltiplos critérios no processo de gestão dos produtos torna- se fundamental num momento em que as organizações deparam-se com a concorrência global, na qual as políticas e objetivos estratégicos devem ser refletidos desde a definição de critérios de apropriação de custos até as decisões maiores que envolvem cortes ou incentivos a este ou àquele produto, ou ainda, o que é mais importante, sobre a continuidade ou não do próprio negócio.

Talvez, a maior dificuldade na área da gestão contábil esteja em considerar aspectos que, a priori, não podem ser medidos monetariamente, mas que os decisores consideram implicitamente em suas tomadas de decisão. E aí, parece não fazer sentido relacionar a Contabilidade como área responsável para dar resposta a este “problema”. É justamente por negligenciar a relação entre tomada de decisão e apoio à decisão que reside a principal dificuldade, qual seja, a de entender a decisão como um processo do qual fazem parte as características objetivas das ações e as perspectivas subjetivas dos decisores.

Assim, pode-se salientar a dificuldade que a Contabilidade Gerencial tem em difundir-se nas organizações públicas brasileiras, uma vez que não é consensual os

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sistemas de valor dos intervenientes no processo, decisores (agentes ativos) e sociedade (agentes passivos). Por estes motivos, torna-se comum o uso de alternativas existentes, através de adaptações de sistemas e/ou modelos, em contrapartida a um processo de construção, baseado na estruturação, cuja tomada de decisão pode ser melhor compreendida.

3.2. A METODOLOGIA MULTICRITÉRIO DE APOIO À