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A pesquisa ‟A televisão pelo olhar das crianças”

5. O TRABALHO NA ESCOLA PEDRO II

5.2. A OBSERVAÇÃO E A INTERAÇÃO COM ALUNOS E PROFESSORES

5.2.1.2. A pesquisa ‟A televisão pelo olhar das crianças”

O segundo texto que elegemos para delinear a relação das crianças com a mídia tem um cunho menos oficial, por assim dizer. A pesquisa começou em 2004 a partir de um spot televisivo exibido da antiga TVE (hoje TV Brasil) e TV Cultura de São Paulo com um convite a crianças de 8 a 12 anos dos estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais para que enviassem a uma caixa postal textos e desenhos que expressassem a sua opinião a respeito da TV: programação, programas prediletos, o que gostavam e não gostavam de assistir. Foram enviadas 980 respostas, entre textos e desenhos, coletados, basicamente, por professores de escolas públicas e privadas. Os organizadores consideraram o material recebido

[…] extremamente rico e interessante e que demonstra o alto grau de expertise por parte das crianças no que diz respeito ao que veem: elas analisam a televisão com muita competência, demonstrando conhecê-la também pelo lado de dentro […] O texto evidencia que as crianças avaliam que a televisão tem um papel social a cumprir e têm propostas de como ela pode cumpri-lo; apresentam reflexões a respeito do conteúdo do que é exibido e […] mostram-se capazes de estabelecer diálogos criativos com a programação, de analisar criticamente os produtos e, inclusive, de sugerir mudanças (DUARTE, 2008, p. 09 e 12).

A partir do recebimento do material, os membros do Grupo de Pesquisa em Educação e Mídia (GRUPEM), vinculado à PUC-Rio, fizeram uma análise temática da qual resultaram 9 artigos publicados em livro. Destacamos alguns destes artigos como os mais relevantes ao nosso trabalho de pesquisa. Num deles, intitulado Telenovela como porta de entrada para o mundo adulto, a autora revela que 75% das crianças indicam como seus programas favoritos aqueles que não são destinados a elas, incluindo as telenovelas do horário noturno (a exceção ficou para ‟Malhação” da Rede Globo).

A palavra ‟novela” foi citada em 199 dos 577 textos analisados. Deste total, 37 citações ressaltam aspectos negativos das novelas e 127 ressaltam aspectos positivos; 35 crianças enfatizaram em seus textos tanto os aspectos negativos,

quanto positivos, admitindo, por exemplo, que acompanham as histórias, mas sabem que muitas vezes há cenas impróprias, ou que a novela os induz ao consumo exacerbado (FISCHBERG, 2008, p. 112).

Na visão das crianças, aspectos negativos seriam por exemplo, segundo uma menina de 12 anos (Ibidem, p. 114), porque ‟as novelas estão deixando o seu lado cômico e partindo para as cenas eróticas; há novelas que sempre mostram o mal vencendo o bem, sem que nunca se mostre a realidade.” Ou então a indução ao consumo:

‟A TV influencia muitas coisas, principalmente as novelas. As pessoas ficam viciadas em tudo que se fala, em todos os comerciais, e tentam ficar iguais às atrizes”, afirma uma menina de 9 anos. Outra menina de 10 anos escreve sobre a ‟febre consumista”: ‟Gosto de diversas coisas na televisão, como desenhos e novelas, mas às vezes ela nos estimulam a comprar demais. Fazem sempre propaganda do que elas acham que é moda”. Duas outras meninas, estudantes de uma escola particular do Rio de Janeiro, escreveram juntas: ‟As novelas são legais, mas às vezes te enganam demais (Ibidem, p. 115 e 116).

Alguns aspectos positivos ressaltados são as ações sociais como a divulgação do uso de preservativos em relações sexuais ou, como escreve um menino de 12 anos (Ibidem, p. 115), ‟eu gosto da televisão porque ela tem programas que ajudam crianças e adolescentes carentes.” Na conclusão do texto, a autora coloca que as crianças apresentam relativa capacidade crítica em relação à TV e que as questões colocadas pelas crianças mereceriam uma discussão dentro da família e da escola.

O artigo intitulado O consumo audiovisual culturalmente ativo na infância ressalta a importância da televisão para as crianças: Segundo o autor (ALEGRIA, 2008, p. 88), ‟têm noção da dimensão planetária do sistema de comunicação televisiva, reconhecem a relevância desse meio de comunicação.” A este respeito, o artigo destaca uma das cartas, enviada Pedro, de 9 anos, habitante do interior de Minas.

A verdade é que a televisão tem um significado muito grande na vida de um ser humano. Não importa a idade ou posição social, ela veio e tomou conta do planeta, pois é na frente da telinha que a maioria das vezes damos os melhores sorrisos, nos emocionamos com alegrias e deixamos, às vezes sem perceber, rolar uma lágrima no rosto ao ver uma transmissão de um belo jogo numa final de copa do mundo, ou, infelizmente a poder ver do outro lado do mundo aviões se chocando contra as mais belas torres gêmeas, nos Estados Unidos. Esta é a prova de que a TV é sem dúvida uma forma extraordinária de demonstrar ao mundo os mais belos espetáculos ou o mais triste que os nossos olhos já viram. Portanto é a TV o maior meio de comunicação existente (Ibidem).

‟interliga o mundo todo”, que ‟a televisão é para todos”, ‟distrai”, ‟alegra”, ‟é criativa”, mas também ‟vicia”. Também colocam a televisão como uma intrusa que muda a rotina familiar, como no texto a seguir de uma menina de 10 anos do interior de Minas Gerais (Ibidem, p. 90): ‟Pena que a TV tomou todo o tempo da família, hoje os pais preferem ver um bom filme do que dialogar com seus filhos e os filhos por sua vez se prenderam aos desenhos, filme, novelas deixando de lado o convívio familiar.” O autor coloca que os textos refletem a mediação da família e da escola a respeito dos conteúdos televisivos. Por outro lado, as crianças também sofrem influência em casa porque mostram a necessidade de se manter informadas sobre ‟tudo” o que acontece no mundo. Por fim, o artigo conclui que os textos produzidos dentro das escolas sofreram influências morais dos professores (e do ambiente escolar) quando condenam a televisão, embora os alunos se sintam atraídos por ela o que, na visão do autor (Ibidem, p. 93), ‟indica contexto cultural ativo no processo de recepção que buscamos investigar.”