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5. O TRABALHO NA ESCOLA PEDRO II

5.3. OS SUPORTES UTILIZADOS NO QUESTIONAMENTO AO CONSUMO

5.3.1. Os trabalhos escritos

A metodologia de ensino utilizada na disciplina de Sociologia no colégio se apresenta de forma a ser complementar no sentido que as exposições verbais pudessem ser complementadas e encontrar pontos de interseção com outros suportes como o vídeo e a dissertação escrita. A partir de nossos referenciais teóricos encontramos caminhos para entender a aquisição do conhecimento como uma leitura de mundo não-linear em que cada conceito, remete a conexões com outros saberes, outros sentidos. Segundo Freire (1997, p. 139), “a leitura de mundo revela, evidentemente, a inteligência do mundo que vem cultural e socialmente se constituindo. Revela também o trabalho

individual de cada sujeito no próprio processo de assimilação da inteligência do mundo”. Neste processo, trabalham, em termos de discurso, a oralidade e a linguagem escrita. Para decodificar as palavras e a oralizar o texto com fluência, o aluno precisa de treinamento, de estímulo em sala de aula para que se aproprie do verdadeiro sentido das palavras e não apenas repita os conceitos prontos que o professor lhe apresenta. Segundo Chartier (1996, p. 115), “é importante multiplicar no período da aula as oportunidades para que os alunos falem sobre situações da vida, […] os atos da vida cotidiana, que constituem o pano de fundo de muitos escritos escolares”. É com esta prática que poderá desenvolver as potencialidades de seu discurso e, ao se apropriar dos conteúdos das ciências, ser capaz de reproduzi-los em um texto escrito.

Neste sentido, a postura da professora Tatiana, que apresenta exemplos que fazem parte do cotidiano dos alunos para explicar complexas questões de relações de poder, mercado de consumo e comportamento social, dá às crianças e adolescentes a possibilidade da expressão oral, a princípio descompromissada, mas que, ao ver os trabalhos escritos, começam a realmente fazer parte do seu universo de saber. Não queremos aqui desvalorizar a oralidade, já que entendemos que o idioma falado é a melhor expressão daquilo que somos como indivíduos, nossa cultura e nossa origem se expressam verdadeiramente na oralidade. Por outro lado, segundo Stubbs (2002, p. 101), “o lugar dos textos escritos, da escrita e do letramento sempre foi central, e em alguns contextos ‘letrado’ e ‘culto’ são sinônimos. Mas o alto valor atribuído à língua escrita é uma visão que tem suas raízes na cultura ocidental de classe média: não é universal”. Apontamos estes conceitos para fazer entender que não queremos aqui dar um maior valor ao texto escrito sobre a fala. O que pretendemos colocar é que no texto escrito há maior possibilidade de exercermos a teorização e a abstração – para escrevermos a respeito dos conceitos, é preciso que eles tenham sido realmente assimilados.

É por isso que os trabalhos escritos, neste sentido, nos foram reveladores no sentido de responder a perguntas sobre a verdadeira compreensão dos temas expostos na disciplina. Um dos trabalhos que nos pareceu mais pertinente e com direta relação com o nosso objeto de estudo – os hábitos de consumo induzidos pela mídia – leva o título de “Aprofundando o aprendizado sobre ideologia e alienação”. O objetivo da atividade, conforme escrito nas folhas impressas entregues aos alunos, “foi a análise e interpretação de programas para entender a importância dos conceitos de ideologia e alienação”. Para a realização da tarefa, os alunos deveriam selecionar uma publicidade qualquer impressa que deveria ser analisada a partir de um questionário de perguntas. O seguinte texto precedia o questionário:

Conforme estamos estudando durante as aulas da segunda certificação (nota: a segunda certificação equivale à segunda avaliação do ano), a alienação é um fenômeno social que ocorre nas

sociedades capitalistas e que é fundamental para a manutenção de sua existência. No contexto das ciências sociais, alienação significa não possuir, estar despojado de..., não ter acesso a... Relembrando dados já apresentados, na produção capitalista os trabalhadores estão alienados de diferentes maneiras:

1) Alienados dos meios de produção (sem a posse desses), os assalariados estão materialmente submetidos e subjugados às regras de funcionamento do regime capitalista. Devem trabalhar para receber um salário baixo que, na verdade, não inclui todo o valor produzido pelo trabalhador, já que os capitalistas se apropriam da mais-valia (trabalho não pago ao trabalhador) [grifos do autor].

2) Alienados do entendimento claro e ampliado (sem o conhecimento) de como o regime capitalista funciona, os assalariados, embora sejam materialmente explorados, muitas vezes não percebem-se como explorados. Eles não encontram motivos para criticar o sistema em que se encontram, aceitam a sociedade do modo em que está constituída e acreditam que sua condição sócio-econômica é reflexo de seus esforços pessoais insuficientes e/ou medíocres [grifos do autor].

3) Alienados dos meios de produção, alienados do entendimento (sem o conhecimento) de como o regime capitalista funciona, e inebriados e/ou iludidos pela ideologia capitalista, pelos meios de comunicação de massa, pela indústria cultural etc., os assalariados mantém o capitalismo em funcionamento, cooperam para a continuidade da desigualdade sócio-econômica, e operam tal como peças de uma engrenagem mecânica (desumanizados) capazes de produzir lucros cada vez maiores e de reforçar a ciranda financeira do capitalismo globalizado [grifos do autor].

Gostaríamos de ressaltar que os professores que elaboraram a atividade, que deveria ser realizada em grupo de 4 componentes, pedem, antes do questionário que se segue, que os alunos “façam a atividade com calma e trocando ideias. O trabalho em grupo tem o objetivo de fazer com que os alunos SOMEM suas reflexões e seu conhecimento, deixando a alienação de lado!” [grifo do autor].

Questionário [grifos do autor]:

1) O que a propaganda quer que vocês pensem? 2) O que a propaganda quer que vocês façam?

3) A propaganda pretende influenciar o comportamento social de que maneira?

4) Conforme estamos estudando, são característica do sistema capitalista o consumo ininterrupto, a competitividade, a valorização da posse e acumulação de bens materiais e de capital. Assim sendo,

respondam: a propaganda escolhida por vocês valoriza ou desvaloriza o sistema capitalista? Expliquem.

5) Expliquem: a propaganda escolhida reforça ou enfraquece a ideologia capitalista? Por quê? 6) Podemos dizer que a propaganda aliena e/ou conscientiza o público alvo? Justifiquem.

Como vemos, as professoras do Colégio Pedro II não “poupam” os alunos, pelo contrário, as questões propostas na avaliação consideram que os alunos sejam capazes de desenvolver um raciocínio coerente a partir das noções propostas. Antes de apresentarmos algumas das respostas dos trabalhos, gostaríamos de enfatizar que estes alunos estavam chegando ao fim do ano letivo e já haviam tido contato com estes conteúdos previamente em longas exposições verbais da professora Tatiana. Em sala de aula, a docente diz que os alunos devem pensar sobre a publicidade, num trabalho que tenta desenvolver o sentido crítico dos alunos, como já dissemos, aproximando os conceitos ideológicos da realidade dos alunos. Em uma aula no dia 9 de setembro de 2010, a professora explicou que a propaganda e o marketing têm o foco no controle do comportamento social. Diz que os cursos de universitários desta área não existem para formar artistas ou para que os futuros profissionais criem propagandas que despertem o senso crítico do público. Para isso, utiliza o exemplo das sandálias Havaianas:

Para que esse curso? […] Para pessoa decidir se ela vai comparar Ipanema ou Havaianas? Ou se vai ficar descalça ou se vai fazer um chinelo de palha ecologicamente sustentável? Não. A propaganda das Havaianas fala: compre Havaianas. Você tem que usar Havaianas. Existe uma orientação do que a gente deve fazer, e não estimular o questionamento: será que devo comparar as Havaianas? “Atenção, nós estamos disponibilizando as Havaianas, mas só compre se você não tiver outro calçado, se você tiver ainda Havaianas em casa, por favor, esqueça essa propaganda, porque suas Havaianas ainda vai durar uns três ou quatro anos. E se você tiver uma sandália que não vai ser utilizada, vai demorar muitos anos para ser biodegradada. Ela não é biodegradável, você sabe disso, então, deixa para lá. Olha essa propaganda é apenas para pessoa que nunca teve Havaianas na vida ou que não tenha uma agora porque arrebentou. E se a sua arrebentou por gentileza envie a suas Havaianas para o endereço tal que nós vamos reaproveitar a borracha para fazer uma nova, obrigada.” Essa propaganda não existe, não vai existir nunca (BUKOWITZ, 2010b).

Este tipo de abordagem é fundamental para atingir o universo dos alunos. Produtos com os quais se identificam – as sandálias Havaianas deixaram de ser um simples produto utilitário, um calçado nacional confortável e barato, criado no início dos anos 1960, para se tornar um item de moda que remete à jovialidade – e que criam identidade entre os jovens. Assim, entendemos que podem se apropriar de conceitos mais complexos.

Nos trabalhos, os alunos escolheram peças publicitárias de revistas que representam o universo desta faixa etária. Encontramos anúncios de bombons com um casal de namorados,

salgadinhos, suplementos alimentares, bonecos distribuídos no McDonaldʼs, Coca-Cola, balas, shopping centers, lojas de roupas, programas para computador, shampoos e cosméticos juvenis, telefones celular, cadernos escolares. Alguns poucos, escolheram anúncios do mundo adulto como de cerveja e imobiliária, e outros, que remetem ao lar, como de papel higiênico e purificadores de água.

Podemos destacar alguns dos trabalhos pela coerência e coesão do texto. Dentre eles, encontramos o trabalho de Patrick, que tem 13 anos (este trabalho foi feito individualmente). O aluno escolheu uma publicidade da Coca-Cola – reggae: viva o lado Coca-Cola da música (anexo II). À primeira pergunta, respondeu que “Coca-cola combina com todo tipo de música” (a campanha apresentava peças publicitárias com outros gêneros musicais). A reposta para a segunda questão foi “ouçam música bebendo Coca-Cola.” Para a pergunta número 3, sobre a influência do comportamento social, escreveu: “ela quer que com esta propaganda as pessoas bebam Coca-Cola ouvindo músicas em show e fazendo outras coisas também; ou seja, quer aumentar o número de vendas da bebida para entrar mais dinheiro em seus bolsos.” Para a última pergunta, sobre alienação, a resposta foi a seguinte: “Aliena, pois o público acha que beber Coca-Cola é bom mas a empresa não informa o mal que o consumo exagerado faz para o organismo por causa da acidez da bebida.”

Segundo Koch e Travaglia (2007, p. 107) o texto tem a capacidade de integrar todas essas possibilidades de trabalho numa “perspectiva textual-interativa, já que os textos são o meio pelo qual a língua funciona”. Aqui, colocamos um sentido cognitivo e social da língua que revela o estágio de desenvolvimento da formação intelectual dos jovens a respeito dos temas propostos na disciplina de Sociologia. O discurso de Patrick revela que o sentimento crítico começa a despertar no adolescente, principalmente, pela última resposta do trabalho. Mostra que a sua percepção de mundo começa a avançar no sentido do questionamento e capacidade argumentativa, num processo de interiorização dos conceitos relativos ao mercado de consumo. Segundo Fairclough (2001, p. 64), “um discurso é um modo particular de construir um assunto, e o conceito difere de seus predecessores por enfatizar que esses conteúdos ou assuntos – áreas de conhecimento – somente entram nos textos na forma mediada de construções particulares dos mesmos”. Estas construções partem de estímulos propostos em sala de aula para que os alunos entendam que podem desenvolver um pensamento único sobre determinada questão e que não precisam ser induzidos a pensar de uma forma única, que pertença a todos. Este é um trabalho que é desenvolvido no Colégio Pedro II e que tem apresentado os resultados que esperamos na formação crítica dos alunos. Nas palavras da professora Tatiana,

Esse espaço de questionamento precisa ser criado. No momento não existe, o mercado, a mídia televisiva de massa ela não está exatamente voltada para criação de um pensamento crítico, nem para abrir grandes questionamentos. A força do mercado faz com que a gente tenha um procedimento coletivo, um procedimento de massa voltado para o consumo. Para adequação a certos padrões: moda, comportamento, enfim. Questionar isso é ir um pouco no contra fluxo. Eu acho que é possível sim BUKOWITZ, 2010a, p. 7 e 8).

Em outro trabalho, um grupo de 4 meninas, escolheu o anúncio de uma linha de cosméticos da Boticário para adolescentes, publicada na revista Capricho e que leva o nome da publicação (anexo III). A peça publicitária estampa o título: “Dicas Capricho do Boticário para uma vida mais feliz, segundo o Fiuk (cantor, filho de Fábio Jr. que tem fãs no público jovem)”. Abaixo, está escrito: “Linha Love: uma linha completa de beleza para você ficar linda e num clima de romance.” A última frase da publicidade é “Linha Capricho do Boticário. Igual a você: diferente”. À primeira pergunta, as jovens responderam: “Segundo a análise da propaganda percebemos que a mesma quer que nós pensemos que só teremos uma vida feliz e linda se comprarmos os produtos do Boticário”. Na resposta seguinte, escrevem: “A propaganda analisada praticamente ʽmandaʼ nós comprarmos os produtos por todos queremos ser lindos e felizes e só conseguiremos isso (segundo a propaganda) se tivermos a linha de cosméticos do Boticário”. A resposta da terceira pergunta: “A propaganda tende a influenciar as pessoas a comprarem o que o anúncio, bastante atrativo, mostra, criando uma competitividade entre os seres humanos onde um quer ter mais do que o outro, ou seja, em uma sociedade capitalista, ser mais do que o outro”. Na quarta pergunta, as meninas responderam: “A propaganda valoriza o sistema capitalista pois faz com que compremos o produto cada vez mais e o sistema capitalista vai lançando cada vez mais produtos novos, valorizando assim o ciclo do sistema.”. Quinta resposta: “A propaganda reforça as ideias do capitalismo porque através de revistas (propagandas) eles controlam a ideologia das pessoas fazendo com que as pessoas confundam o que é ter e o que é ser”. Sexta resposta: “Visto que o público alvo são os jovens e que eles estão em uma fase que podem ser influenciados, dizemos que a propaganda não aliena e nem conscientiza os mesmos para verem todos os problemas que o capitalismo traz, suas contradições e poderes de ʽdominarʼ o pensamento daquele que se deixa levar na ideologia capitalista.”

Alguns fatores nos chamaram muito a atenção neste trabalho. Fica claro no desenvolvimento das respostas, que o grande interesse e dedicação pela atividade. Em segundo lugar, nos surpreendeu a possibilidade de autorreconhecimento (“visto que o público alvo são os jovens e que eles estão em uma fase que podem ser influenciados [...]”). As 4 meninas têm idades entre 13 e 15 anos e mostram um avanço que poderia ser encarado como precoce, mas que, entendemos, foi fruto do contato que tiveram com os conceitos da disciplina. Elas demonstram

entender como podem ser manipuladas pela publicidade, ainda que façam parte de um grupo de faixa etária muito sujeita aos apelos do mercado de consumo.

Durante o nosso trabalho de observação participativa nas aulas, existia alguma resistência dos alunos aos conceitos apresentados. Sempre levamos em consideração o poder da mídia na determinação de estilos de vida e escolhas, nós, que vivemos num país capitalista, não escapamos disso. O mesmo acontece com estas crianças em um período crucial de sua formação que é a passagem da infância à vida adulta. As campanhas de marketing mantém um olhar específico nesta faixa etária porque estes serão os consumidores do futuro. Em um artigo publicado no site da HSM Global, uma empresa especializada em gestão de negócios, encontramos o conceito de “consumidor do futuro”.

Desde que nasce, o homem busca experiências que o realizem e o satisfaçam. Nessa procura encontra prazer, frustrações e dor. Com o sofrimento é obrigado a tomar consciência de si e da realidade, passa a conhecer sua individualidade e percebe que precisa dominar as rédeas: nasce a necessidade de uma estratégia de vida e dá-se origem ao processo de formação de crenças, valores e hábitos. […] O comportamento do consumidor é previsível, ele procura se elevar na hierarquia de realizações psíquicas (OLIVER, 2010).

Este trabalho da publicidade e marketing que lida com os valores sociais está, basicamente, relacionado com o imaginário. Conforme já colocamos no referencial teórico, o imaginário social é que possibilita a relação entre objeto e imagem, sem a qual não haveria reflexo de nada. É o imaginário que orienta as instituições sociais, os desejos e necessidades, e podemos dizer que mobiliza as vontades que, muitas vezes, têm caráter emocional. No caso da publicidade de maquiagem para meninas, os anunciantes transferem os valores dos adultos para as crianças que agem por pura imitação das mulheres mais velhas de sua convivência – a mãe, tia, vizinhas etc. Mas, por agirem por imitação, as crianças não conseguem apreender o verdadeiro sentido para o uso da maquiagem, as meninas ainda não estão numa fase em que a sexualidade tenha se desenvolvido completamente e não encontram tanto apelo no ato de seduzir o sexo masculino, por exemplo. No documentário Criança, a alma do negócio (CRIANÇA, 2008) – um dos trabalhos em vídeo apresentados na sala de aula, sobre o qual teceremos comentários adiante – vemos uma menina na faixa dos 7, 8 anos que adora se maquiar, mas quando é perguntada do porquê, diz: “isso eu ainda não descobri”.

As meninas que fizeram a atividade no Colégio Pedro II parecem ter desenvolvido uma maior capacidade de crítica do que a personagem do documentário e começam entender como os valores são criados socialmente. Começam a entender que a beleza não está relacionada unicamente

à aparência física e que a maquiagem, por si só, não tem a real possibilidade de transformar mulheres em beldades. É, sem dúvida, um trabalho duro porque o mundo social está plenamente permeado com imagens que remetem a significados, não há como fugir da publicidade, já que ela está por todo lado. Mesmo para aqueles que tomam conhecimento e que conseguem decifrar este código, fica difícil não se encontrar por vezes capturado por esta fantasia. Não esperamos a utopia de que a disciplina de Sociologia, ministrada no Ensino Fundamental, possa fazer com que os alunos passem a ser consumidores que só comprem o que realmente necessitem, mesmo porque esta é uma medida muito vaga – o consumo faz parte de nossa cultura. O que entendemos como um trabalho válido é o questionamento dos valores apresentados pela publicidade. Historicamente, nós brasileiros temos a característica de povo subserviente e pouco contestador (uma das características da subserviência). Contestar o sistema e o estado das coisas em sala de aula, é ajudar estas crianças a desenvolver a capacidade de contestação,

Outras respostas nos pareceram bem reveladoras de que este desenvolvimento pode estar em processo de construção. Sobre o programa Windows 7, da Microsoft, um aluno escreveu: ‟A propaganda quer que pensemos que só nós não temos o Windows 7 e estamos atrasados por conta disso em relação à sociedade”. Em outro trabalho, sobre a Coca-Cola, encontramos a resposta: ‟A propaganda valoriza o sistema capitalista porque lazer hoje em dia é sinônimo de consumo e não de descanso. Para fugir do estresse do dia a dia as pessoas se distraem comprando, se tornaram dependentes das invenções das indústrias e dificilmente vivem sem um carro, celular, chocolate, Coca-Cola, etc.” Outro exemplo: ‟A propaganda quer que nós pensemos que se usarmos essas roupas no ano todo teremos sorte, amor, dinheiro e paz. Ou seja, teremos tudo o que queremos apenas usando roupas que a propaganda diz fazer milagres”. Outra resposta sobre reforçar ou não a ideologia capitalista foi: ‟Reforça. Pois a ideologia capitalista tem como arma principal propagandas legais para as pessoas terem desejo de consumir, de ter, os produtos destas propagandas.” Outra reposta interessante se referia a mais um anúncio da Coca-Cola: ‟A propaganda faz com que as pessoas formem certos grupos com alguma característica ou ideologia parecida entre seus membros, em que nesses grupos sociais as pessoas excluem os que não têm essa característica comum e a classificam como rebeldes. Ou seja, se aplicarmos isso na propaganda da Coca-Cola, pode-se dizer que quem não bebe Coca-Cola não aproveita a vida e tem mau gosto e pode até mesmo ser excluído de certos grupos”. Apesar do tom ingênuo, as respostas abordam profundas questões teóricas como a distinção social. Neste sentido, Bourdieu aborda três maneiras de classe dominante se distinguir.

se em um número de oposições igual às diferentes maneiras de afirmar sua distinção em relação à classe operária e a suas necessidades primárias ou, o que dá no mesmo, igual aos poderes que permitem manter a necessidade à distância. Assim, na classe dominante, pode-se distinguir, simplificando, três estruturas de consumo distribuídas em três itens principais: alimentação, cultura e despesas com apresentação de si e com representação (vestuário, cuidados de beleza, artigos de higiene, pessoal de serviço) (BORDIEU, 2007, p. 174)

Este tipo de distinção parece começar a surgir no ideário dos alunos a partir de seus