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Abordagens atuais e modelos de desenvolvimento profissional

2. Desenvolvimento profissional dos professores

2.1 Abordagens atuais e modelos de desenvolvimento profissional

profissional

Os professores, à semelhança de outros profissionais, necessitam de atualizar os seus conhecimentos e competências, em resposta à mudança que surge no contexto escola e sala de aula, bem como a nível social. As exigências daqui decorrentes, quer no trabalho junto dos alunos, quer junto dos pais e dos próprios colegas, definem o tipo de aprendizagem profissional que os docentes têm que realizar. Esta aprendizagem ocorre pela sua participação numa enorme variedade de atividades formais e informais que influenciam a renovação do seu pensamento e da sua ação e, particularmente, do seu compromisso profissional (Day, 2001). Verifica-se que existe um interesse crescente sobre questões relacionadas com a aprendizagem, com os processos de mudança e o

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desenvolvimento profissional dos professores, na tentativa de compreender as suas preferências e processos de aprendizagem, bem como os contextos em que ocorrem (Lieberman, 1996, Veiga Simão, Caetano & Flores, 2005).

Lieberman (1996), centrando-se num conceito de desenvolvimento profissional numa perspetiva alargada de aprendizagem profissional, apresenta o tipo de práticas que o promovem, olhando os professores como agentes ativos nas decisões sobre os processos e apoios organizacionais fundamentais para aprender na escola, onde se incluem as parcerias e as redes de trabalho. Neste contexto, a autora identifica três cenários principais onde a aprendizagem acontece: a instrução direta, onde se incluem as conferências, cursos, ateliers; a aprendizagem na escola que ocorre através dos amigos críticos, da investigação- ação, da formação de pares; a aprendizagem realizada fora da escola, através das redes de trabalho, de parcerias escola-universidade. Day acrescenta um outro contexto de aprendizagem significativa, a sala de aula, através das reações dos alunos, destacando desta forma a relevância da aprendizagem informal. Além disso considera ainda que a melhoria da qualidade da aprendizagem e desenvolvimento profissional, quer a nível das aprendizagens informais, quer das aprendizagens obtidas a partir de atividades formais de formação, “a perspectiva centrada no aprendente é muito mais importante do que a perspectiva centrada na instrução” (2001, p.19).

No entanto, alguns docentes centram as suas preocupações em formas mais tradicionais de desenvolvimento profissional, procurando melhorar a sua prática e a aprendizagem dos alunos, enquanto outros se centram mais na sua própria aprendizagem numa lógica mais ampla da profissão docente. Sachs (2009), apoiando-se nas abordagens de desenvolvimento profissional contínuo que refletem os princípios mencionados por Grundy e Robison (2004), identifica quatro propósitos para o desenvolvimento profissional contínuo que se interligam: re- instrumentação, remodelação, revitalização e re-imaginação. Os dois primeiros identificam-se com uma abordagem mais tradicional de formação e os segundos mais direcionados para a aprendizagem do professor. Estes possuem formas diferentes de organização e de concretização, conduzindo a resultados distintos

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ao nível da prática do professor e do tipo de profissionalismo que daí emerge. Contudo, na opinião do autor, o desenvolvimento profissional necessita incorporar os quatro elementos de forma a conseguir assegurar que o objetivo de melhorar a aprendizagem dos alunos é alcançado, bem como garantir o apoio a uma profissão docente forte e autónoma.

Esta questão remete-nos para a importância de conhecer diferentes modelos de desenvolvimento profissional, escolhendo os que nos são apresentados por Oliveira-Formosinho (2009, p. 237) a partir da revisão de literatura feita por Sparks e Loucks-Hosley (1990), uma referência neste domínio:

- Desenvolvimento profissional autónomo.

- Desenvolvimento baseado nos processos de observação-supervisão e apoio profissional mútuo.

- Desenvolvimento baseado no processo de desenvolvimento e melhoria. - Desenvolvimento profissional através de cursos de formação.

- Desenvolvimento profissional através da investigação para a ação.

O primeiro modelo, desenvolvimento profissional autónomo, encontra a sua fundamentação teórica em Rogers (1970), que defende a ideia de que a aprendizagem que influencia significativamente o comportamento da pessoa resulta da auto-descoberta. Desta forma assenta no pressuposto de que os professores aprendem sozinhos através das leituras e da experimentação de novas estratégias de instrução, sem que existam programas formais de desenvolvimento profissional.

Este modelo defende que os adultos estão disponíveis para aprender motivados por problemas reais que têm que resolver. Normalmente, o modelo desenvolve-se em torno de situações de sala de aula respondendo de forma concreta às necessidades dos alunos. Há, assim, que ter em consideração as suas necessidades profissionais e pessoais e os contextos em que trabalham, bem como as relações interpessoais que neles estabelecem, dado que o professor regula o seu processo de aprendizagem, não apenas através de processos mentais, mas também através de processos de interação social, tal

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como referem Land (2000); Paris e Winograd (2003), citados por Flores, Veiga Simão, Rajala e Tornberg (2009). A fundamentação teórica do modelo de desenvolvimento profissional autónomo remete ainda para a importância da cultura escolar e dos comportamentos de liderança, uma vez que podem favorecer ou inibir a predisposição e capacidade dos professores para o desenvolvimento, encorajando-os ou não a empenharem-se de uma forma sistemática numa aprendizagem individual e coletiva, formal e informal (Day, 2001).

Segundo Oliveira-Formosinho baseado em Loucks-Horsley et al. (1987), o modelo de desenvolvimento profissioal autónomo “pode capacitar os professores para a resolução dos seus problemas e para desenvolver o seu sentido profissional” (2009, p.239). A autora, referindo-se à aprendizagem do adulto e baseando-se em Clark (1992), Sage e Torp (1997) e Sparks (1997), sublinha a importância das suas necessidades individuais e da sua autodireção. Neste âmbito refere-se ainda à necessidade da resposta acontecer em contextos institucionais e organizacionais favoráveis, num processo de partilha entre pares, com uma cultura e uma liderança promotoras da mudança e da inovação. Fullan e Hargreaves (2001) preconizam a aprendizagem de uns com os outros de forma eficaz e valorizam novas formas de liderança, baseadas num profissionalismo interativo. Relativamente aos contextos referem a necessidade de uma compreensão ecológica do ensino de modo que este se desenvolva de forma adequada às diversas circunstâncias. Um outro aspecto referido pelos autores prende-se com os desafios que os docentes colocam aos alunos, transformando a aprendizagem numa experiência ativa. Contudo, são identificadas algumas caraterísticas contextuais que colocam obstáculos à ação dos professores, particularmente a situação de isolamento na sala de aula e os condicionalismos que impedem o trabalho conjunto com os colegas. Dentro dos obstáculos identificados surge ainda outro factor que pode estabelecer limites às possibilidades de aperfeiçoamento, o currículo, o qual “administrativamente controlado, pode estabelecer limites importantes à colaboração entre docentes” (Fullan & Hargreaves, 2001, p.699), sendo colocada uma grande ênfase no cumprimento do programa.

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O modelo de desenvolvimento profissional baseado nos processos de

observação/supervisão de um professor por outro encontra a sua

fundamentação teórica na literatura sobre supervisão clínica, desenvolvida nos Estados Unidos da América no final dos anos 50. Distinguindo-se de outras práticas supervisivas de caráter mais geral, começou por ser utilizada no âmbito da formação inicial. Contudo, verificou-se o seu alargamento no âmbito da formação contínua perspetivando o desenvolvimento profissional dos professores. Os pressupostos deste modelo centram-se na reflexão e na análise de situações educativas, existindo a reflexão e o apoio profissional mútuo, bem como no feedback sobre os desempenhos observados, o qual surge como “elemento orientador, estimulador e regulador” (Alarcão & Roldão, 2010, p. 31), promovendo mudanças positivas. Este modelo de desenvolvimento profissional, ao tomar a forma do apoio profissional mútuo, faz surgir a noção de coaching, o qual amplia o conceito de treino contribuindo para a compreensão do processo de desenvolvimento que implica a pessoa, comprometendo-a com a condução do próprio processo (Alarcão & Canha, 2013). No âmbito do modelo de desenvolvimento profissional baseado nos processos de observação/supervisão, o apoio profissional mútuo entre colegas tem como finalidade prestar apoio profissional no próprio local de trabalho, contudo a observação neste contexto pode beneficiar ambas as partes envolvidas, o professor observador e o professor em observação (Oliveira-Formosinho, 2009). A reflexão assume igualmente neste modelo um papel fundamental, face ao seu grande potencial formativo, particularmente se ocorrer num contexto aberto à prática de trabalho colaborativo. Por esta razão Oliveira-Formosinho (2009) alerta para a importância do contexto em que o modelo se desenvolve, sendo decisivo para a sua aceitação e utilidade. Neste âmbito as fronteiras ultrapassam as paredes da sala de aula e a supervisão amplia o seu campo de ação (Alarcão, 2000; Sá-Chaves, 2007).

Face à temática central do estudo, bem como do seu enquadramento teórico, este modelo será objeto de aprofundamento em capítulo próprio.

O modelo dedesenvolvimento profissional baseado no processo de

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em torno de problemas concretos, nos quais os professores se envolvem visando a sua resolução. Estes problemas relacionam-se com situações gerais ou específicas de âmbito curricular ou relacionados com a melhoria que se pretende para a escola, cuja resolução exige dos professores a aquisição de conhecimentos e competências que podem obter através da formação, de leituras, de debates, da observação, entre outros. Na prática, é perante a resolução de problemas concretos que os professores desenvolvem os conhecimentos e competências específicas, por exemplo ao nível de planeamento do currículo e da resolução de problemas em grupo.

Barroso considera que este modelo deriva da “formação centrada na escola”, ou seja, “uma formação que faz do establelecimento de ensino o lugar onde emergem as actividades de formação dos seus profissionais, com o fim de identificar problemas, construir soluções e definir projectos” (2003b, p.74). Coloca em relevo a relação entre os modos de ensinar e os modos de organizar e gerir a escola, de forma que esta seja uma “organização qualificante” para os alunos e para os professores.

De acordo com a fundamentação teórica que sustenta este modelo, o mero envolvimento dos professores nos processos de mudança curricular ou organizacional irá promover o seu desenvolvimento profissional, contudo na opinião de Rudduck (1991), citado por Day (200, p. 135-136), aquele poderá não ser suficiente:

(…) para uma auto-renovação de perspectivas e de propósitos, se eles não forem ajudados a adquirir novos hábitos ou a rever os modos de pensamento existentes, as suas predisposições e as suas práticas, então as suas capacidades para contribuírem para uma melhoria da qualidade das oportunidades de aprendizagem dos alunos e para o desenvolvimento do pensamento e das práticas dos seus colegas estarão condicionadas à partida e o seu crescimento será limitado.

Na realidade Sparks e Loucks-Horsey (1990), citados por Oliveira-Formosinho (2009), são de opinião que existe pouca investigação sobre o impacto dos processos de desenvolvimento curricular e organizacional no desenvolvimento profissional dos professores, uma vez que os estudos têm incidido sobre os

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processos de inovação e mudança ou sobre a satisfação dos professores sobre o exercício da função docente.

O modelo de desenvolvimento profissional através de cursos de

formação preconiza o envolvimento dos professores em contextos formais de

formação. São criadas oportunidades que proporcionam a aquisição de conhecimentos e de competências através de diferentes modalidades formativas, onde se incluem as oficinas ou cursos orientados por um formador ou monitor que estabelece os objetivos, os conteúdos a trabalhar e as atividades a desenvolver, bem como a forma e a sequência como estas se apresentam nas diferentes sessões. Estas modalidades incluem, geralmente, um processo que contém uma fundamentação teórica, uma modelação de uma ou várias competências, uma parte de prática simulada e respetivo feedback, podendo ainda assegurar o apoio profissional mútuo no local de trabalho (Oliveira-Formosinho, 2009).

Este modelo remete-nos para a formação contínua de professores que encerra uma grande diversidade de conceitos, sobre os quais nos debruçaremos em capítulo específico. No contexto desta abordagem Sparks e Lucks-Horsley (1990), citados por Oliveira-Formosinho (2009) consideram que os cursos de formação e as oficinas têm a vantagem de mudar os conhecimentos e os comportamentos dos professores e, consequentemente, os desempenhos dos alunos. No entanto, sublinham a necessidade de desenvolvimento de atividades de prolongamento das sessões de formação onde se inclui a observação pelos pares ou situações de apoio profissional mútuo, tendo em vista a aplicação dos conhecimentos adquiridos na formação. Conclui-se que este modelo se aproxima do modelo de desenvolvimento profissional baseado nos processos de observação-supervisão, anteriormente referido.

Ao debruçarmo-nos sobre as questões relacionadas com a formação contínua é, no entanto, relevante considerar as motivações dos professores para este modelo de formação. Para isso recorremos ao estudo realizado por Flores, Simão, Rajala e Aki Tornberg (2009), o qual envolveu 763 professores de Portugal, Finlândia e Sérvia Montenegro. Neste âmbito, os autores distinguiram quatro tipos de motivações: i) políticas, relacionadas com a implementação de

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políticas educativas nacionais e/ou locais; ii) pedagógicas, relacionadas com perspetivas ligadas a uma maior eficácia do ensino; iii) práticas, relativas à resolução de questões sobre o ensino e ainda relacionadas com motivos emancipatórios associados ao seu próprio desenvolvimento. Numa análise global, embora identificassem diferenças significativas entre a opinião dos professores dos três países, concluíram que os motivos emancipatórios e práticos se destacaram comparativamente aos pedagógicos e políticos. São ainda identificados obstáculos que levam os professores a manifestar-se dececionados face à inadequação da formação contínua relativamente aos seus interesses e necessidades, bem como a sua falta de articulação com a prática, a natureza obrigatória de frequência, a falta de diversidade e de flexibilidade. De acordo com a opinião dos autores estas conclusões confirmam as do estudo realizado em Portugal neste domínio por Estrela, Eliseu, Amaral, Carvalho e Pereira (2006) no sentido de que a formação contínua foi concetualizada “enquanto realidade exterior ao sujeito”.

Day sublinha que, com as alterações verificadas ao nível do crescimento do modelo de gestão centrado na escola, bem como as alterações curriculares, conjuntamente com as reformas sobre avaliação, centradas no aumento dos padrões de ensino e de aprendizagem dos alunos na sala de aula, “a formação contínua tornou-se apenas numa das oportunidades de desenvolvimento profissional disponíveis para os professores” (2001, p. 205). De acordo com o autor, historicamente houve poucas tentativas nos países da Europa em garantir o apoio sistemático e diferenciado ao longo da carreira dos professores para o seu desenvolvimento profissional contínuo. Através da análise do Livro Europeu de Estudos Comparativos sobre a Formação dos Professores – 1994 (Sander, 1994), Day constata que nos 21 países abrangidos, o enfoque recaiu sobre a formação inicial dos professores. Relativamente à formação contínua verificou que era de curta duração, organizada numa lógica de top-down, como acontecia em Portugal, e voluntária, não coordenada e não concetualizada em muitos dos outros países europeus.

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O modelo dedesenvolvimento profissional através da investigação para a

ação constitui uma metodologia de planificação, ação, observação e reflexão

sobre a ação, que articula investigação e ensino, teoria e prática, reflexão e ação (Moreira, Paiva, Vieira Barbosa & Fernandes, 2010). A investigação para a ação constitui um processo de natureza cíclica e flexível onde o professor é visto como um profissional autónomo e crítico reflexivo, com uma atitude indagadora perante a prática e os contextos, procurando a melhoria progressiva das condições em que ocorre o processo de ensino e aprendizagem. Desta forma constitui-se como uma estratégia fundamental (Estrela, 2002) que prepara os professores para analisarem e refletirem sobre as circunstâncias complexas relacionadas com aspetos profissionais. Este posicionamento investigativo, face à profissão docente, traduz-se numa ação fortemente participada dos professores, promotora da sua autonomia, bem como da renovação da ação educativa em colaboração com outros atores educativos.

Day (2001) encoraja os professores a serem investigadores dos fenómenos que ocorrem na sala de aula, uma vez que uma questão ou dificuldade identificada podem ser o ponto de partida para desencadear um processo de investigação para a ação, com o fim de equacionar e resolver problemas educativos. Após a identificação do problema, urge indagar sobre a(s) temática(s) através da consulta de literatura sobre o assunto, proceder à recolha de dados na sala de aula ou na escola, ao seu tratamento, análise e interpretação (Oliveira- Formosindo, 2009), tendo em vista a identificação da solução para o problema, seguindo-se a intervenção adequada para o resolver. Assim, a investigação para a ação apresenta-se como um precioso contributo para o desenvolvimento profissional dos professores, bem como para a promoção de uma cultura de transformação dos contextos de trabalho, uma vez que proporciona uma ação reflexiva sistemática de forma participada e colaborativa.

A investigação-ação surge, desta forma, como estratégia de desenvolvimento profissional, visando promover uma posição crítica face ao pensamento e à ação (Moreira, Paiva, Vieira Barbosa & Fernandes, 2010), com vista à melhoria na qualidade das aprendizagens dos alunos e professores com impacto na

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transformação do próprio contexto educativo. O modelo convida, assim, os professores a um questionamento auto-reflexivo sistemático e colaborativo, visando a melhoria das práticas, através de uma metodologia de planificação, ação, observação e reflexão sobre a ação.

Em síntese, Sparks e Loucks-Horsley (1990), citados por Oliveira-Formosinho (2009), ao apresentarem os cinco modelos de desenvolvimento profissional, apresentam igualmente os seus princípios orientadores e investigativos, tentando avaliar o impacto dos mesmos no desenvolvimento profissional dos professores. Neste âmbito, reportamo-nos também à opinião de outros autores dentro da mesma temática que corroboram ou questionam as perspetivas apresentadas e/ou dão o seu contributo através de estudos desenvolvidos. Indepentemente dos modelos e da avaliação sobre o seu impacto no crescimento e desenvolvimento profissional dos professores, parece-nos de salientar que a abordagem, embora apresente uma dimensão de caráter eminentemente teórico, evidencia também sólidos conhecimentos adquiridos na área. Contudo, é de salientar a necessidade sentida sobre uma investigação mais aprofundada relativamente às potencialidades de alguns modelos de desenvolvimento profissional apresentados, dado que ficam algumas questões sobre a sua eficácia ao nível da aquisição de conhecimentos e desenvolvimento de competências dos professores.