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A urgência da reflexão sobre as práticas no contexto de uma educação inclusiva

3. A supervisão numa perspetiva colaborativa

3.4 A urgência da reflexão sobre as práticas no contexto de uma educação inclusiva

Existe um consenso generalizado que o sucesso da educação inclusiva está diretamente relacionado com a melhoria da escola. Assim, o que se deseja neste contexto é que as crianças e jovens tenham uma resposta de qualidade adequada às suas necessidades educativas, o que implica que a escola se organize para que todos os alunos possam ter acesso e sucesso na educação e na aprendizagem.

Contudo, existem ainda barreiras que voluntaria ou involuntariamente são colocadas à aprendizagem de alguns alunos conduzindo ao abandono e à exclusão. Neste âmbito, surgem factores de vária ordem, tais como as políticas educativas, os recursos, a formação de professores, a organização escolar, a gestão da sala de aula, entre outros. Centrando a nossa atenção na realidade de sala de aula, constata-se que, por vezes, “as estratégias convencionais utilizadas para apoiar a diversidade das crianças contribuem para agravar os seus problemas de aprendizagem” (Wang, 1997, p.53). Efetivamente, para assegurar o acesso dos alunos ao currículo comum, conseguindo atingir a meta da equidade educativa, tendo em consideração a diversidade das suas necessidades, as escolas necessitam de mudanças a nível concetual e estrutural. Na realidade, a existência de uma determinada organização pedagógica e padrões culturais uniformes contribuem para que muitos alunos não encontrem a motivação

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necessária na escola (Barroso, 2003). Neste contexto, as mudanças devem permitir uma resposta adequada à diversidade de alunos no que diz respeito às suas especificidades, às comunidades de origem, à sua cultura, às suas experiências e projetos de vida.

A escola deve ainda optar por uma organização que permita criar condições que favoreçam a existência de um espaço de encontro, de reflexão e de diálogo que incentive a colaboração entre os professores e a investigação sobre as práticas. É assim fundamental “desenvolver nos professores uma consciência epistemológica que os leve a questionar as suas práticas e a reflectir sobre elas, a implementar formas de trabalho colaborativo entre os professores e entre estes e os alunos” (Almeida & Rodrigues, 2006, p.24) tendo em vista a implementação de práticas educativas inclusivas. Assim, a escola deve centrar a sua ação na diversidade curricular, desvalorizando o enfoque nas dificuldades do aluno.

Ainscow (1997, p.15), referindo-se às caraterísticas da eficácia da ação do professor, no que diz respeito às formas de trabalhar para que tenha em conta todos os alunos, mesmo os que apresentam dificuldades, destaca algumas estratégias promotoras da sua valorização profissional que se enquadram em duas categorias: oportunidades de considerar novas possibilidades e apoio à experimentação e reflexão. A primeira relaciona-se com o uso de novas metodologias que favoreçam a aprendizagem de todos os alunos, a segunda é relativa à necessidade de reforço da auto-confiança dos professores, aspecto essencial para que possam enfrentar os riscos decorrentes das opções tomadas.

De acordo com a opinião do autor, tendo em vista a criação de salas de aula mais inclusivas, é de grande relevância a participação dos professores em experiências de formação que os incentivem a pôr em prática novas possibilidades de ação, tendo ao seu dispor uma diversidade de estratégias de aprendizagem ativa. Nesta perspetiva os professores situam-se no contexto de sala de aula encarando-o do ponto de vista dos alunos. Os professores são ainda incentivados à planificação das atividades para toda a classe, contrariando a tendência existente de planificação individual quando se trata da inclusão de alunos com necessidades educativas especiais. Dentro das estratégias referidas

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é também valorizada a questão dos recursos naturais a utilizar na sala de aula, os próprios alunos. Os alunos são vistos como um recurso para a própria aprendizagem na perspetiva de que a aprendizagem é “um processo social” (Ainscow, 1997, p.16).

O autor vem neste contexto valorizar o poder dos pares, já referido anteriormente. Contudo, alerta para a necessidade de desenvolvimento de competências nos professores que lhes permitam pôr em prática esta estratégia, uma vez que necessitarão organizar a classe de forma que seja incentivado esse processo social de aprendizagem, necessitando para isso de muito mais do que competências técnicas. Neste âmbito, o autor refere a importância da resposta imediata do professor conseguindo improvisar. Esta necessidade surge, uma vez que “apesar de uma boa planificação, o processo de ensino-aprendizagem é sempre um empreendimento incerto” (Martins, 1998, p.56), no qual os professores têm que responder a situações não planeadas. Desta forma têm que preparar-se para o imprevisto, criando um repertório que lhes irá facilitar a sua ação junto dos alunos. Assim, conseguirão atuar com maior flexibilidade ajustando o plano de aula e as suas respostas à reação dos alunos numa espécie de “planificação rolante”. Segundo Alarcão trata-se da “capacidade de saber agir em situação” perspetiva que concebe um “conhecimento profissional contextualizado e sistematizado numa permanente dinâmica interactiva entre acção e o pensamento ou a reflexão” (2000, p.17)

No âmbito das estratégias ao alcance dos professores, tendo em vista novas formas de desenvolver a prática, a reflexão assume particular importância. Este conceito-chave mereceu já anteriormente uma atenção particular quando nos referimos às estratégias de formação contínua, tendo em vista formar professores reflexivos que questionam e avaliam criticamente as suas práticas. Na abordagem sobre observação das práticas foram novamente reforçadas as estratégias de reflexão numa perspetiva de criação de uma atitude investigativa nos professores face à prática e ao ensino. Esta reflexão crítica, realizada colaborativamente, a qual não se deve limitar à “experiência de sala de aula” (Fullan & Hargreaves, 2001, p.119), surge, assim, de forma indissociável da formação e, por sua vez, do

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desenvolvimento profissional dos professores. Neste contexto, quando a nossa preocupação é tornar a educação para todos uma realidade, a formação dos professores e o seu desenvolvimento profissional surgem como uma condição fundamental, o que atribui à reflexão um particular enfoque, particularmente se considerarmos a sua importância sobre a eficácia do trabalho a realizar com os alunos. Desta forma, os professores terão possibilidade de se tornarem “pensadores reflexivos” (Ainscow, 1997, p.20) e conseguem desenvolver a sua confiança para experimentarem novas práticas, utilizando de forma eficaz o feedback dos alunos (Fullan & Hargreaves, 2001).

A reflexão crítica ajuda os professores a perceber o porquê do trabalho que fazem com os seus alunos, revendo os princípios subjacentes à prática desenvolvida, bem como perceber o grau de eficácia das estratégias utilizadas, tendo em vista a melhoria das práticas. Contudo, é importante referir que as novas respostas encontradas ou a encontrar não se podem limitar aos métodos e às estratégias considerados eficazes, conduzindo a uma perspetiva tecnicista da ação do professor. É importante que o professor passe para uma visão mais ampla que envolva as dimensões contextuais. Na realidade, segundo o modelo ecológico do desenvolvimento humano de Urie Bronfenbrenner, apresentado por Portugal (1992), já mencionado, a experiência contextual constitui um potencial de desenvolvimento do sujeito, considerando as interações entre os diferentes contextos que o envolvem e que influenciam o seu processo de desenvolvimento, ao nível micro, meso, exo e macrossitémico. Assim, o ambiente relevante para o processo de desenvolvimento do sujeito não se limita ao contexto mais próximo e imediato (microssistema), onde se inclui a escola e a família, mas envolve inter- relações entre os vários contextos onde se incluem os contextos sociais e institucionais. De acordo com este modelo existe uma “interação mútua e progressiva entre, por um lado um indivíduo activo, em constante crescimento, e, por outro lado as propriedades sempre em transformação dos meios imediatos em que o indivíduo vive, sendo este processo influenciado pelas relações entre os contextos mais imediatos e os contextos mais vastos em que aqueles se integram” (Portugal, 1992, p. 37).

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Os contextos assumem nesta perspetiva uma importância fundamental, dependendo deles o desenvolvimento do sujeito, desde o microssistema, onde estabelece um contacto mais direto, passando pelo exossistema que se refere a ambientes que não implicando a sua participação ativa, a influenciam, enquanto o próprio sujeito os pode influenciar também. O macrossistema, constituído por ideologias e atitudes, inclui os aspectos relacionados com a cultura e influencia todos os outros sistemas, inclusivamente o próprio sujeito.

Na leitura de Bronfenbrenner, Portugal (1992) considera que será consoante o tipo de relações interpessoais e atividades desenvolvidas num determinado contexto que poderemos compreender o desenvolvimento do sujeito. Assim, situando-nos na realidade escola, é importante uma análise e reflexão sobre as caraterísticas do contexto, no que diz respeito aos papéis desempenhados, o tipo de atividades e de relações e a forma como os alunos os experienciam e de que forma isso afetará o seu desenvolvimento.

A reflexão sobre as práticas não pode, assim, ignorar as caraterísticas contextuais. Recorrendo novamente à perspetiva de Bronfenbrenner, consideramos importante sublinhar que as atividades, os papéis e as relações interpessoais experienciadas pelo sujeito, são determinantes para o seu desenvolvimento, tal como as matrizes que dão forma à natureza dos contextos e das suas relações.