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Crer: – Dar, conceder ou prestar crédito ou assenti- mento a uma coisa. Ter por certo algo que o entendi- mento não alcança. Dar firme e completo assentimento às verdades reveladas por Deus e propostas pela Igreja. Pensar, julgar, haver entendido, suspeitar uma coisa ou estar persuadido dela. Imaginar, figurar, pensar alguma coisa. (Diccionario Enciclopédico Espasa-Calpe.)

Crer: – Ter como certa uma coisa que o entendimen- to não alcança. Dar firme assentimento às verdades re- veladas por Deus e propostas pela Igreja. Pensar, julgar, suspeitar uma coisa ou estar persuadido dela. Ter uma coisa por verossímil ou provável. (Diccionario Real Academia Española.)

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Uma das coisas que mais decepcionam e desorientam a alma huma- na é a carência de fontes que ilustrem, com autoridade, a inteligência que indaga o significado ou o conteúdo das palavras, tal como elas de- vem manifestar-se à consciência do homem.

A enorme variedade de critérios sustentados pelas academias e pelos dicio- nários, que correntemente são utilizados como os meios mais sérios de infor- mação, sempre provocou muita confusão e, sobretudo, uma verdadeira deso- rientação. Quando se trata de esclarecer o conteúdo de certas palavras, espe- cialmente aquelas que mais influência exercem sobre o espírito humano, a fim de determinar os próprios conceitos, percebemos que nem sempre elas são interpretadas com a profundidade necessária para termos, de cada uma delas, uma compreensão cabal e clara; pelo contrário, vemos no final escure- cer ainda mais seu conteúdo, em razão das múltiplas contradições que apare- cem registradas nessas obras que, como dissemos, emanam de diversas fon- tes, quase todas consideradas pouco menos que inquestionáveis.

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A sabedoria logosófica não as discute, nem tampouco as leva em con- sideração ao se pronunciar sobre cada conceito ou vocábulo, cujo con- teúdo exato expressa sem reticência de espécie alguma, para que cada um julgue a diferença de apreciação entre o que vulgarmente foi admi- tido sem reparo e o que a Logosofia diz a respeito.

As reflexões suscitadas como conseqüência por esta revisão de pala- vras e conceitos que reclamam – e até exigem, diríamos – um novo tra- tamento nas formas correntes de expressão, darão a todos, e em parti- cular aos investigadores sinceros, uma excelente oportunidade para discernir a verdade contida nos conceitos expostos pela Logosofia nes- tas páginas, que irão aparecendo sob o título de "Concepção logosófi- ca das palavras". Muito seguramente, esta nova concepção do sentido que elas encerram haverá de promover saudáveis reações nos espíritos amantes da verdade e nas inteligências bem dotadas.

Quando se busca uma simples explicação para conhecer de passagem, ou por exigência de alguma fugaz circunstância, o significado de uma pa- lavra, é indiscutível que não há maiores motivos para nos pormos a pen- sar se o que expressa essa academia ou aquele dicionário, ou o que diz tal ou qual autor a respeito, é a expressão da própria verdade. Comumente se admite o fato como ponto pacífico. E ainda mais quando é o caso dos di- cionários, pois eles até chegam a ser considerados como uma espécie de lei da linguagem. Tanto é assim que, nas escolas primárias e secundárias, como nas universidades, os estudantes devem ater-se ao significado que essas fontes de consulta expressam. Em seguida vêm as interpretações par- ticulares sobre o conteúdo das palavras, buscando-se, geralmente, que elas coincidam com as intenções que cada um tem ao usá-las. Daí chegarmos à seguinte conclusão: falando os seres humanos um mesmo idioma, exis- tem entre eles grandes desentendimentos, compreendendo-se cada dia menos uns aos outros.

A Logosofia mostra e evidencia nestes estudos que, aprofundando o con- teúdo das palavras e a origem dos conceitos, consegue-se obter uma im- pressão cabal do real ou, mais expressivamente ainda, da verdade entra- nhada no significado do elemento que motivou a investigação e do que esse elemento deve representar para a inteligência; o que, porém, dá a sen-

sação mais profunda e plena dessa verdade é, mais que nada, a força da ló- gica e o poder convincente da discriminação, que vão se revelando como suas provas concludentes.

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Ainda que a palavra crer, analisada friamente, seja um verbo como outro qualquer, ela tem uma conexão direta com a palavra crença, tan- to que uma parece ser inseparável da outra. Entretanto, nem sempre é assim, já que a primeira implica um ato espontâneo da vontade quan- do se trabalha com plena liberdade de consciência, enquanto a segun- da é aplicada como dogma, caso em que é imposta ao crente.

Se concebemos a palavra crer em sua acepção mais pura, devemos esta- belecer forçosamente uma separação entre ela e a palavra crença, e condi- cioná-la a uma espécie de situação ou fato aceito há séculos e regulamen- tado, digamos, pelas exigências de tempo que fazem possível a relação de entendimento entre os seres humanos, relação mais diretamente visível e necessária quando concerne a quem ensina e a quem aprende. Por exem- plo, o estudante recebe adiantamentos do saber que lhe são proporciona- dos da cátedra pelos professores, os quais vão formando nele a consciên- cia da profissão que haverá de exercer. A palavra do professor neste caso constitui, como dissemos, um adiantamento, e o aluno deve necessaria- mente crer nela; deve existir uma absoluta boa-fé nesse sentido, para tor- nar possível a compreensão da complexidade dos estudos e ensejar, ao mesmo tempo, a oportunidade de que aquilo que o estudante escuta e ad- mite, ou seja, crê do professor, converta-se depois em saber. O mesmo ocorre com as demais atividades da inteligência; referimo-nos às que o ser desenvolve nos múltiplos setores da vida.

É necessário esse adiantamento de boa-fé, que significa admitir uma coisa

prima facie, para que a convivência comum não sofra os transtornos desagra-

dáveis da extrema desconfiança ou da intencionalidade que subverte os ter- mos da concórdia em que se devem desenvolver os seres em seu trato diário. É lei social que cada um esteja obrigado a respeitar seu semelhante, e é precisamente um ato de respeito o que se verifica no momento em

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que o trato mútuo se faz viável, ao se crer de boa-fé no que outro ma- nifesta. Naturalmente, quem altera esta norma de convivência, hiper- trofiando o volume do que diz ou surpreendendo a confiança do pró- ximo com palavras cujos conteúdos sejam falsos, está exposto a ser desconceituado. Essa atitude de alguns deu lugar a que muitas vezes a espontaneidade esteja ausente do trato comum, e a que se detenham em ante-salas as manifestações dos demais, até ver se merecem, em rea- lidade, ser acolhidas.

A palavra crer é elástica, e só adquire seu exato significado quando seu conteúdo não é alterado e serve de verdadeiro nexo entre os pen- samentos de uns e de outros.

Enquanto a palavra crer obedecer, com pureza de expressão, sem tra- vas de nenhuma espécie, a uma finalidade superior, ela conservará seu conteúdo real; se, em vez disso, ela for utilizada como coisa imposta, violentando a livre manifestação da consciência, perderá, a nosso juí- zo, sua verdadeira essência. Eis a grande diferença.

Todo homem que nasce livre e concebe a liberdade como genuína ex- pressão dos direitos humanos e como a mais alta expressão do conteú- do da própria vida, não pode aceitar que, enquanto seu corpo se move e anda livremente, sua razão e sua consciência permaneçam encarcera- das ou, no melhor dos casos, gozem de uma liberdade condicional.

Quando isto for compreendido em toda a sua amplitude, considera- mos que terá chegado o momento em que será necessária, da parte das fontes oficiais, uma revisão total de conceitos e conteúdos de palavras que, segundo pensamos, não são utilizadas como deveriam sê-lo.

A QUINTA-ESSÊNCIA