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Todos os conhecimentos que emanam da sabedoria logosófica es- tão irmanados entre si pela força imanente de sua origem. Do mes- mo modo, acham-se irmanados todos os pensamentos que lhes ser- vem como veículo de expressão, pensamentos que se manifestam na palavra construtiva e criadora. Por isso, é inconfundível o verbo que a anima, e ele é reconhecido onde quer que seja visto ou escu- tado; fique claro que, ao dizer visto, quisemos expressar lido através

da palavra escrita.

Todos os que cultivam o conhecimento logosófico se familiarizam de tal forma com o caráter exclusivo deste verbo condutor de sua sabedo- ria, que, tão logo alguém, por descuido ou intencionalmente, muda qualquer das palavras por ele expressadas ou dá uma interpretação er- rônea ao seu conteúdo, percebem que ela agora não coincide com o pensamento que as anima; que é estranha à vida e ao vigor contidos nas de origem logosófica; em resumo: que, deliberadamente ou não, modificou-se o legítimo parentesco que as une.

Nos casos em que isso ocorre sem nenhuma intenção, como resulta- do de uma interpretação equivocada mas de boa-fé, é fácil recorrer à própria fonte para recuperar o verdadeiro sentido do vocábulo ou do pensamento expressado, o que permite retomar o fio que conduz a mente a compreender tudo o que lhe vai ensinando este saber. Pelo contrário, quando se muda o parentesco das palavras, desfigurando-as com propósitos muitas vezes inconfessáveis, evidenciando-se a má in- tenção, o verbo logosófico, ao sentir-se intencionalmente afetado, rea- ge em defesa de sua prole – as palavras – e trava uma luta aberta com o agressor, a fim de denunciar, com toda a força de sua verdade, a exis- tência da intriga e seu autor.

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Quantas vezes, no curso da História, se registraram fatos desta natureza, que chegaram até a agitar o espírito de povos inteiros, unidos em defesa de princípios ou da paternidade de suas palavras, estampadas em protocolos, tratados, ou em escritos que os honraram e lhes deram timbre de grandeza! A violação dos pactos não tem sido causa das guerras mais atrozes? A lei do direito à propriedade intelectual, promulgada faz poucos anos na Repú- blica Argentina* e que foi e continua sendo motivo de preocupação nas de- mais nações do continente, acaso não persegue um fim nobre e não é todo um sinal de avanço e de elevada compreensão das necessidades espirituais? Com essa lei, buscou-se, precisamente, o reconhecimento da paternidade a que aludimos, amparando os direitos justos e inalienáveis do autor. Nin- guém poderia defender o que não é de sua legítima propriedade com a for- ça de convicção com que a defenderia seu verdadeiro dono. E, mesmo no caso dos espíritos débeis, que não sentem suficiente valentia moral para en- frentar os riscos de sua própria defesa, sempre restariam os recursos salomô- nicos: aqueles que permitiram reconhecer qual era a legítima mãe do filho que estava em discussão. O estudo da capacidade, o cotejo da produção e os antecedentes bastariam para que o juízo não se equivocasse e para saber com certeza a origem do pensamento ou da palavra em disputa, como ocorreu com o vocábulo "argentinidad", em Buenos Aires. Daí que os autores devam cuidar muito do parentesco de todos os seus pensamentos e palavras, para que cada um deles defina sem dificuldade sua verdadeira origem.

O cruzamento das palavras próprias com as alheias e a mistura de pensamen- tos e idéias que, ainda quando às vezes pareçam afins, se contradizem em seu fundo, dão motivo a freqüentes confusões ao serem analisados seus conteúdos, ao extremo de, em mais de uma ocasião, ter o leitor se perguntado se o autor de tal ou qual livro sabia o que queria dizer nele. Ao contrário, quando o verbo é fe- cundo e nele ardem as chamas inextinguíveis do conhecimento que alenta a alma e vigoriza a inteligência; quando seus conteúdos profundos se resumem em viris potências de convicções infinitas, e as imagens postas em figuras plenas de vida são assimiladas, se não com inteira, pelo menos com relativa facilidade, não é só o autor que, quando for o caso, poderá demonstrar sua paternidade em de- fesa de seus direitos; haverá muitos de seus leitores que adotarão também como

sua essa defesa, como já aconteceu, para demonstrar, com todo o aprumo e cer- teza da afirmação, de quem é tal ou qual pensamento, palavra ou idéia.

As mentes acostumadas a discernir sobre as conhecidas formas do pensa- mento antigo, moderno e contemporâneo se surpreendem sempre que irrom- pe no ambiente um novo verbo, trazendo uma nova concepção. Isto já ocor- reu em diferentes épocas da História; entretanto, não foi o suficiente para fa- zer os homens compreender que jamais foram as disciplinas acadêmicas das culturas exacerbadas as que realizaram as grandes revoluções do pensamen- to. Foram gênios espontâneos, que apareceram de tempos em tempos, os que impregnaram os ambientes ciclópicos com o fulgor de suas brilhantíssimas concepções. Daí que sua simples presença provocasse reações, por vezes mui- to inflamadas, nos que se consideravam os únicos autorizados a falar em nome do saber aceito e feito doutrina em convencionais conjuntos que, em síntese, estabeleciam diretivas dogmáticas às quais não cabiam emendas, a menos que as disposições proviessem das cúpulas oficiais, as únicas que eram levadas em conta e de cuja capacidade ninguém ousava duvidar.

O que não se pensa, é justo dizer isto em homenagem à verdade, é que toda nova concepção do pensamento leva consigo uma saudável renovação de va- lores e um estimulante despertar de inquietudes espirituais, ao mesmo tem- po que promove a reativação de estímulos e aptidões que logo pugnam por se manifestar, com grandes vantagens para o aperfeiçoamento individual. As- semelha-se, de certo modo, ao encarnar estes ideais em benefício da humani- dade, a esses ventos que transformam atmosferas pesadas e viciadas em am- biente purificado, onde se respira plenamente o ar. Além disso, não se deve desconhecer o valor que, como contribuição à cultura, as novas concepções podem representar, pois deve ser levado em conta quão cristalinas são as cor- rentes das frescas nascentes que inesperadamente brotam à superfície e que, segundo seja o caudal que carregam, logo se transformam em riachos e rios que fecundam vales e terras estéreis.

Assim aconteceu com aqueles grandes espíritos cujo saber, como as nascen- tes, transformou-se em correntes imprevistas, de um poder fertilizante que animou muitas gerações e ainda continua beneficiando a humanidade.

Não se deve, pois, tapar os ouvidos. E também é bom que a surdez desapareça quando uma nova expressão da verdade se manifesta para

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fecundar as adormecidas fibras da inteligência e despertar um novo afã de aperfeiçoamento em benefício do mundo.

CONCEPÇÃO LOGOSÓFICA

DAS PALAVRAS