• Nenhum resultado encontrado

%

Não há dúvida, por ser algo inegável, que o futuro dos povos e de toda a humanidade em conjunto depende muito da formação da juventude.

Os diversos países do mundo, configurados por sua situação étnica e geográfica, educaram suas juventudes seguindo as inspirações naturais do solo pátrio, determinando assim preferências que depois haveriam de ca- racterizá-los nas respectivas linhagens de grandes condutores políticos, oradores ilustres, filósofos, navegantes, artistas, gênios da literatura, ex- poentes máximos da ciência ou eminências do pensamento econômico. Cada nação se distinguia e sobressaía em heranças notáveis.

Entretanto, não nos remontemos aos tempos em que reinaram os astró- logos, os alquimistas e as pitonisas de primeira linha, nem nos internemos na imensidão do mundo asiático para extrair do coração da China as for- mas mais reluzentes do pensamento com que foi moldada e forjada sua história milenar. Voltemo-nos para os povos que estiveram mais perto de nosso conhecimento familiar: Egito e Grécia, que foram berços de juven- tudes ilustres, como também o foram de civilizações gloriosas. Que apren- diam aqueles jovens que, mal transpondo os umbrais da maturidade, apa- reciam já como culminâncias do pensamento, acendendo com suas luzes o entusiasmo das multidões, estendendo por gerações seu esplendor? Que ensinavam aqueles privilegiados e veneráveis anciãos, dos quais se dizia possuírem toda a sabedoria? Será necessário investigá-lo? Pensamos que é preferível nos determos a observar a trajetória do pensamento que animou a mente daqueles homens. Deveríamos mencionar aqui os nomes dessa quantidade de iluminados, filósofos e heróis que por seus feitos e suas obras honram a história da humanidade? Basta dizer, simplesmente, que quase todos eram jovens e que muitos deles surgiram desses dois rincões do mundo, Grécia e Egito, onde a alma, de geração em geração, parecia su-

154

perar-se em sucessivos esforços, a fim de dar aos demais povos da terra os expoentes máximos da sabedoria humana.

Também em outros povos existiram afãs semelhantes e destacaram- se muitas figuras de relevo universal. Assim, na França, Inglaterra, Ale- manha, Espanha e na Itália despontaram novas auroras para a vida do pensamento, e novas culturas foram tomando corpo nessas regiões da Europa, como contribuição magna dada por elas ao progresso da civi- lização ocidental.

A preservação da cultura, o arraigamento das tradições e a indestrutibi- lidade da consciência nacional constituíram a preocupação básica de todas as antigas dinastias que reinaram por então em muitos povos do mundo. O anelo mais profundo e ardente que, pode-se dizer, o pensamento íntimo dos governantes continha, era o de estabelecer para seus reinos, sem peri- go de perturbações, as correntes ascendentes de progresso na alma de to- dos os súditos, mediante continuados esforços de superação, sobretudo das massas inteligentes, a fim de conservar no conceito universal o posto de honra que lhes coube em alguma de suas melhores épocas, pelo fruto que souberam colher de suas inteligências, fruto que, por certo, beneficiou depois toda a humanidade.

Isso quer dizer, em conseqüência, que existiu algo acima da ilustração comum e dos conhecimentos gerais que se costuma dar ao jovem para for- mar sua cultura corrente e convertê-lo em incipiente homem de ciência ou de estudo, de modo que possa desenvolver-se dignamente em qualquer das carreiras que ele escolha: existiu uma educação superior tendente a criar, ou talvez seja melhor dizer a despertar, aptidões distantes da índole vulgar, que obedeçam às altas finalidades contidas naquela preocupação apontada e que, como dissemos, tendam a forjar em relevo novos capítu- los encarregados de manter incólume o prestígio da estirpe.

Bem se viu que aqueles países onde não existiu essa supereducação da inteligência sobressaíram nada mais que em rebentos isolados de grandes figuras, que deveram tudo a sua própria iniciativa e a suas próprias inspi- rações. Foram, pois, terras medíocres, cujos cultivos rotineiros não foram além dos afãs materiais e utilitários de suas populações nativas. E só quan-

do um ou outro enxerto estrangeiro lançou seus brotos na ânsia popular é que surgiram, repetimos, esporadicamente, homens de envergadura que se destacaram do ambiente nacional para estender seu prestígio por outras terras; estrelas fugazes na imensidão do firmamento mental, muito dife- rentes das plêiades que iluminaram os céus de famosas civilizações. É que, neste último caso, o acervo da herança parece formar parte efetiva da pró- pria alma nacional, pois somente assim se justifica a existência dessa edu- cação superior nos povos altamente civilizados, que cumpriram etapas tão brilhantes em sua história.

De tudo isso se depreende que a preparação da juventude requer, como tantas vezes já assinalamos, e não deixaremos de repetir, algo mais que a simples cultura escolar e universitária. Requer ser preparada à margem dessa instrução rotineira, da qual se encarrega a pedagogia comum; requer ser preparada, repetimos, para as altas funções da vida superior, seja no campo da política, da ciência, da filosofia, da docência, etc., e ainda nas ar- tes, na literatura ou na oratória.

As inquietudes do espírito manifestam-se no ser humano quando este surpreende em si mesmo os sintomas precursores de sua geniali- dade. E dizemos precursores porque é muito freqüente ver, após se ma- nifestarem tais sintomas, que, caso não se revele no ânimo a vontade de estimulá-los e explorar os veios denunciadores do gênio, eles per- manecem estáticos. A essas inquietudes respondeu sempre a iniciativa particular, criando instituições e centros de estudo que fomentam o de- senvolvimento das faculdades intelectuais, orientadas para diferentes campos; porém, como aqueles são organizados em entidades acadêmi- cas com suas rígidas fórmulas estatutárias, afastam-se, por assim dizer, do coração da juventude, pois nas Academias só penetram os eleitos, aos quais pareceria corresponder a direção quase ilimitada das ques- tões que a inteligência propõe em todos os terrenos do saber. Fica a ju- ventude, assim, pouco menos que órfã da atenção que sua natureza in- telectual incipiente exige dos que têm o dever de se acercar a ela e lhe prodigalizar, munidos de alta dose de paciência, afeto e compreensão, todo o calor requerido por sua débil vontade e pela fragilidade de seu caráter. Acentuamos a palavra compreensão porque é ela, justamente,

156

a que evidenciaria os altos fins de tão elevada docência, que por certo não deve circunscrever-se à sala de aula ou ao lugar de estudo, mas também estender-se a todos os momentos e circunstâncias em que a rudimentar evolução moral e intelectual dos jovens reclame de seus mestres o auxílio do conselho e da experiência.

Mas a essa compreensão não se chega, de maneira alguma, como já se viu, pelo império de normas rígidas, pelos freqüentes ensaios de sistemas de ensino ou pela existência da cátedra, mesmo nos estudos livres, pois a relação entre professor e aluno não deve morrer ao terminar a aula. O alu- no tem que experimentar, em todo momento, a influência fecunda do en- sinamento que recebe, tornando-se o professor, assim, seu melhor amigo e seu conselheiro constante. E é o próprio professor quem deve cuidar para que nada perturbe a livre manifestação do pensamento do estudante e para que nenhuma imposição arbitrária violente o jogo harmônico das faculda- des que este cultiva. Os grandes servidores da humanidade foram sempre as almas que conseguiram se emancipar de toda limitação e preconceito, e agiram sempre, até o último instante de suas vidas, com plenitude de cons- ciência, conservando íntegra a liberdade do espírito.

A Escola de Logosofia, surgida na República Argentina há mais de treze anos*, está promovendo neste país e em outros da América uma verdadei- ra conjunção de anelos tendentes a formar grupos de estudiosos que cul- tivem o ensinamento superior aludido e propiciem, em colaboração co- mum, a extensão dessas inquietudes espirituais, a fim de elevar a moral e alcançar aperfeiçoamentos pela conquista de conhecimentos transcenden- tes que haverão de redundar, mais tarde, em melhorias coletivas de vital importância para a sociedade humana.

Está claro que muito contribuiria, para esses novos fins de superação, pôr um dique à crescente influência dos centros de diversão que, como co- gumelos, brotam por todas as partes nas cidades, e que, diferentemente da- queles, são mais visíveis durante a noite. A embriaguez moral pelo aturdi- mento dos sentidos é sempre nociva ao espírito, e, se a juventude não é resguardada a tempo das conseqüências a que está exposta, pouco será o que se poderá esperar dela amanhã.

Ninguém, pois, a menos que seja um retrógrado ou um caduco mo- ral, poderá deixar de reconhecer a imperiosa necessidade que existe de propiciar o incremento de todas as comunidades que se inspirem em altos princípios de bem e que orientem a juventude pelos caminhos do conhecimento integral, o qual abre as portas da vida superior e prepa- ra os alicerces de uma civilização forte e capaz de produzir as obras mais maravilhosas da História.