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Bacharelando em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.

Professor orientador: Marco Polo Levorin

Professor de Processo Penal da Universidade Presbiteriana Mackenzie. Mestre em Processo Penal pela PUC/SP.

Resumo: A influência norte-americana na América Latina como extensão da Guerra Fria, aliada às forças conservadoras regionais, promoveu um palco sangrento para a proliferação dos regimes militares ditatoriais. A repercussão dessa época na sociedade causou uma ferida difícil de cicatrizar. A forma como a sociedade brasileira vem enfrentando essa problemática é o tema deste artigo.

Palavras-chave: Ditadura militar; Justiça de transição; Anistia; Comissão nacional da verdade; Guerrilha do Araguaia.

Abstract: The North-American influence on Latin America as an extension of the Cold War, connected to the conservative forces of regional alliances promoted a very bloody stage for the rapid spread of military dictatorship regimes. The repercussion of this period in society has caused a wound which is hard to heal. The way in which Brazilian society has been dealing with this issue is the topic of this article.

Key words: Military dictatorship, justice of transition, amnesty, the national commission of truth, the Araguaia guerilla.

Sumário: 1. Introdução; 2. Ditadura Militar na América Latina; 3. Ditadura Militar no Brasil; 4. Justiça de transição; 5. Lei de Anistia; 6. Guerrilha do Araguaia; 7. Perspectivas; 8. Referências bibliográficas.

1. Introdução

Durante o século XX, o mundo passava por uma fase conturbada. Depois do fim da Segunda Guerra Mundial, em 1945, a Guerra Fria dividira o mundo em dois blocos: o bloco capitalista, encabeçado pelos EUA, e o bloco socialista, encabeçado pela URSS. Essa situação de hostilidade generalizada influenciava a todos os países. A América Latina era alvo de abordagem dessas potências para aumentar a área de influência de cada bloco. A regra era o maior número de aliados para demonstrar a maior força.

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Da corrida armamentista até as outras competições de cunho tecnológico, acadêmico, desportivo, político, econômico entre os EUA e a URSS havia a disputa ideológica entre o capitalismo e o socialismo. Os militares da América Latina, inclusive do Brasil, absorveram o lema do combate à expansão do comunismo e promoveram uma série de mudanças de ordem política, econômica e social nos países latinos em detrimento dos direitos fundamentais da população.

O regime militar no Brasil foi um período nefasto, existindo concentração de poder no governo e inúmeras restrições às liberdades civis. Inaugurado com o golpe de 1964 e tendo fim somente em 1985, a ditadura militar teve seu auge entre 1969 e 1974, quando o número de casos relatados de desaparecimentos, torturas, prisões ilegais e execuções aumentou de forma exponencial.

Com o fim do regime autoritário, a transição para o sistema democrático enfrentou e vem enfrentando vários problemas. Entre eles está a análise da punição ou do perdão dos crimes, das injustiças e dos excessos de violência cometidos durante o período de repressão, a reparação das vítimas dessa época e de suas famílias, assim como a assimilação da sociedade sobre a legitimação do golpe militar e a pressão dos órgãos internacionais sobre o respeito aos direitos humanos.

Lon Luvois Fuller, autor do ensaio O caso dos exploradores de cavernas, publicou uma obra que busca ilustrar a análise sobre a mudança de um regime autoritário para outro democrático. O texto intitulado O problema do denunciante invejoso é examinado por Dimitri Dimoulis, que o resume: “Fuller apresenta nesse texto um caso bastante diferente naquele narrado nos ‘Exploradores de Cavernas’. Durante uma ditadura, muitas pessoas denunciaram seus inimigos sabendo que os tribunais do país, aplicando a legislação da época, pronunciaram a pena de morte para delitos que, objetivamente, não eram graves. Após a queda do regime ditatorial, os denunciantes, que Fuller chama de ‘invejosos’, foram objeto de execração popular. Ainda que os denunciantes não tivessem cometido nenhum delito, pois só levaram a conhecimento das autoridades fatos puníveis segundo a legislação em vigor, muitos exigiram sua punição”.1

Tal obra mostra as consequências do impasse enfrentado pela sociedade na mudança do regime político. Buscam-se examinar as formas e os métodos aplicáveis na reparação dos danos das vítimas sem ultrapassar os limites da vingança, sem desrespeitar as normas da democracia.

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2. Ditadura Militar na América Latina

A América Latina foi palco da ascensão do militarismo ao poder central durante o século XX. A influência capitalista americana, as crises pós-Segunda Guerra Mundial e o caudilhismo foram fatores fundamentais para os golpes praticados nesse período. Todas foram marcadas pelo desrespeito aos direitos humanos sem limitação, havendo detenções ilegais, torturas e desaparecimentos.

A primeira experiência ocorreu com o governo do Paraguai em maio de 1954, quando o general Alfredo Stroessner chegou ao poder pelo Partido Colorado e se manteve durante 35 anos, conforme explica César Alfonso: “En 1954 se instauró en la República del Paraguay el régimen del general Alfredo Strossner, el cual tuvo fin con un golpe militar que comenzó en la noche del 2 y culmino en la madrugada del 3 de febrero de 1989”.2 As Forças Armadas no Paraguai sempre foram um agente político importante e, com a vitória

contra a Bolívia na Guerra do Charco em 1935, consolidaram-se na sociedade paraguaia, conseguindo a simpatia da população. O general teve apoio dos EUA, transformando o Paraguai no laboratório da Doutrina da Segurança Nacional, como César Alfonso

pontua: “La doctrina de la seguridad nacional fue utilizada como base ideológica de la représion, al igual que un marco jurídico que permitía la legitimación de los actos cometidos por los agentes del Estado”.3 De fato, era uma ideologia cujo objetivo era a construção

de um inimigo público interno com a pretensão de legitimar o uso da violência pelos militares. Ludmilla Franca, pelo Instituto Norberto Bobbio, explica: “O aspecto que mais se destaca nessa ideologia é a construção da figura do inimigo público interno, que incutia nos sujeitos a necessidade ideológica de uma guerra interna constante e permanente contra a influência do comunismo internacional (o ‘perigo vermelho’), impondo, destarte, a adoção de um projeto de desenvolvimento com segurança, que colocava os militares como salvaguardas dos anseios nacionais no terreno das políticas sócio-econômicas, na medida em que entendia-se que estes compunham o único corpo social apto a transformar o caos instalado pelos subversivos em paz e estabilidade duradouras. Desse modo, o Estado se fortalece em sua pseudo-legalidade, exercendo o poder normativo da forma que lhe aprouvesse, legitimando meios – na maioria das vezes nada éticos nem tampouco humanitários – para identificar e eliminar qualquer organização que fosse entendida como ligada ao

2....amBoS, Kai; malarino, Ezequiel; elSner, Gisela (Ed.). Justicia de transición: informes de América Latina, Alemania, Itália y España. Berlin: Uruguay: Konrad-Adenauer-Stiftung,

2009. p. 345. 3....Idem, p. 346.

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