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5.2 Animação sociocultural (ASC)

A primeira questão é saber o que entendemos por animação sociocultural (ASC)?

Não existe uma definição clara do que se pode entender por animação sociocultural (ASC). O conceito e/ou a definição têm variado ao longo dos anos. Podemo-la definir como um meio, um conjunto de técnicas e de práticas (socio) pedagógicas específicas destinadas a promover a comunicação e a participação, exercido relacionalmente entre pessoas ou entre uma mensagem e os seus recetores. Ou seja, pode-se entender como um sistema de comunicação em que o animador é o comunicador e/ou mediador dessa comunicação. Por exemplo, para a Unesco a ASC é um conjunto de práticas sociais que se destinam a incentivar a iniciativa e a participação das comunidades no processo do seu próprio desenvolvimento e na dinâmica global de vida sociopolítica, em que estão integrados (Besnard, 1999). Para Ezequiel Ader- Egg (2000) a ASC seria um leque de técnicas sociais, com base numa pedagogia participativa, de modo a promover nas pessoas uma participação ativa, através de atividades e práticas voluntárias, desenvolvidas no seio de um determinado grupo ou comunidade e que se manifesta em diferentes áreas do desenvolvimento da qualidade de vida.

Outros autores, na perspetiva educativa ou pedagógica, como Mário Viché, citado por Trilla (2004) focam o aspeto educativo e pedagógico da ASC, definindo-a como sendo atividades não-formais de ensino, não intencionais, em que os diferentes atores (meios de comunicação, grupos, instituições e associações de todos os tipos, têm influência sobre os atores sociais, a fim de mudar a sua visão da realidade, os seus hábitos e comportamentos ou com o objetivo de completar as atividades socioeducativas dos vários agentes primários de socialização (família, escola, comunidade). Ela envolve o uso de técnicas diversificadas, metodologia e atividades, que ao serem instrumentos ao serviço de determinados objetivos e tipos de sujeitos permitem ocupar o tempo livre ou de ócio. Para se realizar essas ações socioculturais ou socioeducativas de animação deve-se dispor de recursos humanos, técnicos e financeiros adequados, já que não é uma simples soma de atividades que procuram uma mudança nos sujeitos e do seu contexto e ocupar um espaço temporário, fazendo algo (lúdico- recreativo, artístico, cultural, educativo, etc.).

De facto, a animação sociocultural é uma nova forma de intervenção social relativamente recente. Não se pode precisar a sua cronologia com total exatidão. Não contrariando esta

constatação Marcelino Lopes (2008: 135) afirma, porém, que “ ():sabemos, no entanto, que desde sempre existiu um tempo para o trabalho e outro para o não-trabalho, para a festa, para o recreio, aquilo que, em sentido lato, podemos chamar animação”. Historicamente pensava-se que a animação sociocultural só tinha surgido neste século. Mas nas antigas cortes 1810 já se fazia e era entendida como diversão e não animação, fazia-se através dos:chamados:“Bobos da corte”:e:por:isso:quando:chegou:aos:nossos:dias:foi:bastante:complicada:a:implementação:da: animação. Houve uma grande contribuição no que toca à reflexão e ação educativa “ (): consistiu em pôr em evidência a dimensão quantitativa e qualitativa dos fenómenos educativos não formalizados e/ou não deliberados”:(Canário:2000: 16). Há um momento na história que a educação deixa de se confinar a práticas educativas formais e valoriza outras dimensões, abrindo assim caminhos para novas formas de pensar na educação e para o aparecimento de novo projetos, como é o da animação de idosos.

Com o surgimento da ASC, como um campo de práticas sociais e educativas, só é atingível no contexto de união de mutações sociais, segundo Besnard (2003), citado por R. Canário (2000:17), as “(): tendências: da: normalização: social: fenómenos: de: natureza: demográfica: fenómenos de massificação; acelerado crescimento económico; e o aumento generalizado do tempo livre”:Nos:dias:de:hoje:ainda:há:algum:receio:em:aplicar o estatuto do animador. A arte não é um privilégio nem um luxo, é uma forma de expressão de ideias e sentimentos capaz de fazer com que as pessoas adquiram sensibilidade e harmonia e descubram capacidades expressivas que pensavam não ter.

Embora nos seja difícil precisar o momento da sua chegada e utilização no dia-a-dia social, temos noção de que está associada ao aumento do tempo livre. Magalhães (2008) encara que este fenómeno cultural é relativamente novo, e tendo surgido na Revolução Industrial, surgindo nas sociedades modernas. Segundo a história, sabemos que as sociedades primitivas e o lazer, ou tempo em que não se trabalhava, era visto como um tempo sagrado, de dedicação aos deuses. Com o surgimento da Idade Média surge o tempo religioso, vivido de outra maneira (monoteísmo). Na nossa sociedade o tempo de lazer sempre existiu, e foi-se atualizando ou modernizando a partir da Revolução Industrial.

Na verdade, a ASC é uma metodologia de intervenção social e cultural destinada ao desenvolvimento socioeconómico e cultural e, também uma ferramenta de trabalho para a qualidade de vida (Veja, 1997: 209-212). O seu objetivo é o de promover uma atitude participativa no processo do seu próprio desenvolvimento, significa que tem de existir uma auto-consciencialização individual capaz de gerar uma responsabilização perante si próprio e os outros. Um pouco como na maiêutica de Sócrates, um processo de aprofundamento do ‘Ser’, cuja divisa é ‘conhece-te a ti mesmo’. No entanto, Ander-Egg (2000: 338) considera que sob o conceito de animação sociocultural realiza-se uma grande variedade de atividades, que podem classificar-se em cinco grandes categorias, cada uma das quais compreende, por sua vez, uma amplíssima diversidade de ações sócio-educativas-culturais, como: Animação formativa: que engloba atividades que favorecem a aquisição de conhecimentos e o uso crítico da razão; Animação de difusão cultural: que engloba atividades que favorecem o acesso a determinados bens culturais; Animação artística (não profissional): que engloba atividades que favorecem a expressão e constitui uma forma de iniciativa, de inovação e diversificação de formas de expressão; Animação lúdica: que engloba atividades ao ar livre, que favorecem a atividade física e desportiva; Animação social: que engloba atividades que favorecem a vida associativa, a atenção às necessidades grupais e a solução de problemas coletivos.

Todas estas atividades de animação sociocultural possuem relação direta com o trabalho na comunidade. Visando inclusive oferecer, enquanto instrumento, educacional e recreativo, inúmeras vias de admissão ao universo da cultura e do conhecimento, seja através de manifestações expressivas naturais ou estruturadas. Assim a animação sociocultural possui um instrumental de natureza pedagógica enorme, colocando-se apta, como instrumento, para intervir nas mais distintas circunstâncias e esferas sociais. Além disso, proporciona e tem

como fim realizar as necessárias mudanças no âmbito da realidade, por vezes atuando como um árbitro cultural, com o objetivo de gerar uma sociedade melhor e mais solidária, na qual todos os direitos individuais são amplamente respeitados (Trilla, 1993).

A ASC ganhou, nos últimos tempos, mais visibilidade, graças ao desenvolvimento de diversas empresas no ramo da prestação de serviços, principalmente hotéis que se especializaram no turismo de lazer. Além deste setor, porém, várias outras companhias empresariais se consciencializaram da carência de seus trabalhadores na esfera do lazer, da recreação, como de outras formas de transmissão do conhecimento. Alguns autores (Caride, 2005; Ventosa, 2002; Augustin & Gillet, 2000) atribuem-lhe dois sentidos: a animação sociocultural vista como um processo comunitário, traduzida numa autogestão social e de auto-organização, por lugar das próprias populações; e como gestão sociocultural, articulando os processos de dinamização e difusão de atividades culturais ou artísticas numa lógica de engenharia social, a partir da gestão e da promoção de novos espaços urbanos de proximidade (Borja, 2003). Estas duas tendências acerca da animação sociocultural, como acabámos de referir, foram assumindo contornos difíceis de delimitar num tempo de crise de representação das dinâmicas ou dos movimentos sociais (Touraine, 2000). Por isso, falar de animação sociocultural remete-nos para um campo semântico polissémico.

Neste momento (sem pretensões de exaustividade), podemos considerar que, quando nos referimos à expressão de animação sociocultural, ela quer, pelo menos, significar três coisas (Ventosa, 2002):

Animação social. Esta animação tende a ser incorporada, de forma transversal, nos campos profissionais da educação social ou do trabalho social. Neste âmbito, a animação é sinónimo de desenvolvimento comunitário. Enquadrado numa vertente de trabalho social e educativo, este tipo de intervenção social visa potenciar o ‘empowerment’ nas comunidades locais, reabilitando o poder da comunidade como ator do seu autodesenvolvimento social (Dumazedier, 2002). Do ponto de vista do modelo concetual, este tipo de ação tem por base paradigmática a Pedagogia Social, entendida na sua aceção sócio-crítica-dialética (Ventosa, 2002). Esta conceção educativa (para além do sentido formal e escolar) visa promover uma cultura de participação democrática e otimizar práticas de emancipação social numa ótica crítico-transformadora (Caride, 2005).

Animação educativa. Esta animação (socioeducativa), inscrita, também, de forma transversal nas funções dos profissionais de Educação Social (ou educação especializada) (Rouzel, 2002) e de Trabalho Social (no sentido anglo-saxónico), tende a ser associada ao serviço educativo prestado no âmbito da comunidade (ex. autarquias, bibliotecas, museus, ludotecas, etc.). Este tipo de trabalho socioeducativo visa potenciar sistemas de mediação pedagógica entre os técnicos (mediadores) e os usuários, numa perspetiva de serviço público de qualidade e com o intuito de promover uma cultura cívica de responsabilidade pessoal e social.

Animação cultural. Esta animação tende a configurar-se a partir de duas vertentes fundamentais: o sector da animação cultural (artística, desportiva, turística, urbana, virtual): e: o: setor: da: engenharia: social: (gestão: sociocultural: ou: gestão: dos: espaços: urbanos). Para além dos animadores de rua, de eventos de caráter lúdico-cultural, de centros comerciais (etc.), emergem (entre outros) no espaço da cultura urbana outras figuras como os gestores culturais, os operadores culturais ou os desenhadores (urbanistas) dos espaços de proximidade. Este amplo setor emergente parece enquadrar- se nas políticas sociais e culturais que preconizam uma difusão, uma gestão e uma dinamização da cultura urbana numa ótica de circularidade de bens (culturais) e de serviços (sociais) acessíveis a toda a comunidade (Bertin et al., 2003; Poyraz, 2003; Borja, 2003; Ventosa, 2002). Quanto ao modelo concetual que lhes está subjacente é tanto o modelo Crítico-Dialético como o modelo Racional-Tecnológico (Ventosa, 2002). Este

paradigma de intervenção social assenta, por um lado, no potencial da dinamização da democracia cultural (o acesso da cultura por todos) e, por outro lado, na capacidade de gestão em rede (Castells, 1998) da cultura urbana e de novos espaços de proximidade.

Outra questão são os valores que a ASC promove nos seus destinatários. De facto, entre os valores que a intervenção de animação proporciona destacamos: desenvolvimento da consciencialização e o sentido crítico, que exige educar para a participação responsável e estimular a expressão de sentimentos (solidariedade, colaboração); a participação, dando protagonismo à pessoa; a integração social – adaptação; o pluralismo no sentido amplo (multiplicidade de opiniões e pontos de vista); a dinamização sociocultural das pessoas e comunidades (intergerações); inovação e criação cultural; promoção da liberdade; etc. (Ander-Egg, 2000; Trilla, 2004).

Por conseguinte, há diversos tipos/âmbitos de animação, segundo o tipo de animador, os distintos destinatários, as diferentes atividades, os diversos territórios e os objetivos da animação. Portanto, falar de ASC, como fórmula sincrética, introduz-nos numa complexidade de tal ordem que, se quisermos ser rigorosos do ponto de vista conceptual, importa delimitar os âmbitos profissionais que lhes estão associados: uns inscritos, ainda, nas tradições da clássica «animação sociocultural» (socioeducativa), outros, já numa lógica emergente, articulados em novas figuras de animação social-cultural (desenvolvimento comunitário e engenharia social) (Elizasu, 1999). Devemos, pois, compreender o ASC como uma atividade de educação em contexto não formal estruturada em torno de três eixos principais:

* O centro educativo, no qual estão inseridas as ações que são projetados para alcançar o desenvolvimento pessoal, consciência, ideação e desenvolvimento cognitivo.

* O segundo eixo é formado por cultura, com a qual pretende desenvolver identidades individuais e coletivas, a criatividade individual e da criação artística, como expressão de identidades comuns.

* O terceiro eixo é formado pela estrutura da vida comunitária, ou seja, o desenvolvimento de redes de coletivos que se baseiam na identificação, participação e compromisso para com os membros da comunidade ou grupo que integra o individual.

Devido à versatilidade da ASC há uma dificuldade na atribuição de etiquetas provenientes da terminologia pedagógica. Ou seja, há a tendência de encaixar os conceitos de educação permanente, a pedagogia social e a educação não formal, no âmbito da ASC.

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