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O papel da família Silva Telles na perseguição aos barbudos foi largamente comentado pelos monges entrevistados419, conforme apontado no capítulo 5. Oscar Telles foi

apontado como autor da morte Anastácio Desidério Fiúza, na igreja da Bela Vista, na Páscoa de 1938. Ele teria sido o primeiro a atirar. No Arquivo Público do Estado foram localizados

418 RIO GRANDE DO SUL. Delegacia de Polícia de Soledade. Relatório. Do delegado de polícia de Soledade, 1o tenente

Januário Dutra, para o emissário do Governo, capitão José Rodrigues da Silva. Registra os acontecimentos de 13 e 17 de abril de 1938, ocorridos no 5o e 6o distritos de Soledade. Soledade, 15 de maio de 1938. (APERS)

três processos crimes contra Oscar da Silva Telles, filho do comerciante Júlio Telles, como réu por brigas, confusões e violências no município de Sobradinho, então chamado de Jacuí. O primeiro deles é sobre eventos ocorridos em janeiro de 1932, na casa de Gabriel Dias, na linha Tamanduá, 3o distrito do município de Jacuí. Na residência, acontecia um baile de

aniversário quando, a certa hora, chegou Oscar da Silva Telles armado. Começou a provocar algumas pessoas. Nisso, Ricardo Hoffmann interveio, tirando-lhe o revólver. Uma autoridade presente teria dado voz de prisão ao jovem. Como ele resistiu, foi atado “para evitar novos delitos” e conduzindo à “instância maior”. No meio do caminho, os condutores de Oscar “foram assaltados pelos parentes do dito delinquente, os quais libertaram-no”. No outro dia, o comerciante Júlio da Silva Telles escreveu uma carta ao juiz inocentando seu filho, menor de idade.420 Nos documentos de 1938, Oscar Telles declarou ter 25 anos.

O segundo processo crime refere-se também a invasão de uma festa. Em novembro de 1934, Oscar com 23 anos, acompanhado por dois amigos, moradores do 1o distrito do

município de Jacuí, teria invadido a residência de Augusto Lira, também no 1o distrito, na

Taboasinha, onde se realizava um baile:

Iam as danças correndo animadas, quando apareceram Oscar da Silva Telles, João Elias Telles e João Cardoso e, em atitude agressiva, exigiram participar da festa. Dessa imposição resultou sério conflito, tendo Oscar da Silva Telles e João Cardoso disparado seus revólveres e João Elias Telles vibrado cacetadas.

Após o conflito, os denunciados fugiram, ficando feridos três agricultores: Gaudêncio Alves da Silva, 18 anos, Antônio Cecílio dos Santos, 42 anos, e Bento Alves da Silva, 55 anos. Eles foram feridos com objetos contundentes e à bala.421 Em dezembro de 1935, o juiz

municipal, Henrique de Freitas Lima Filho, pedia a prisão preventiva dos “desordeiros reconhecidos”. Eles não compareceram a citação, só participaram da audiência inicial, porque já estavam presos por desordens na cadeia civil de Sobradinho. Para o juiz a prisão preventiva era “uma medida de segurança pública e de ordem social”. Em setembro de 1937, o promotor público ad hoc, João Francisco Magalhães, denunciava Júlio Telles ao Ministério Público porque ele levou as testemunhas “afim de desfazer tudo” o que disseram “de verdade dentro dos autos”. Em dezembro de 1937, os réus foram absolvidos por legítima defesa.422

No terceiro processo crime, em junho de 1939, Oscar Telles não se dizia mais lavrador, nem empregado no comércio, como afirmou em 1932 e 1935. Com 25 anos, ele era agora chofer e residia no sexto distrito de Soledade. No entanto, continuava a frequentar a

420 RIO GRANDE DO SUL. Justiça Pública. Processo Crime Oscar Telles. Terceiro distrito de Jacuí, janeiro de 1932, n. 105, autos n. 160. Refere-se a conflito na linha Tamanduá. (APERS)

421 RIO GRANDE DO SUL. Justiça Pública. Processo Crime Oscar da Silva Telles e outros. Sobradinho, janeiro de 1935, n. 83, autos n. 105, maço 8, estante 41. (APERS)

Delegacia de Polícia de Sobradinho. Desta vez, o motivo da desavença era corridas de cavalos e dívidas de jogo. No início da tarde do dia 24, algumas pessoas estavam reunidas na venda de Teobaldo Verlang, no 3o distrito de Sobradinho, quando iniciou uma conversa sobre

“carreira” de cavalos. Logo surgiu uma dúvida entre Aníbal Carvalho e Oscar Telles. Este teria puxado uma faca e, o outro, teria reagido atirando com um revólver e acertando o agricultor João Giovano Wichs, que se encontrava na porta do estabelecimento.423

Segundo o agredido João Giovano, ele estava na venda com Aníbal e João Pedro, quando chegou Oscar Telles propondo uma corrida de cavalos a João Pedro. Os dois não chegaram a um acordo e Aníbal fez uma proposta a Oscar que teria respondido com uma proposta que lhe dava vantagens. Aníbal teria respondido que se o cavalo não prestava, ele “não andasse fazendo propostas de carreiras”. Oscar, ofendido, puxou a faca, que carregava na cintura, e investiu contra Aníbal, que se defendeu: sacou o revólver e atirou. Errou o tiro e acabou acertando João Giovano, que não procurou médico, nem autoridades, por ser amigo de ambos e por não achar necessário.424

Segundo o acusado Oscar Telles, ele foi à venda para saber se Teodoro Meier havia deixado um dinheiro que lhe devia. Em seguida, passou a tratar uma corrida com João Pedro. Aníbal teria se intrometido afirmando: “Não ate carreira com ele porque não sustenta o que trata e é um tipo tratante.” Oscar disse que a conversa não era com ele e que não se metesse. Aníbal teria lhe dado com um relho, puxado o revólver e disparado. Oscar afirmou que somente colocou a mão na faca, mas não a retirou da cintura, indo em direção a porta, quando o tiro atingiu João Giovano, que estava de costas. Oscar afirmou ser inimigo de Aníbal por uma outra desavença que envolveu disputa de cavalos.

Já o jornaleiro Aníbal Carvalho, 32 anos, morador do 3o distrito de Sobradinho, na

Serrinha, apresentou outra versão. Afirmava estar na venda, tocando violão, acompanhando a trova de João Giovano Witchs, quando apareceu Oscar: “tomou um trago e saiu, para voltar dali a poucos minutos a procura de João Giovano Witchs, para tratarem de uma corrida de cavalos.” João teria negado a aposta, por não possuir cavalos de corrida, mas, Aníbal tinha. Oscar teria respondido que “com cavalo desse sujeito eu não corro carreira, porque ele tem uma dívida comigo”. Aníbal respondeu afirmando que se devesse pagaria. Oscar teria bebido mais uns goles de cachaça, sacado a faca e dito: “então tu pagas hoje”. Nesse momento, Aníbal puxou o revólver, apontando na direção de Oscar e disse: “não venhas que eu te atiro”. João Giovano meteu o braço no revólver e outra pessoa puxou-lhe o braço por trás. Negou

423 RIO GRANDE DO SUL. Justiça Pública. Processo Crime Aníbal Carvalho e Oscar da Silva Telles, Sobradinho, 31 de julho de 1939, n. 67, autos n. 523, maço 16. Refere-se a conflito na venda de Teobaldo Verlang, no 3o distrito de

Sobradinho. (APERS). 424 Loc. cit.

que tivesse intenção de disparar. Negou, também, que tivesse dado com um relho em Oscar, mas confirmou que se tornaram inimigos devido às disputas de cavalos.425

O episódio dos monges ainda era assunto recente, quando outro assassinato ocorreu na região. Desta vez o envolvido era Janico Telles, irmão de Oscar. Ele foi apontado como autor da morte de Tomás Sigilio426. A vítima era filho de família de posses, quando ele foi comprar

sal na venda dos Telles. Ele usava cabelo e barba longos, apesar da perseguição aos monges

barbudos. Tomás comprou o sal e Janico teria perguntado: – Tu vai comer esse sal? – Vou,

respondeu ele. – Ah, duvido! – Mas eu compro e pago. Pagou e saiu. Janico saiu atrás, acompanhado de um cigano. Chovia. Por isso, botou um pala de gorgorão fino. Alcançaram Tomás e ele parou. Mataram o rapaz degolado. Mas, um imprevisto veio a delatar Janico. Ao morrer, Sigilio ficou agarrado no pala de Janico. Por mais que tentassem, não conseguiram tirar o pala da mão do morto, tiveram de cortar. Quando um sobrinho, do Arroio do Tigre, veio assistir a morte do tio, notou um pedaço de tecido em sua mão. Foi a prova da autoria do crime. Cada um teria amargado cinco anos de prisão.427 Com esses processos e narrativas da

população local verifica-se a constância com que os Telles envolviam-se com disputas violentas e tentativas de imposição pelo uso da força.