• Nenhum resultado encontrado

FORTALEZA DÉCADA

12. José antonio machado

2.5.3 AS Casas Exportadoras estrangeiras

Após a Abertura dos Portos, no topo da organização comercial estavam aqueles que atuavam na exportação do algodão. Cabia às grandes casas exportadoras o papel de agentes financeiros, mesmo após a criação das primeiras instituições de crédito. Assim, essas firmas financiavam os agricultores como forma de garantir a compra antecipada da safra e contratavam “os carreteiros através dos quais se fazia todo o transporte das mercadorias em comboios de animais do interior para a capital” (GIRÃO, 1947:193). Essas firmas vão investir nas atividades comerciais218 e

desempenhar um papel fundamental na evolução do comércio cearense.

Com o crescimento do comércio em Fortaleza, outras casas exportadoras estrangeiras sucederam- se: Kalkmann & Cia, John William Studart, Henry Ellery, Alfred Harvey, Richard Hugges. “Ao findar a década de 1860, Fortaleza contava com nada menos de quinze casas estrangeiras, afora as de origem portuguesa com tendência à nacionalização e radicação na terra” (SOUZA,1968:14). Assim, em 1862, existiam 357 estabelecimentos comerciais, dos quais 84 estrangeiros e 273 luso- brasileiros. Importa destacar que aqueles estabelecimentos dedicados às atividades de exportação e importação (escritórios de comércio e armazéns) eram majoritariamente (60,0% e 75,0% respectivamente) de propriedade de estrangeiros (Tabela 7). Ou seja, os estrangeiros roubam a cena, tomando para si o comércio internacional da mão dos ricos portugueses de outrora.

TABELA 7

Fortaleza Estabelecimentos Comerciais - 1862

Estabelecimentos Nacionalidade do Proprietários Brasileiros Estrangeiros Total Estabelecimentos de comércio (representação) 05 07 12 Lojas de fazenda 38 15 53

Tabernas 49 24 73

Quitandas 87 06 93

Boticas 03 01 04

Armazéns (provavelmente escritório de representações) 04 12 16 Fábricas (sabão, charutos) 02 02 04 Oficinas (alfaiates, sapateiros, etc.) 70 06 76

Açougues 09 06 15

Casa de roupas e calçados feitos 06 05 11

total 273 84 357

Fonte: GUABIRABA, 1978:37-38, LEMENHE, 1983:137

CAPÍTULO 2 | FORTALEZA CAPITAL DA PROVÍNCIA DO CEARÁ E A ECONOMIA DO ALGODÃO

100

216 Na décima urbana de 1872 possuíam quatro imóveis em

Fortaleza: rua Boa Vista no 31, rua Amélia no 135, rua do Quartel no 16 e rua Formosa no 57.

217 A décima urbana de 1872 confirma essa afirmação, pois só

nessa rua Samico possuía 12 imóveis (nos 63, 65, 72, 74, 76, 78, 80, 82, 86, 98 e 100), mais cinco na rua das Hortas (nos 51, 53, 55, 57 e 59) e mais dois na rua Formosa (nos 54 e 56).

218 Gêneros alimentares, vinhos, bebidas, vestuários em geral,

101

Francisco luis salgado219 português, que chega em Fortaleza em 1852, “servindo a principio de

caixeiro, por fim montou casa comercial” (GIRÃO,1975:373). Possui como bens de raiz algumas propriedades na cidade de Fortaleza220: dois sobrados avaliados em 10:000$000(dez contos

de réis). (Rua Boa Vista e Amélia) e três casas de três portas221 (Largo dos Voluntários, Rua do

Cajueiro); um sítio na serra de Baturité, no lugar denominado Riacho do Negro, avaliado 400$000 reis; uma fazenda denominada Monte Alegre, própria para criar e plantar, avaliada em 800$000 reis; dívidas ativas; e dez ações da Companhia de Gás desta cidade, avaliada em 1:000$000 réis222.

Estas firmas chegaram a monopolizar os carregamentos entre Ceará e os portos internacionais. Por exemplo, a Cia “inglesa Booth Line , de Liverpool, a começar de 1866 e, três anos mais tarde, com os da Red Cross, também britânica, as quais acabam fundindo-se, para fazer de modo quase exclusivo os carregamentos entre o Ceará e os cais europeus e norte americanos” (GIRÃO, 1947:349). Os portos como Liverpool, Hamburgo, Havre, Barcelona, Lisboa e Nova York figuram na lista dos mais acessados. Algumas dessas firmas abasteciam-se de produtos europeus via porto de Recife, como informa Raimundo Girão, encarecendo-os para os consumidores cearenses

De alguns anos para trás intensificara-se a mania das viagens dos comerciantes ao Recife, onde se abasteciam do indispensável ao sortimento de suas lojas. A viagenzinha ou peregrinação anual tornou-se uma obsessão, que a imprensa criticava como pruridos de novos-ricos, e combatia veementemente como prejudicial aos interesses gerais, pela alta dos preços que trazia a compra dos efeitos europeus na praça intermediária de Pernambuco, em vez de feitas directamente da Europa, em condições melhores. O exemplo eram os estabelecimentos de Singlehurts & Cia., de Corlett & Cia., de Jose Smith de Vasconcelos, de Pacheco Mendes, de Rocha Junior e outros, que negociavam dessa forma, podendo vender mais barato (1947:323).

Além dos negociantes relacionados com o comércio atacadista internacional, havia aqueles que se destacavam no comércio varejista. Dentre eles, José smith de vasconcelos223 (1817-1903),

primeiro Barão de Vasconcelos, português e inglês de educação, que se estabeleceu na cidade com o comércio de secos e molhados na loja “Bom Sertanejo” (Zé Barateiro). Depois diversificou seu comércio para produtos finos - fazendas, perfumaria, artigos de armarinho, objetos de luxo, porcelana, cristais, tapetes (REGO, 1935:114-115), todos importados diretamente das praças européias, mantendo “o que havia de mais em moda no tocante a tecidos superiores” (GIRÃO, 1947:322). Instalou uma padaria, em 1852, com máquinas apropriadas à preparação de biscoitos finos e massa de pão224 de tipo Provença. Associou-se ao genro Richard P. Hugges, com razão social

J. Smith de Vasconcelos & Hugges, depois passando para J. Smith de Vasconcelos, Hugges & Cia225.

Na Inglaterra, denominou-se Vasconcelos, Ridgway & Co. Seu filho Rodolf Smith de Vasconcelos, cearense, foi o segundo Barão de Vasconcelos.

John William studart226 - chegou em 1842, recebendo matricula no Livro de Registro de

Estrangeiros, declarando profissão de caixeiro. Foi comerciante e vice-cônsul britânico no Ceará. Em 1872 possuía somente um imóvel na rua da Palma no 37 e alugava outros dois na mesma rua

CAPÍTULO 2 | FORTALEZA CAPITAL DA PROVÍNCIA DO CEARÁ E A ECONOMIA DO ALGODÃO

219 Faleceu em 01.01.1868; seu inventario é de 1869. Casado com

Virginia da Rocha (falecido em 1923) filha de Joaquim da Rocha Moreira. Seus filhos: Alfredo da Rocha Salgado 1855-1947, liderança no comércio do Ceará. Torna-se em 1875 guarda- livros do estabelecimento de sua genitora. Em 1878 trabalha na organização britânica conhecida como CASA INGLESA – Singlehurst & Co, ate sua liquidação em 1892, constituiu com George Holderness a firma Holderness & Salgado, depois Salgado, Rogers & Cia e em 1921 Salgado, Filho & Cia. (Sócios: Alfredo seu filho José Salgado e o sobrinho Eurico Salgado Duarte) Em 1936, constituíram uma sociedade anônima – Casa Salgado S. A., sendo a primeira a montar prensa hidráulica para o enfardamento de algodão, no Ceará (GIRAO, 1975: 373).

220 Sobrados na rua Boa Vista (Floriano Peixoto e na rua Amélia

(Senador Pompeu), Casas com 3 portas: largo dos Voluntários e duas na travessa do cajueiro , Terreno a rua da Cadeia fundo correspondente e casas no Sitio Jacarecanga.

221 Avaliadas em 4:600$000.

222 Seus herdeiros possuíam nove imóveis em 1872 na rua da

Alegria no 10, no 17, rua do Cajueiro no 13 e no 15, praça dos Voluntários no 19, rua da Assembléia no 3, s/n, rua Boa Vista no 30, no 50.

223 Tornou-se Barão de Vasconcelos em 1869. “Depois, com as

prosperidade alcançadas, passou ao commercio de fazendas finas, perfumaria, artigos de armarinho, objectos de luxo, porcellanas, cristaes, tapetes, tudo importado directamente das praças européas, mantendo sempre a mercearia, onde se encontravam finas conservas e superiores vinhos e licores estrangeiros” (REGO,1935:114-115).

224 ABREU, 1935:114.

225 Representante da Liverpool Northern Brazil Steamers,

“primeira companhia de navegação a manter uma linha regular de vapores para o intercambio entre Fortaleza e os portos da Europa” (NOBRE,1989:360).

(no 34 e no 54) pertencentes, respectivamente, a Jose Lourenço de Castro e Silva e a Jose Francisco

da Silva Albano, respectivamente.

henry ellery227 chegou em 1843, dedicando-se ao ramo de exportação e importação, com

armazéns na rua da Alfândega (rua Dragão do Mar), possuindo o conhecido “trapiche Ellery”, próprio para o embarque e desembarque de produtos na zona portuária. Entre seus negócios, destaca-se o comércio de carnes secas, montando a sua oficina na rua da Palma (Major Facundo). Segundo seu inventário, possuía apenas duas casas, uma na rua Formosa (Barão do Rio Branco)- com cinco portas, murada com cacimba de tijolo, avaliada em 5:500$000 réis; e outra na rua da Palma (Major Facundo)- com cinco portas, murada, e com cacimba, avaliada 3:000$000 réis. Entre seus devedores aparecem Albano & Irmão (63$000 réis), Salgado & Irmão (2:084$360 réis), José Antônio Machado (220$270 réis), Justa & Faria (829$966 réis), Gurgel & Irmão (2:335$966 réis). Entre seus credores Singlehurst Corlett & Cia (4:630$431 réis), Guimarães & Irmão (6:302$958 réis), José Caetano Cardoso (53:302$976 réis), Pinto Leite & Irmão (6:302$958 réis), Manoel Caetano de Gouveia (4:668$000 réis) e Tasso & Irmãos (3:606$333 réis)228.

alfred harvey, casado com Mariana Alves de Abreu, tornou-se importante comerciante e grande

proprietário de imóveis, como se nota no seu testamento de 1847 na tabela 8:

TABELA 8

Inventário do Exportador Alfred Harvey - 1847

Localização Imóvel Aluguel anual 01. Rua Formosa no 15 Casa alugada a João Antonio Damasceno, 40$000

02. Rua Formosa no 54 Armazém 120$000

03. Rua Formosa no 40 Casa alugada a Francisco Dutra Macedo 240$000

04. Rua da Palma no 122 Armazém 60$000

05. Rua da palma no 122 Sobrado 60$000

06. Rua da palma no 20 Casa alugada Henrique Cals 96$000

07. Rua da Palma no 94 Residência do inventariado

08. Praça Carolina no 50 José Joaquim da Sa Braga

09. Praça Carolina no 169 Armazém 200$000

Fonte: Inventário de Alfred Harvey 1847, pacote 95

Estes comerciantes envolveram-se “em tudo aquilo que beneficiasse a atividade comercial de modo geral e favorecesse a expansão de seus negócios na província” (TAKEYA, 1995:113), como por exemplo, participação na diretoria da Associação Comercial fundada em 1868 (tendo como presidente Henrique Kalkmann, e na diretoria Ricardo Hughes), na criação de bancos, na implantação da primeira Estrada de Ferro de Baturité229 para o escoamento da produção e na

fundação de companhias de seguros.

CAPÍTULO 2 | FORTALEZA CAPITAL DA PROVÍNCIA DO CEARÁ E A ECONOMIA DO ALGODÃO

102

227 Casa-se com D. Ana de Castro Saldanha, filha de João José

Saldanha Marinho, e neta, pelo lado materno, do capitão–mor Antônio de Castro Viana, (numero um da lista dos homens brancos no Ceara) proprietário das casas que, mediante sucessivas reformas, se transformaram no Palácio da Luz (GIRÃO, 1975:152).

228 Inventário Henrique Ellery, pacote 122 de 1856.

229 A Companhia Cearense de via férrea de Baturité tem como

o maior acionista a firma Singlehurst & Comp. com 200 ações (Jornal Cearense de 10.02.1871).

103

No capítulo 3 a interpretação e espacialização das décimas urbanas de 1872, 1890 e 1911, permitirá observar a concentração das terras e imóveis urbanos nas mãos dessas firmas de importação e exportação.