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Este trabalho fundamentou-se em contribuições anteriores realizadas por memorialistas, cronistas, historiadores, arquitetos e geógrafos importantes para a história da cidade de Fortaleza. José Honório Rodrigues e Leda Boechet, no Índice anotado da Revista do Instituto do Ceará, consideram como início da historiografia cearense o ano de 1850, destacando vários historiadores anteriores à fundação do Instituto do Ceará, em 1887, que configuram a primeira geração de pensadores sobre o tema. Depois da fundação do Instituto do Ceará, em 1887, surgiu a segunda geração de estudiosos e investigadores cearenses, sob a influência do Barão de Studart. A terceira geração de autores é formada por Mozart Soriano Aderaldo, Raimundo Girão, entre outros, que se destacam pelo “mérito da compreensão e da interpretação, do domínio sobre o documento e da adequada aplicação teórica ao texto histórico” (RODRIGUES, 2002:53). Na retrospectiva que segue, procurou-se organizar a bibliografia supracitada, contextualizando-a e analisando suas contribuições para o presente estudo.

Século XIX

Tomaz Pompeu de sousa brasil, Senador Pompeu (1818-1877)9, advogado, deputado geral (1846),

Senador do Império, professor, jornalista10, é considerado o precursor dos estudos demográficos e

estatísticos no Brasil. Dentre seus trabalhos, destaca-se a primeira edição do Ensaio Estatístico da Província do Ceará11 (Tomo I 1863, Tomo II 1864).

Na literatura, merece destaque o trabalho do memorialista cearense João Brígido dos Santos (1829- 1921), advogado, professor, deputado12 e senador, que baseou sua pesquisa na “tradição popular

e oral [...] a colher pelo interior, ainda vivas, as vozes da consciência popular [...] impregnado do sentimento local da terra e da gente” (RODRIGUES, 2002:34-35). Em 1912, na Revista do Instituto do Ceará publicou A Fortaleza em 1810, uma crônica baseada em dados extraídos dos livros do antigo senado da Câmara (RODRIGUES, 2002:490). Nela, descreve todos os detalhes da “Planta do Porto de Fortaleza”, realizada pelo capitão-de-fragata Francisco Antônio Marques Giraldes, em 1810, no governo de Barba Alardo. Relata minuciosamente aspectos da paisagem natural e as transformações no final do XVIII e início do século XIX. Em 1919, pela editora Tyt. Besnard, Frère do Rio de Janeiro, publica o livro Ceará- Homens e Factos, reunindo o resumo cronológico e vários ensaios históricos sobre o povoamento do Ceará, como também Fortaleza em 181013, onde “revela

uma refinada sensibilidade social [...] e uma ampla visão de nossa realidade” (MENEZES, 2005:126). Outro ensaio A Fortaleza de 1845, foi publicado em 1903 no jornal Unitário, assinado por Outro

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INTRODUÇÃO

9 Esse ensaio sobre a estatística da Província é resultado de

um contrato com o presidente da província Pires da Motta em 1855.

10 Participou do Jornal O Cearense, ligado ao partido Liberal. 11 Data de 1997 a edição fac-similar, em dois volumes.

12 Deputado provincial (1864-67), deputado geral (1878-81)

Senador do Estado (1892) e deputado estadual (1893-94).

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Aramac, “pseudônimo do cronista João Brígido dos Santos, proprietário e redator chefe do jornal” (CASTRO, 2005:116). Na época com 16 anos, apoiou-se “em sua prodigiosa memória mas também ao testemunho de terceiros, contemporâneos dos fatos, e nas plantas de Simões de Faria [1850] e do Padre Medeiros “[1856](CASTRO, 2005:116), que vai interessar particularmente.

antônio bezerra (1841-1921), jornalista, cronista e autodidata, “foi uma das mais destacadas

figuras do Ceará intelectual de seu tempo, que soube projetar-se em grande estilo na vida cultural e política de sua terra” (MENEZES, 2005:107). Em seu texto, Descrição da cidade da Fortaleza, publicado na Revista do Instituto do Ceará, em 1895, expôs aspectos de Fortaleza, atendo-se às suas origens e apresentando suas principais edificações e logradouros. Estas três descrições, de 1810, 1845 e 1895, foram de fundamental importância para nossa análise dos atores sociais envolvidos na produção do espaço urbano e para os nossos exercícios de reconstituição da cidade por meio das plantas de Fortaleza datadas do século XIX.

barão de studart 14(1856-1938), médico, cronista, geógrafo, historiador e editor de documentos,

dedicou-se à pesquisa de arquivos, coleções particulares e bibliotecas brasileiras e europeias, sendo considerado uma das figuras notáveis da historiografia cearense, pois “ultrapassa realmente qualquer valor puramente local para transformar-se numa expressão nacional. [...] o maior historiador local do Brasil (RODRIGUES, 2002:45). Entre seus trabalhos publicados, destaca-se o Pequeno Dicionário Biobibliográfico Cearense, apresentado entre os anos 1899-1907 em vários jornais do Estado e na Revista da Academia Cearense. Posteriormente, foi editado em três volumes com o título Dicionário Bio-bibliográfico Cearense, entre 1910 e 1915. O autor fundou a Revista do Instituto do Ceará, onde publicou vários textos, ressaltando-se, especialmente, um completo levantamento dos estrangeiros, sob o titulo Estrangeiros e o Ceará.

paulino nogueira (1842-1908), jornalista, professor, político conservador e católico praticante,

completou em 1865 o Curso de Direito (Recife), sendo deputado à Assembléia Geral Legislativa (1872), Vice-Presidente da Província do Ceará (1823 e 1875) e, em 1878, Presidente da Província. Direciona seu estudo para biografias exemplares do Ceará, dentre elas a de Antonio Rodrigues Ferreira (1842-1908) (O Boticário Ferreira), e a do coronel José Antonio Machado.

João da cruz abreu (1866-1947) é médico e adquiriu o título de doutor em 1892 no Rio de

Janeiro, fixando sua residência na capital do País, depois de uma temporada no interior de São Paulo (GIRÃO, 1987:33). Mesmo vivendo fora do Ceará, dedicou-se à pesquisa histórica, tornando- se importante colaborador da Revista do Instituto do Ceará (1919 e 1922). Dentre suas publicações, foram utilizados especialmente os artigos sobre os Presidentes do Ceará no Segundo Reinado, principalmente sobre Fausto Augusto Aguiar e Dr. Joaquim Marcos de Almeida Rêgo.

João nogueira15 (1867-1947) engenheiro, diplomado em 1896 no Rio de Janeiro, foi nomeado

Chefe de Linha da Estrada de Ferro de Baturité. Escreveu Fortaleza Velha (1954), resultante da seleção de suas crônicas publicadas nos jornais de Fortaleza entre 1921 e 1942.

Gustavo adolfo luis Guilherme dodt barroso16 (1888-1959), advogado, historiador, professor,

político, folclorista, contista, cronista, ensaísta, escreveu vários livros, dentre os quais À margem

INTRODUÇÃO

14 Guilherme Studart.

15 Filho do desembargador Paulino Nogueira.

16 Membro e presidente duas vezes da Academia Brasileira de

da História do Ceará (1962), publicado pela Imprensa Universitária da Universidade Federal do Ceará. O livro é uma coletânea de artigos sobre eventos do passado cearense, a história da praça do Ferreira, do velho Palácio da Luz, do sobradinho do naturalista Feijó, sobre o primeiro urbanista de Fortaleza e outros temas. Como não indica fontes de consulta, os seus relatos parecem ser fruto de suas observações e vivências pessoais.

Século XX

mozart soriano aderaldo (1917- 1995), bacharel em Direito, professor, crítico, ensaísta,

historiador e genealogista, é autor do livro História Abreviada de Fortaleza, reeditado em 1974, na qual foram incluídas varias crônicas recentes; contém um subtítulo - Crônicas sobre a cidade amada. O autor reúne uma série de artigos publicados no jornal Unitário sobre a antiga rua Formosa, atual Barão do Rio Branco, detendo-se no trecho entre a orla marítima e a antiga rua das Trincheiras, atual Liberato Barroso. Na parte final, descreve a antiga rua da Palma, atual Major Facundo. Do mesmo autor, o livro A Praça (1989) é uma importante fonte de informação da praça do Ferreira no século XIX, enfatizando suas várias transformações ao longo do tempo.

raimundo Girão (1900-1988), historiador, escritor e prefeito de Fortaleza (1933-34), é autor

de várias obras sobre o Ceará e a sua capital. O livro História Econômica do Ceará (1947) é um dos primeiros estudos sobre a economia cearense, dos primórdios até a década de 1940, numa proposta de resumir os fatos econômicos por meio de uma extensa bibliografia, tornando- se consulta indispensável para o entendimento da economia do algodão no Estado. Dedica-se também à pesquisa e ao estudo sobre Fortaleza, no livro Geografia Estética de Fortaleza, publicado em 1959 e aos apontamentos genealógicos, Famílias de Fortaleza, de 1975. O autor descreve a origem de algumas famílias portuguesas e estrangeiras (Albano, Amaral, Gouveia, Machado etc.), atores sociais envolvidos na produção do espaço urbano.

Outros memorialistas, cronistas e poetas também focaram aspectos de Fortaleza, sendo importantes fontes de pesquisa para este trabalho: por exemplo, o pintor, cronista e poeta otacílio de azevedo (1896-1978), com seu livro Fortaleza Descalça, que descreve a Fortaleza antiga e suas lembranças do inicio do século XX; herman lima (1897-1981), autor da crônica Imagens do Ceará, publicada no Rio de Janeiro em 1958 e atualizada em 1977; e Eduardo Campos (1923-2007), bacharel em Direito, teatrólogo, escritor, jornalista e historiador, autor de Capítulos de História da Fortaleza do século XIX: o social e o urbano, de 1985, e A Fortaleza provincial: rural e urbana, de 1988, na qual transcreve as Posturas da Câmara Municipal da Cidade de Fortaleza, aprovadas pela Assembleia Legislativa Provincial em 1835, cotejando-as com as Posturas Municipais de 1835, 1865, 1870 e 1879.

Além desses autores, Geraldo da silva nobre (1924-2005), professor, historiador, jornalista, pesquisador e “continuador do projeto de escrita da História à maneira do Barão de Studart” possui ampla produção bibliográfica. Suas pesquisas nos auxiliaram no estudo dos setores médios da população cujos nomes e perfis foram inventariados no livro O processo histórico de industrialização do

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Ceará de 1989. Geraldo Nobre realizou um minucioso levantamento nos livros da Câmara Municipal e no Arquivo Público Estadual do Ceará sobre Qualificação para o serviço ativo da Guarda Nacional da Comarca da Fortaleza, de 16 de abril de 1851. Outros livros do mesmo autor foram também fonte de pesquisa para nossos estudos, tais como Introdução à História do Jornalismo Cearense, de 1974 e Água para o progresso de Fortaleza, de 1981, A capital do Ceará: evolução política e administrativa, de 1997, além de vários artigos na Revista do Instituto do Ceará e em jornais locais.

Entre os arquitetos, destaca-se o trabalho do pesquisador e professor emérito da Universidade Federal do Ceará, José liberal de castro (1926), fonte de pesquisa indispensável para a nossa tese. Merece destaque o seu livro Cartografia urbana fortalezense na Colônia e no Império e outros comentários, de 1982, onde analisa a evolução urbana de Fortaleza por meio da cartografia. Em Arquitetura eclética no Ceará (1987), o autor discorre sobre o ecletismo no Ceará, mais especificamente na cidade de Fortaleza. Seus textos publicados na Revista do Instituto do Ceará são referências para a compreensão do Urbanismo e da Arquitetura de Fortaleza no século XIX- Contribuição de Adolfo Herbster à forma urbana da cidade da Fortaleza (1994), Cartografia cearense no Arquivo Histórico do Exercito (1997) e Tombamento do sobrado do Dr. José Lourenço (2003). Outras publicações foram também consultadas, tais como “Localização da chácara Villa Izabel propriedade do livreiro Gualter da Silva” (2004), Uma planta fortalezense de 1850 reencontrada (2005); esta última comenta o projeto de expansão urbana de 1850, elaborado por José Simões de Faria.

Vale destacar também algumas dissertações de mestrado e teses de doutorado sobre o tema17. O livro

As Razões de uma cidade: Fortaleza em questão, escrito inicialmente como dissertação de Mestrado, da socióloga Maria Auxiliadora Lemenhe, foi de fundamental importância para o entendimento da expansão e hegemonia de Fortaleza no contexto da economia algodoeira. Diferencia-se deste trabalho na medida em que enfoca um recorte temporal menos amplo, com objetivos diferentes, mais social e menos material.

À vista do exposto, concluí-se que são vários os estudos realizados por memorialistas, cronistas, historiadores, arquitetos e geógrafos18 sobre a cidade de Fortaleza, porem é escassa a literatura que

busca analisar o processo de urbanização numa perspectiva histórica de longa duração (1810- 1933), focalizando as transformações na tessitura urbana e os atores sociais que as promoveram, e dela participaram, com base na seriação de fontes conexas jamais tratadas simultaneamente: décimas urbanas, cartografia, inventários post-mortem, legislação, censos, livros de notas. A linha de investigação desta pesquisa advém particularmente dos trabalhos da historiadora Beatriz P. Siqueira Bueno (2005 e 2008). Neles, a autora apresenta uma metodologia original de espacialização de documentação primária (décima urbana de 1809 e 1829, documentação cartorial, projetos arquitetônicos, cartografia e iconografia), reconstituindo os atores e as lógicas de apropriação e produção do espaço urbano de São Paulo por parte da iniciativa privada, lote a lote, numa perspectiva histórica de longa duração.

INTRODUÇÃO

17 A tese de doutorado sobre a economia cearense do século

XIX, na área de História Econômica da Universidade de São Paulo, é a de Ana Cristina Leite - O Algodão no Ceará: estrutura fundiária e capital comercial (1850/1880)17. Denise Monteiro

Takeya é autora de outra tese de doutorado, defendida no Departamento de História da USP. Também merecem destaque duas dissertações de mestrado: “Urbanização, dependência e classes sociais: o caso de Fortaleza” (1986), da arquiteta Regina

Elizabeth do Rego Barros Marques, defendida na Sociologia, Departamento de Ciências Sociais e Filosofia do Centro de Humanidades da UFC, e a da arquiteta Beatriz Helena Nogueira Diógenes, defendida na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, com o título “A centralidade da Aldeota como expressão da dinâmica intraurbana de Fortaleza” (2005) e JUCA NETO,

Clovis. Urbanização do Ceará Setecentista, as vilas de N. S. da Expectação do Icó e de Santa Cruz do Aracati. Salvador: Tese (Doutorado), UFBa, 2007 .

18 Alguns trabalhos merecem destaque: COSTA, Maria Clélia

Lustosa. ”A cidade e o pensamento médico: uma leitura do espaço urbano”. In: Revista de Geografia da UFC, ano 01,

número 02, 2002, e o texto “Teorias médicas e gestão urbana:

a seca de 1877-79 em Fortaleza”. In: História, Ciências, Saúde-