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Behrens e a implementação prática do design industrial

2. PRIMEIRA PARTE: ENQUADRAMENTO TEÓRICO

2.2. O D ESIGN I NDUSTRIAL E A SUA H ISTÓRIA

2.2.1. D E FINAIS DO SÉCULO XIX A 1950:

2.2.1.2. Behrens e a implementação prática do design industrial

Peter Behrens (1868-1940) distinguiu-se igualmente como um dos mais importantes nomes do grupo de fundadores da Werkbund. Defensor da teoria

racionalização/tipificação proposta por Muthesius, não ignorava contudo a

possibilidade de uma aplicação “comedida” da proposta de ornamentação de Van de Velde75. Artista, arquitecto e designer com estudos diversificados que incluíram, em

71 Identificando a necessidade de uma adaptação estratégica à investida concorrencial alemã, em 1915, é fundada em

Inglaterra a Associação de Design e Indústrias cujos propósitos se assemelhavam aos da Werkbund.

72 “Teve o grande mérito de propor à criação arquitectónica e ligada ao design módulos e decorações que prescindiam

por completo de qualquer herança estilística, inspirando-se em elementos naturalistas (principalmente florais) e em motivos em que se podia discernir influências da arte do Extremo Oriente. Esta admiração pelas coisas do mundo da natureza manifesta nas decorações da art nouveau revela a sua afinidade com as propostas dos movimentos inspirados em Morris e nos pré-rafaelistas, com os quais se identifica igualmente no sentido de uma mais íntima coesão entre estrutura e decoração. Mas, por outro lado, este movimento […] aceitava incondicionalmente a intervenção da máquina. «O potente jogo dos seus braços de ferro» – escreve Van de Velde em Kunstgewerbliche Laiensprdikten, 1901 – «criará a beleza, contanto que seja a beleza a guiá-lo»” (Gillo Dorfles, 1991, 132).

73 “Em 1907, H. Muthesius (1861-1927) pronuncia, na Escola Superior de Comércio de Berlim, a sua famosa conferência sobre

o tema Die Bedeutung des Kunstgewerbes (A importância da Arte Aplicada), que constitui uma duríssima tomada de posição a este respeito. Efectivamente, no decurso daqueles anos, a Kunstgewerbe alemã observa ainda as aberrantes modalidades formais dos estilos decorativos, herdados da tradição de gosto da época vitoriana: o neo-egípcio, o neogrego, o neogótico, o neo-renascentista, o neochinês. «Sucedâneos e imitações festejam o seu próprio triunfo», verifica Muthesius sarcasticamente. […] Segundo Muthesius, a explicação deveria procurar-se no «comportamento pretensioso do parvenu», pertencente a determinada categoria social, a dos «burgueses bem instalados», dominados pela obsessão de «dar nas vistas. […] A conferência de Muthesius em Berlim provocou, como era de esperar, uma duríssima reacção por parte de muitos industriais e artistas, que defendiam exactamente o tipo da Kunstgewerbe denunciado por Muthesius. No entanto muitos houve que tomaram partido por ele. […] Atitudes muito semelhantes à de Muthesius foram assumidas pelos arquitectos e artistas P.Behrens (1863-1940), R.Riemerschmid (1868-1957), J.Olbrich (1867- 1908), J.Hoffmann (1870-1956), Th.Fischer (1862-1938), F.Schumacher (1869-1947), W.Kreis (1873-1955). […] Todavia, a Werkbund não terá a rigidez que a adesão inicial às ideias de Muthesius poderia ter levado a inferir. Efectivamente, não poucos dos seus membros consideravam errado pôr globalmente em causa o ornamento. O problema, diziam, não é tanto rejeitar o ornamento, quanto substituir o «imoral» dos estilos tradicionais pelo «moral» do estilo moderno. Este era o ponto de vista defendido por H. van de Velde (1863-1957), em 1901, no seu livro Die Renaissance im Modern Kunstgewerbe. Na defesa do ornamento – ou, pelo menos, do ornamento considerado moral – encontrava-se, de forma embrionária, a posição que o próprio Van de Velde, em aberto contraste com Muthesius, iria adoptar no Congresso da Werkbund, em 1914, em Colónia. Nessa ocasião, em nome da «liberdade criativa do artista», Van de Velde recusará a tese de Muthesius sobre a racionalização e a tipificação, que, em última análise, acabava por denunciar, mais uma vez, toda e qualquer forma estilística supérflua, fosse ela de cunho moral ou imoral” (Tomás Maldonado, 1999, 38-40).

74 Tomás Maldonado, 1999, 41.

75 “O ideal de Behrens seria poder fundir arte e técnica numa única realidade. «A técnica» - observa Behrens - «não pode

continuar a ser entendida por mais tempo como finalidade em si própria, mas adquire valor e significado quando é reconhecida como o meio mais adequado de uma cultura.» A esta proposta nada haveria a objectar, se por fusão ele

1898, uma especialização em Produção Industrial em Massa (Industrial Mass Production), Behrens é, hoje, quase unanimemente reconhecido como o primeiro designer industrial. Esse facto deve-se, determinantemente, ao trabalho que desenvolveu para a AEG. Peter Behrens inicia a sua colaboração com a AEG no mesmo ano em que é fundada a Deutscher Werkbund. Entre 1907 e 1914, assumiria não só a concepção e desenvolvimento de novos produtos como, também, o trabalho inerente ao grafismo comercial da marca e o projecto dos edifícios da empresa, mediante a consideração e reestruturação da respectiva organização de lay-outs76. A sua parceria com a AEG

surgiu como o primeiro exemplo de implementação prática de processos conciliatórios entre design e gestão industrial77. A quase abolição de motivos ornamentais, a

racionalização e tipificação das formas e a consequente simplificação dos processos produtivos (com influencia directa nos custos de fabrico) fizeram dos produtos por si desenvolvidos um imediato sucesso comercial (Figura 2). Em poucos anos, a AEG detinha

a liderança do seu sector a nível internacional. Do trabalho de Behrens nessa empresa salienta-se a produção dos seguintes produtos: Ventoinha SW 1; Chaleira Modelo-P138; e Relógio Typ Fulo e Synchron (1910).

Figura 2 – Ventoinha SW 178 (1908), Chaleira Modelo-P13879 (1909), Relógio Typ Fulo 80 (1910), Peter Berhens.

não entendesse uma subordinação da técnica à arte: «No entanto, uma cultura amadurecida fala apenas a linguagem da arte», o que, na prática, significa voltar a propor o artista como o último (e inapelável) juiz da produção da cultura material. Mas o texto de Behrens extravasa em buscas e desconcertantes inversões de tendências. Assim, o entendimento agora mencionado, que recorda o de Van de Velde é subitamente abandonado por Behrens para dar lugar a outro, muito semelhante ao de Muthesius, sobre a racionalização e tipificação: «Trata-se aqui de estabelecer tipos para cada um dos produtos, construídos de uma forma limpa, respeitando o material utilizado e sem a pretensão de querer criar estupendas formas novas». O que não impede Behrens, pouco depois, de voltar a propor a ornamentação, até nos aparelhos técnicos, na condição de que sejam ornamentos «geométricos», «impessoais».” (Tomás Maldonado, 1999, 43).

76 Peter Behrens pode ser considerado o pioneiro da aplicação prática daquilo que viria mais tarde a ser denominado como:

“imagem corporativa de uma empresa”.

77 “ (…) há que se reconhecer precisamente a Behrens (eleito em 1909 consultor da AEG, cuja fábrica tinha construído em

Berlim) o mérito – ou a sorte – de ter sido talvez o primeiro caso de «consultor artístico» – e por conseguinte designer – chamado directamente por uma industria com a finalidade de cuidar simultaneamente da organização técnica e da artística. Assim, é a Behrens, no seu posterior cargo de director da academia de arte de Dusseldorf, e a Van de Velde, no de director da escola de Weimar, que se deve todo o reconhecimento enquanto pioneiros de um método didáctico capaz de reconhecer a importância que o design industrial deveria assumir no sector técnico e artístico da produção em série.” (Gillo Dorfles, 1991, 134). Apesar de no excerto supracitado se referir 1909 como a data de contratação de Peter Berhens como consultor da AEG, 1907, é a data do início da sua colaboração com a empresa. A esse propósito recomenda-se a obra de Tilmann Buddensieg, Industriekultur. Peter Behrens and the AEG, 1907-1914, Boston, The MIT Press, 1984.

“ (…) P. Behrens, unanimemente considerado, graças aos seus trabalhos para a «AEG» (1907-1914), o primeiro designer industrial” (Tomás Maldonado, 1999, 43).

78 Fonte: Fotografia cedida pelo coleccionador Paulo Parra.

Em paralelo com a actividade industrial, Berhens partilha o seu conhecimento com jovens estudantes promissores a quem marcaria profundamente. Entre 1908 e 1911, acolhe no seu atelier três dos nomes que viriam mais tarde a ser identificados como determinantes para a evolução e sedimentação de conceitos e práticas do Design, como disciplina, e da arquitectura moderna. Eram eles: em 1908, Walter Gropius e Mies van der Rohe e, em 1911, Le Corbusier. Abriam-se, assim, os horizontes para a gradual delimitação, expansão e implementação de novas posturas didácticas aplicáveis ao universo metodológico-concepcional dos produtos industriais, ou seja, do Design Industrial.

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