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Capital de ponte, 24/

No documento La Vem Todo Mundo Shirky Clay (páginas 118-120)

Joi Ito é um misto de investidor, escritor, fissurado por jogos de computador e membro do conselho de diversas instituições sem fins lucrativos e empresas. Sua agenda de endereços contém vários milhares de nomes. Ele está sempre viajando; em 2005 viajou tanto que sua velocidade média no ano foi de oitenta quilômetros por hora. Ito é também um adepto inveterado das novas tecnologias; experimenta um número extraordinário de ferramentas sociais e organizacionais todo ano e aferra- se às que fazem sentido para ele. Uma das ferramentas que adotou alguns anos atrás foi o Internet Relay Chat, ou IRC, uma ferramenta antiga (criada em 1988) que gera uma sala de bate-papo em tempo real chamada de canal. Todas as pessoas que usam determinado canal de IRC podem falar  com todas as outras ali dentro. (Uso “falar com” aqui no sentido coloquial de “teclar rapidamente  para”.) Os canais no IRC são como conversas em mensagem instantânea ou torpedo, mas, em vez de

serem centradas em pessoas, são centradas em assuntos. O nome de um canal dá aos usuários alguma ideia do tema sobre o qual os participantes estão conversando ou pelo menos do que eles têm em comum. Alguns canais têm vida longa – há um canal com décadas de existência chamado #hottub (os canais do IRC sempre começam com um sinal #), dedicado sobretudo à paquera entre universitários entediados do mundo inteiro. Outros canais de IRC são passageiros – uma dúzia deles foi criada durante a perseguição policial em baixa velocidade a O.J. Simpson em 1994, com especulações sobre os resultados da caça enquanto ela se desenrolava.

Em 2004, Ito criou um canal de IRC chamado #joiito, no qual seus amigos e contatos poderiam se reunir e conversar. A ideia era fazer, nas palavras dele, “não um lugar meu, mas um lugar  semipúblico, onde eu poderia ser um anfitrião”. Ele usou seu nome tanto por ser reconhecido em muitas comunidades (não há vaidade nisso, só constatação – uma busca por “Joi Ito” na web produz quase 1 milhão de resultados) quanto por querer ser capaz de exercer uma espécie de persuasão moral sobre os procedimentos no canal. Se este tivesse seu nome, ele teria mais chance de impor  um comportamento cortês. O canal logo chegou a reunir cerca de cem pessoas conectadas ao mesmo tempo. A maioria delas não falava durante grande parte do tempo – permanecia conectada, mesmo que não estivesse prestando atenção ao canal, ou mesmo se não estivesse sentada diante de seu computador. Mas sua presença assegurava uma conversa relativamente regular entre os  participantes.

Um dos frequentadores, um programador chamado Victor Ruiz, escreveu um software chamado ibot (abreviatura de #joiito bot”, em que “bot” é um programa interativo). A função do jibot seria monitorar o canal e responder a perguntas especialmente formatadas, inclusive consultando  palavras em um dicionário personalizado. Um dos participantes regulares levou para o canal uma

usuária nova, Jennie Cool, que se tornou uma anfitriã não oficial. Ela adotou o jibot como ferramenta social, registrando no dicionário “definições” associadas aos nomes dos outros usuários. Vendo isso, Kevin Marks, outro frequentador regular, modificou o jibot para anunciar  essa “definição” cada vez que alguém se conectasse ao canal (uma função chamada “anúncio”). Por  exemplo, assim que o usuário mmealling se conecta, o jibot posta a frase: “mmealing é Michel Mealling. Ele mora em Atlanta, GA.” Esse programa, com toda a sua simplicidade, ajudou a transformar o #joiito, um lugar criado sobretudo para gerar capital de ligação ( geeks que conheciam Joi), em um lugar que produzia capital de ponte (pessoas que conheciam  geeks que conheciam Joi). Em outras palavras, o jibot deixou o #joiito mais parecido com uma liga de

 boliche, em que é possível ingressar sem conhecer a maioria dos membros.

A interseção entre redes sociais e redes eletrônicas é simples em seus elementos, mas complexa em seus resultados, em parte pela existência de tantos circuitos de retroalimentação. Joi adotou o IRC porque era uma boa maneira de oferecer um site permanente para que as pessoas que ele conhecia interagissem. As pessoas que se reuniam ali ficaram se conhecendo melhor por meio de suas interações, e, como ocorre com qualquer comunidade bem-sucedida, outras pessoas foram convidadas a ingressar no canal. Esses novos membros não conheciam, como os membros originais, todo o contexto, e, para suprir essa necessidade, Ruiz usou suas habilidades técnicas para  personalizar um software e criar os anúncios. O importante é que o uso do jibot como ferramenta social precedia o anúncio – a alteração do software foi um reflexo do comportamento, não o contrário. Até o momento em que escrevo este livro, há todo dia cerca de oitenta pessoas conectadas ao #joiito. A existência do canal permite a Joi criar um ambiente duradouro no qual  pessoas que o conhecem podem se encontrar, mesmo que ele não esteja presente. Depois que o

canal alcançou uma espécie de estabilidade social, ele passou a se conectar com frequência cada vez menor; no #joiito há pessoas do mundo todo 24 horas por dia que não precisam muito de Joi Ito  para fazer as coisas acontecerem. (O dodgeball também se baseava no capital social de seus

usuários para ajudar a intermediar apresentações sem que a presença deles fosse necessária.)  Nesse aspecto, o #joiito é uma representação do papel de Joi como conector; se todo mundo

criasse seu próprio canal de IRC, ninguém falaria nunca com ninguém, pois todos estariam em seus  próprios espaços individuais. Um canal chamado #joiito faz sentido do ponto de vista social – 

contamos com Joi para providenciar capital de ponte insubstituível – enquanto um chamado #jusuarioqualquer não faria sentido algum. Como um bar ou um café, #joiito abriga o tipo de conversa informal de que o capital social é feito; diferentemente de um bar ou café, seu funcionamento não custa nada.

O canal de IRC de Joi é inusitado, mas não a capacidade que uma pessoa ou um grupo pequeno tem de criar esse tipo de valor social. Outro canal de IRC, o #winprog, é um ponto de encontro  para alguns dos mais talentosos programadores para Windows. Como muitos pontos de encontro de eeks, o canal é uma meritocracia técnica brutal (regra número um do canal: “não se queixe”), mas é inestimável para pessoas que levam a programação para Windows a sério, servindo tanto como fonte de informação quanto como um meio de programadores empenhados se integrarem em uma comunidade de prática. Como uma fonte tanto de informação quanto de camaradagem, o #winprog é satisfatório e eficaz para seus membros.

De maneira semelhante, o Howard Forums é um fórum de discussão na web fundado por Howard Chui, um programador de computação que se tornou obcecado por telefones celulares. Chui fundou o Howard Forums após responder a algumas perguntas técnicas enviadas por vários leitores a seu  blog sobre celulares; ele raciocinou que pôr seus leitores em contato uns com os outros seria mais fácil que tentar responder ele mesmo a todas as perguntas. A intuição provou-se correta: menos de cinco anos depois de sua fundação, o site recebe meio bilhão de acessos por ano para consultas sobre assuntos incrivelmente detalhados, como formas de personalizar marcas específicas de telefones ou os méritos das várias redes de celular. A informação produzida é tão boa que engenheiros das companhias telefônicas por vezes remetem seus clientes ao site quando eles têm uma dúvida particularmente complicada. Embora o Howard Forums não seja parte oficial de nenhuma companhia telefônica, a qualidade da informação técnica ali encontrada é extraordinária,

um produto da paixão (ou obsessão) da comunidade por telefones.

Tim O’Reilly, o editor e organizador de conferências, fundou a conferência FOO Camp (Friends of O’Reilly). Essa conferência começa com a lista de convidados – reunir uma centena de pessoas interessantes – e deixa que elas elaborem o programa e o conteúdo do encontro (em um wiki, é claro). Todas essas formas sugerem que a agregação estruturada de interesses e talentos individuais  pode criar um tipo de valor que é difícil reproduzir em formas institucionais comuns e impossível

reproduzir a um custo tão baixo.

A questão não é quantas pessoas você

No documento La Vem Todo Mundo Shirky Clay (páginas 118-120)