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A ESCRITA NO 1.º CICLO DO ENSINO BÁSICO

CAPÍTULO 2 – FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2. Competências da Produção Textual

2.2. Competência Compositiva

Quando a criança já tem um certo domínio sobre as competências gráfica e ortográfica, já é capaz de produzir textos escritos para expressar conhecimentos e/ou para escrever em termos criativos e pessoais.

A produção de textos é, na nossa sociedade, uma exigência generalizada, sendo que todos os indivíduos devem demonstrar capacidades para a escrita, tendo em conta a diversidade de géneros (Barbeiro e Pereira 2007).

É neste sentido que pretendemos realçar a importância do desenvolvimento da competência compositiva. Pretendemos mostrar que o processo de produção textual é de elevada complexidade e que, por esse facto, temos que adquirir conhecimentos sobre modos de ação que devemos adotar no ensino da escrita.

[…] A escrita não tem que ser entendida, exclusivamente, como um produto acabado, produto esse a ser avaliado em função de normas previamente ensinadas, mas, fundamentalmente, como um processo em que se tem que resolver múltiplos problemas que vão desde o encontrar o que se quer dizer, à forma como se vai escrever […] (Martins e Niza 1998:160).

Qualquer texto escrito resulta de um processo. “[…] A perspectiva pedagógica […] defende que, no contexto de ensino-aprendizagem, é possível intervir nesse processo […]” (Barbeiro 1999:15). Desde o início da aprendizagem da escrita, a criança pode, com a ajuda do professor, produzir textos com sentido (Martins e Niza 1998). Ao professor cabe, portanto, a função, não só de conhecer as caraterísticas a atingir pelo produto final, mas apoiar “[…] durante o percurso em que consiste a produção de cada texto ou no percurso global de desenvolvimento das capacidades de expressão escrita […]” (Barbeiro 1999:15). Assim sendo, este tem que ter “[…] consciência das características do processo, dos subprocessos nele existentes, das relações que estabelecem entre si e ainda do relacionamento com o processo de escrita por parte dos alunos […]” (Barbeiro 1999:15-16).

2.2.1. Modos de Ação no Ensino da Escrita

 Ação sobre o Processo de Escrita e Ação sobre o Contexto dos Escritos

No desenvolvimento da escrita, a aquisição de competências específicas – ação sobre o processo de escrita – deve ser combinada com o acesso às funções desempenhadas pela diversidade de textos – ação sobre o contexto dos escritos. A primeira pretende desenvolver as competências e os conhecimentos implicados na escrita. A segunda permite o contacto com textos social e culturalmente relevantes e o acesso às suas diversas funções (Barbeiro e Pereira 2007).

2.2.2. Princípios Orientadores da Escrita

O professor e a escola devem-se guiar por princípios orientadores. O professor, através de atividades e estratégias práticas, vai proporcionar aos alunos o domínio na escrita. Existem sete princípios orientadores gerais sobre a escrita – ensino precoce da produção textual,

ensino que proporciona uma prática intensiva, ensino do processo (planificação, textualização e revisão), ensino sobre textos de género diversificados, social e escolarmente relevantes, ensino sequencial das atividades de escrita, ensino que permita uma regulação externa e interna da produção textual e por último, ensino que assegure uma gradual complexificação da produção textual (Barbeiro e Pereira 2007).

Em relação ao primeiro princípio enumerado, o ensino precoce da produção textual, pode dizer-se que é essencial que a aprendizagem da escrita se inicie logo na entrada para a escola. Isto, porque a aprendizagem da escrita é um processo moroso e longo (Barbeiro e Pereira 2007). O professor deve proporcionar, aos alunos, uma prática intensiva, que consiste num «treino» pessoal frequente de escrita, da realização de exercícios sistemáticos e que ao mesmo tempo traga «momentos de produção inventiva e crítica» (Barbeiro e Pereira 2007). Deve também acentuar o ensino do processo, praticando e utilizando com os alunos as componentes de produção textual: planificação, textualização e revisão.

O ensino deve incidir sobre textos de géneros diversificados, social e escolarmente relevantes. Este princípio diz-nos que existem diversos géneros textuais que são relevantes para a aprendizagem da escrita, aprendendo “[…] a sua especificidade em termos de forma e conteúdo […]” (Barbeiro e Pereira 2007:8) e acedendo “[…] à realização de funções por meio dos produtos escritos” (Barbeiro e Pereira 2007:8).

O ensino das atividades de escrita deve ser sequencial. As atividades sequenciais possibilitam ao aluno uma autonomia em relação à produção textual ganhando, assim, mais potencialidades na escrita para poder expressar sentimentos, opiniões, conceitos, conhecimentos, vivências, etc. Deve permitir também uma regulação externa e interna da produção textual, que consiste em várias interpretações em relação a um mesmo texto, podendo assim, negociar critérios de avaliação dos textos produzidos e ajudar em decisões para resolver problemas existentes num texto (Barbeiro e Pereira 2007).

Por fim, o ensino deve assegurar uma gradual complexificação da produção textual. Sendo a aprendizagem da escrita um processo que necessita um certo tempo para o incorporar da aprendizagem, é necessário que se vá complexificando gradualmente o ensino das produções textuais à medida que o aluno vai evoluindo (Barbeiro e Pereira 2007).

2.2.3. Estratégias

Há estratégias que podem ser seguidas pelo professor e que permitem criar novas atividades, transformar atividades anteriormente usadas ou presentes em manuais ou outros

materiais didáticos que ajudam na concretização dos princípios orientadores (Barbeiro e Pereira 2007).

Estas estratégias podem ter uma ação sobre o processo da escrita ou sobre o contexto da escrita. No que diz respeito, à ação sobre o processo, podemos salientar três estratégias, sendo elas: facilitação processual, escrita colaborativa e reflexão sobre a escrita. Já em relação à ação sobre o contexto, salientamos duas estratégias: a integração de saberes e a realização de funções.

Comecemos pelas estratégias da ação sobre o processo.

A facilitação processual tem a ver com “ […] dominar o processo […]” (Barbeiro e Pereira 2007:10). Isto é, ao longo da elaboração de um texto, o aluno tem de tomar decisões sobre o conteúdo essencial a colocar no mesmo e a linguagem a utilizar. A função do professor é, então, propor atividades facilitadoras, tendo como objetivo “[…] desencadear e apoiar a realização das tarefas ligadas às componentes de planificação, textualização e revisão […]” (Barbeiro e Pereira 2007:10).

A escrita colaborativa tem a ver com o escrever em conjunto, para que se possa aprender a escrever. Através da escrita colaborativa, podemos verificar uma interação que leva aos alunos uma possibilidade para apresentar propostas, obter feedbacks, comparar opiniões, apresentar alternativas e argumentos, pedir explicações e resolver problemas em conjunto. Na colaboração pode estar envolvido quer o aluno quer o professor, e nesta colaboração reflete-se não só o reforço do sentimento de participação como também o sentido emocional. Com esta estratégia, existe a possibilidade de obter reações mesmo ainda durante o processo de escrita (Barbeiro e Pereira 2007).

A reflexão sobre a escrita diz respeito ao “[…] falar ou escrever sobre a escrita […]” (Barbeiro e Pereira 2007:11). Aqui, a estratégia aprofunda em atividades específicas à componente metadiscursiva, já inserida na escrita colaborativa. Estas atividades devem provocar nos alunos a capacidade de refletirem e de falarem sobre os próprios textos e sobre o processo que levou à sua construção (Barbeiro e Pereira 2007).

Na ação sobre o contexto, temos em primeiro lugar a integração de saberes. Esta estratégia relaciona-se com o “[…] construir e expressar conhecimento […]” (Barbeiro e Pereira 2007:11). A escrita tem potencialidades específicas que derivam de dois fatores: “[…] o processo da sua produção decorre antes de o texto cumprir as suas funções junto do leitor, o que dá tempo ao aluno para pensar, para reflectir, para procurar novos elementos […], para alterar […]” (Barbeiro e Pereira 2007:11); “[…] a escrita dá origem a um produto autónomo

(texto) que, registando o conhecimento, permanece para além da situação em que foi escrito, podendo ser consultado e alvo de novas etapas de reescrita […]” (Barbeiro e Pereira 2007:11). É entre a escrita e o conhecimento expressado que se dá a integração de saberes. É necessário que se tome decisões em relação ao conteúdo, às palavras e à organização, pois na produção de um texto tem que existir mobilização de conhecimentos. A integração de saberes no ensino da escrita deve ser dada não apenas em português como também nas outras áreas disciplinares quando se produz um texto. Com isto, a escrita aproxima-se à realização de funções (Barbeiro e Pereira 2007).

A realização de funções tem a ver com “[…] conquistar o poder da escrita […]” (Barbeiro e Pereira 2007:12), ou seja, ao aprendermos a escrever, aprendemos também a utilizar a escrita na realização de funções, tendo um alcance intrapessoal ou interpessoal (Barbeiro e Pereira 2007:12).

Todas as estratégias anteriormente referidas podem surgir ligadas, correspondendo a diversos momentos de uma atividade de escrita em que se realize determinadas funções.

2.2.4. A Complexidade do Processo de Escrita

Ao contrário da competência gráfica e da competência ortográfica, a competência compositiva nunca será completamente automatizada, dado que a produção de diferentes textos coloca-nos sempre perante diferentes desafios.

A competência compositiva implica a passagem por diferentes fases, como: ativação de conteúdos, decisão sobre o que incluir no texto, articulação de ideias, coesão e coerência textual. Esta competência é utilizada tanto ao nível global (grandes unidades de texto – macro-estruturas: organização de todo um texto, por exemplo) como ao nível específico (combinação de expressões linguísticas – micro-estruturas: escolha de uma palavra numa determinada passagem do texto, por exemplo) (Barbeiro e Pereira 2007).

A competência compositiva pretende que um aluno desenvolva a capacidade de gerar diferentes possibilidades para a construção do texto e aprofunde a capacidade de tomar decisões adequadas (Barbeiro e Pereira 2007).

O processo de produção de um texto escrito é bastante complexo, dado estar dependente de fatores sociais, emocionais e cognitivos e pelo facto de existirem diversas componentes de formulação de expressões linguísticas que têm de ser adequadas ao contexto.