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Competências da Autoadvocacia para a Participação Social

CAPÍTULO II: EDUCAÇÃO DE PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NO BRASIL: POLÍTICAS E

4.3 Dimensão da Experiência individual de Empoderamento e Autoadvocacia

4.3.3 Competências da Autoadvocacia para a Participação Social

A participação social depende das oportunidades que são disponibilizadas às pessoas com deficiência: o acesso à educação básica formal; o ingresso no ensino superior; a participação em projetos de ensino profissionalizante; o domínio tecnológico; a reivindicação

junto a movimentos sociais, entre outras, são fatores que favorecem o exercício do empoderamento e da autoadvocacia, porque criam situações em que as pessoas com deficiência aprendem junto com seus pares a tomar decisões, a planejar projetos de vida futura e ter uma mobilização pessoal.

No Brasil, existe uma Lei que regulamenta a cota de 2 a 5% de vagas nas empresas que possuem mais de 100 funcionários em seu quadro. Por essa lei, tem-se assegurado o acesso de pessoas com deficiência ao mercado de trabalho, embora isso não garanta sua permanência. Francisco, jovem com deficiência intelectual da cidade de João Pessoa, foi beneficiado com a Política de Cotas e trabalha há cinco anos em uma grande franquia de supermercado brasileira. Essa oportunidade possibilitou ao jovem pensar sobre sua vida nas decisões de querer morar só, de gerenciar seu próprio dinheiro e de planejar uma vida futura.

Como a maioria das pessoas no Brasil, as pessoas com deficiência que estão empregadas geralmente ocupam cargos com baixos salários, com poucas oportunidades de desenvolvimento cognitivo-profissional e criatividade:

Toda pessoa tem potencial para ser criativa, mas nem todas realizam esse potencial, por não terem oportunidades de desenvolvê-lo. A criatividade precisa ser exercitada com persistência, existindo para isso técnicas e estratégias de pensamento que auxiliam no desenvolvimento do potencial criativo (OLIVEIRA, 2010, p. 3).

A execução de trabalho simplificado e com pouco potencial-criativo não atinge apenas pessoas com deficiência residentes no Brasil – Mariana: organiza roupas em uma loja; Bia: é secretária voluntária numa ONG; Francisco: empacota mercadorias em um supermercado; Williams: é telefonista de um órgão governamental; Thiago: organiza papéis em um escritório; –, mas também as pessoas com deficiência que moram no Canadá – Carol: cuidadora de crianças numa escola; Mike: atendente numa cafeteria; John: recepcionista de cinema; Brand: secretário numa ONG; Clarisse: organiza roupas. É evidente que essas ocupações têm seu valor social, o que está em questão é que as pessoas com deficiência são impedidas de atingirem cargos de liderança, político ou que exijam um nível de abstração mais intenso, justamente por causa de barreiras sociais, que as colocam em ocupações subalternas.

As barreiras para o ingresso no ensino superior também são impeditivas para que um expressivo número de pessoas com deficiência consiga melhor status educacional e, consequentemente, profissional, através de um diploma de nível superior. No Brasil, dos entrevistados, apenas Alseni tem formação num curso superior e foi recentemente concursada

num serviço público. Isso foi uma conquista tanto para seu grupo social como para a população em geral, uma vez que no país poucas são as pessoas que chegam a conquistar espaços como Alseni.

No Canadá, as pessoas com deficiência, que não possuem diploma da educação básica (por terem estudado em escolas especiais ou não terem concluído o ensino regular), ingressam no ensino superior por meio de programas de educação especial, caso queiram. Esses programas constituem cursos profissionalizantes que visam à formação específica para o mercado de trabalho. Ao concluírem, os estudantes são encaminhados para o mercado de trabalho e continuam a receber suporte (programa de emprego apoiado) para permanecerem na função. Ashley é uma das alunas do programa de educação especial oferecido pela Faculdade Douglas College e, com a conclusão do curso, foi inserida no mercado de trabalho. Ela afirma que a experiência de estar hoje no mercado de trabalho representa a possibilidade de ter uma vida independente em sua própria casa, uma vez que ela foi adotada por uma família.

Dessa forma, a inserção no mercado de trabalho, através de programas complementares de educação no Canadá, é um diferencial que oportuniza às pessoas com deficiência a participação e contribuição social, importantes para a autodefensoria de pessoas com deficiência em seu contexto de vida particular:

(...) A autodefesa implica uma modalidade de participação efetiva na sociedade, com autonomia e produtividade satisfatória (...) Desde seu espaço mais próximo, até outras instâncias sociais e políticas mais complexas. Vai depender de suas habilidades e sua escolha. Enfim, ao falar de autogestão e autodefesa, estamos falando de processos singulares e complementares, cuja direção será determinada pelo desenvolvimento pessoal e autônomo, atribuído à pessoa com deficiência. Não se trata, apenas, de ter clareza de conceitos. Trata-se de ter visão, postura e disponibilidade para aprender, criando formas de trabalho renovadas, quantas vezes necessárias (NOÉ, CARVALHAIS, 2009, p. 27).

É importante destacar que a formação técnica é a mais almejada pelos jovens no Canadá, já que o diploma no nível superior não é pré-requisito para uma vida financeira bem sucedida e estável. Por essa razão, as pessoas com deficiência não estão em posição inferior por não obterem o diploma de nível superior, mas, ao mesmo tempo, isso impossibilita a formação de carreiras profissionais.

No Brasil, o diploma em nível superior significa, além do status social que traz uma carreira profissional, a possibilidade de ter um emprego com melhores retornos financeiros, diferentemente de uma ocupação em geral. Somando-se a isso, para pessoas com deficiência,

a formação em nível superior significa “provar” socialmente sua capacidade intelectual, uma vez que elas são colocadas em posição de incapazes. A formação em ensino superior representa, portanto, o nível alto de empoderamento e autoadvocacia, uma vez que essas pessoas precisam romper muitas barreiras desde o ingresso até à permanência no ensino básico, passando pelo vestibular para atingir o nível superior.

Segundo Glat e Fellows (1999 apud GLAT, 2004), a participação social e autonomia são princípios da autoadvocacia que norteiam o pressuposto de que todos/as, como cidadãos/ãs, possuem o direito de fazer escolhas e arcar com os erros e consequências advindas delas. A participação social é dependente de contextos diversos, podendo variar desde a contribuição social frente a grandes representações governamentais como Barb Goode (Canadá) e Everton (Brasil), que são ativos na defesa de seus direitos a situações do dia a dia que estimulam a construção da autonomia pessoal como o cotidiano de trabalho.