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3. MEIO AMBIENTE DO TRABALHO RURAL E LEGISLAÇÃO APLICÁVEL

3.3. Legislação Rural

3.3.4 As Convenções da OIT

3.3.4.5 Convenção 29 e 105 da OIT – Sobre o trabalho forçado

Portanto, não restam dúvidas que esses serviços de saúde e segurança no trabalho devem executar suas tarefas com o apoio do tomador de serviços, mas sempre visando beneficiar o trabalhador, no sentido de garantir-lhe um meio ambiente do trabalho equilibrado, seguro e saudável, onde o mesmo possa desempenhar suas funções sem o risco de acidentes e doenças ocupacionais.

3.3.4.5 Convenção 29 e 105 da OIT – Sobre o trabalho forçado

Serão abordadas as duas convenções no mesmo tópico, 29 e 105, por versarem sobre temáticas entrelaçadas. A primeira veda o trabalho forçado, enquanto a segunda foi editada para avançar em tal proibição.

A Convenção 29204 foi ratificada pelo Brasil e está em vigor aqui desde o dia 25.4.1958, tendo sido promulgada pelo Decreto 41.721/1957205. Seu interesse está na abolição da utilização do trabalho forçado ou obrigatório em todas as suas formas

203

MARANO, op. cit. 24.

204

OIT - Organização Internacional do Trabalho. Convenção 29. Disponível em: <http://www.oit.org.br/node/449>. Acesso em: 22.02.2015.

205

BRASIL. Decreto-Lei n. 41.721, de 25 de junho de 1957. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/Antigos/D41721.htm>. Acesso em: 22.02.2015.

- com exclusão de aplicação em alguns tipos de trabalho elencados no artigo 2º, item 2 - no mais breve espaço de tempo possível (artigo 1º, item 1), admitindo o recurso ao trabalho forçado, no período de transição, isto é, até sua completa erradicação, unicamente para fins públicos e como medida excepcional, ainda assim nas condições estipuladas na Convenção (artigo 1º, item 2).

Dentre as condições apresentadas, a Convenção 29 estabeleceu que apenas os adultos do sexo masculino, fisicamente aptos, cuja idade presumível não seja inferior a dezoito anos, nem superior a quarenta e cinco, poderiam ser convocados para o trabalho forçado ou obrigatório (artigo 11, item 1) e que estes só poderiam ser submetidos ao trabalho forçado no período máximo de 60 (sessenta) dias a cada 12 (doze) meses (artigo 12, item 1), devendo ainda ser observado o mesmo horário de trabalho adotado para o trabalho voluntário, ao passo que as horas trabalhadas além do período normal deveriam ser renumeradas na mesma base das horas de trabalho voluntário, concedendo-se um dia de repouso semanal (artigo 13, item 1 e 2). No mesmo sentido, com exceção do trabalho previsto no artigo 10 da Convenção, o trabalho forçado, sob todas as suas formas, deveria ser remunerado em espécie e em base não inferior à que prevalecia para espécies similares de trabalho na região onde a mão-de-obra era empregada ou na região onde era recrutada, prevalecendo a que fosse maior (artigo 14, item 1).

Observa-se das condições apontadas, que mesmo quando havia autorização para o trabalho forçado, ainda assim a Convenção 29 atribuía aos trabalhadores certas garantias. É o que inclusive aponta Denise Lapolla de Paula Aguiar Andrade:

Verifica-se, por outro lado, que o trabalho forçado, por ser exigido contra a vontade do trabalhador, mesmo durante o período transitório em que foi admitido, deveria garantir o respeito à dignidade do trabalhador, razão pela qual a Convenção nº 29 da OIT estabeleceu uma série de garantias aos obreiros submetidos a essa forma de trabalho, disciplinando salário, jornada de trabalho, repouso, proibição de descontos salariais, condições de higiene e segurança dos locais de trabalho, assistência médica ao trabalhador e a sua família, transferências, indenizações e vedações quanto a determinadas atividades.206

Os Estados-Membros que ratificaram a Convenção 29 se comprometeram, nos termos do artigo 2º, item 1, a reconhecer e abolir todo trabalho ou serviço

206

ANDRADE, Denise Lapolla de Paula Aguiar. A servidão por dívidas e o princípio da dignidade

humana. Apontamentos sobre trabalho escravo, forçado e degradante. Revista Synthesis: direito do

exigido de uma pessoa sob a ameaça de sanção e para o qual não se tenha oferecido espontaneamente. A sanção não precisa ser necessariamente penal, pode ser a simples perda de direitos e privilégios, ou mesmo uma ameaça, sob as mais variadas formas, como violência física, ameaças de morte, confinamento, retenção de documentos, presença de guardas armados, o não pagamento de salário, etc.

Apenas para esclarecer quanto o consentimento, este pode até ter sido dado inicialmente, todavia, não o isenta de acabar submetido à prática. O que se deve ter em mente é se o trabalhador foi enganado, houve um consentimento viciado pela fraude.

No mesmo sentido leciona Aurélio Pires:

O trabalho forçado não é apenas aquele para o qual o obreiro não se apresentou espontaneamente, como destacado na Convenção nº 29 da OIT, pois existem situações em que o trabalhador é ludibriado por promessas falaciosas de salário e emprego, sendo coagido no curso do pacto laboral a continuar a prestação dos serviços, o que o impossibilita de deixar o trabalho, situação que também caracteriza trabalho forçado.207

Dessa forma, toda vez que o trabalhador, seja urbano ou rural, estiver impedido de deixar o serviço haverá trabalho forçado, mesmo quando o mesmo tenha ajustado livremente a prestação do trabalho ou incorrido em vício de consentimento em função de falsas promessas do beneficiário direto ou indireto do seu labor.

Já a Convenção 105208 da OIT foi ratificada pelo Brasil em 1965 e está em vigor desde o dia 18.06.1966, tendo sido promulgada pelo Decreto 58.822/1966209. Também milita pela extinção e proibição do uso de trabalho forçado ou obrigatório.

Contudo, ela vai além. Aryon Sayão Romita relata que a norma em questão é mais avançada no sentido de que todo Estado-Membro da Organização Internacional do Trabalho que ratificá-la, compromete-se a abolir toda forma de trabalho forçado ou obrigatório e dele não fazer uso (artigo 1º), nas seguintes modalidades:

207

PIRES, Aurélio. Direito do trabalho e trabalho escravo. Suplemento Trabalhista, São Paulo, ano 41, n. 5/05, 2005, p. 17-20.

208

OIT - Organização Internacional do Trabalho. Convenção 105. Disponível em: <http://www.oit.org.br/node/469>. Acesso em: 22.02.2015.

209

BRASIL. Decreto-Lei n. 58.822, de 14 de julho de 1966. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1950-1969/D58822.htm>. Acesso em: 22.02.2015.

[...] como meio de coação ou de educação política ou expressar determinadas opiniões políticas, ou por manifestar oposição ideológica à ordem política, social ou econômica estabelecida; como método de mobilização e utilização da mão de obra para fins de fomento econômico; como medida de disciplina no trabalho; como castigo racial, nacional ou religiosa.210

Como visto, as Convenções se complementam. A primeira estabelece a proibição geral de se adotar o trabalho forçado em todas as suas formas e a segunda prevê a proibição do trabalho forçado em cinco casos específicos, ligados a situações econômicas e políticas vigentes no período em que ela foi adotada, o contexto pós-segunda Guerra Mundial. Diante disso, as legislações dos países membros que ratificaram a Convenção 105, devem tipificar a prática levando em conta as particularidades econômicas, sociais e culturais do seu Estado.

Já que a Convenção 105 se aplica a todas as atividades econômicas, estão incluídas aquelas que se desenvolvem no meio rural, onde a prática de violações às normas de proteção ao trabalhador é bastante comum, tal como a adoção da condição análoga a de escravo. Mais uma vez, verifica-se o empenho de tal organização em combater esse tipo de trabalho, através de programas com o intuito de fomentar a erradicação das formas servis de agricultura em países em desenvolvimento.

Também vedando a adoção do trabalho forçado há o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos de 1966211, cujo artigo 8º proíbe a escravidão, o tráfico de escravos, a servidão e o trabalho forçado ou obrigatório, bem como a Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969212, que, em seu artigo 6º, prevê que ninguém deve ser constrangido a executar trabalho forçado ou obrigatório.

Comungando os mesmos esforços, estabelece a Declaração da Organização Internacional do Trabalho sobre os Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho de 1998213, no seu artigo 2º que todos os Membros, ainda que não tenham ratificado as respectivas convenções, têm um compromisso derivado do fato de pertencer à

210

ROMITA, Arion Sayão. Direitos fundamentais nas relações de trabalho. 4.ed. rev. e aumentada. São Paulo: LTr, 2012, p. 234.

211

Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/D0592.htm>. Acesso em: 22.02.2015.

212

Convenção Americana de Direitos Humanos. Disponível em: <http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/instrumentos/sanjose.htm>. Acesso em: 22.02.2015.

213

Declaração da Organização Internacional do Trabalho sobre os Princípios e Direitos Fundamentais

no Trabalho. Disponível em:

<http://www.oitbrasil.org.br/sites/default/files/topic/oit/doc/declaracao_oit_547.pdf>. Acesso em: 22.02.2015.

OIT de respeitar, promover e tornar realidade, de boa fé e de conformidade com a Constituição, os princípios relativos aos direitos fundamentais que são objeto dessas convenções, isto é, a liberdade sindical e o reconhecimento efetivo do direito de negociação coletiva; a eliminação de todas as formas de trabalho forçado ou obrigatório; a abolição efetiva do trabalho infantil; e a eliminação da discriminação em matéria de emprego e ocupação.

Enfim, tendo o Brasil ratificado as Convenções 29 e 105 da OIT, o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (1966) e a Convenção Americana de Direitos Humanos (1969), tornou-se, com amparo nestas normas internacionais, obrigado a erradicar todas as situações de trabalho forçado ocorridas no país, o que será abordado de forma mais detalhada na sequência.