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Ciranda, cirandinha, Vamos todos cirandar, Vamos dar a meia volta, Volta e meia vamos dar...18

Olhando para o quadro de Portinari Roda Infantil percebe-se que a criança estando ou não nas instituições ela brinca e as brincadeiras foram ao longo do tempo sendo retratado por artistas em poesias, em estampas, em histórias em quadrinhos, em livros e na fantasia das crianças. Registro “que é muito interessante para que se tenha um referencial do passado e compreenda-se a brincadeira como parte constitutiva da cultura” (PETRAUSKI, 2008, p.05).

No início do século XX surgem as primeiras creches no Brasil acompanhando a estruturação do capitalismo, a crescente urbanização e a necessidade de reprodução da força de trabalho em acordo com Haddad, (1993). Portanto, a mudança do modelo de economia agrária para o industrial, significou alterações na configuração do espaço

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Refrão de cantiga de roda tradicional brasileira, disponível em:

http://meusbrinquedosantigos.blogspot.com.br/ 2012/02/brincadeiras-de-roda.html Figura 1. Roda Infantil, Portinari - 1932

50 urbano, com crescente êxodo rural, o que fez com que as cidades estratégicas no cenário nacional assumissem ano a ano, acréscimo demográfico e de serviços.

Conforme Santos (s/d, p.539), a partir dos anos 20 a 30, diante dos processos de industrialização e urbanização e com a política voltada ao Estado de bem-estar social, se desencadeou uma preocupação permanente com a educação infantil, motivada também pela constatação dos altos índices de mortalidade infantil que acometia tanto ricos quanto pobres no país (FARIA, 1999, p. 68-69). Para tanto, foi realizado o 1º Congresso Brasileiro de Proteção à Infância (RJ) que publicizou um levantamento do número de creches e jardins de infância, que totalizavam 30 unidades em 1922.

Tal evento representou segundo Faria (idem, p. 68-69), “um congresso de educação infantil que a predominância do caráter médico-higienista pode ser vista como a forma mais avançada e moderna de se conceber a infância naquele momento. “Aliado aos movimentos modernos que marcou a segunda década do século XX, este acontecimento pode ser considerado de caráter” democrático por apresentar os temas mais variados em relação à infância, e algumas tendências de pensamento progressista por apresentar algumas posições bastante avançadas para a época”. Posições estas que deixavam em evidência a reflexão sobre o binômio assistencial versus educativo em relação às crianças de 0 a 6 anos.

A Escola Nova, de forte influência na Europa, repercutiu no Brasil desencadeando uma maior preocupação com a educação. O contexto brasileiro, com a expansão das indústrias e crescimento urbano, exigia da escola um aporte necessário para a inserção do trabalhador neste novo modelo de produção, inclusive a educação passou a ser vista como “peça-chave” para esta renovação.

Em 1932, a regulamentação do trabalho feminino trouxe, em caráter obrigatório, a necessidade da criação de creches por empresas com mais de 30 funcionárias. Mais tarde, na Constituição de 1988, esta medida foi integrada às referências à educação infantil, sendo previstas creches gratuitas para crianças de zero a seis anos, destinadas a mães trabalhadoras.

Segundo Arroyo (1995) apud Laureano (2007, p. 21), “o trabalho feminino, seja por necessidade, seja por opção, traz como consequência a necessidade de tornar coletivo o cuidado e a Educação da criança pequena”. Surge, portanto, a infância como

51 categoria social e não mais como categoria familiar.

Assim, foram surgindo atendimentos à criança, que visavam um modelo coletivo tendo, sua formalização regulamentada em 1940.

Na Europa, o atendimento coletivo se dava através de estabelecimentos cujos fins maiores eram a caridade e o humanitarismo, estes locais eram destinados aos filhos de operários. Outra identidade, própria das contribuições de educadores como Froebel, estava amplamente difundida na Europa, e deixava nítidas concepções de criança relacionada a jardins, onde estas desabrochariam tal como flores, se cultivadas. Esta proposta estava voltada aos filhos das classes mais abastadas economicamente.

No Brasil, segundo Oliveira (2002) apud Munhoz (2005, p. 52) “até aproximadamente metade do século XIX não existia atendimento a crianças pequenas longe da mãe, em creches, jardins-de-infância ou parques infantis”. Somente após a metade daquele século que, contagiados pelos ideais liberais de uma nação moderna, pensamentos voltados ao atendimento às crianças, começam a ser sedimentados.

Nas últimas décadas do séc. XIX (MONARCHA, 2001, p. 3) informações educacionais, vigentes na Europa, chegam ao Brasil e inspiram práticas, em consonância maior ou menor com a proposta pedagógica de Froebel.

A criança dos 04 aos 06 anos, no jardim, educaria a mão e o olho, desenvolveria hábitos de asseio, urbanidade, império sobre si mesma, aguçaria o engenho, interpretaria os números e as formas geométricas, inventaria combinações de linhas e imagens, e as representaria com o lápis,

nessas valiosas lições e, acima de tudo, as preciosas inspirações que sugeridas pelo trato nos Kindergarten, hão de penetrar os métodos de educação nas outras escolas (grifo do autor) (KUHLMANN Jr, 1998, p.142).

Conforme Santos (s/d, p. 539), em 1940 foi regulamentado o Parque Infantil que

em 1935teve a sua primeira sede em São Paulo. O ano de 1935 pode ser considerado

como inicio da rede de educação infantil paulistana que contava com o projeto de Mário de Andrade. Este projeto englobava a educação não escolar voltada às crianças das classes operárias e se fundamentava no trabalho com o folclore, isto é, as crianças vivenciavam experiências educacionais voltadas às tradições populares, a arte, aos jogos tradicionais infantis, ao lúdico, a ginástica, além de valorizar o trabalho ao ar livre para prevenir a tuberculose.

Educar, assistir e recrear era o lema dos Parques Infantis do Departamento de Cultura, que tinham uma pedagogia que assegurava o direito da criança ser criança,

52 levando em consideração todas as dimensões: humanas, físicas, intelectuais, culturais, lúdicas, artísticas, etc em acordo com Faria (1999).

A expansão deste modelo foi progressiva. Em meados do século XX tínhamos cerca de “3320 jardins de infância espalhados pelo Brasil, sendo 1.535 públicos e 1785 particulares” (SANTOS, s/d, p. 539), porém insuficientes para o atendimento crescente do número de crianças com faixa etária de zero a seis anos.

Diante da passagem do meio de produção doméstico para o fabril e da progressiva formação da classe operária e com a incorporação crescente da mão de obra feminina ao mercado de trabalho, a Europa presenciou muitas mudanças que se agregaram aos costumes da família tradicional. Assim, a criança pequena passou dos cuidados maternos à atenção de outras mães, não incluídas naquele modelo de produção, que vendiam sua força de trabalho às mães trabalhadoras. Outros arranjos sociais voltados ao atendimento às crianças pequenas também foram se desenhando diante da eminente configuração do mercado de trabalho que alijava a mãe do atendimento direto ao filho.

Corroborando esta posição, Paschoal e Machado (2009, p.80) colocam que, com o nascimento da indústria moderna, modificou-se a estrutura social familiar vigente, em seus hábitos e costumes. A necessidade premente pela sobrevivência das famílias e o ritmo de trabalho imposto, fez com que se desconsiderasse a qualidade no atendimento às crianças das mães trabalhadoras, que era feito por pessoas leigas e, que às vezes, incluía na rotina a presença de maus tratos e desprezo, além do descuido com a alimentação, higiene e estímulos adequados. Estes maus tratos foram “legitimados” nas relações entre adultos e

crianças, inseridos na

convivência com os

pequenos e supostamente

explica a cultura de

agressões impostas sob a égide da educação.

As mazelas

enfrentadas pelas crianças e Figura 2. As Crianças (Orfanato)1935/1949. Tarsila do Amaral

53 o abandono que muitas estavam sujeitas, fizeram com que filantropos tomassem para si a tarefa do acolhimento da infância, tirando das ruas a triste visão das crianças pobres e da sujeira onde se instalavam (idem, p. 80). Iniciava-se um novo modelo coletivo de assistência à infância. A obra de Tarcila do Amaral intitulada “As Crianças” retrata segundo pesquisas sua fase social onde retratava as crianças em orfanatos muitas vezes com faces tristes. Na poesia Infância no Orfanato do blog Mediadores da leitura (2011) inspirados na obra de Tarcila do Amaral” “As crianças (Orfanato)” os autores perguntam:

O que é a infância? Circunstância... De vida tem ânsia.

E no orfanato? De fato... Jamais um ornato. Circunstância, Um belo retrato. Infância no orfanato Seria perder a infância?

Seria ganhar um teto? Sonhá-la sem mau trato,

Vida em abundância, Infância no orfanato. Apesar de tanta distância, Com o amor ter contato...

Bastos (2001) deixa claro, que aconteceram reflexões sobre a necessidade ou não dos Jardins da Infância se estabelecerem no Brasil.

A família brasileira atravessa uma época bastante crítica, a lei de 28 de setembro19 vai produzindo seus naturais efeitos e muito breve a mulher brasileira, deixando de ser senhora limitar-se-á ao papel de senhora, será auxiliar do esposo, irá ao trabalho pedir os meios para a subsistência do casal. Nesse dia as creches e os jardins de infância serão indispensáveis (p. 75). No parecer de Manoel Olímpo R. da Costa como nos aponta Bastos (2001) houve uma crítica severa contra a implementação dos Jardins da Infância, pois não trariam solução rápida para a melhoria da educação e que o Brasil teria que criar muitos estabelecimentos para abrigar as crianças pequenas e propunha que eles fossem criados

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Menezes Vieira procura também demonstrar a necessidade dos jardins de infância no Brasil. Defende a implantação com o argumento da lei do Ventre Livre - Lei ir 2.040, de 28 de setembro de 1871, que declarava livres os filhos de mulher escrava nascidos após essa data. Disponível em: Pro patria laboremus: Joaquim José de Menezes Vieira, 1848-1897, acesso em 29/08/2012.

54 e mantidos pela indústria particular. A preocupação dele era com as crianças em idade de aprender e que, ainda não haviam recebido a instrução prometida pelo governo. O Conselheiro Junqueira também discordava e afirmava que o jardim da infância não tinha nada de instrução e que:

(...) é uma instituição de caridade para meninos desvalidos, que serve para que a mãe e o pai, sendo minimamente pobres, quando vão ao trabalho, entreguem seus filhos aos asilos, como já se faz entre nós e até na Bahia, em algumas casas dirigidas pelas irmãs de caridade, porquanto a mulher raramente deixa o lar para o trabalho, e não deve ser substituída, sem necessidade, no exercício da sua mais nobre privada”, mas a Comissão sobre Jardins da Infância, na exposição pedagógica de 1883 se opõe e não concordaram com os Conselheiros quando dizem que os jardins são instituições de caridade, acreditam que os mesmos são “escola de educação e, auxilia o desenvolvimento físico dos meninos por meio de exercícios apropriados a sua idade, anima os primeiros esforços de sua inteligência, oferecendo-lhes alimento à curiosidade para os quais sua inteligência é atraída (apud BASTOS, 2001, p. 63).

Essas reflexões iniciais foram importantes para se esclarecer que os jardins de infância até então eram privados e que nos países europeus os eles estavam colaborando com o desenvolvimento das crianças. Essas discussões entre os conselheiros ajudaram a retardar o início do jardim da infância no Brasil. O jardim da infância se restringia a uma parcela da população, as das mães trabalhadoras. O Estado demorou em assumir o seu compromisso com o direito das crianças, o que aconteceu somente após a República.

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