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2.4 Direito do Trabalho: particularidades caracterizadoras

2.4.1 Denominações da disciplina jurídica

No que se refere ao nome da ciência jurídica em apreço, segundo SÜSSEKIND, a grande controvérsia é “prevalentemente, de índole acadêmica e reflete, na presente fase, apenas o antagonismo em que se colocaram diversos juristas no concernente ao conteúdo mais ou menos amplo da disciplina em apreço”.172 Soma-se a essa divergência (hodiernamente superada,

“com sabor rememorativo”173) o contraponto entre os designativos “Direito” versus “Legislação”.

“Legislação Industrial”174, “Legislação Operária”, “Legislação Trabalhista” e

“Legislação Social-Trabalhista”, dentre outras, são denominações decisivamente superadas e em desuso, sobremaneira com vista ao desenvolvimento desse ramo jurídico especializado e ao alcance da sua autonomia.

Seguem no mesmo passo, menos pelo desuso e mais pela impropriedade designativa, as denominações: “Direito Industrial”175, “Direito Operário”176, “Direito

Corporativo”177, “Direito Sindical”178 e “Direito Social”179.

classificatória das fontes jurídicas em formais e materiais, conforme será discorrido com maior detalhamento em momento oportuno (ao tratar-se das fontes juslaborais).

172 SÜSSEKIND et al. Instituições de Direito..., v. 1, p. 101. 173 DELGADO, Curso de Direito..., 9. ed., p. 50.

174 O epíteto “Legislação Industrial”, inclusive, foi o eleito pela Constituição de 1934, especificamente no art.

art. 121, §1º.

175 A denominação Direito Industrial já foi utilizada, sobremaneira por remontar à época do surgimento do

Direito do Trabalho, após a Revolução Industrial. Contudo, recebe severa crítica doutrinária por transmitir duas ideias aparentemente antagônicas: ideia muito ampla, no sentido de englobar também temáticas inerentes ao Direito Comercial e Econômico (e.g. patentes e invenções); e ideia muito restrita, incapaz de alcançar todo o universo das relações trabalhistas (e.g. aquelas desenvolvidas no âmbito dos setores primários, agropecuário, terciário, serviços, e no doméstico).

176 A denominação Direito Operário também já foi adotada no Brasil, inclusive pela Constituição de 1937

(quando previa a competência da União para legislar sobre o tema, art. 16, XVI). Apesar disso, também recebe críticas doutrinárias por remontar as relações de emprego à época do surgimento do Direito do Trabalho e por valer-se apenas da figura do empregado da indústria (o operário), desprezando os outros empregados (que labutam em outros setores da economia) e o caráter expansionista do ramo juslaborativo. Salienta-se que EVARISTO DE MORAIS, in: Apontamentos de Direito Operário (1905) foi um dos pioneiros a adotar a denominação “Direito Operário”. Cf. MARTINS, Direito do Trabalho, p. 13.

177 O Direito do Trabalho também já foi designado de Direito Corporativo. Contudo, tal designativo também não

é acolhido pela doutrina principalmente pelo fato de ser empregada a partir de políticas autoritárias do entre- guerras do século XX (fascismo italiano). De acordo com MARTINS, Oliveira Viana é a referência autoral da

adoção no Brasil dessa denominação. Oliveira Viana, Problemas de direito corporativo apud MARTINS,

Direito do Trabalho, p. 14.

178 A expressão Direito Sindical, igualmente, já foi empregada para designar o ramo juslaboral. Nada obstante,

enfoca muito mais a relação de trabalho na qual se verifica a presença do sindicato profissional (relações coletivas de trabalho) do que, propriamente, a relação individual de trabalho, principal objeto de regulação da disciplina em análise.

179 A denominação Direito Social, cujo maior defensor brasileiro foi CESARINO JÚNIOR, também recebe críticas

doutrinárias, principalmente porque traduz ideia muito ampla, englobando também outros ramos do Direito (e.g. Previdenciário, Ambiental e o do Consumidor). MARTINS, referindo-se ao entendimento de CESARINO JÚNIOR, afirma

De outro lado, de acordo com o DICIONÁRIO HOUAISS DA LÍNGUA PORTUGUESA, o verbo transitivo direto denominar significa “nomear (algo ou alguém) de, designar; dar-se apelido ou qualificação de; intitular-se”.180

A melhor denominação de algo ou alguém é aquela que consegue reverberar-lhe a essência (a característica particular) e, empregando poucas palavras, consegue transmitir a ideia central do todo o que se pretende apelidar, referindo-se ao seu objeto fundamental.

O designativo Direito do Trabalho181 mostra-se, então, como o mais adequado

(podendo-se dizer: perfeito), tornando-se hegemônico contemporaneamente não só no Brasil como em diversos outros países: na França, Droit du Travail; na Itália, Diritto del Lavoro; nos países de língua espanhola, Derecho del Trabajo; nas línguas inglesas, Labor Law.

Não obstante, convém tecer algumas considerações acerca da razão dessa hegemônica adoção terminológica e de sua certeira adequação à disciplina em apreço.

Se, de um lado, o ramo juslaboral tem o seu campo de aplicação restrito (em regra, originalmente e tradicionalmente) às relações empregatícias, de outro, ele tem forte tendência expansionista (ao menos tradicionalmente182), isto é, tendência a estender o seu manto tutelar a

relações de trabalhos outras. Recorde-se: originalmente, era apenas um direito operário. A própria ordem constitucional vigente, designadamente no caput do art. 7º, que, “com fim deliberadamente expansionista de tutela”183, adota a terminologia “trabalhador” ao

invés de “empregado”.

Daí dizer PORTO, citando o RELATÓRIO SUPIOT, que “a vocação futura do Direito do Trabalho é a de se tornar o Direito comum de todas as relações de trabalho, subordinadas ou não”.184

que, “o Direito é social em razão da prevalência do interesse coletivo sobre o individual, como apregoado na Revolução Francesa. Para ele [Cesarino Júnior] o Direito do Trabalho seria social por excelência, o mais social dos direitos. Seria um Direito reservado à promoção da justiça social [1957, v.1:17 e 35]”. MARTINS, Direito do Trabalho, p. 14.

180 HOUAISS, Dicionário Houaiss..., p. 938.

181 A previsão constitucional brasileira da denominação Direito do Trabalho remonta à de 1967, que prescrevia

ser competência da União legislar sobre “Direito do Trabalho” (art. 8º, XVII, alínea “b”).

182 Aqui se fala “ao menos tradicionalmente”, principalmente diante de novas tendências teóricas,

jurisprudências e normativas imbuídas do propósito de restrição do campo pessoal de aplicação do Direito do Trabalho, podendo-se citar a criação da figura do “empregado parassubordinado” (que, nos dizeres de SOUTO

MAIOR, é “um ser da mitologia jurídica moderna, uma espécie de trabalhador minotauro, meio subordinado,

meio autônomo”) e a própria legitimação jurisprudencial da terceirização (Súmula 331 do TST). SOUTO MAIOR, A supersubordinação... In: Revista do Tribunal..., p. 166.

183 VILHENA, Relação de emprego..., p. 137.

184 O Relatório de Supiot, coordenado por Alain Supiot, foi elaborado a pedido da Comissão Europeia e propõe a

criação de um “Direito Comum do Trabalho”, mediante a formulação de quatro grupos de tutelas. O primeiro compreende os direitos sociais universais, garantidos a todos, independente do exercício de atividade laborativa. O segundo abrange os direitos fundados no trabalho não remunerado, ligado a atividades socialmente úteis, como o trabalho voluntário e aqueles atrelados a auto-formação (e.g. direito a aposentadoria e a cobertura dos acidentes de trabalho). O terceiro consiste no grupo de direitos destinados àqueles que exercem atividade

Ademais, conforme precisa colocação de RENAULT, o objeto do Direito do Trabalho é o trabalho do homem.185 Então, se é certo que o Direito do Trabalho clássico teve

como preocupação central as relações empregatícias (em um primeiro momento, as industriais), não é menos certo que, diante de todas as mudanças ocorridas no mundo do trabalho, devem implicar mudanças no próprio Direito do Trabalho, sobremaneira, por meio de formas mais inclusivas de pensá-lo, interpretá-lo e aplicá-lo.

Nesse sentido, cita-se a tendência interpretativa conferida ao Direito individual do Trabalho por seus estudiosos no sentido de estabelecer construções doutrinárias hábeis à extensão de suas normas para outros trabalhadores considerados hipossuficientes, não se limitando apenas ao trabalho subordinado clássico.186

Pelo exposto, a precisão da denominação Direito do Trabalho justifica-se em face do seu objeto (trabalho do homem), não obstante seja ainda aplicado, original e prioritariamente, às relações empregatícias.

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