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2.5 Princípios do direito do trabalho: relevância, conceito, funções e proposta de sistematização

2.5.3 As funções dos princípios

Dentre as funções desempenhadas pelos princípios, tradicionalmente, arrolam-se apenas três delas. Com base no entendimento de FEDERICO DE CASTRO233, são: informadora,

normativa e interpretadora.

Na sua função informadora, atuam como o que se costuma chamar de “fontes materiais do direito”, na medida em que se portam como fatores que influenciam e fundamentam a produção (criação e modificação) das normas jurídicas, inspirando o legislador.

Na função normativa (mais adequadamente chamada de “integrativa”), diante de um caso concreto em que exista uma lacuna normativa, os intérpretes e aplicadores do direito utilizam os princípios para completarem expressamente o ordenamento jurídico. Os princípios, nestas situações, agem

231 BONAVIDES, Curso de Direito..., 23. ed., p. 288. 232 GONÇALVES, Flexibilização trabalhista, p. 58.

233 DE CASTRO, Federico. Derecho Civil de España. Madrid: 1949, t. 1, p. 473 apud PLÁ RODRIGUEZ,

como fonte formal supletiva ou subsidiária, tal como previsto nos art. 4º234 da

LINDB235, 126236 do CPC e 8º237 da CLT. Aqui, a aplicação das demais

normas jurídicas é direta, ao passo que a dos princípios é indireta.

Na função interpretadora, os princípios são utilizados como critério orientador do juiz ou intérprete, contribuindo para o processo de compreensão da norma. Neste papel, os princípios atuam como fontes instrumentais, isto é, como verdadeiras balizas interpretativas diretivas. DELGADO, fundando-se em moderna doutrina constitucional, pautada no paradigma do Estado Democrático de Direito, assevera que os princípios desempenham uma quarta função, com inquestionável força vinculante (e não meramente pragmática): a

normativa própria.238

Assim expõe o autor:

A função fundamentadora dos princípios (ou função normativa própria) passa, necessariamente, pelo reconhecimento doutrinário do princípio e sua natureza de norma jurídica efetiva e não simples enunciado programático não vinculante. Isso significa que o caráter normativo contido nas regras jurídicas integrantes dos clássicos diplomas jurídicos (constituições, leis e diplomas correlatos) estariam

234 Art. 4º da LINDB: ”Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e

os princípios gerais de direito”. FERRAZ JÚNIOR, discorrendo sobre esse preceito, salienta: “A ordem, na

enunciação, pode ser uma orientação – primeiro se tenta a analogia, depois, os costumes e por último, os princípios –, mas ela não é compulsória, não estabelece impositivamente uma relação de superioridade da analogia sobre os costumes e destes sobre os princípios”. FERRAZ JÚNIOR, Introdução ao estudo..., p. 145. No mesmo sentido, REALE e, em sentido contrário, pelo entendimento de que há uma enumeração excludente (em primeiro lugar, o recurso à analogia; a seguir, aos costumes e, por fim, aos princípios gerais), CLÓVIS

BEVILÁQUA. Cf. REALE, Lições preliminares de Direito, p. 315.

235 A recente Lei 12.376, de 30.12.10, amplia o campo de aplicação e altera o designativo da emenda do Decreto-

Lei 4.659, de 4.09.1942, anteriormente alcunhada restritivamente de “Lei de Introdução ao Código Civil” (LICC).

236 Art. 126 do CPC: “O juiz não se exime de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuridade da lei. No

julgamento da lide caber-lhe-á aplicar as normas legais; não as havendo, recorrerá à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito”.

237 Art. 8º da CLT: “As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou

contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por eqüidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito de trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direto comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público”.

238 Observa-se que, em sentido contrário, isto é, pelo não desempenho pelos princípios de função normativa

própria e, portanto, não os entendendo como fontes do Direito, PLÁ RODRIGUEZ. É o que se aufere do seguinte

trecho: “Em face do exposto, estamos em condições de responder à pergunta central que nos fizemos: os princípios próprios do direito do trabalho constituem uma fonte do direito? A resposta é negativa. Acabamos de ver que a função dos princípios é variada. A única função de caráter normativo é constituída pela atuação como fonte supletiva em caso de omissão da lei”.238 PLÁ RODRIGUEZ, Princípios do Direito... In: PLÁ

também presentes nos princípios gerais de direito. Ambos seriam, pois, norma jurídica, dotados da mesma natureza normativa.239

Percebe-se, então, por esta quarta função (normativa própria ou autônoma) que os princípios são dotados de força vinculante e de inquestionável aplicabilidade prática direta – não atuando apenas de forma indireta, nos casos de ausência de dispositivos legais expressos (lacunas normativas) –, além, é claro, de influírem no processo legislativo e de interpretação do ordenamento jurídico, tal como entendimento tradicional.

Frisa-se que os princípios não cumprem na mesma medida e com a mesma intensidade essas quatro funções.240 Em verdade, cada qual desempenha mais detidamente

uma delas (e.g. o princípio in dubio pro operario, que possui destinação específica para a interpretação do Direito do Trabalho e o princípio da norma mais favorável, que atua especificamente como critério de aplicação das normas241), sem, entretanto, reduzir-lhes a

devida importância. Ao contrário, atribuindo a cada um dos princípios pontuada, forte e inquestionável aplicabilidade direta e concreta.

Pela análise, aufere-se, contemporaneamente, a natureza jurídica normativa dos princípios, pertencentes ao gênero normas, ao lado das regras jurídicas, igualmente consideradas como espécie daquela.

ALEXY justifica:

Tanto regras quanto princípios são normas, porque ambos dizem o que deve ser. Ambos podem ser formulados por meio das expressões deônticas básicas do dever, da permissão e da proibição. Princípios são, tanto quanto as regras, razões para juízos concretos de dever-ser, ainda que de espécie muito diferente. A distinção entre regras e princípios é, portanto, uma distinção entre duas espécies de normas.242

239 ALEXY, Teoria de los Derechos..., apud DELGADO, Princípios de Direito..., p. 20-21. “Esta nova

compreensão doutrinária passou a se valer da expressão norma como referencia geral aos dispositivos gerais, abstratos, impessoais, e obrigatórios que regulam a vida social. Assim, na idéia de norma (em sentido amplo) estariam abrangidas, pois, as noções de regras (ou norma, em sentido estrito) e de princípios jurídicos (e também a noção de institutos jurídicos, acrescentamos nós). A “distinção entre regras e princípios é pois uma distinção entre dois tipos de normas”, (afirma Robert Alexy, sintetizando esta compreensão teórica sobre o problema”).

240 Entendimento cf. PLÁ RODRIGUEZ, Princípios do Direito... In: PLÁ RODRIGUEZ, Estudos sobre..., p. 24. 241 DELGADO sustenta que a aplicabilidade do princípio da norma mais favorável tem maior extensão, podendo

este ser distinguido em três dimensões, a saber: na ação legislativa, quando da elaboração da norma jurídica; no critério de hierarquia das normas, em caso de confronto de regras concorrentes; e, por fim, como critério de interpretação do direito. Cf. DELGADO, Princípios de Direito..., p. 43. Contudo, especificamente no que se refere ao critério de interpretação do Direito, entende-se, juntamente com a doutrina majoritária, que o Direito do Trabalho possui princípio especificamente destinado a essa função interpretativa, a saber, princípio in dubio pro operario (que será tratado do com maior aprofundamento no capítulo 4 deste trabalho). Dessa forma, opta-se pelo posicionamento teórico de que a função específica desempenhada pelo princípio da norma mais favorável é servir de diretriz para a aplicação da norma em caso de concorrência normativa (estudo que será desenvolvido no capítulo 3 desse trabalho).

242 ALEXY, Teoria dos Direitos..., p. 87. Após essa explanação, o autor apresenta inúmeros critérios distintivos

entre regras e princípios. Contudo, acentua que o da generalidade é o mais frequente. Segundo esse critério o autor explica que os princípios são dotados de algo grau de generalidade relativa, ao passo que as regras, de grau

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