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Parte II. Razão e Desenvolvimento

Capítulo 08. Desenvolvimento Sustentável

8.5. Críticas e limites do DS

8.5.6. Diferenças Norte / Sul

Diegues (2001, p.50) critica que a proposta de DS ignora as relações de forças internacionais, os interesses dos países industrializados em dificultar o acesso à tecnologia aos países em desenvolvimento, as relações desiguais de comércio e a oposição de multinacionais às propostas tecnológicas contrárias às suas estratégias globais.

Em decorrência dos acordos estabelecidos em âmbito internacional, muitos países passaram a adotar legislações e a criar mecanismos institucionais que suportem ministérios, secretarias e agências de planejamento e implementação de políticas ambientais. Sachs (1993, p.14) aponta que desde os anos '70 já houve progresso nesse sentido, mas há ainda muito a ser feito no campo da legislação nacional e internacional, sobretudo no que refere ao seu cumprimento. Esse problema explicita as diferenças existentes entre os países do Norte e Sul, pois não há linearidade na implementação do que se entende por DS. Como descrito pelo autor, há uma grande defasagem entre tais países: segundo dados da Organização para Cooperação Econômica e Desenvolvimento (OCED, 1991 in SACHS, 1993), seus países membros respondem por parcela pequena da população mundial, concentram grande parte do capital, do comércio internacional e do consumo de energia, e são responsáveis por grande parte da poluição do planeta. Esta defasagem explicita que os padrões de consumo dos países do Norte são insustentáveis e teve profundo impacto sobre a crise socioambiental.

Por esse raciocínio, é preciso ponderar que existem estilos de vida inerentes aos países promotores das bandeiras do DS, que foram, justamente, os que contribuíram de maneira mais efetiva para o acirramento da crise socioambiental. Na ótica de Sachs (1993), os países industrializados deveriam reconsiderar o desperdício que caracteriza seus

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padrões de consumo e de utilização de recursos, antes de exportar esse estilo de vida ocidental aos países do Sul. Nas palavras do autor:

Embora reconhecendo a ligação entre meio ambiente e desenvolvimento, o Norte insiste na idéia de riscos ambientais globais e na responsabilidade compartilhada de enfrentá-los. O Sul, ao contrário, prioriza a agenda de desenvolvimento, alertando para o perigo de imposições descabidas, sob o pretexto da degradação ambiental, de novas condicionalidades sobre as economias altamente endividadas e depauperadas do Sul, enquanto o Norte prossegue com seus padrões de vida ambientalmente inviáveis (South Comission, 1990, p.281). O Sul não pode aceitar que seu desenvolvimento seja interrompido em nome da preservação do meio ambiente. A verdadeira escolha não é entre desenvolvimento e meio ambiente, mas entre formas de desenvolvimento sensíveis ou insensíveis à questão ambiental (SACHS, 1993, p.17).

Pelas análises críticas de Leff (2002)224, o movimento ambientalista problematiza uma série de fatores interligados: padrões de produção e de consumo, estilo de vida e a orientação e aplicação do conhecimento no processo de desenvolvimento. O redimensionamento destes levaria, necessariamente, a um novo projeto de civilização, no qual se recolocam as necessidades humanas em um patamar diferente do atual, se reconfiguram as relações entre o Estado e as demandas dos diferentes grupos sociais, sejam estes organizados em organizações do mercado como da sociedade civil de forma mais ampla.

Apesar dos esforços da comunidade internacional serem unanimemente favoráveis à concepção do DS, ainda existem fatores inerentes aos sistemas políticos e econômicos que impedem, nos momentos de negociação de acordos e na implementação das estratégias de políticas públicas, a orientação para o bem comum, como apontado por Klaus FREY (2001, p. 2)225. Esse é o problema que Leonardo AVRITZER e Sérgio Costa (2004, p. 714-717)226 salientam sobre a uniformização de uma agenda pública global: os fóruns transnacionais são diversos, segmentados e desarticulados entre si e, além disso, as questões tratadas no plano global são, na verdade, materializadas e praticadas segundo as lógicas nacionais e nas esferas locais.

Segundo Frey (2001, p.22-34), boa parte das teorias que embasam o DS – segundo as abordagens econômico-liberal de mercado, ecológico-tecnocrata de planejamento, política de participação democrática – carecem de investigações que aprofundem a

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LEFF, Henrique (2002). Epistemologia ambiental. São Paulo: Cortez.

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FREY, Klaus (2001). A dimensão político-democrática nas teorias de desenvolvimento sustentável e suas implicação para a gestão local. Ambiente & Sociedade, ano IV, nº 9, 2º semestre, p. 1-34.

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AVRITZER, Leonardo & COSTA, Sérgio. (2004) Teoria crítica, democracia e esfera pública. Concepções e usos na América Latina. DADOS - Revista de Ciências Sociais. Rio de Janeiro, v. 47, nº 4, p. 703-728. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/dados/v47n4/a03v47n4.pdf>. Acesso em: 03 de Ago, 2009.

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dimensão político-democrática do termo. Nesse sentido, o desafio destas teorizações é superar os problemas de cunho político e de exercício de poder, que trazem à tona as questões das instituições político-administrativas, da participação e do processo político. Para superação desses entraves, é essencial que as esferas estatais propiciem o exercício democrático dos cidadãos, nas comunidades locais, por meio da ampliação ativa das margens de ação da sociedade civil e de sua capacitação para defender e sustentar interesses relacionados às suas causas.

Sachs (1993, p.15) descreve que a conscientização da opinião pública, a pressão dos movimentos civis por meio da sociedade civil organizada e os movimentos populares de base têm gerado transformações significativas no que tange à aplicação de políticas ambientais. Mais do que isso, o autor descreve que os processos de modernização conduzidos de cima para baixo são os que geralmente produzem desequilíbrios socioambientais, enquanto que os sistemas de gestão de recursos e meio ambiente baseados na comunidade têm mostrado bons resultados. Esse é um dos caminhos, reconhecidos por Sachs, para a promoção e consolidação da genuína democracia participativa, exercida em todos os níveis: global, nacional e local.

8.6. Avanços graças à discussão sobre DS