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LIMA, Aluísio Ferreira de (2005) A dependência de drogas como um problema de identidade:

possibilidades de apresentação do 'Eu' por meio da oficina terapêutica de teatro. 198p. Dissertação

(mestrado). Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Social da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo:PUC-SP

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FRABE, Deborrah, E. S. (1997). Gender, racial, ethnic, sexual, and class identities. Annual Review of

Psychology, vol. 48, p. 139-162. Disponível em: <http://maxweber.hunter.cuny.edu/pub/eres/SOC217_PIMENTEL/frable.pdf>. Acesso em: 27 de Jan, 2010.

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LIMA, Aluísio Ferreira de (2009). Sofrimento de indeterminação e reconhecimento perverso: um estudo da

construção da personagem doente mental a partir do sintagma identidade-metamorfose-emancipação. 283p.

Tese (doutorado). Programa de Estudos Pós-Graduados em Psicologia Social da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo:PUC-SP.

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Termo que se origina de um erro histórico, usado como categoria genérica de identificação utilizada pelos europeus, sem relação com as identidades dos povos indígenas aos quais se referia – e que posteriormente ganha força de identificação e autoidentificação.

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criativo e desconfiado. Igualmente negativos, os traços de sua cultura são associados com atraso, inferioridade e primitivo. A vida simples é ligada à pobreza – em relação ao padrão de vida urbano opulento. E a depreciação por não alcançarem o progresso (por isso, fracassados), segundo Lima (1999, p. 14), relaciona-se à expectativa de elevada performance (material, econômica, cultural) na Amazônia, tida como reino de riqueza e que não é explorada dada a incompetência do caboclo. É pobreza atribuída à herança étnica do ameríndio: indisposição para o trabalho (em oposição ao ideal de produtividade), visualizável pelo modesto padrão de vida290.

Todas visões que não levam em conta as reais condições de vida do habitante do meio rural: ambiente de muitas adversidades, abundante só na aparência e permeado por contingências políticas e econômicas bastante desfavoráveis. Tampouco consideram o processo histórico e as lutas de resistência de certos segmentos na constituição desses estereótipos, modo de vida e identidades. Sobre tais aspectos na atualidade, mais adiante debateremos a respeito de como as políticas públicas na região são incongruentes com a realidade local e, por isso, estão longe de favorecer qualquer tipo de benefício ou melhoria a essas pessoas.

11.3.2. Natureza conceitual: campesinato histórico

A natureza conceitual refere-se a uma categoria social fixa usada nas ciências sociais para designar o campesinato histórico da Amazônia. Segundo LIMA (1999, p. 08-9):

A natureza do termo caboclo é portanto conceitual e consiste em uma categoria social de pensamento analítico. Sendo uma categoria social, o termo é uma abstração, uma unidade de um sistema de classificação social projetado para retratar as diferenças entre as pessoas na sociedade. Em contraste com um grupo social, uma categoria social consiste em uma agregação artificial de pessoas baseada na identificação de atributos comuns compartilhados por indivíduos que não se engajam necessariamente em um relacionamento social em razão dessa similaridade. Os atributos que definem uma categoria social podem ser biológicos, sociais ou culturais. Um grupo social, por outro lado, consiste em uma agregação humana real, que é definida por interações estreitas e relacionamentos pessoais.

Por essa colocação, vemos que há uma distinção clara entre: o modo como grupos

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A indolência não é exclusividade atribuída ao índio ou ao caboclo. Martín-Baró (1998, p. 73-101) mostra que esta é uma característica atribuída a muitos latino-americanos. Aborda-se a pobreza e incapacidade de alcançar o progresso segundo uma visão fatalista, isto é, um destino inevitável e premeditado, dada as características inerentes a essas pessoas. Segundo o autor, a perpetuação dessa condição está em função de um sistema social (regido por interesses políticos, econômicos, etc.), que gera a interiorização das relações de dominação (os indivíduos sentem-se conformados, passivos) e impedem mudanças sociais dessas camadas da população (luta por transformações sociais), mantendo-as como 'pobres', 'preguiçosos', 'indolentes', num círculo vicioso a favor das camadas dominantes. A ruptura com o fatalismo seria possível pela transformação tanto pessoal (psicossocial) quanto social (estruturas políticas e econômicas), por meio da: recuperação da memória histórica; organização popular; e prática de classe (interesses de cada grupo).

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se identificam e/ou rotulam a outros, em função das características acima mencionadas; e as tentativas de classificação acadêmica de um tipo particular de pessoas: o habitante não- indígena e não-remanescentes de comunidades quilombolas das zonas rurais da amazônia. Como discutem Cristina ADAMS, Rui MURRIETA e Walter NEVES (2006)291, durante muito tempo as 'sociedades caboclas' foram negligenciadas pela academia e pela sociedade de modo geral. As referências ao modo de vida dessas pessoas vieram primeiramente da literatura nacional e internacional, o que favoreceu a estereotipia do 'típico amazônida' herdeiro da cultura indígena. Stephen NUGENT (2006)292 enumera alguns motivos para isso: a) visão de paisagem natural norte-americana e europeia estava cega à percepção de uma paisagem social; b) estudos do campesinato no Novo Mundo, demonstrando a relação entre o capitalismo agrário e o industrial com base na produção da plantation, não se enquadravam no caso da Amazônia293; c) o campesinato amazônico não

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ADAMS, Cristina; MURRIETA, Rui; NEVES, Walter (2006). Introdução. In: ADAMS, Cristina et al.

Sociedades caboclas amazônicas: modernidade e invisibilidade. São Paulo: FAPESP; Annablume.

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NUGENT, Stephen (2006). Utopias e distopias na paisagem social amazônica. In: ADAMS, Cristina et al.

Sociedades caboclas amazônicas: modernidade e invisibilidade. São Paulo: FAPESP; Annablume.

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Terezinha FRAXE (2000, p. 15) se propõe a reconstruir os processos sociais que configuram a existência do camponês da várzea do rio Solimões-Amazonas, tomando as discussões a respeito de campesinato de autores como Abramovay, Cândido, Chayanov, Mendras, Queiroz, Redfield, Wolf. Para a autora, os sujeitos sociais 'cabloco/ribeirinho' são identificados: sociologicamente como camponeses, por estarem a “meio caminho entre a tribo primitiva e a sociedade industrial” (idem, p.16), isto é, a existência do mundo camponês é definido por seu relacionamento subordinado a grupos dominantes exteriores, o que lhes obriga a manter o equilíbrio entre suas necessidades e aquelas vindas de fora (idem, p.17); metaforicamente como 'homens anfíbios', pois representa o modo de vida dessas populações em dois ambientes (terra e água), que deve ser considerado antes de categorizações antropológicas, sociológicas, econômicas, etc. (idem, p.16-18). Nessa mesma perspectiva problematizadora, Antônio Carlos WITKOSKI (2007) ancora a compreensão de campesinato com base nesses autores referendados por Fraxe (adicionando também leituras de Marx & Engels, Shanin e Firth) e discute que no caso do campesinato amazônico, essa categoria deve ser ampliada por abarcar, além do elemento 'terra' como definidor, a 'água' e a 'floresta'. O estilo de vida do 'caboclo/ribeirinho' seria o caso empírico desse campesinato particular da Amazônia, uma categoria analítica para entender não apenas aspectos econômicos, mas também os elementos históricos e sociais do cotidiano (cultura, modo de vida, identidade) dessas pessoas. Essa ampliação do 'campesinato' também é revista por Helena Doris de Almeida Barbosa QUARESMA (2003), que mostra que suas definições (também pelos autores citados por Fraxe e Witkoski) se aproximam e dão base às definições de 'populações tradicionais', mas só se adequam a esta última quando se considera a multiplicidade de fatores que configuram o estilo de vida concreto de 'caboclos/ ribeirinhos/ etc.'.

Para Biorn MAYBURY-LEWIS (1997, p. 47), “não se pode considerar como um campesinato tradicional as classes subalternas do campo brasileiro, na mesma proporção que se pode pensar seus equivalentes em grande parte da América Hispânica”, pois o uso da terra e a vida comunitária (autonomia cultural) pelos ribeirinhos/caboclos ocorre de um modo diferente daquela descrita na literatura sobre o comportamento político de movimentos sociais rurais. O autor entende que se pode identificar nas comunidades ribeirinhas algum grau (maior ou menor) de campesinato, segundo as atitudes políticas descritas nas obras de Redfield, Hobsbawn e Shanin: “a) quanto maior o grau de isolamento de uma dada comunidade ribeirinha amazônida, maior sua autonomia cultural, maior seu controle sobre a economia local de subsistência, mais provável seu engajamento em ações políticas (…); b) Ou: quanto menor o grau de isolamento comunitário, autonomia

cultural e controle da economia de subsistência, menor a probabilidade de que os ribeirinhos se engajem em

ações políticas coletivas, e maior chance de que suas comunidades se dividam (…); c) resumindo: quanto

maior o grau de 'camponesidade', menos o espaço para os outside power holder (re)organizarem o uso de terra, água e mão-de-obra segundo seus critérios de organização político-social” (idem, p. 51-2).

FRAXE, Terezinha de Jesus Pinto (2000). Homens anfíbios: etnografia de um campesinato das águas. São Paulo: Annablume; Fortaleza: Secretaria da Cultura e Desporto do Governo do Estado do Ceará.

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é pós-indígena (como na América Hispânica), mas artefato do empreendimento colonia, e a integração da Amazônia na economia global moderna veio do extrativismo, e não baseado na plantation; d) A Amazônia era fronteira do Estado e da economia mundial ao mesmo tempo, o que dificulta entendê-la no contexto de formação do Estado brasileiro. Além deste motivos, o autor ainda se refere a impasses com a Antropologia, que deixaram de lado os estudos dos 'caboclos': a) a formação indígena e não-indígena traz um sujeito antropológico não autêntico, por isso deixado de lado; b) a integração da Amazônia na economia mundial pelo ciclo da borracha294 foi impulsionada pela demanda exterior e durou quase 100 anos, não apenas 25 do boom – o que impõe dificuldade de teorização a respeito da linearidade da formação desse Homem amazônico; c) considerar a Amazônia como domínio tropical, visão predominante dos naturalista, exclui a presença humana e sua sociodiversidade; d) dificuldade de categorização do mestiço de forma geral.

A partir dos anos '50, no entanto, começaram a surgir estudos focados mais especificamente nessas sociedades caboclas e que se fortaleceram na atualidade. Segundo a revisão Adams, Murrieta e Neves (2006, p. 18-20), pode-se dividir as linhas teóricas desses estudos em fases:

1) A primeira fase de antropólogos americanos e seus pupilos brasileiros, sob perspectiva funcionalista da cultura, retrata as sociedades caboclas como modelo dentro das quais as