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Instrumentos de pesquisa Para conseguir executar nossas estratégias e dar conta

MONTERO, Maritza (2004a) Introducción a la psicología comunitaria: desarrollo, conceptos y processos.

Capítulo 4. Estratégias metodológicas (ou um psicólogo no 'paraíso dos etnólogos') 102

4.4. Da mudança de contingência: novas dificuldades, novas estratégias.

4.4.7. Instrumentos de pesquisa Para conseguir executar nossas estratégias e dar conta

de cumprir com nossos objetivos, que a cada viagem exigiam rearticulação, nos utilizamos dos seguintes instrumentos.

1) Questionário sócio-econômico. Para obter um perfil sócio-econômico da comunidade, com dados sobre: gênero, faixa etária, ocupação, escolaridade, origem e/ou naturalidade, número de filhos (com idade, escolaridade), renda familiar, condições de moradia, relações de convivência, acesso a bens e serviços sociais, organização sociopolítica, representação institucional, relação com o ambiente, uso de recursos naturais e perfil da atividade pesqueira. De um total de 64 grupos domésticos, foram preenchidos 22 questionários. O

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Minha pretensão era realizar essa viagem entre outubro e novembro. No entanto, na viagem anterior, a época do tracajá havia se adiantado de Agosto para Julho, o que indicava que a seca viria antes. Como queria estar presente durante o trabalho de plantio (durante a vazante), os moradores me sugeriram ir em Setembro. Assim, eu poderia também ver a vazante e a seca em seu ápice e, por outro lado, pegar a época de eleições municipais, com direito a visitas dos candidatos na comunidade. Tive de ir embora poucos dias antes das eleições (começo de outubro), para cumprir com meus deveres cívicos.

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Também tínhamos intensão de fazer mais uma viagem em Dezembro de 2008, mas pela transição da prefeitura, não conseguimos obter o apoio necessário.

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O festejo da comunidade acontece dia 02 de Abril, comemorando a data de sua fundação. Infelizmente, devido à cheia do rio, que alagou completamente a comunidade, nesse ano não foi possível realizá-lo.

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critério para seleção dos informantes foi serem representantes de seus respectivos grupos domésticos (reconhecidos como tal pelo próprio grupo a que pertencem) e possuírem no mínimo 15 anos de idade. Realizado na primeira viagem.

2) Entrevistas semi-estruturadas. Com cada uma das lideranças formais (religião, agricultura, pesca, indígena, educação e saúde) e com não-líderes (12 entrevistas). A eleição destes últimos seguiu o critério da indicação dos próprios moradores – semelhante ao que se chama de 'técnica da bola de neve'. O recurso à entrevista são comuns e preferenciais a pesquisadores que vão a campo, segundo Minayo (2007b)130. Do mesmo modo, a entrevista é o instrumento predileto daqueles advindos da Psicologia e Psicologia Social. As vantagens da entrevista, como apontado por Ecléia BOSI (1998, p. 200)131, são sua flexibilidade, seu contato mais próximo com os sujeitos, a possibilidade de colher atitudes gerais do interlocutor diante das perguntas e, principalmente, a criação de uma atmosfera de confiança que se estabelece entre os envolvidos132. As análises das entrevistas foram guiadas segundo a perspectiva de Laurence BARDIN (1977)133, seguindo- se as seguintes etapas: a) pré-análise: após transcrever as entrevistas, realiza-se uma primeira leitura 'flutuante', que consiste em deixar-se invadir por impressões e orientações do texto, para que, aos poucos, tal leitura torne-se mais precisa em função de hipóteses emergentes, desencadeadas pelas impressões da permanência no campo e pelo ponto de vista teórico inerente à pesquisa (mais uma transgressão: não fizemos validação de teoria pela experiência, mas a construímos ao longo da investigação). b) análise: trata-se da sistematização da pré-analise, desconstruindo, agregando e enumerando algumas falas dos depoentes, agrupando-as em grandes eixos temáticos. c) síntese: os temas decorrentes, destacados nessas categorias temáticas, são descritos e discutidos de modo mais profundo, relacionando-os aos temas abordados teoricamente e presentes nos objetivos da pesquisa. Realizamos entrevistas na segunda, terceira e quarta viagem.

3) Grupo Focal. Para Minayo (2007b, p.68), “consistem em reuniões com um pequeno número de de interlocutores (seis a doze)”. Para Solange Abrocesi LERVOLINO & Maria Cecilia Focesi PELICIONI (2001p.116)134, “a essência do grupo focal consiste justamente na

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MINAYO, Maria Cecília de Souza (2007b). Trabalho de campo: contexto de observação, interação e descoberta. In: ______ (org.). Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 26ª edição. Petrópolis: Vozes.

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BOSI, Ecléia (1998). Cultura popular e cultura operária. Leituras operárias. In: OLIVEIRA, Paulo de Salles (org.). Metodologia das Ciências Humanas. São Paulo: Hucitec/Unesp.

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Para as entrevistas e para outros procedimentos da pesquisa, seguimos as orientações de Minayo (2007b, p.66-7): apresentação, menção dos interesses da pesquisa, apresentação dos credenciais institucionais, explicação dos motivos da pesquisa, justificativa da escolha do entrevistado, garantia de anonimato e de sigilo (apresentação do consentimento livre e esclarecido), conversa inicial (aquecimento) antes de iniciar a entrevista.

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BARDIN, Laurence (1977). Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70.

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LERVOLINO, Solange Abrocesi & PELICIONI, Maria Cecilia Focesi (2001). A utilização do grupo focal como metodologia qualitativa na promoção da Saúde. Revista da Escola de Enfermagem USP, vol. 35, n. 2, p. 115-21, jun.

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interação entre os participantes e o pesquisador, que objetiva colher dados a partir da discussão focada em tópicos específicos e diretivos (por isso é chamado grupo focal)”. Igualmente às entrevistas semi-estruturadas, a partir das respostas do roteiro inicial, podem- se fazer perguntas para aprofundar temas emergentes durante a entrevista. Exige a presença de um animador e um relator, cada um com função específica. Seguimos as exigências desta técnica. Realizamos 02 grupos focais: com as lideranças da comunidade e outro com não-líderes, seguindo o mesmo roteiro. Todos participantes foram eleitos segundo indicação dos próprios moradores, em reunião comunitária. Realizamos os grupos focais na terceira viagem.

4) Reuniões comunitárias. Reuniões com os moradores, convocadas pelas lideranças, a pedido dos pesquisadores. O objetivo dessas reuniões foi nos apresentarmos, explicar os objetivos das pesquisas, obter informações, estabelecer acordos com os comunitários sobre as atividades a serem desenvolvidas, bem como transmitir os resultados obtidos nas visitas anteriores. Utilizou-se de técnicas de abordagem grupal para facilitar a explicação de alguns tópicos e para coleta de informações. A observação das reuniões comunitárias são fontes importantes de informações a respeito da organização interna da comunidade. Só não fizemos reunião na quinta viagem, pois a comunidade estava alagada, a casa de reuniões tinha sido desmontada (para não ser levada pelo barranco), não havia outro local de encontro coletivo e os moradores não dispunham de canoas suficientes para irem à reunião. Como substituição, foram feitas visitas domiciliares em casas que concentravam núcleos familiares centrais.

5) Participação nas atividades cotidianas dos moradores. Como trabalhos coletivos, reuniões, eventos religiosos, pescaria, agricultura, produção de farinha, preparo de açaí, refeições, conversas com agentes do governo presentes na comunidade e fora dela, etc. Em diversas ocasiões, as conversas com as famílias tornaram-se verdadeiras entrevistas coletivas, sem roteiros prévios ou formalidades de algum instrumento. Realizadas em todas as viagens.

6) Diário de campo. Procede-se ao registro das conversas informais, fatos observados e impressões pessoais que, no momento de sua sistematização, guia a maneira como as informações são dispostas e cruzadas com as outras fontes de dados. Instrumento de excelência para pesquisadores em campo, nos inspiramos nas recomendações dos antropólogos para realizar um bom registro das vivências na comunidade (MINAYO, 2007b; OLIVEIRA, 2006) e dos psicólogos que trabalham com grupos, instituições e comunidades. Sempre estávamos acompanhados de nosso caderno de campo, gravador e máquina fotográfica. Realizados em todas as viagens.

7) Visitas domiciliares. A todas as casas. Conversar com cada família para estreitar laços, esclarecer suas origens genealógicas, histórias familiares, número de filhos, problemas

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enfrentados, fonte de renda, ocupação, condições de moradia, entre outros assuntos enriquecedores da pesquisa. Realizadas na quarta e quinta viagem.

8) Elaboração de croqui. Trata-se de um desenho da comunidade, feitos pelos próprios moradores, contendo informações sobre localização das casas e outras construções, roças, número de famílias, quantidade de pessoas em cada casa, eletrodomésticos, fonte de renda familiar e origem genealógica. Também foi elaborado um croqui com a comunidade antes da queda do barranco (a partir de 1992), para compreender o deslocamento geográfico dos moradores ao longo dos anos. Realizado na terceira e quarta viagem.

9) Registro fotográfico. Para identificar melhor as peculiaridades da região, comprovar nossas idas à comunidade e servir como fonte de dados. Realizado em todas as viagens. 10) Levantamento de documentos. Das origens da comunidade e de suas organizações formais; de dados sobre aspectos físicos, infra-estrutura, populacionais, socioeconômicos e do pescado em Tabatinga. Realizado em todas as viagens.

11) Reuniões de equipe. Este tipo de reunião se assemelha ao que, em Psicologia Clínica, se chama de supervisão – ou análise de implicação, no universo discursivo da Análise Institucional. Por meio desta, discutem-se as implicações vividas pelos pesquisadores em relação aos pesquisados e vice-versa, sob o ponto de vista dos primeiros. O objetivo desse tipo de reunião é problematizar os tipos de relações que se estabeleceram entre esses atores, compreender melhor a dinâmica comunitária e contribuir para a tomada de decisões mais precisas sobre os re-direcionamentos dos próximos passos da pesquisa. Isso porque, como apontado por Freitas (1999b), se considera que as informações não seguem uma objetividade cartesiana, mas passam pelas vivências e laços criados entre pesquisadores e pesquisados, bem como pelas impressões compartilhadas entre os membros da equipe. Realizada nas primeiras três viagens.

12) Reuniões temáticas. Este procedimento se assemelha à reunião de equipe no sentido de ser um momento de reflexão sobre as experiências vividas pelos pesquisadores em campo. No entanto, traz um elemento diferente e inovador inspirado na obra de Paulo Freire (2005). Ao elaborar uma proposta de 'ação cultural' libertadora, Freire indica dois momentos para a compreensão da realidade local e a posterior ação educativa. No primeiro, trata-se do levantamento de uma série de informações da localidade, em que os educadores convivem com a população e captam elementos que, no momento seguinte, serão fundamentais para a prática. A inovação freiriana que adotaremos consiste na maneira como as informações são sistematizadas. O autor sugere que estas sejam discutidas entre todos os autores envolvidos no processo educativo. Ou seja, há um momento de reunião em que educadores e educandos discutem a validade de todas as informações obtidas durante esse período de reconhecimento da vida comunitária. Esse gesto é o que concretiza a posição do autor de superação educador/ educando, para uma de educador-

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educando e educando-educador. Esta postura ética coloca o pesquisado na condição de interlocutor e co-autor de todo o conhecimento produzido, conferindo-lhe o papel de protagonista na transformação de sua realidade. Realizado na quinta viagem, em casas que concentravam núcleos familiares centrais.

4.5. Conclusão

Neste capítulo referendamos as bases metodológicas das quais partimos e, na medida do possível, explicamos quais os pontos transgredidos em cada uma das fontes de inspiração na construção de nosso percurso metodológico. Tivemos de romper com alguns esquemas pré-estabelecidos porque assim o exigiram as experiências vividas na prática. Além do mais, não tratamos de simplesmente fazer verificações de teorias, mas construí-las a partir das vivências e das inquietações produzidas por estas.

Descrevemos também nossas dificuldades para concretização desta pesquisa, pois não havia como e porque deixá-las de lado. É importante explicitar tais condições, por terem permeado boa parte de nossas escolhas. Muitas vezes, pesquisadores omitem esses acontecimentos, sob a justificativa de que estes não fazem parte dos dados obtidos. No entanto, não somos partidários desse ponto de vista e pudemos constatar, pela experiência de produção desta tese, que uma pesquisa empreendida na Amazônia requer a observância de uma série de aspectos e que, de uma forma ou de outra, marcam profundamente as verdades alcançadas e os erros cometidos.

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