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de Arte

Novos Caminhos

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Introdução

Conhecer é uma construção e não uma aquisição. Supõe oportunidade de ter acesso à informação e supõe um movimento interno que torne significativa essa informação para que possam ser tomadas decisões não a partir do que está na moda ou do que outras pessoas fazem, mas com base nos pensamentos e na autonomia da vontade pessoal. Os saberes são construídos a partir do conhecimento. Os saberes em arte pressupõem, portanto, um trabalho de informação e de conhecimento – a cargo do ensino de arte – que faz parte do trabalho de educação em arte.

É muito importante pensar e discutir o porquê do ensino de arte na escola. Uma das questões é entender a justificativa para serem incluídas aulas de arte na Educação Básica. Na maioria das vezes, o ensino de arte, nas escolas, tem como objetivos: desenvolver a criatividade, permitir a auto-expressão e ajudar a sociabilidade. Não há, normalmente, o registro a priori de que o objetivo das aulas de arte é ensinar e aprender arte.

Arte, na escola, é a oportunidade de uma pessoa explorar, construir e aumentar seu conhecimento, desenvolver suas habilidades, articular e realizar trabalhos estéticos e explorar seus sentimentos. Proporciona meios de conhecer, apresentar, interpretar, simbolizar e metaforizar em um contexto de apreciação e valorização. Para que isso ocorra, é preciso que o ensino de arte possibilite a tod@s @s alun@s a construção de conhecimentos que interajam com sua emoção, através do pensar, do apreciar e do fazer arte.

A escola, sendo lugar social de construção do conhecimento, de aprender e de ensinar, deve contribuir para promover o pensamento e construir conhecimento nas áreas nela presentes. Tem-se, pois, que arte está presente no currículo escolar porque é uma área de conhecimento e como área de conhecimento tem que estar na escola da mesma maneira que as outras áreas estão.

Sabemos, através de estudos que vêm sendo desenvolvidos em diversas partes do mundo, inclusive aqui no Brasil, que existem ações inteligentes, ações mentais, que só podem ser feitas a partir de determinados raciocínios em arte, assim como existem algumas que somente são feitas a partir de determinados raciocínios em história, em matemática etc. Portanto, temos diversas áreas de conhecimento presentes na escola porque as formas de pensar são diferentes e peculiares a cada área.

Arte/Educação (ECA/USP). Membro da Amarte (Associação Mineira de Arte/Educação), da Faeb e da InSEA. Coordenadora da Coleção Arte & Ensino (Editora C/ARTE-BH) e membro do Conselho Editorial da Revista Art&. luciagpi.bh@terra.com.br e luciagpi@ufmg.br.

Arte relaciona-se com registros diversificados e com a imaginação estética desses registros, que podem ser tanto gestuais quanto gráficos, sonoros, virtuais, espaciais etc. A dificuldade que se tem de entendimento da arte contemporânea está muito relacionada a uma capacidade que normalmente não desenvolvemos, que é a de pensar registros. Os registros podem ser vários e não padronizados. Dentre os registros possíveis, as referências visuais, sonoras, gestuais e comportamentais estão à disposição de tod@s e, cada vez, mais direcionados à criança e ao jovem. Entender registros, contextualizá-los e recontextualizá-los e pensar novas possibilidades para eles é importante para a formação de crianças e jovens. Note-se que não estamos nos referindo à comunicação visual, mas ao desenvolvimento e criação de repertório imagético.

O fato de, na escola, não serem trabalhados conteúdos de arte tem como conseqüência maior massificação e alienação, porque tiramos das crianças e jovens as chances de conhecer novas possibilidades de trabalho em arte, de pensar o que há de desafio em uma imagem, um gesto ou um movimento e de imaginar como se expressar em uma imagem, um gesto ou um movimento.

Ensinar arte é uma tarefa extremamente complexa, porque lidamos com questões materiais, instrumentais e conceituais do que seja aprender e ensinar arte, do que seja a própria questão da área do conhecimento arte e, inerentemente, com a questão emotiva, sensível d@s alun@s. Essa tarefa, que é complexa, necessita de uma preparação bastante profunda e constante para poder ser bem sucedida. Por isso, a necessidade de que @ professor@ de arte tenha tempo de pensar e experimentar questões de arte e possa estar em conexão com especialistas de outras áreas de conhecimento. O produto – necessário como consumação de um processo, mesmo que não seja perene – é importante como registro do percurso dessa experiência.

A arte deve ser tratada em suas diversas facetas, como área de conhecimento, na relação com a memória e na possibilidade de pensar registros imagéticos e imaginários, com referência em seu contexto cultural. Se há algum tempo a obra de arte era obra de arte por ela mesma, hoje ela tem valor relacionado ao seu contexto cultural. Isto é extremamente importante para o ensino de arte na contemporaneidade. O conhecimento em arte propicia a construção de novos saberes acadêmicos e pessoais para o grupo de maneira geral e para cada indivíduo em particular, podendo em muito contribuir para o compartilhamento de experiências estéticas sensíveis e significativas.

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Nossas escolhas no campo da arte, seu ensino, sua aprendizagem, sua pesquisa e sua ação são fatores determinantes para que determinemos os rumos do que pretendemos que seja a arte neste início de século XXI. O ensino da arte, em todos os níveis, tem passado, ao longo dos tempos, por processos os mais diversos, quer por fatores de influência social, quer por modismos, ou pela importação de modelos sem a necessária adaptação ao contexto cultural brasileiro. E agora é o momento de pensarmos a arte como parte integrante da formação da criança e do jovem, como componente curricular e extra-curricular de construção não só de conhecimentos, mas também de cidadania.

Aqui, o problema maior serelaciona a duas lacunas: a formação d@ professor@ e a sala ambiente de arte. Sem professor@s especializad@s e locais adequados, o ensino de arte na Educação Básica, que deveria propiciar a@ alun@ oportunidades experenciais nas diversas formas de arte, praticamente inexiste na maioria das escolas, restringindo-se a atividades não possibilitadoras de construção de conhecimentos na área.

Considera-se que currículo é a referência social para um esforço reconstrutivo pessoal e integrado que possibilita uma atitude participativa, envolvida, emocionalmente carregada do aluno, um campo fértil para criação e construção de conhecimentos. Um currículo deve:

• ser flexível;

• trabalhar em todas as áreas derivadas do processo artístico de criação; • pensar na perspectiva que o mundo apresenta hoje;

• compatibilizar as tendências do corpo docente com as tendências de abertura necessária, de flexibilização e de processualidade mais rigorosa;

• ser contemporâneo, ensinar ao sujeito como aprender sempre, como estudar sempre. Ainda há que se notar que a tradição de arte é dinâmica e é formada, a cada dia e continuamente, pela inclusão das tecnologias contemporâneas como acréscimo às possibilidades existentes. Além da atualização tecnológica, é preciso que as escolas tenham à disposição a possibilidade de pesquisa constante na área, por parte d@s professor@s. Há que se investir, portanto, na formação de professor@s para que conheçam essa área e possam instigar e propiciar vivências significativas.

O desafio diante de um material a ser trabalhado esteticamente ou de uma obra de arte já finalizada propiciam a elaboração do pensamento em que todas as forças intelectuais/emocionais agem em completude. As experiências de desenhar, pintar, cantar, dançar, apreciar, filmar, videografar, dramatizar etc. são vivências essenciais para a construção de conhecimento em arte. Não se pode pensar na formação de professor@s de arte em cursos que não tenham o tempo adequado para que essas experiências se realizem.

Saber como a arte é concebida e ensinada na escola, como se expressa em cada cultura e que significado tem para um indivíduo e para a sociedade é importante para que se possa planejar as ações necessárias para o ensino/ aprendizagem da arte. Pela necessidade da especulação constante, o estudo-ação está sempre presente na arte, quer seja em sua análise ou produção.

Ensinar arte significa possibilitar experiências e vivências significativas em apreciação, reflexão e elaboração artística. Para isso, é necessário que @ professor@ tenha uma base teórica que lhe possibilite a amplidão de pensamento, tanto para conhecer os caminhos trilhados por seus(suas) alun@s quanto para propiciar momentos significativos que possibilitem encontrar novos processos individuais e coletivos.

Além dos trabalhos tradicionais bidimensionais e tridimensionais, em artes visuais é importante que as formas contemporâneas de expressão também sejam contempladas, tais como o grafite, a instalação e a arte digital.

O trabalho de arte digital não é chamado de 2D (bidimensional) ou 3D (tridimensional) porque é virtual. Isto porque a arte digital é de outra natureza. São obras digitais as realizadas com o uso de equipamentos que produzem imagens digitalizadas, como o computador e a câmara digital, por exemplo. Essas imagens podem ou não ser impressas em suportes tradicionais. Não é o uso de papel ou de tela como suporte o que caracteriza a impressão, quando se pensa na imagem digital. Impressão, hoje, é um dos conceitos a serem revisitados.

A tecnologia digital propicia novas formas de pensar e fazer arte. Para que isso aconteça, @s alun@s precisam entender a natureza dos instrumentos de arte e os meios de escolha. Isso significa que é importante que façam exercícios para conhecer programas de tratamento de imagem, por exemplo, mas é essencial que pensem seu trabalho como sua própria produção artística, e não somente usem os recursos desses programas aleatoriamente. É importante, portanto, que @ professor@ de arte conheça e experiencie os meios digitais de produção artística, para poder fazer propostas e

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aceitar propostas de alun@s, bem como para poder contextualizar adequadamente obras de arte digital.

Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), arte é fundamental, no processo ensino/aprendizagem de arte contemporâneo, que @s alun@s, através de pesquisas, observações, análises e críticas, possam conhecer e analisar os processos:

• d@s produtores de arte – artistas; • dos seus produtos – obras de arte;

• dos difusores comunicacionais da produção artística;

• dos públicos apreciadores de arte no âmbito da multiculturalidade.

Quanto à expressão audiovisual, hoje, além dos tradicionais meios audiovisuais já assimilados – como a fotografia, televisão, cinema – vêm se somando outras mídias. A formatação da internet, por exemplo, tem permitido o desenvolvimento e a criação de novas formas de relacionamento e conhecimento.

Aprender/ensinar arte é, portanto, tarefa muito mais complexa que o simples ensino de técnicas ou o uso de materiais artísticos em atividades prazerosas. Exige um investimento de completude constante, para que as experiências sejam significativas tanto para @ professor@ quanto para @ alun@.

Em vista disso, torna-se premente repensar os currículos escolares de maneira geral e, principalmente, os que são responsáveis pela formação de professor@s de arte. Quais serão os conteúdos e procedimentos metodológicos que melhor poderão preparar @s alun@s para viverem em um mundo em constante mudança?

No momento em que os PCNs-Arte ainda não estão instalados no Ensino Fundamental e Médio e já estão sendo repensados – e é preciso que estejamos atent@s a isto, sob pena de perdermos o pouco que já conquistamos –, estarão os cursos de licenciatura em arte preparando professor@s conhecedor@s da área e com capacidade crítica para neles buscar não uma prescrição, mas um ponto de referência para a construção de novos conhecimentos e práticas metodológicas?

É preciso que cuidemos para que haja coerência entre a formação d@ bacharel e d@ professor@, bem como que haja respeito à área específica de conhecimento e expressão, sem detrimento das possibilidades de ação entre as diversas áreas artísticas (Artes Audiovisuais, Artes Visuais, Dança, Música, Teatro). Parte-se do princípio que uma Escola de Arte forma artistas; alguns vão ser professores, outros não. Para

@s que fazem a opção de ser professor@, é preciso fazer a ligação entre o que é o conhecimento de arte, sua expressão, seu ensino e sua inter-relação com a formação artística d@ alun@. Assim, @ licenciad@ em arte é artista e é professor@.

Lembremos, ainda, que os desafios a serem vencidos não são os do século XXI, mas os deste início do século XXI que, portanto, se fazem presentes agora. Outras pessoas virão para dar continuidade ao que propusermos ou para mudar tudo. Isso depende de fatores externos, sim, mas também de como nos sairmos nessa tarefa. Temos que saber que as crianças e jovens são cidadãos(ãs) hoje e como tal devem ser respeitad@s. Não estamos preparando futuros cidadãos(ãs), estamos compartilhando, como cúmplices, da vida cidadã da idade que el@s têm.