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Inicialmente, gostaria de salientar que não falo aqui como especialista em arte-educação, nem mesmo falo como professor, mas sim como funcionário público federal, por trinta anos desempenhando diversos cargos e funções na órbita da educação, cultura e meio ambiente. Por essa condição e, também, pelo privilégio da permanência na alta direção da Administração Pública Federal, em setores tão importantes, meu texto traz um testemunho sobre o papel desempenhado pelo setor público a respeito do tema deste Congresso.

Como ensina Celso Furtado (terceiro Ministro da Cultura no Brasil), devemos analisar a questão cultural por três ângulos: o relativo ao arcabouço jurídico de que dispomos – Constituição Federal e Leis e Decretos específicos –; o aparato institucional que montamos – o conjunto de organizações do Estado que tratam da matéria; e, por

* Carlos Alberto Ribeiro de Xavier, é assessor especial do Ministro da Educação. Foi Diretor do Jardim Botânico do Rio de Janeiro (MMA); do IPHAN (MinC); Secretário de Cooperação Internacional e Chefe de Gabinete do Ministro da Cultura e do Gabinete do Ministro da Educação, em várias gestões. <carlosxavier@mec.gov.br>

fim, a organização da sociedade: o conjunto de entidades de interesse público, não- estatais, criadas pelos cidadãos.

Tendo isso em conta, informo também que não vou falar apenas da educação cultural ou do ensino de arte, vou fazer um breve histórico da evolução institucional do Ministério da Educação (MEC), desde a sua fundação em 1930 até os dias atuais, especialmente no que diz respeito ao tratamento dado a certos conteúdos do processo educativo os quais, apesar de essenciais, nem sempre são assim considerados: a educação física; o ensino de artes; a formação cultural e todas as atividades complementares necessárias ao desenvolvimento da criança e do jovem, para fazê-lo cidadão responsável e participativo.

Introdução

Onze dias após a tomada do poder pela Revolução de 1930, o Governo Provisório de Getúlio Vargas criou o Ministério da Educação e Saúde Pública, nomeando o doutor Francisco Campos, o primeiro titular desta Pasta. Antes do surgimento do Ministério, a educação era tarefa afeta ao Departamento de Instrução Pública, Correios e Telégrafos, do Ministério da Justiça e Negócios Interiores.

Em 1934, em meio ao processo constituinte, Gustavo Capanema foi nomeado ministro e, dois anos e meio depois, em 1937, conduziu uma ampla reforma do Ministério, incluindo todos os assuntos ligados à Cultura, à Educação Física, à Ciência e à Pesquisa na Universidade em uma nova estrutura, o Ministério da Educação e Saúde denominação persistente até 1953, quando surgiram o Ministério da Saúde, o Ministério da Educação e Cultura, fixando-se a sigla MEC, que se conserva até hoje.

Vale lembrar, ainda, que a reforma proposta e implementada por Gustavo Capanema, em 1937, deu a conformação institucional que vigora até os nossos dias, mesmo que aqui ou ali, como em São Paulo, onde o estado assumiu integralmente as tarefas da educação, inclusive o Ensino Superior com a criação da USP em 1934. Hoje, as atividades antes desenvolvidas pelo Ministério de Capanema estão subdivididas entre seis Ministérios: Saúde, Meio Ambiente, Cultura, Educação, Esportes, Ciência e Tecnologia e, com a crescente descentralização e autonomia dos sistemas educacionais, o modelo federal tende a se reproduzir.

Com a criação da ONU e dos organismos a ela vinculados, como OMS, Unesco, OIT, entre outros, vários países criaram instituições homólogas ou análogas, ou foram

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se adaptando aos novos tempos do pós-guerra. Assim é que foram criados: um organismo autônomo, não-estatal, denominado Ibecc (Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura), para articular a sociedade nacional em torno da Educação, Ciência e Cultura. Essa mesma preocupação apareceu nas Américas com o sistema da OEA e na Iberoamérica com o sistema OEI, organismo do qual o Brasil voltou a fazer parte em 2002. Mas o Brasil já vinha, pioneiramente, implantando as bases da educação nacional, um poderoso Ministério, inclusive com a inauguração do prédio de sua sede que é hoje, marco mundial indiscutível da arquitetura moderna no Rio de Janeiro.

Nós todos, funcionários do Ministério da Educação e Cultura, o MEC, somos herdeiros do exemplo deixado pelo grupo de pessoas que o ministro Gustavo Capanema conseguiu reunir em torno de um projeto: auxiliares e colaborares do porte de Carlos Drummond de Andrade ou Mário de Andrade; de um Anísio Teixeira e um inventor de cinema brasileiro, Humberto Mauro que, como um Chaplin caboclo, era autor, produtor, diretor, montador de dezenas de filmes educativos, além de clássicos longas metragens, patrimônio cultural dos mais importantes.

Capanema reuniu desde um padre-inspetor do ensino médio chamado D. Helder Câmara a um maestro brilhante como Villa Lobos, que conseguia reger milhares de vozes para cantar o Brasil; jovens arquitetos como Oscar Niemeyer, Lucio Costa, a Jorge Moreira, a Carlos Leão, a Afonso Reidy e Hernani Vasconcelos; artistas como Bruno Giorgi, Roberto Burle Marx e Cândido Portinari, Celso Antônio, Adriana Janacópulus e Lipchitz, que construíram no Brasil, país periférico, um prédio dentro das mais modernas linhas arquitetônicas da vanguarda mundial, um marco da modernidade no Rio de Janeiro, em um tempo em que, como disse Lucio Costa, a Europa e o mundo estavam envolvidos em um conflito que destruía, com a guerra, milhares de vidas e importante patrimônio cultural da humanidade.

Também devemos nos lembrar de Rodrigo de Melo Franco de Andrade, que soube erguer solidamente, com pedra e cal, as robustas bases do Iphan, que vem prestando enorme serviço à nação há várias décadas; e de tantas outras pessoas, professores e diretores de escolas e de faculdades de todo o Brasil, ou simples funcionários, como eu próprio, que emprestam todo seu vigor, inteligência e anônima labuta; gente que dedicava e dedica, até a morte, todo amor que é capaz de sentir, para quê? Tudo isso por um patrimônio imaterial, a idéia de um Brasil possível, um Brasil melhor para todos.

Oscar Niemeyer considera o período Capanema tão ou mais importante do que a Semana de Arte Moderna em São Paulo, pelos efeitos duradouros que causou.

Recomendou a exposição A construção do Moderno, instalada no segundo andar do Palácio Capanema, como bem ilustrativa do que representa essa construção para o Brasil; e tem essa mesma indicação a exposição sobre a história do Ministério da Educação montada na sede do MEC, em Brasília.

Assim, na esteira do desenvolvimento do MEC surgiram, no início dos anos 1950, o CNPq (Conselho Nacional de Pesquisa), hoje vinculado ao Ministério de Ciência e Tecnologia, e a Campanha de Aperfeiçoamento de Pessoal do Ensino Superior, depois Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento do Pessoal do Ensino Superior), hoje uma Fundação ainda vinculada ao Ministério da Educação; em 1953, com a autonomia dada à área da Saúde com a criação do novo Ministério, consolidou- se o Ministério da Educação e Cultura.