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O local e uma educação consciente do local

Um dos elementos que definem meu pensamento sobre a importância da comunidade para a educação procede das teorias sobre local e educação consciente do

local. Um dos argumentos dessas teorias é que as localidades ou os lugares têm

importância pedagógica por serem os contextos mais amplos de vida, dos quais a educação faz parte (GRUENEWALD, 2003; HOOKS, 1994; HOVEY, 2004). Gruenewald (2003) conclama os educadores e administradores a associar a experiência baseada no local à responsabilidade acadêmica. Segundo ele:

Para que o local tenha significado para a escolaridade, é preciso que a responsabilidade e o propósito sejam concebidos de modo a levar em conta o

valor do local como um contexto primário da experiência, como uma via de autêntica participação democrática e como um legado vivo do envolvimento humano no mundo. (p. 645)

Além de ser uma fonte de conhecimento que influi na pedagogia, a comunidade pode funcionar como um local ou lugar de resistência, propiciando matéria e comportamentos que suscitam um diálogo crítico. Isto é, o status quo das práticas educacionais que dependem de uma interação unidirecional entre professor e aluno pode ser mudado, mediante uma cooperação instrutiva, que se realize numa multiplicidade de direções, vozes e camadas. Uma educação que prestigie o microcosmo social da educação baseada na comunidade prepara o estudante para o macrocosmo da comunidade mundial.

A participação de professores e alunos na experiência bidirecional de cada um, como pessoas de lugares diferentes, é outro aspecto da pedagogia baseada na comunidade. Professores procedentes da cultura majoritária (que talvez não se expressem como maioria numérica) precisam, eles próprios, participar dessa experiência, para que possam merecer confiança e ser eficientes em contextos cultural, racial e etnicamente diferentes. Em muitos casos, precisarão aprender a interessar-se profundamente pelo contexto pessoal de seus alunos, a fim de elaborar e ministrar um conteúdo curricular atraente.

Alguns educadores, na tentativa de fazer modificações num conteúdo curricular cultural e racialmente pobre, enganoso ou simplesmente errado, têm propiciado a seus alunos que se preparam para ser professores experiências baseadas na comunidade. Os professores podem racionalizar, alegando que, apenas por se encontrarem em contextos comunitários ou lugares novos ou desconhecidos, tais como centros de recreação, centros culturais, oficinas de artistas, centros comunitários ou programas extracurriculares, estarão preparados para ensinar nesses contextos. Mas, se professores e alunos não se conectarem com o etos, práticas, objetivos, estratégias para a solução de problemas, experiências e histórias que caracterizam a comunidade, a experiência baseada na comunidade não passará de um exercício sem propósito.

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A comunidade como fonte de conhecimento prévio

A experiência tanto dos professores como dos alunos é fonte de conhecimento prévio proveniente de algum tipo de conexão com a comunidade, quer seja essa conexão rica, inteiramente aprazível, estimulante e nutriente, quer seja ela distante e lamentável. A utilização desse conhecimento prévio, que poderá vir do lar ou da comunidade, tem relação com o processo de educação. SHAPIRO (2004), ao estudar o que é que os estudantes aprendem pela leitura de um texto, concluiu que “o conteúdo do conhecimento prévio pode afetar o grau de informação que os leitores extraem de um texto” (p. 162) e que, embora “um conhecimento prévio preciso possa ajudar os leitores a extrair informação de um texto, um conhecimento prévio inexato pode até mesmo

interferir com o aprendizado” (p. 163). Os estudos de Lipson, de 1982 e 1983 (citados

por SHAPIRO, 2004), alertam que é mais difícil corrigir um conhecimento prévio incorreto durante o processo de aprendizagem do que assimilar uma informação desconhecida. Os professores e membros da comunidade que pelejam no sentido de corrigir conceitos errôneos baseados em preconceitos, estereótipos, medos infundados de pessoas, culturas e comunidades desconhecidas, esforçam-se para corrigir um conhecimento prévio inexato. SHAPIRO (2004) sugere que os professores capazes de identificar aquilo que os estudantes já sabem, o conhecimento prévio que eles trazem consigo para a escola, estão mais bem capacitados para identificar o que é que eles estão aprendendo na escola. Além disso, como sugere Freire (1973), é preciso que os professores se familiarizem com as vidas e realidades de seus alunos. Precisam prestigiar o conhecimento que eles trazem consigo, derivado do contexto de sua experiência, como sendo, do ponto de vista educacional, matriz de relevância, prazer, emancipação e autonomia, tanto para alunos como para professores.

O conhecimento que posso identificar como resultado de meu envolvimento com ações comunitárias permite-me identificar alguns dos objetivos que os grupos comunitários parecem compartir. Exemplos:

• aquisição da auto-suficiência por meio de iniciativas comerciais;

• aquisição e demonstração de autodeterminação política e cultural pelo esforço próprio;

• iniciativas de melhoria ambiental e participação nelas;

• exploração e compartilhamento de histórias, filosofias e cosmologias pessoais como um aspecto importante da história coletiva;

• utilização da arte, da estética pessoal e comunitária e do ensino de arte como instrumentos de transformação social;

• celebração, valorização e observação pública e privada de crenças e práticas pessoais e comunitárias importantes; e

• concessão de voz aos sem-voz.

À medida que fui me familiarizando com esses objetivos, comecei a compreender que eles são formulados e moldados por experiências do passado e do presente, como deve acontecer também com os objetivos da educação formal. Parece também que, para que os educadores possam propugnar por objetivos que sejam importantes e valiosos para alunos e professores, é preciso que as características das ações comunitárias fiquem bem claras tanto para eles como para os estudantes. A identificação de ações criativas e positivas da comunidade e a participação nessas ações poderão levar a uma pedagogia educacional esclarecida e fazer com que a epistemologia baseada na comunidade seja reconhecida e utilizada com proveito como conteúdo curricular.