• Nenhum resultado encontrado

Função Social e Responsabilidade Social Empresarial.

RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL

5.7. Identificação da Responsabilidade Social Empresarial no ordenamento jurídico.

5.7.1. Função Social e Responsabilidade Social Empresarial.

Para clarificar nosso entendimento de que a

responsabilidade social empresarial encontra melhor guarida no prncípio da

153

solidariedade, mister se faz a cotização entre função social (da empresa) e

responsabilidade social empresarial, para a seguir, executarmos o mesmo

exercício com (princípio da) solidariedade e responsabilidade social

empresarial.

Essa cotização não objetiva identificar a

responsabilidade social empresarial com aqueles institutos de Direito, até

porque não se pode comparar ou obter subsunção de coisas diferentes, haja vista, como já dito, a responsabilidade social empresarial é metajurídica e interdisciplinar. O que buscamos é apontar os pontos de intersecção.

O que se tem constatado é um aumento vertiginoso do anseio da sociedade pela “responsabilidade social empresarial”. Parece-nos um caminho sem volta. Aumentam as carências e desigualdades populacionais, mostrando-se o Estado cada vez mais ineficiente, demandando a sociedade ação dos detentores do poder econômico.

Essa relação humana, assim como as demais são verificadas antes e o Direito para discipliná-la é criado depois. Certo é também que entendemos que no caso da responsabilidade social, o Direito não deva se ocupar de disciplinar o relacionamento socialmente responsável, deixando-o a cargo dos próprios atores sociais que dispõem de mecanismos até mais hábeis para tanto.

A gênese da responsabilidade social empresarial como visto, tem escopo na demanda social, apoiada nas regras de mercado, - e continua fora do mundo das normas – entretanto, encontra pontos de intersecção com a função social das empresas, que por sua vez deriva da

função social da propriedade, haja vista, ser a empresa a forma contemporânea do exercício das propriedades.154155

Função social e responsabilidade social diferem. Responsabilidade social limita-se ao processo decisório e à solução do processo decisório dos administradores. Reside na escolha de execução de ação positiva. Função social refere-se à questão da solução de conflitos sociais através da organização empresarial – empresa como catalisador social de conflitos. Pressupõe conflito de interesses, ação que fira direitos sociais.

A função social é condicionante – princípio - constitucional para o exercício da atividade econômica (que continua tendo o seu caráter de liberdade individual)156. Enquanto que, a responsabilidade

social é condicionante social (e até mercadológica) para o exercício da atividade econômica.

Em conseqüência, sob o prima jurídico, fundamental distinguir, que a função social – no caso do particular, em especial o dever negativo - é cogente (uma vez que o detentor dos bens de produção resolve desenvolver atividade econômica ele está obrigado a atender à função social).

154

Marcos Alberto SantÁnna Bitelli, Temas Atuais de Direito Civil na Constituição Federal, p. 235-237.

155

Até porque, como define Celso Ribeiro Bastos, Curso de Direito Constitucional, p. 207, sob o ângulo do direito civil, a propriedade consiste em “assegurar a uma pessoa o monopólio da

exploração de um bem e de fazer valer essa faculdade contra todos que eventualmente queiram a ela se opor.”

156

A ordem constitucional pressupõe uma utilidade social da liberdade de iniciativa empresarial. Ensina José Afonso da Silva:

“a iniciativa econômica privada é amplamente condicionada no sistema da constituição econômica brasileira. Se ela se implementa na atuação empresarial, e esta se subordina ao princípio da função social, para realizar ao mesmo tempo o desenvolvimento nacional, assegurada a existência digna de todos, conforme ditames da justiça social, bem se vê que a liberdade de iniciativa só se legitima quando voltada à efetiva consecução desses fundamentos, fins e valores da ordem econômica.” Curso de Direito Constitucional Positivo, p. 788.

Já a responsabilidade social não pode ser imposta, haja vista que o seu exercício pelo detentor dos bens de produção se dá em atendimento a uma demanda da sociedade, ou seja responsabilidade social goza de caráter voluntário.

Não se faça confusão com a cogência do conteúdo da responsabilidade social. É possível admitir-se que essa expectativa da sociedade com relação à uma empresa inclua o cumprimento das leis, que se prestam a veicular um padrão mínimo, mas aqui trata-se de sujeição à legislação, e não implica em imposição do comportamento socialmente responsável.

Responsabilidade social é responder à sociedade, atendendo às suas expectativas econômicas, legais, éticas e sociais num determinado período de tempo.157 Enquanto que a função social não é

condicionante limitada a determinado período de tempo e de aplicação imediata (art. 5º, § 1º, da CF). Enquanto durar a atividade econômica deverá ser atendida a função social. No exercício da atividade empresarial o empresário tem ou não tem comportamento socialmente responsável.

Façamos um parêntese com relação a “expectativa”. O que venha a preencher essa expectativa é vago, depende dos valores adotados pela sociedade. Na função social também está presente essa vagueza que também poderá ser preenchida.

A concreção da função social pode ser exigida pelo judiciário – até porque a função social é cláusula geral. Já o exercício da

157

Archie B. Carrol, apud Marcos Alberto Sant’Anna Bitelli, define que “a responsabilidade social das

organizações toca às expectativas econômicas, legais, éticas e sociais que a sociedade espera que as empresas atendam, num determinado período de tempo.” Temas Atuais de Direito Civil na Constituição Federal, p. 269.

responsabilidade social somente tem por legitimado para cobrança da sua observância, a sociedade de acordo com aquilo que ela entender como justo e aceitável. Obviamente se estivermos tratando de uma expectativa legal dessa sociedade outros poderão ser os agentes da coerção, inclusive o Estado. Todavia, para a responsabilidade social, como já vimos não há “ação” que reclame esse “direito”.

Uma fundamental cotização diz respeito aos resultados. Embora fora do mundo das normas positivadas, a responsabilidade social empresarial tem alcançado mais resultados concretos (efetivo atendimento às necessidades sociais) do que a função social poderia alcançar. Isso porque ações positivas (deveres positivos) têm sido realizadas não em atendimento à função social, mas sim à expectativa da sociedade, como já dito, refletida hoje em regras de mercado.

A função social, como estudado no Capítulo II, não tem logrado êxito em exigir ações positivas das empresas, até porque estaria o Estado desse modo transferindo sua função para o particular, e desonerando-se.

Embora, reitere-se, quando se fale em função social não se está falando em limitações negativas do direito de propriedade, sendo mais amplo, devendo (ou ao menos deveria) abarcar ações promocionais do interesse coletivo158. “A função social é mais que limitação. (...) A função é o poder de dar à propriedade determinado destino, de vinculá-la a um objetivo.

158

Nesse sentido são também as assertivas de Pietro Perlingieri:

“Em um sistema inspirado na solidariedade política, econômica e social e ao pleno desenvolvimento da pessoa (art. 2 Const.) o conteúdo da função social assume um papel de tipo promocional, no sentido de que a disciplina das formas de propriedade e as suas interpretações deveriam ser atuadas para garantir e para promover os valores sobre os quais se funda o ordenamento.” Perfis do Direito Civil, p.. 226.

O qualificativo “social” indica que esse objetivo corresponde ao interesse coletivo, não ao interesse do proprietário.”159

Um dever não exclui o outro. Tanto a função social não exclui o dever do Estado, como a responsabilidade social não exclui a função social nem o dever do Estado.

Em outro parêntese, vale ressaltar que o

comportamento socialmente responsável não está sujeito às políticas públicas. Obviamente, também não há impedimento de elegê-las, até mesmo porque possibilita a união de forças com o Estado na sua execução. Todavia, a política pública não pode servir de limitador do comportamento do empresário no campo social.

Nesse sentido, NILSON LAUTENSCHLEGER JÚNIOR, assevera

que:

“Também é comum na doutrina brasileira haver confusão entre função social e políticas públicas. Como elemento da própria função social da empresa constituiriam, por exemplo, políticas públicas relativas à obrigatoriedade de creches ou médicos para os empregados e seus filhos, posturas municipais de localização das empresas, entre outras. Parece haver confusão entre atitude e resultado. Tais posturas podem ser reflexos ou, até mesmo, admite- se, conseqüência desta visão de função social da empresa, porém não seu elemento constituinte. Se assim fosse, não poderia a administração ir além das políticas

159

Gilberto Bercovici, Constituição Econômica e Desenvolvimento – uma leitura a partir da

públicas – e não parece ser esta a intenção do legislador.”160