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As funções do Poder Legislativo

No documento Processo legislativo estadual (páginas 86-88)

CAP 4 O PROCESSO LEGISLATIVO COMO INSTRUMENTO PARA CONSECUÇÃO DAS FUNÇÕES DO PODER LEGISLATIVO NO

4.1 As funções do Poder Legislativo

Para se chegar às funções do Poder Legislativo há que se passar pela separação dos poderes, a qual defluiu do poder político, que se há de entender como aquele que “assume a gestão dos interesses gerais da sociedade. Político, portanto, no sentido etimológico do termo, isto é, relativo à polis, aos negócios públicos, ao bem geral”.139 Caracteriza-se o poder político estatal como poder soberano, uno e indivisível. Se uno e indivisível, “como falar-se na divisão desse poder em poderes?”140 A teoria da ‘separação de poderes’ de Montesquieu, fundamenta-se na distinção das funções exercidas pelo poder político. De fato, buscava o filósofo francês, que nos deixou esse legado, um arranjo para conter o arbítrio de quem exerce o poder: “A experiência eterna mostra que todo homem que tem poder é tentado a abusar dele; vai até onde encontra limites. Quem o diria! A própria virtude tem necessidade de limites. Para que não se possa abusar do poder é preciso que, pela disposição das coisas, o poder freie o poder”.141 E, ao engendrar a disposição das coisas, concebeu um sistema de freios e contrapesos, assim depois referido por Hamilton, Jay e Madison n’O

Federalista142, mediante atribuição do poder político uno a órgãos diferentes das

funções legislativa, executiva e judiciária, sem descurar da liberdade do indivíduo. Essa concepção da separação de poderes incorporar-se-á ao ideário liberal da Revolução Americana e ao da Francesa, e constará da primeira Constituição escrita, a dos Estados Unidos da América, em 1787, irradiando-se também como estruturação do Estado constitucional, fundado, outrossim, na democracia representativa, que tinha como um dos seus pilares de sustentação o mandato parlamentar.

A partir do século XVIII, a preeminência do Legislativo decorria, então, do prestígio da lei. E a lei como expressão da vontade geral, aprovada pelos representantes

139 ALMEIDA. Fernanda Dias Menezes de. O Poder Legislativo e suas atribuições no Estado

contemporâneo. In: Revista Jurídica 9 de Julho. São Paulo: Alesp, n. 2, 2003, p. 213.

140 Idem, p. 214.

141 MONTESQUIEU, Charles-Louis de Secondat. Do espírito das leis. Trad. Fernando Henrique

Cardoso e Leôncio Martins Rodrigues. São Paulo: Ed. Abril, 1973. p. 156.

142

HAMILTON, Alexander; MADISON, James; JAY, John. O Federalista. Trad. Reggy Zacconi de Moraes, Rio de Janeiro: Nacional de Direito, 1959, n. 51. p. 209-212.

do povo no Legislativo, e indissociável do conteúdo de justiça, justamente por ser fruto da razão humana e da vontade geral.143

Todavia, a primordial função legislativa que, pela separação de poderes punha-se como exclusiva do Legislativo, por uma série de fatores que não se vai aqui enumerar, acaba por restar apenas predominante144, pois o Judiciário e, notadamente, o Executivo dela também passam a dispor.

Malgrado tenha havido acentuado desalojamento de sua função precípua, o Poder Legislativo ainda não foi destituído da função de legislar que, aliás, não foi a primeira a ser conquistada; precedeu-a a função de aprovar a tributação. Como salienta Woodrow Wilson:

“Foi tão-somente mediante processo mui vagaroso e indireto que as assembléias de representantes, ou pelos a assembléia de representantes ingleses, modelo de todas as demais, chegou a possuir ou exercer o direito de fazer leis. Passaram-se muitas gerações antes de supor-se tivesse o Parlamento algo a ver com as leis, senão dar-lhes assentimento ou retirá-lo quando novas leis lhe eram submetidas pelo rei.”145

Conquistou também o Parlamento a função de fiscalização e controle dos

atos do Executivo.

Várias são, ainda, as funções do Parlamento, como salienta Maurizio Cotta: “Do ponto de vista funcional, os Parlamentos são instituições geralmente polivantes. A variedade de funções desempenhadas tem uma explicação no papel característico dos Parlamentos, que faz delas os instrumentos políticos do princípio da soberania popular. É deste papel que nasce para o Parlamento o direito e o dever de intervir, embora de formas diversas, em todos os estágios do processo político. Segundo o estágio e as modalidades de tal intervenção, haverá atividades de estímulo e de iniciativa legislativa, de discussão e de deliberação, de inquérito e de controle, de apoio e de legitimação. Tão variadas atividades podem ser englobadamente compreendidas no quadro das quatro funções parlamentares fundamentais:

representação, legislação, controle do Executivo e legitimação. É

natural que, conforme a posição que cada Parlamento ocupa no sistema político, varie a importância das diversas funções; certamente há

143 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Do processo legislativo. 6ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007,

p. 19-77.

144

Alexandre de Moraes salienta que “cada um dos Poderes possui uma função predominante, que o caracteriza como detentor de parcela da soberania estatal, além de outras funções previstas no texto constitucional. São as chamadas funções típicas e atípicas.” Direito constitucional. 21. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 391.

145

Governo constitucional nos Estados Unidos. Tradução de E. Jacy Monteiro. São Paulo: Ibrasa, 1963. p. 11.

funções que, em determinadas situações políticas, podem se atrofiar e ficar reduzidas ao simples aspecto formal.

Dentre as funções parlamentares, é a representativa a que possui uma posição que poderíamos chamar preliminar. Isso porque, em primeiro lugar, ela é uma constante histórica em meio das transformações sofridas pelas atribuições do Parlamento, e, em segundo lugar, porque nela se baseiam todas as demais funções parlamentares, cujas características dependem, em boa parte, das formas do seu desenvolvimento. Por ser fundamental, esta função assume um significado discriminante entre um Parlamento e outro. Todas as demais atividades parlamentares estão estreitamente ligadas à função representativa: elas são, na realidade, os instrumentos da sua atuação.” 146

Da função representativa do Poder Legislativo, todas as demais são ancilares.

A função deliberativa, e.g., operacionaliza a função representativa, dando- lhe efetividade. Com efeito, instrumentalizados pelo voto os representantes legislam, judicam (condenam ou absolvem autoridades no impeachment), impõem tributação, decidem investigações, aprovam políticas públicas etc.

Alude-se, ainda, à função de aprovação ou rejeição das indicações de magistrados para composição dos Tribunais Superiores; à de eleger o Presidente e o Vice-Presidente da República na hipótese de dupla vacância, da mesma forma à Assembléia Legislativa incumbe eleger o Governador do Estado.

Essas funções todas, e notadamente a legislativa, efetivam-se por alguma das proposições (proposta de emenda à Constituição, projeto de lei complementar, projeto de lei ordinária, lei delegada, medida provisória, decreto legislativo, resolução) previstas no processo legislativo por norma constitucional ou, no caso de moção e indicação, prevista por norma regimental; é o que se verá adiante.

No documento Processo legislativo estadual (páginas 86-88)