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Procedimento legislativo sumário

No documento Processo legislativo estadual (páginas 132-138)

CAP 6 PROCEDIMENTOS LEGISLATIVOS

6.3 Procedimento legislativo sumário

O procedimento legislativo sumário aplica-se aos projetos de lei de iniciativa do Governador e, no Estado do Pará, também aos projetos de iniciativa do presidente do Tribunal de Justiça e da Mesa da Assembléia (art. 107), que contenham solicitação de urgência do autor. Essa urgência é conhecida como urgência constitucional, porque prevista em todas as Constituições Estaduais, que também prescrevem as linhas gerais desse procedimento legislativo. Nesses casos, estipula-se que a Assembléia Legislativa disporá, depois de solicitada a urgência, de quarenta e cinco dias para deliberar sobre o projeto. Se, nesse período não houver deliberação, o projeto será incluído em Ordem do Dia até ou para que se ultime sua votação, com sobrestamento da discussão e votação das demais matérias. No Rio Grande do Sul, se o Governador solicitar, para projeto de sua iniciativa, apreciação em regime de urgência, a Assembléia disporá de trinta dias (art. 62, § 1º, da Constituição Estadual). Se não houver deliberação sobre o projeto no prazo de trinta dias, será ele incluído na Ordem do Dia, sobrestando-se a deliberação de “qualquer outro assunto” até que se ultime a sua votação.

Como se vê, por este procedimento buscou-se abolir o decurso de prazo, expediente previsto no ordenamento constitucional imediatamente anterior, que presumia aprovado projeto de iniciativa do Executivo, não fosse ele deliberado no prazo constitucionalmente determinado. O constituinte cearense foi o único constituinte estadual de 1989, que ainda tentou manter o decurso de prazo, não para aprovação, mas para rejeição ficta de um projeto de lei. Determinou inclusão automática em Ordem do Dia de projeto de iniciativa do governador com solicitação de urgência e estipulou que, após quarenta e cinco dias do pedido de urgência e após mais dez sessões consecutivas de inclusão na Ordem do Dia do projeto, se, ainda assim, ele não tivesse sido deliberado, seria, então, considerado “definitivamente rejeitado” (art. 63, § 2º, da Constituição Estadual do Ceará).203

Subjacente nessa questão de aprovação ou rejeição por decurso de prazo, a antítese que acompanha o tema: celeridade / morosidade das decisões legislativas.

203 ADI 143-4. Rel. Min. Celso de Mello. Decisão monocrática final: “Tendo em vista reiterada

omissão do autor da presente ação direta, que se absteve – não obstante formalmente intimado – de subsidiar esta Corte com a prestação de informações relevantes ao prosseguimento da causa, julgo-a extinta, com a conseqüente cassação das medidas cautelares anteriormente deferidas (fls. 238/256 e fls. 257/264).”

Sobre o expediente do decurso de prazo Andyara Klopstock Sproesser tece as seguintes ponderações:

“Apesar da oposição que possa sofrer, - e sofre, especialmente nas Casas Legislativas, o que é compreensível, - o certo é que a aprovação por decurso de prazo não é incompatível com a liberdade parlamentar.

Ficou-lhe essa pecha – de incompatibilidade – por haver sido instituída no País pelo regime militar instaurado em 1964. Abstração feita, no entanto, da sua origem, não há por que negar-lhe o mérito de responder à moderna demanda social por maior presteza no processo legislativo.

Convenha-se, ademais, em que a aprovação por decurso de prazo não atinge a liberdade parlamentar, na medida em que sua existência não significa negar-se ao Legislativo – processualmente falando – a possibilidade de votar não nas deliberações sobre quaisquer projetos.

De sorte que, se instituída em texto constitucional democrático, a aprovação por decurso de prazo representaria, sem dúvida, um movimento claro no sentido de satisfazer às instâncias da sociedade pela aprovação oportuna, breve, sem delongas, das proposições legislativas de interesse público, geral, coletivo.

Ademais disso, contribuiria para evitar o desgaste da imagem do Legislativo, que infelizmente só reconhece presteza no seu comportamento quando estão em jogo interesses seus, corporativos. (...)

Silenciando-se o Legislativo, muito embora pudesse e devesse manifestar-se no caso específico, nada mais justo, do ponto de vista coletivo ou social, do que se concluir que aprovou.

A vida do País reclama por celeridade. À sociedade aborrece a procrastinação. De sorte que o Legislativo faria bem, se impusesse a si mesmo essa regra.

É preciso encontrar novos caminhos, dar um passo adiante em matéria de regimes de tramitação, que, como técnica, tiveram sua serventia a um tempo em que a vida social não reclamava, como agora, medidas de urgência, para atender às instâncias do presente.”204

No procedimento legislativo sumário aboliu-se, como se observou, o decurso de prazo e criou-se o sobrestamento de proposições. Mas, no exercício de sua autonomia, os constituintes de São Paulo (art. 26) e Roraima (art. 42, § 1º) não o adotaram. 205 Certamente fundamentados em forte convicção de que não é mais de

204

Direito Parlamentar – processo legislativo. 2. ed., São Paulo: Alesp/SGP, 2004, p. 80-81.

205 Registre-se que, em São Paulo, a EC n. 21, de 14-02-06, adotou o sobrestamento e, antes de

transcorridos três meses, a EC n. 22, de 25-05-06 o aboliu. Sua adoção deu-se no bojo de alterações de inúmeros dispositivos constitucionais e, quando se foi colocar em prática o expediente do sobrestamento, simplesmente houve exigência para sua supressão pela minoria parlamentar, que não sabia ao certo o que tinha aprovado na EC n. 21.

observância compulsória para os Estados-membros a irrestrita adoção do processo legislativo federal. O sobrestamento de proposições – preterição do andamento das demais proposições que figuram na Ordem do Dia em benefício somente dos projetos de autoria do Executivo, com solicitação de urgência constitucional – é regra que informa um procedimento legislativo, o sumário, não se constituindo em princípio constitucional. De modo que, ao não adotarem o sobrestamento de proposições, os constituintes paulistas e roraimenses admitiram figurar na Ordem do Dia de suas Assembléias Legislativas, juntos, sem primazia, tanto os projetos de lei de iniciativa governamental, com solicitação de urgência prevista constitucionalmente, como também os demais projetos de autoria outra, que não a governamental, e que igualmente tramitam em regime de urgência, mas a urgência já prevista por norma regimental e decorrente de aprovação do Plenário da Assembléia ou a resultante de enquadramento automático de matéria nesse regime de tramitação pelo próprio legislador regimental. O Regimento Interno da Assembléia Legislativa do Amazonas, ao disciplinar a tramitação de urgência, incluiu também a solicitação do Governador à deliberação do Plenário (art. 171, I). No entanto, quando não há expressa norma regimental assim dispondo, recorrente a indagação nas Casas Legislativas estaduais sobre o alcance da solicitação de urgência, feita pelos Governadores, a projetos de lei de sua autoria.

Por se tratar de solicitação, não caberia, ao Plenário da Assembléia Legislativa aprová-la ou rejeitá-la, em legítima avaliação sobre o preenchimento de requisitos da urgência, como se dá no âmbito da Assembléia Legislativa amazonense, por exemplo?

As dúvidas sobre a interpretação do Regimento Interno, na sua prática ou relacionada com a Constituição, como a que se põe, constituem-se Questões de Ordem que, suscitadas pelos parlamentares, são resolvidas pelo Presidente da Casa Legislativa. Ou então, o Presidente pode delegar ao Plenário a decisão da Questão. Na ausência de norma regimental específica remetendo ao Plenário a deliberação da urgência pelo Governador requerida, o entendimento de presidências das Assembléias Legislativas206 acompanha, in casu, a disciplina regimental sobre a mesma matéria dada pela Câmara

206 Questão de Ordem n. 1, levantada em 17-10-1989, na Assembléia Legislativa de São Paulo, pelos

Dep. Vanderlei Macris, Luiz Máximo, José Mentor e Dep. Clara Ant, contraditada pelo Dep. Aloysio Nunes Ferreira; in Diário Oficial do Estado de São Paulo, Poder Legislativo, edição de 17-11-89, p. 54-55.

dos Deputados: a solicitação do regime de urgência poderá ser feita pelo Presidente da República (art. 64, § 1º, da CF) depois da remessa do projeto, em qualquer fase de seu andamento, aplicando-se a partir daí o regime de urgência (art.204, § 1º), independentemente de deliberação do Plenário. Tratar-se-ia de faculdade conferida ao Chefe do Executivo que, ao ser exercida, conteria direito potestativo a sua implementação, independentemente de aprovação pelo Plenário da Assembléia, por

presunção de que a urgência solicitada reveste-se sempre do requisito da correta

discricionariedade do Chefe do Executivo ao requerê-la.

Resta a observação de que algumas Constituições Estaduais restringiram o alcance da discricionariedade dos Governadores na solicitação de urgência, não admitindo sua aplicação para projetos de codificação (Alagoas, art. 88; Amapá, art. 106, § 2º; Bahia, art. 79, § 2º; Goiás, art. 22, § 2º; Mato Grosso do Sul, art. 69, § 3º; Pernambuco, art. 21, § 2º; Rio de Janeiro, art. 114, § 2º; Rio Grande do Norte, art. 47, § 3º; Rondônia, art. 41, § 2º; Roraima, art. 42, § 2º; e Sergipe, art. 63, § 2º); projeto de

lei complementar (Amazonas, art. 35, § 2º; Espírito Santo, art. 65, § 2º; Mato Grosso,

art. 41, § 2º; e Paraíba, art. 64, § 4º); para projeto de lei orgânica, código e estatuto (Acre, art. 54, § 3º; Pará, art. 107, § 2º; e Paraná, art. 66, § 3º); orçamento (Bahia, art. 79, § 2º); e para projeto “que dependa de quorum especial para aprovação; de lei orgânica, estatutária ou equivalente a código; e a projeto relativo a plano plurianual, diretrizes orçamentárias, orçamento anual ou crédito adicional” (art. 69, § 2º, da Constituição de Minas Gerais). Como se vê, o constituinte mineiro apurou a limitação dos projetos que podem ser submetidos ao procedimento legislativo sumário; cerceando as opções de discricionariedade do Executivo para solicitação de urgência, fortaleceu o alvedrio do Legislativo para disciplinar, mediante norma regimental, o trâmite de matérias desse escol.

Os Regimentos Internos das Assembléias Legislativas não adotam o

procedimento legislativo sumaríssimo, tal como previsto pelo Regimento da Câmara

dos Deputados (art. 155) e do Senado (art. 336, alíneas “a” e “b”). Nesse procedimento pode ser incluído automaticamente na Ordem do Dia, para discussão e votação imediata, ainda que iniciada a sessão em que for apresentada, proposição que verse sobre matéria de relevante e inadiável interesse nacional, a requerimento da maioria absoluta da composição da Câmara, ou de Líderes que representem esse número, desde que aprovado pela maioria absoluta dos Deputados. É a urgência urgentíssima, como

ficou conhecida essa tramitação. Não obstante servir para imediata discussão e votação de matéria que envolva segurança nacional e calamidade pública, é utilizada para inclusão na Ordem do Dia, de sessão já iniciada, de qualquer proposição que merecer essa avaliação de, pelo menos, maioria absoluta dos parlamentares ou de Líderes que representem essa grandeza.

6.4 Especial

O procedimento legislativo especial é o empregado, com ritos distintos, para que a Assembléia Legislativa efetive o poder constituinte decorrente do qual está investida (emendas constitucionais); a função legislativa também (divisão territorial administrativa do Estado – criação, incorporação, fusão e desmembramento de Municípios; plano plurianual, diretrizes orçamentárias e orçamento; medidas provisórias); a função de fiscalização e controle do Executivo (contas do Governador; sustação de atos normativos do Poder Executivo, que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa; sustação de contrato julgado irregular pelo Tribunal de Contas); função julgadora (impeachment do Governador; destituição do Procurador-Geral de Justiça); competência autonormativa (Regimento Interno).

O procedimento legislativo especial envolve, na verdade, outros tantos procedimentos, diferentes em relação aos procedimentos padrão, abreviado e sumário. O procedimento especial não se confunde com a elaboração de cada uma das demais espécies legislativas, excetuada a proposta de emenda constitucional. É que, mesmo a elaboração de lei, que deveria seguir o procedimento legislativo padrão, pode não observá-lo, mas aí em razão da matéria disciplinada, que acabou por merecer normas procedimentais especiais. Veja-se, e.g., a criação de Municípios, que se efetiva mediante lei ordinária, mas que ostenta nos Regimentos Internos das Assembléias Legislativas procedimento diferente do padrão. Observe-se, da mesma forma, especial disciplina procedimental em relação aos projetos de lei ordinária para elaboração do plano plurianual, diretrizes orçamentárias e orçamento. De modo que, quando há referência a procedimento legislativo especial não é necessariamente para se fazer a correspondência com as demais espécies legislativas; pode até haver coincidência, como é o caso do procedimento legislativo especial para proposta de emenda à constituição, mas não há necessariamente correspondência. Frise-se. O procedimento legislativo especial rege-se pelas peculiaridades procedimentais previstas em função da matéria disciplinada. E como são várias as matérias que mereceram do legislador

constituinte e do regimental tratamento especial, vários também são os procedimentos legislativos especiais previstos.

No documento Processo legislativo estadual (páginas 132-138)