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CAPÍTULO III. IDENTIDADE NO CONTEXTO DO TRABALHO E DA ORGANIZAÇÃO

SEÇÃO 1. IDENTIDADE: QUESTÕES HISTÓRICAS

1.3 IDENTIDADE SOCIAL

Para Tajfel (1981), a identidade social pode ser definida como uma representação que um indivíduo dá a si mesmo por pertencer a um grupo. Complementando essa definição, Brewer (1997) esclarece que a identidade social de um indivíduo é constituída por uma série de identificações sociais que esse indivíduo tem com várias categorias sociais. Ressalta, ainda, esse autor que nem todas as identificações são privilegiadas, ativadas ou salientadas a qualquer momento. Em um dado momento, a identidade social é composta de poucas identificações selecionadas para servir a um contexto social particular.

Identidade, seja pessoal, seja social, é um fenômeno que pode ser percebido tanto como diferenças, que levam a distintas categorias sociais e individuais, como semelhanças, que unem pessoas numa mesma categoria social. A única diferenciação é que a identidade social é dirigida por dois motivos sociais opostos ao nível individual: a necessidade de inclusão e a necessidade de diferenciação (Brewer, 1997).

Diante dessa diversidade de qualificações e predicativos atribuídos à identidade, Laurente e Barros (2000) observam que o termo identidade social se destaca, em virtude dos elementos que o compõem, ao apontar, de forma mais evidente, as duas instâncias  individual e social – que enriquecem a discussão da problemática conceitual, referindo-se à origem individual ou coletiva da identidade. As reflexões que aqui podem ser feitas levam à concepção de homem subjacente, no que se refere à interpretação do termo; assim, é possível superar a errônea dicotomia (individual e social), para mostrar que é na articulação destas que é tecida a identidade.

Quando se trata dos termos identidade e social, surge a necessidade de um conceito que “explique, por exemplo, o sentimento pessoal e a consciência da posse de um eu” (Brandão, 1990, p.37) estando, de um lado, o indivíduo como privilegiado, e, de outro lado, a coletividade, resultando numa disposição na qual se assegura o homem inserido na sociedade, bem como a dinâmica das relações sociais (Laurenti & Barros, 2000).

A identidade de um grupo assenta-se sobre uma representação social construída, sobre a qual uma coletividade toma consciência de sua unidade pela diferenciação dos outros (Dubar, 1996), porque a vida no grupo cria um imaginário social (Maffesoli, 2000). Dessa forma, a identidade social é estabelecida não somente pela representação que o sujeito faz dele mesmo no seu ambiente social, referindo-se a distintos grupos aos quais ele pertence, mas, também, aos grupos de oposição, aos quais ele não pertence (Chauchat & Durand- Delvigne, 1999). Vista dessa forma, conforme Berger e Luckmann (2002), o sujeito como

membro da sociedade exterioriza seu modo de ser no mundo e o interioriza, por intermédio dos processos de socialização primária e secundária. Isso ocorre em virtude da definição do outro e de si mesmo que é largamente relacional e comparativa (Ashforth & Mael, 1989).

Sob a ótica da identidade social, membros de todas as sociedades encaixam-se em categorizações e recategorizações sociais (Brewer, 1991; Tajfel, 1978). Tajfel (1978) estabelece, ainda, que a identidade social é construída levando-se em conta o contexto das atividades de um grupo e está relacionada com o preconceito, o conflito intergrupo, a cultura e a aculturação. A motivação individual para defender e expressar a identidade social depende das necessidades concorrentes para atingir a unidade, na qual a pessoa obtém um nível ótimo de diferenciação (Brewer, 1991). Tem-se, então, que os sinais podem mudar o que especifica a identidade proeminente, mas as pessoas enxergam a si mesmos e aos outros em termos consistentes e criam situações para respaldar esta visão.

Deschamps e Moliner (2009) estabelecem que o ponto de pesquisa de identidade trate da integração dos agentes sociais no espaço social, o que gera o reconhecimento de uma pertença, e, ao mesmo tempo, leva em conta o fato de que esses indivíduos procuram um lugar específico nesse mesmo espaço social, no qual se busca tanto a diferenciação como a singularização.

Assim, como as identidades sociais são partilhadas por aqueles que ocupam posições semelhantes, que têm pertenças comuns, é precisamente ao fator semelhança que é remetida a ideia de identidade social. Entretanto, esse sentimento de pertença bem como a identificação não são possíveis, a não ser em relação a outros grupos ou categorias sociais de não pertença (Deschamps & Moliner, 2009).

Os processos acima descritos relacionam-se com a forma de os indivíduos organizarem conhecimentos sobre si mesmos e sobre o grupo ao qual pertencem. Vários são os modelos teóricos que permitem prever os efeitos advindos dessas formas de organização. Entretanto, além do caráter explicativo ou previsível, todos esses modelos levantam à questão da relação entre identidade social e pessoal (Deschamps & Moliner, 2009).

O sociocentrismo nas relações entre grupos, integrando teoricamente a noção de identidade e o processo de categorização social, foi explicado por Tajfel (1972) ao proferir determinadas proposições.

Com base na teoria da comparação social de Festinger (1957, 1971), na qual o autor afirma que a avaliação das opiniões e aptidões dos indivíduos ocorre pela comparação com as de outros indivíduos, Tajfel (1972) propõe uma extensão mais social dessa teoria. A avaliação de si mesmo, preferencialmente, acontece alicerçada numa comparação entre

indivíduos que se assemelham. Por outro lado, para Tajfel (1972), com base na avaliação de si mesmo encontra-se a identidade social.

No plano comportamental, a categorização social leva também à discriminação comportamental, o que induziu Tajfel (1970) a desenvolver as célebres pesquisas que tendem a isolar as condições mínimas que provocam uma atitude de discriminação sistemática do exogrupo em relação ao endogrupo. Para testar os efeitos da categorização sobre os comportamentos discriminatórios, Tajfel (1970) e Tajfel, Billing, Bundy & Flament (1979) utilizaram o paradigma chamado dos grupos mínimos, ou seja, a indução experimental da clivagem de uma população em dois grupos mínimos e de importância reduzida impele os indivíduos a comportarem-se de maneira diferente para com seu grupo e para com o outro grupo.

Tajfel (1970) percebeu que normas de favoritismo em relação a membros do grupo de pertença exercem influência sobre os comportamentos. A pertença a dois grupos distintos, ao passar por uma atualização ao nível representacional, leva a uma discriminação em favor dos membros do intragrupo. Isso, de modo geral, é denominado de “sociocentrismo” e explica, de um lado, o fato de os membros de um grupo instituírem uma distinção simplificadora entre eles e os dos outros grupos e, de outro lado, os efeitos discriminatórios dessa distinção, tanto em nível dos valores como em nível dos comportamentos (Deschamps & Moliner, 2009, p. 37).

A ideia de Tajfel (1970) baseia-se, neste aspecto, em considerar o processo de categorização social, que conduz os indivíduos a dicotomizar o espaço social com base na dimensão nós/eles, o que constitui a origem essencial da discriminação, pois o autor propõe uma norma de interação competitiva. No momento da repartição ou da atribuição de recursos, esta norma induziria os indivíduos a querer ganhar e, portanto, a discriminar os outros. Essa hipótese, que foi, posteriormente, abandonada por Tajfel (1970), serviu de alicerce para o desenvolvimento da teoria da identidade social, utilizada para explicar a discriminação.