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CAPÍTULO II. CULTURA, VALORES E PRÁTICAS ORGANIZACIONAIS

SEÇÃO 3. PRÁTICAS SOCIAIS E PRÁTICAS ORGANIZACIONAIS

4.2 RELAÇÃO ENTRE CULTURA E DESEMPENHO

A representação de que as organizações possuem culturas origina um foco de investigações sobre a relação entre cultura organizacional e eficácia (Schneider et al., 2013). Em recente revisão, Sackmann (2011) esclarece que as investigações dessa relação baseiam- se em medidas de cultura organizacional. Dificuldades para a realização dessas pesquisas são apresentadas pelo autor, entre elas: (1) quais níveis da cultura devem ser foco da avaliação (por exemplo, os mitos, histórias, valores, práticas, comportamentos); (2) em qual unidade de análise deve ser avaliada (subcultura versus a cultura como um todo); e (3) o conteúdo das dimensões ao longo do qual as avaliações podem ser melhor realizadas (por exemplo, experiências de funcionários, táticas de socialização, ações de liderança). Em virtude destas dificuldades, Wilderom, Glunk e Mazlowski (2000) apontam a falta de consistência dessa relação. Entretanto, ao se compararem as revisões de Wilderom et al. (2000) e Sackmann (2011) com a revisão de Schneider et al., (2013) evidencia-se que o interesse no relacionamento entre cultura e desempenho persiste e está em desenvolvimento, com resultados significativos consistentes, justificando-se, novamente, o objetivo desta tese em testar a relação entre esses construtos.

Os estudos descritos por Schneider et al. (2013) encontraram evidências de impacto no desempenho, utilizando medidas tradicionais. Entre essas, destacam-se medidas de desempenho financeiro (Gregory, Harris, Armenakis & Shook, 2009; Kotrba et al. 2012; Lee & Yu, 2004; Yesil & Kaya, 2013), as de satisfação do cliente (Gillespie, Denison, Haaland, Smerek & Neale, 2008), as de realização do objetivo (Xenikou & Simosi, 2006) e os relatórios de gestão de topo (por exemplo, Chan, Shaffer & Snape, 2004, Glisson et al. 2008). Recentemente, pesquisas conduzidas, no Brasil, por Coelho Jr. (2009), Brandão (2009) e Santos (2012) testaram o impacto da cultura organizacional sobre o desempenho por competências, isto é, para ser competente, o desempenho dever estar em consonância com os objetivos, metas e valores organizacionais de eficiência e eficácia (Abbad & Borges- Andrade, 2004).

Foram também estudados outros índices menos tradicionais de eficácia, por exemplo, o percentual de mulheres na gestão (Bajdo & Dickson, 2001). O estudo proposto por Shim (2010) analisou a eficácia organizacional baseada no bem-estar das crianças, filhos dos empregados, bem como a relação entre cultura e o clima organizacional na intenção do funcionário de deixar a empresa. Os resultados mostraram que a cultura organizacional e o clima são os fatores significativos para explicar a intenção da rotatividade do empregado. Assim, quando a ênfase nas recompensas na cultura organizacional for significativa, percebe- se melhor bem-estar infantil nos filhos dos funcionários, o que resulta em mais eficácia e melhor desempenho do trabalho, bem como menor intenção de deixar o emprego, comparados às empresas em que os incentivos e recompensas são menos claros e eficazes. Resultados semelhantes a esses foram encontrados na pesquisa de Westbrook, Ellett e Asberg (2012).

Parte dos estudos encontrados na literatura incluiu mediadores da relação cultura e performance (por exemplo, as atitudes em Gregory et al. 2009), enquanto que outros incluídos foram os efeitos interativos entre as dimensões da cultura (Kotrba et al. 2012), com práticas organizacionais (Chan et al., 2004; Peltier, Zahay & Lehmann, 2013), valores (Gregory et al., 2009; Tomczyk, Lee & Winslow, 2013) ou com as características da indústria (Sørensen, 2002).

A variedade de medidas de cultura também tem sido abordada pelos estudiosos. Entre as medidas, destacam-se: o inventário de cultura organizacional (Cooke & Lafferty, 1989), o Denison Survey de cultura organizacional (Denison, 1990), e o perfil da cultura organizacional (OCP; O’Reilly et al., 1991), que são frequentemente encontrados na literatura (Schneider et al., 2013).

Como foi acima observado, as estratégias para se mensurar o impacto da cultura organizacional sobre o desempenho são diversas. Ao se analisarem os estudos publicados nos últimos cinco anos em periódicos científicos, encontram-se investigações que vão desde diferenças na cultura de organizações sobre o desempenho no relacionamento de duplas de empregados (Beugelsdijk, Koen & Noorderhaven, 2008), prioridades estratégicas sobre medidas de desempenho e do próprio desempenho da firma (Verbeeten, Arnick & Boons, 2009, Yarbrough, Morgan & Vorhies, 2011) até o impacto da orientação para serviços na cultura corporativa (medida pelos valores dos gestores e dos empregados) sobre o desempenho dos negócios em empresas de manufatura (Gebauer, Edvardsson & Bjurko, 2010).

Liderança tem sido outra variável que aparece com frequência nos estudos da relação entre cultura organizacional e desempenho. Investigações que tratam as percepções de quais facetas da cultura organizacional estão relacionadas à liderança e eficácia pessoal (Kwantes & Boglarsky, 2007), influência da competência de liderança e da cultura organizacional na capacidade de resposta e desempenho das empresas (Asree, Zain & Razalli, 2010), a liderança como variável antecedente da relação entre cultura organizacional e desempenho (Chen, 2004) ou mesmo, dos estilos de liderança e da cultura organizacional no desempenho das empresas (Wilderom, Van der Berg & Wiersma, 2012; Yildirim & Birinci, 2013; Zehir, Ertosun, Zehir & Mueldili, 2011) estão entre as pesquisas mais celebradas.

Encontram-se, ainda, estudos que abordam a relação entre subculturas organizacionais e desempenho (Li & Jones, 2010), a correlação entre a cultura organizacional e a conversão do conhecimento sobre o desempenho corporativo (Tseng, 2009). Espaço também tem sido reservado para a relação entre cultura organizacional, os valores sobre os resultados dos colaboradores, mediada pelo conflito da tarefa (McMillan, Chen, Richard & Bhuian, 2012), ou somente a relação entre cultura e desempenho (Agbényiga, 2011; Cheung, Wong & Lam, 2012; Jacobs et al., 2013; Mathew, Ogbonna & Harris, 2011; Murphy, Cooke & Lopez, 2013; Prajogo & McDermott, 2010; Yazici, 2010, Yilmaz & Ergun, 2008).

Práticas de inovação e desempenho representam importantes pesquisas realizadas no cenário atual. Entre outras, destacam-se as investigações sobre a relação entre cultura de inovação, programas de inovação e desempenho (Stock, Six & Zacharias, 2013), fatores ambientais e organizacionais como moderadores da relação multidimensional da inovação e o desempenho (García-Zamora, González-Bento & Muñoz-Gallego, 2013). Para o maior aprofundamento entre cultura e inovação, recorre-se à recente revisão elaborada por

Buschgens, Bausch e Balkin, (2013).

O trabalho desenvolvido por Hartnell et al. (2011) utilizando a estrutura de valores concorrentes (Competing Values Framework - CVF; Quinn & Rohrbaugh, 1983) é apresentado como um dos mais abrangentes testes da relação entre cultura e desempenho organizacional. Em sua meta-análise, Hartnell et al. (2011) exploraram a estrutura da CVF, bem como a relação entre suas dimensões e três indicadores de eficácia organizacional (atitudes dos funcionários, o desempenho operacional e desempenho financeiro). Os resultados da pesquisa de Hartnell et al. (2011) apontaram que a estrutura dos valores concorrentes se comportou como o previsto. A cultura de clã apresentou os funcionários mais satisfeitos e comprometidos, enquanto aqueles com maior orientação de mercado obtiveram um desempenho operacional e financeiro superior.

Outro importante estudo do impacto da cultura, que utilizou a estrutura de valores concorrentes na eficácia da empresa foi o de Gregory et al. (2008). Esses autores examinaram as atitudes dos funcionários (satisfação dos médicos e dos outros empregados) como um mediador potencial da relação entre a cultura organizacional e diversas medidas de eficácia organizacional (despesas controláveis e satisfação do paciente). Os resultados forneceram evidências de que as atitudes dos funcionários mediam a relação cultura-efetividade.

Como já relatado na presente revisão, valores e práticas organizacionais apresentam um importante papel na predição do desempenho. Estudos como o de Triguero-Sánchez, Peña-Vinces & Sánchez-Apellániz (2013) mostram que práticas de recursos humanos relacionam-se com o desempenho organizacional (percebido e financeiro), sendo essa relação moderada pela distância hierárquica, encerrando uma lacuna na literatura, em que até o momento não havia nenhuma evidência empírica que demonstrasse que a distância hierárquica afetasse esta relação. Os resultados mostram que a distância hierárquica é uma dimensão cultural que modera a relação entre práticas de recursos humanos e o desempenho organizacional. Além disso, os autores observam que, ao se estudar o desempenho em relação às práticas organizacionais, o uso de medidas de percepção são consideradas mais apropriadas (R2=0,48), como indicaram a opinião de funcionários e gestores se comparadas ao desempenho financeiro (R2=0,07) (Triguero-Sánchez et al., 2013) na relação direta entre práticas e desempenho.

Na mesma direção, a pesquisa conduzida por Nicolau e Musetescu (2012) tratou de práticas de recursos humanos, especificamente, programas que oferecem aprendizagem ao longo da vida. O papel desses programas ficou claro, e, segundo os autores, gera o desenvolvimento da capacidade de pessoal, o que se reflete no desempenho futuro da organização.

Anderson, Spataro e Flynn (2008) investigaram a influência de pessoas na organização. Os autores testaram se a influência pode ser resultado da compatibilidade indivíduo-organização. Os resultados demonstraram que pessoas extrovertidas revelam maior influência em uma organização orientada para a equipe. Ao contrário, indivíduos conscienciosos apresentam maior influência em organizações em que os indivíduos trabalham sozinhos, em tarefas técnicas. Além disso, estes efeitos impactaram no desempenho no trabalho e sofreram influência de características demográficas, como sexo, etnia e nível socioeconômico.

A presente revisão de literatura mostrou a influência da cultura organizacional ou de seus componentes (valores e práticas organizacionais) sobre o desempenho. Entretanto, pode-

se perceber que os estudos, salvo algumas exceções (ver Hartnell et al., 2011; Triguero- Sánchez et al., 2013), não especificam quais valores e quais práticas predizem o desempenho, expondo, assim, uma importante lacuna para estudos que tratam da relação entre estas variáveis.

Mesmo que diversos estudos aqui relatados tenham apresentado análises robustas como, por exemplo, modelagem por equações estruturais (Kwantes & Boglarsky, 2007; Murphy et al., 2013) ou análise multinível (Kull & Narasimhan, 2010), o contexto de pesquisas brasileiro ainda é incipiente para pesquisas que utilizem análises de ponta, que indicam outra lacuna. Ademais, são escassos os estudos que trabalham com todas as dimensões aqui apresentadas, que serão objeto de investigação da presente tese.

Diante das lacunas apresentadas, esta tese contribuirá com a literatura, entre outros aspectos, no que se refere ao estudo da influência dos valores e das práticas especificas (utilizando-se modelos teóricos definidos) sobre o desempenho no trabalho. Além disso, testará um modelo em que a relação entre cultura organizacional e desempenho é comprovada com a identidade no contexto do trabalho e da organização.

Conclusões do Capítulo II

As investigações sobre cultura organizacional no campo dos estudos organizacionais apresentam-se polissêmicas, conforme referenciado no presente capítulo. Desse fato, aflorou a diversificação e a diferenciação que caracterizam a conceituação, a metodologia e a abrangência das pesquisas sobre cultura organizacional. A complexidade polissêmica que caracteriza a cultura organizacional também se reflete na forma de mensurar este construto. Não existe consenso, conforme já salientado, entre os autores a respeito da maneira de se medir cultura organizacional, o que gera uma controvérsia epistemológica. Além desses aspectos, foi abordada outra contestação, que se refere aos principais elementos constitutivos da cultura organizacional, sendo para alguns autores os valores organizacionais, e, para outros, as práticas organizacionais.

Neste capítulo, abordaram-se aspectos históricos, teóricos, metodológicos da noção de cultura, valores e práticas organizacionais. No primeiro momento, a cultura nacional e a cultura organizacional foram abordadas, assim como suas definições, tipologias e limites conceituais, bem como a relação entre os dois níveis culturais. Posteriormente, reservou-se espaço especial para os valores humanos e os valores organizacionais. Além do histórico e da conceituação, foi apresentada a teoria que referenciará os estudos posteriores desta tese. Em seguida, as práticas sociais e organizacionais foram retratadas. Novamente, aspectos da

história, definições e tipologias foram apresentados, tendo lugar especial a discussão das práticas organizacionais vinculadas às práticas sociais. Por fim, uma revisão da literatura mostrou os principais estudos publicados no Brasil e no exterior que tratavam das relações entre cultura, valores, práticas organizacionais, identidade no contexto do trabalho e das organizações e desempenho.

A análise dos estudos revisados permitiu concluir que, em geral, existe uma diversidade de estudos que contemplam as variáveis revisadas. Entretanto, quando se analisaram os estudos entre cultura organizacional e identidade, seja no contexto do trabalho, seja na organização, poucos estudos apresentaram uma especificação de quais valores e quais práticas influenciam a formação da identidade. Outro aspecto observado trata da condição de a identidade ser utilizada como variável mediadora ou moderadora da relação entre cultura e outro construto (por exemplo, desempenho). Nos estudos sobre cultura, valores, práticas e desempenho, novamente não se especificaram quais são os valores e práticas que influenciam essa relação. Outra lacuna trazida pela revisão refere-se à utilização de análises mais robustas como modelagem por equações estruturais ou análise multinível, ainda incipientes no cenário brasileiro de pesquisa.

PARTE 1

ANÁLISE TEÓRICA E CONCEITUAL

CAPITULO I:

Desempenho no Trabalho e Desempenho Competente Seção 1: Desempenho no Trabalho

Seção 2: Desempenho Competente

CAPITULO II: Cultura Organizacional

Seção 1: Cultura, Cultura Nacional e Cultura Organizacional Seção 2: Valores Organizacionais

Seção 3: Práticas Organizacionais

CAPITULO III:

Identidade no Contexto do Trabalho e da Organização Seção 1: Identidade: Questões Históricas

Seção 2: Identidade Pessoal Seção 3: Identidade Social

CAPITULO IV:

Modelo Conceitual e Hipóteses de Pesquisa Seção 1: Modelo Conceitual e as Hipóteses de Pesquisa

CAPÍTULO III. IDENTIDADE NO CONTEXTO DO TRABALHO E DA