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NOVOS TIPOS “PUROS” DE DOMINAÇÃO ORGANIZADA DA METRÓPOLE

Capítulo 5. A “Cidade-mercado” como Dominação Organizada da Metrópole com relação a fins

5.1 Instituições e Política Urbana Global

O advento da rede urbana global - uma teia de territórios conectados por objetos e comandados por sistemas técnico-informacionais - as chamadas novas tecnologias da informação e comunicação (NTIC), que se comunicam em tempo real proporcionando operações e decisões instantâneas - tornou possível o fluxo de pessoas, bens, materiais, dinheiro e toda forma de energia, vale dizer, a convergência espaço-tempo, transformando as metrópoles na principal força produtiva do novo regime de acumulação presente no final do séc. XX.

Um dos aspectos notáveis da formação desses novos espaços metropolitanos é a sobreposição de escalas espaço-temporais (do global ao local) e a emergência de espaços institucionais correspondentes, que reivindicam para si uma posição específica na divisão do trabalho de dominação e controle da metrópole. Esses espaços institucionais caracterizam-se por serem instâncias de produção, consagração e legitimação de formações discursivas e modelos de cidade no contexto da urbanização global, além de comandarem o capital necessário à produção de objetos na escala correspondente ao padrão de acumulação propriamente planetária (revitalização de centros urbanos, aeroportos internacionais, rede metroviária, saneamento ambiental etc).

Se, como observa Bourdieu (2004:25) as oportunidades que um agente singular tem de submeter as forças do campo aos seus desejos são proporcionais à sua força sobre o campo, isto é, à sua carteira de capital ou, mais precisamente, à sua posição na estrutura de distribuição do capital, então as instituições globais como a ONU, o Banco Mundial e o FMI encontram-se, para o bem ou para o mal, em uma posição privilegiada no campo urbanístico, uma vez que são grandes reservatórios de poder cultural, material e simbólico. O ex-conselheiro do governo Clinton, ganhador do Prêmio Nobel de economia e ex- Economista Chefe do Banco Mundial Joseph Stiglitz (2002:23) é um dos inúmeros intelectuais a se dedicar à analise das conseqüências dessas para os países em desenvolvimento:

em muitas situações, os benefícios da globalização têm sido menores do que seus defensores apregoaram, e o preço pago tem sido maior, já que o meio ambiente foi destruído e os processos políticos, corrompidos, além de o ritmo acelerado das mudanças não ter dado aos países tempo suficiente para uma adaptação cultural. As crises, por sua vez, que trouxeram em seu rastro o desemprego em massa, têm sido acompanhadas por problemas de desintegradas social de maior prazo – desde a violência urbana na América Latina até os conflitos étnicos em outras regiões do mundo, como na Indonésia.

Stiglitz (idem, idem) parece estar convencido de que os males da globalização são decorrentes da atuação das instituições que presidem o processo de globalização desencadeado pelo chamado Consenso de Washington que impôs a austeridade fiscal, a privatização e a abertura dos mercados como receituário para as nações periféricas:

para compreender o que deu errado, é importante analisar as três principais instituições que controlam a globalização: O FMI, o Banco Mundial e a OMC. Além dessas, há uma série de outras que desempenham um papel específico no sistema econômico internacional – uma série de bancos regionais, irmãos menores e mais jovens do Banco Mundial, e um grande número de organizações das Nações Unidas, como o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento ou a Conferência das Nações Unidas para o Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD – United Nations Conference on Trade and Development Program).

O fato de a própria organização territorial estar vinculada à lógica interna de determinadas instituições torna extremamente relevante a recuperação dos aspectos essenciais da atuação dessas mesmas instituições, suas diretrizes, princípios e

conseqüências para a produção da ordem na metrópole. Essa recuperação é tanto mais importante quanto o é o fato de que determinadas instituições não se limitam à difusão de preceitos doutrinários, mas à sua operacionalização e à submissão do processo de produção do espaço, dos territórios e dos objetos à consecução de fins práticos.

O FMI e o Banco Mundial

O FMI e o Banco Mundial surgiram durante a Segunda Guerra Mundial em decorrência da Conferência Financeira e Monetária das Nações Unidas em Bretton Woods, New Hampshire, em julho de 1944. O Banco foi criado inicialmente para prover recursos financeiros para a reconstrução das economias dos países atingidos pela Segunda Guerra Mundial, e, como resultado de uma reflexão posterior, acresentou-se o “D‘ de desenvolvimento ao nome do Banco para financiar o desenvolvimento econômico dos países considerados menos desenvolvidos no Hemisfério Sul (Stiglitz, 2002).3

A partir dos anos 80 o Banco concentrou as suas ações na promoção do financiamento de países em desenvolvimento e, conjuntamente com o FMI, na definição de políticas econômicas para os mesmos. Aos poucos essas instituições reforçam um modo de atuação de caráter coercitivo e doutrinário sobre as políticas urbanas, uma vez que as transferências e empréstimos do Banco a países “periféricos” devem ser condicionados à adoção de uma agenda de reformas concebidas de forma centralizada em Washington.

No período estudado, instituições globais como o Banco Mundial e a ONU passaram não só a coordenar linhas de financiamento para projetos, mas também a elaborar seus próprios modelos de cidade, convertendo capital econômico em capital cognitivo e simbólico e realizando grandes investimentos no campo de produção da ordem na metrópole. “De um banco de desenvolvimento, indutor de investimentos, o Banco Mundial tornou-se o guardião dos interesses dos grandes credores internacionais, responsável por assegurar o pagamento da dívida externa e por empreender a reestruturação e abertura dessas economias, adequando-as aos novos requisitos do capital globalizado” (Soares, 1996:2).

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O Grupo do Banco Mundial é composto pelo Banco Internacional para a Reconstrução e Desenvolvimento – BIRD que foi criado em 1945; a Corporação Financeira Internacional (CFI) que foi criada em 20 de julho de 1956; a Associação Internacional de Desenvolvimento (AID) criada em 29 de setembro de 1959; o Centro Internacional de Resolução de Diferenças Relativas a Investimentos (CIRD) (The International Centre for Settlement of Investment Disputes - ICSID) criado em 1966; e finalmente, criada em 1988, a Agência Multilateral de Garantia de Investimentos (AMGI).

Dada a dependência que os países endividados têm dos recursos do Banco Mundial, este passou a impor uma série de condicionalidades, mediante as quais pode intervir diretamente na formulação de políticas internas e na legislação desses países. Note-se, porém que como nota Soares (idem, idem):

Essa influência se dá menos em função do volume de recursos emprestados, embora este seja importante para grande número de países, do que pelo fato de os grandes capitais internacionais e o Grupo dos Sete terem transformado o Banco Mundial e o FMI nos organismos responsáveis não só pela gestão da crise de endividamento como também pela reestruturação neoliberal dos países em desenvolvimento. Assim, esse novo papel do Banco reforçou a sua capacidade de impor políticas, dado que, sem o seu aval e do FMI, todas as fontes de crédito internacional são fechadas, o que torna muito difícil a resistência de governos eventualmente insatisfeitos com a nova ordem.

Vale lembrar que, em relação ao seu funcionamento, o Banco Mundial é composto por um Conselho de governantes e outro Conselho de chefes e executivos para cada agência multilateral que integra o Banco (World Bank, 2000c). Os governantes representam os países membros e têm direito a votos proporcionais às suas contribuições financeiras. Para tornar-se membro do Banco o país deve primeiro aderir ao FMI. As decisões do Banco são fortemente influenciadas pelo montante de contribuição de cada país, sendo que o direito ao voto é proporcional às contribuições de cada país.4

O Banco Mundial exerce um papel fundamental na coordenação desses empréstimos, assim como na produção e disseminação de novas políticas de investimentos por meio de publicações técnicas. Os economistas do Banco desenvolvem e publicam modelos e projeções referentes aos mercados internacionais, bem como de prospecções de crescimento por meio de indicadores que servem de base para o planejamento de políticas nacionais de diversos países (Cole, 1987, apud. Cavalcanti, 2004).

Assim, o Banco se distingue das demais agências pela natureza auto-referente de sua doutrina, pois “somente em função dos resultados das intervenções apoiadas pelo Banco,

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Somando-se apenas os percentuais dos cinco países mais influentes (EUA, Japão, Alemanha, Reino Unido e França), vê-se que eles controlam 37,55% dos votos, o que dá poder a esse grupo para controlar o resultado das decisões do Conselho. Os outros 19 membros (em grupos de países) com direito a voto, que representam todos os demais países do mundo distribuídos nestes 19 grupos de membros dificilmente têm condições de vencer uma votação, dadas as regras de composição. O Brasil, por exemplo, encontra-se num grupo cujo poder de voto somado representa apenas 3% do total votante.Os Estados Unidos sozinhos representam 17,43% dos votos do BIRD, apesar de que já teve poder maior em décadas anteriores. Outros países de influência significativa nas decisões do banco são: Japão (6,18%), Alemanha (4,78%), Reino Unido (4,58%)

por ele analisadas e exclusivamente segundo seu ponto de vista, serão por ele reformuladas face à realidade existente” (Osmont, 1995, apud. Compans, 2001:127).

Para Compans (2001:128) esse fato se reveste de grande importância para a compreensão sobre o que veio a acontecer nas cidades a partir da década de 90, pois, nesse período, o Banco Mundial se tornou, o principal provedor de recursos para o financiamento de projetos urbanos em “países em desenvolvimento” tanto no que diz respeito a transferências quanto em relação aos empréstimos. Estima-se que a participação do Banco em projetos de habitação, infra-estrutura, água e saneamento e programas de geração de emprego e renda esteja em torno de 57%. A autora (ibid:129) acrescenta que coordenação dessas inversões é feita mediante a ação conjunta das cinco instituições que compõem o Banco. Além da atuação em esfera própria, o Banco participa também do Programa de Gestão Urbana coordenado pelo Habitat, considerado pelo Banco como o “veiculo principal para a execução de políticas urbanas”.

No que tange especificamente à ordem urbana observa-se que desde a década de 1980 o Banco Mundial vem elaborando documentos e projetos específicos referenciados na noção de produtividade urbana. A política de desenvolvimento urbano do Banco Mundial que, hoje sabemos, teve ampla influência nas políticas urbanas das cidades brasileiras é explicitada em documentos como o “Urban Policy and Economic Development: an a Agenda for de 1990s”. Em linhas gerais, o documento defende a tese de que o equilíbrio macroeconômico está estreitamente vinculado ao desempenho da economia urbana. Preconiza a gestão racional e eficiente dos recursos sociais, econômicos e naturais, visando ao equilíbrio da riqueza com equilíbrio fiscal. Cabe às políticas urbanas atuar no sentido do aumento da produtividade urbana, no combate à pobreza e no enfrentamento da questão ambiental urbana. Os meios para se alcançar estes objetivos são o aperfeiçoamento das instituições que regulam o mercado, a provisão de infra-estrutura e a ampliação do nível de emprego em atividades intensiva em mão-de-obra. A crença no mercado como coordenador do desenvolvimento urbano e da provisão de bens e serviços, inclusive os de consumo coletivo vis a vis as ineficiências do Estado principalmente relacionadas à corrupção e aos anacronismos organizacionais não chega a surpreender, em se tratando de uma instituição de Breton Woods.

Como vemos, a idéia de ordem urbana encontra-se referenciada na noção de equilíbrio macroeconômico do Estado-nação e ao ajuste estrutural da economia global, às quais se vincula o desempenho da economia urbana. Com base nesses documentos, pode-se afirmar que as práticas engendradas por essas instituições não são isoladas ou ocasionais.

São ações intencionais codificadas por especialistas da produção simbólica, que articulam meios e fins específicos, com vistas à imposição de uma determinada concepção de ordem urbana. De acordo com essa visão, a crise socioambiental decorreria da estagnação econômica, que só pode ser vencida com o aumento da “produtividade urbana” objetivo central da política urbana. Se a degradação socioambiental é uma externalidade negativa a ser controlada, a sustentabilidade urbana depende do gerenciamento voltado ao bom funcionamento do sistema.

Tome-se como exemplo o Programa Cities Alliance. A partir do reconhecimento, pelas instituições globais, da existência de partes negligenciadas de cidades onde as condições de vida e moradia são espantosamente pobres, assentamentos que, embora identificados por denominações variadas – slums, kampungs, bidonvilles, favelas, tugúrios – partilham as mesmas condições de vida miseráveis, o Banco Mundial e a ONU/Habitat estabeleceram parceria para:

a) introduzir melhorias inéditas nas condições de vida de pessoas de baixa renda na zona urbana, mediante o desenvolvimento, em âmbito local e nacional, de programas de urbanização de assentamentos precários; e

b) apoiar processos de formação, em âmbito urbano, do consenso sob o qual grupos locais interessados definem sua visão da cidade e estabelecem estratégias de desenvolvimento urbano com claras prioridades de ação e investimentos (Banco Mundial/ONU, 2003).

Se considerarmos que essa leitura vale para o planeta como um todo, pode-se afirmar que o propósito de intervir nas cidades mediante uma perspectiva global e universalizante define um espaço institucional específico, que caracteriza uma posição distinta dessas instituições no campo de produção e, logo, na divisão do trabalho de dominação e controle da metrópole. Desse modo, a lógica de intervenção das instituições globais remete à existência de um projeto global de desenvolvimento – fundado em concepções, reflexões e pesquisas próprias, geradas no interior dessas instituições – que se traduzem em programas setoriais de operacionalização desse projeto.

Outra referência à visão do Banco Mundial para as cidades pode ser extraída do próprio Cities Alliance. O Plano de Ação de Urbanização de Assentamentos Precários preconiza como uma das principais ações (Banco Mundial/ONU, 1999):

o reforço da capacidade interna do país através da reestruturação de políticas e do arcabouço regulatório e operacional e da eliminação das restrições técnicas/legais para urbanização em larga escala, da superação de entraves institucionais; do encorajamento do compromisso e determinação locais, incluindo a compreensão política e a apropriação do conceito; e do reforço do aprendizado e do treinamento.

A relação entre a concepção de desenvolvimento e o plano operacional se dá por mediação de conceitos como a “boa governança”, segundo o qual (idem):

a capacidade dos governos locais deve ser reforçada para que possam cumprir sua responsabilidade de uma distribuição eqüitativa de infraestrutura e serviços para todos os residentes urbanos, fazendo ao mesmo tempo o planejamento para um crescimento futuro. A capacidade das autoridades municipais, estaduais e nacionais deve ser reforçada para assegurar seu papel normativo crítico, de modo a estabelecer um ambiente político facilitador e eliminar a corrupção do mercado imobiliário e da distribuição de serviços públicos.

Cumpre lembrar a esta altura que tais concepções não se esgotam na retórica, mas são amplamente executados pelos governos locais mundo afora. O Programa Boa Governança e Combate à Corrupção da Prefeitura de São Paulo, desenvolvido na gestão Marta Suplicy, por exemplo, foi elaborado em cooperação técnica com o Instituto Banco Mundial “em função de projetos similares que este organismo tem desenvolvido em outros países, tendo adquirido técnica e metodologia para elaboração de diagnóstico na área de boa governança e transparência da administração pública” (PMSP, 2004).5

5.2 “Cidade-mercado” e Sustentabilidade Urbana

A transformação do espaço e dos serviços urbanos em mercadoria engendra inúmeros pontos de embate da “cidade-mercado” com o paradigma “direito à cidade” em

torno à definição e apropriação legítima da idéia de sustentabilidade, erigida como um dos principais móveis de luta no campo. Temos aqui subclasses de agentes que lutam pela apropriação e definição legítima do conceito de sustentabilidade urbana como fator teleológico, o dever-ser da metrópole. Tal embate suscita um problema teórico e outro prático. No plano teórico a metrópole apareceria em contradição com as relações de produção correspondentes ao novo padrão de acumulação global, mas também com as relações de sustentabilidade ambiental, sendo necessário que ela realize o movimento de transição para um novo modelo de realidade, a metrópole global-sustentável. Em termos práticos, a problemática recai sobre a possibilidade de um consenso negociado em torno de instrumentos de política urbana entre agentes que se encontram em posições opostas e mesmo antagônicas no campo de disputas (Ribeiro, 2004:15).

há possibilidades de nossas grandes metrópoles tornarem-se competitivas e ao mesmo tempo socialmente justas e ambientalmente sustentáveis? Será efetivamente possível construir um projeto de cidade governada por acordos e pactos negociados com todas as forças presentes nas metrópoles?

Uma das faces visíveis dessa problemática é a tentativa de compatibilizar em um mesmo modelo sociocognitivo noções aparentemente díspares e contraditórias como a de “cidade global” alinhada às regras de mercado e “cidade sustentável” mais coerente com a idéia de universalização do “direito à cidade”. Esse debate passou a figurar com grande freqüência no campo urbanístico, mobilizando o meio acadêmico e político e suscitando a análise das possibilidades objetivas de produção de territórios globais sustentáveis. Como observa Compans (2001) embora contraditórios no plano da retórica, os dois modelos que mais têm rapidamente se propagado entre governos e organizações da sociedade civil são os de “cidades sustentáveis” e “cidades globais”.

Como construções sóciocognitivas no interior do campo urbanístico, essas formulações encerram representações distintas do dever-ser da metrópole e, como tais, conformam elaborações alternativas a respeito do espaço-tempo urbano e do processo de urbanização global.

enquanto o primeiro privilegia a dimensão econômica, o curto prazo e a integração a fluxos econômicos desterritorializados – já que as atividades econômicas que coesionam a rede urbana mundial tendem à desvinculação das economias regionais e nacionais -, o segundo privilegia as dimensões ecológicas e cultural, o longo prazo e a articulação de escalas

espaciais – o desenvolvimento local e global – e temporais – os ritmos naturais e urbanos (Emelianoff, apud Compans, 2001:112).

Para alguns, a contradição entre cidade global e cidade sustentável seria irredutível, pois, no que se refere, por exemplo, à temporalidade Emelianoff (apud Compans, 2001:110) observou que:

A supressão do tempo por tecnologias de informação, para que as trocas, comandadas centralizadamente, possam se realizar em qualquer parte do planeta em “tempo real” é a condição de competitividade das “cidades globais”. A reintrodução das temporalidades naturais – cíclicas (depuração, tempo de renovação de recursos) e evolutivas (biodiversidade, dinâmicas dos espaços vegetais) – e urbanas (patrimônio, história e cultura) é a condição de durabilidade do desenvolvimento urbano.

Assim, o modelo cidade global atenderia a uma lógica de desenvolvimento conectado a interesses planetários, quase invisíveis à percepção cotidiana, mas desconectado dos interesses da maioria local, regional e nacional, estes mais vinculados à aspiração pelo alcance da sustentabilidade socioambiental com base na organização intra- urbana por um sistema de valores alinhavados pela noção de justiça social e de proteção ambiental.

De outra perspectiva, esses modelos, ao invés de representarem projetos antagônicos, apareceriam como idéias complementares. A competitividade dependeria de recursos lentos, quer dizer, que só podem ser criados e renovados no médio e longo prazos, como a competência dos trabalhadores, a confiança nas relações entre os atores, a capacidade coletiva de dominar objetos técnicos-científicos, cada vez mais complicados e frágeis. Dependeria também da articulação das distintas temporalidades econômicas nas grandes metrópoles, o que se daria por meio do controle dos territórios, transformando-os em máquinas de acelerar fluxos, dando, ao mesmo tempo, acesso aos recursos lentos dos quais dependem a competitividade. De acordo com essa visão o investimento em educação, saúde, infra-estrutura, formação profissional dos trabalhadores, habitação, equipamentos de consumo coletivo e até mesmo a recuperação e/ou preservação de ecossistemas fragilizados, longe de corresponderem a um projeto antagônico à busca da instantaneidade e da volatilidade nas operações comerciais e financeiras, lhes podem ser perfeitamente acessórios (Veltz, apud. Compans, 2001:111).

Borja e Castells (apud. Compans, 2001:112), defensores da “cidade-mercado” no âmbito da Habitat II, estão entre aqueles que argumentam que não há contradição entre a agenda da sustentabilidade e da competitividade urbanas. Ao contrario, afirmam que uma não pode existir sem a outra, sendo a competitividade um dado da realidade, uma condição inexorável imposta às cidades pela globalização da economia. A riqueza das nações, empresas e indivíduos dependeria do movimento do capital, em cadeias de produção, distribuição e gestão que se inter-relacionam em escala planetária, tornando o território local irrelevante como unidade de produção e consumo. Nessas condições, as cidades