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CAPÍTULO II Os Principais Conceitos da Investigação

5. Insucesso Escolar: os conceitos e os indicadores

O sistema de ensino está desenhado com o objetivo de uma progressão anual na aprendizagem dos alunos, de modo a terem um percurso escolar com sucesso, segundo uma conceção meritocrática, tendo por base a utilidade social das várias áreas do saber. No entanto, alguns alunos apresentam dificuldades na aprendizagem, dando origem ao insucesso escolar. Em Portugal, as estatísticas do insucesso escolar evidenciam percentagens elevadas de retenção dos alunos, nomeadamente em comparação com outros países europeus e da OCDE. Neste âmbito, são necessárias estratégias políticas com o objetivo de uma redução deste problema social. 7

Os principais indicadores do insucesso escolar são as más notas nas disciplinas (negativas) e a repetição de ano(s) de escolaridade, designadamente de retenção (Avanzini 1982). No entanto, na prática e segundo o Relatório Eurodyce (2014), alguns países, nomeadamente

7Santiago, P. et al. (2012), OECD Reviews of Evaluation and Assessment in Education: Portugal 2012, OECD

Publishing. O Relatório (PISA 2012) salienta uma melhoria dos resultados escolares dos estudantes, em Portugal, na faixa etária dos 15 anos desde 2003, no entanto estabelece um conjunto assinalável de orientações no âmbito das políticas educativas, na medida em que os resultados dos alunos portugueses, ainda estão abaixo da média dos países da OCDE que são uma referência incontornável no âmbito da avaliação da educação dos países. O sistema educativo português não está isolado dos outros países, quer da União Europeia, quer de um conjunto mais vasto de países no âmbito da OCDE. As políticas educativas em Portugal estão estabelecidas em várias diretivas, no âmbito da educação, nomeadamente no contexto da União Europeia Strategic Framework for

European Co-operation in Education (“ET 2020”) onde se dão orientações para uma melhoria da educação e da

aprendizagem, em vários domínios, nomeadamente nas competências básicas dos alunos, na motivação, na diminuição do insucesso e abandono escolar, tendo por exemplo como meta reduzir a percentagem de abandono escolar que é superior a 30% para os valores entre os 10% e os 15%, até 2020 [Em linha] Disponível:

Portugal, Itália, Chipre, Hungria, Polónia e Roménia, consideram outros indicadores, nomeadamente a assiduidade e/ou situação familiar, podendo verificar-se uma retenção quando se regista um certo número de ausências (justificadas e injustificadas) dos alunos. Na Bélgica (Comunidade de língua Alemã e Francesa), Polónia, Itália e Roménia considera-se o

comportamento dos alunos para efeitos de retenção.

Segundo Avanzini (1982), as causas do insucesso escolar podem ser várias: a) no que respeita aos alunos - o nível intelectual, o género, as características afetivas; b) dos familiares – o nível cultural das famílias, o nível de escolaridade dos pais, o nível socioeconómico, fatores relacionais da própria família; c) dos professores – estratégias pedagógicas, relação pedagógica, métodos utilizados; d) os fatores socioeconómicos e culturais dos alunos imigrantes e famílias. Deste modo, o insucesso escolar é um problema com um carácter plurideterminado podendo estar associado a vários fatores: do sujeito, das famílias, das escolas e da conjuntura política, social e cultural de uma sociedade, entre outros aspetos. Não existe um consenso, quanto à importância relativa de cada um dos aspetos, no entanto, existe algum consenso, relativamente à necessidade de se considerarem várias abordagens na sua compreensão.

Analisaram-se os dados da retenção dos alunos portugueses do ensino básico, nos relatórios PISA (Program for International Student Assessment), da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) (Conboy J. et al. 2013:20). Neste âmbito concluiu-se que a prática de retenção em Portugal é excessiva, nos vários níveis de ensino, quando comparada com os outros países europeus. No que respeita à caracterização das variáveis ou fatores onde existe uma significância estatística com a retenção referem-se, algumas diferenças: no género (masculino e feminino), na classe social, nas diferentes culturas dos estudantes imigrantes, nos alunos que frequentam as escolas públicas ou escolas localizadas em meios pequenos e aqueles que têm menores recursos económicos. Neste sentido, os resultados evidenciaram que as fragilidades socioeconómicas dos alunos e das suas famílias estão associadas com elevadas taxas de repetência dos alunos.

Segundo os resultados do Relatório PISA (Santiago et al. 2012), a percentagem dos alunos que tiveram que repetir, pelo menos um ano de escolaridade em Portugal foi de 20,9%, sendo que este valor é um dos mais elevados, no conjunto dos países da EU. Portugal está na quarta

posição, relativamente aos países que têm maiores percentagens de insucesso escolar, nomeadamente situado em quarto lugar, a seguir à Espanha (31,9%), Bélgica Fr. (24,2%) e França (23,5%). Um outro resultado diz respeito à percentagem de alunos portugueses, na mesma faixa etária (15 anos) que repetem um ou mais graus de ensino ser de 35%. Refere-se, ainda que a percentagem dos alunos portugueses, nessa faixa etária, no nível ISCED 2 (9º ano de escolaridade) que repetiram um grau, no ano anterior é de 9,5% (op. cit. Anexo D p. 174).

Em Portugal, o ensino básico regular é unificado até ao 9º ano, sendo que só a partir deste ano, o aluno pode escolher uma área de estudo, com vista a uma progressão nos estudos de nível secundário e superior. No entanto, existem cursos com uma via profissionalizante, nomeadamente os Cursos de Educação e Formação (CEF) 8 que permitem aos alunos com 15

ou mais anos de idade e que não conseguiram completar o 6º ou 9º, no ensino regular obter uma formação de nível básico (9º ano). Estes cursos são uma alternativa de estudo para esses alunos. No entanto pode-se considerar que muitos dos alunos que frequentam estes cursos o fazem, porque o sistema de ensino, não lhes proporcionou uma igual oportunidade no sucesso escolar, relativamente a outros alunos, tendo em consideração as diferenças socioculturais existentes, nomeadamente ao nível familiar.

Segundo os dados oficiais nacionais, divulgados pela Direção Geral de Estatísticas da Educação e Ciência (DGEEC),9 a taxa de retenção e desistência no 3º ciclo em 2012/2013 foi

15,9%. Esta percentagem diminuiu 2,3%, em doze anos (2000/2001 – 2012/2013) e apresentou o valor mais baixo em 2010/2011 (13,3%). No entanto, desde este ano (2010/2011) inverteu-se a tendência de diminuição e houve um aumento de 2,6%, em apenas dois anos (2010 – 2012). Este resultado levanta, desde logo um questionamento que importa esclarecer, nomeadamente porque este período coincide com o início do programa de austeridade implementado em Portugal, pelas entidades externas que financiaram Portugal (Troika). Neste âmbito, as medidas de austeridade implementadas na educação, pelo governo português, neste período poderão ter afetado os indicadores da retenção dos alunos. Outras

8 Os Cursos de Educação e Formação (CEF) do nível básico são cursos de dupla certificação, destinados preferencialmente a alunos em risco de abandono escolar. Estes cursos têm dois objetivos principais: por um lado, a qualificação escolar dos jovens e por outro, permitem um ensino profissional como forma de transição para a vida ativa (Diário da República, 1ª série – Nº 129 – 5 de Julho de 2012. Disponível em: https://educar.files.wordpress.com/2012/07/dr1-129.pdf. (Consultado:10/10/2012).

9 Direção Geral de Estatísticas da Educação e Ciência (DGEEC) Disponível em: http://w3.dgeec.mec.pt/dse/eef/indicadores/Indicador_3_5.asp. (Consultado: 03/04/2013).

medidas de austeridade, nomeadamente o elevado aumento de impostos sobre o trabalho e dos pensionistas e a diminuição das prestações sociais, nomeadamente do abono de família e do subsídio de desemprego afetaram as famílias portuguesas.

Um inquérito às condições de vida dos portugueses, sobre os rendimentos em 2013, realizado em 2014, cujos resultados foram divulgados pelo Instituto Nacional de Estatísticas indica que 19,5% das pessoas estavam em risco de pobreza, tendo aumentado em relação ao ano anterior (18,7% em 2012). O aumento do risco de pobreza abrangeu todos os grupos etários, tendo sido mais elevado no caso das/os menores de 18 anos, tendo neste grupo etário o risco aumentado de 24,4% em 2012, para 25,6% em 2013. Quando os agregados familiares têm crianças, o risco de pobreza aumenta para 23%, sendo que nas famílias sem dependentes o risco diminui para 15,8%. Mantem-se o aumento significativo da insuficiência de recursos da população em risco de pobreza (30,3%), com um novo agravamento do défice de recursos: 2,9 p.p. entre 2012 e 2013. 10

Um outro dado preocupante consiste no facto de que os alunos têm, em média, dois anos de atraso e deste modo têm maior probabilidade de desistir da escolaridade e abandonar a escola precocemente (Almeida 2013: 400-402 in Relatório CNE 2015:10). Em Portugal existe um programa de intervenção educativa, em escolas que apresentam um elevado insucesso escolar designado de Territórios Educativos de Intervenção Prioritári (TEIP) 11. Este programa foi regulamentado em três versões (TEIP1,TEIP2,TEIP3), no sentido de um reforço da autonomia das escolas que estão integradas em contextos particularmente desafiantes, do ponto de vista do insucesso escolar dos alunos e do meio socioeconómico desfavorável em que se inserem. A última versão (TEIP3) regulamentada pelo despacho normativo nº 20/2012, com início no ano letivo 2012-2013 permitiu a algumas escolas um contrato-programa financiado pelo Programa Operacional Potencial Humano (POPH) que “visa estabelecer condições para a promoção do sucesso educativo de todos os alunos e, em particular, das crianças e dos jovens

10 Instituto Nacional de Estatística (INE), Destaque (informação à comunicação social), 30 de Janeiro de 2015,

Rendimento e Condições de Vida (2014) (Dados Provisórios). Disponível em:

https://www.google.pt/?gfe_rd=cr&ei=ocRtVoraO4Os8weSmoHgBw&gws_rd=ssl#q=relat%C3%B3rio+sobre+ a+pobreza+em+portugal+2014+ine&btnK=Pesquisa+Google. (Consultado 09/05/2015).

11 Em Portugal, o total de alunos inscritos em escolas TEIP, no ensino básico, no ano letivo 2010/2011 foi

113.665 que corresponde a uma percentagem de 12,7%, do total de alunos inscritos, no país, no nível básico (Fonte: Relatório TEIP 2010/2011. DGE, 2011, Cit In CNE 2012:83). De acordo com o relatório mencionado, o programa tem um efeito positivo nos alunos integrados nestas unidades orgânicas, principalmente na redução do abandono escolar e do absentismo, na contenção dos fenómenos de indisciplina e na melhoria do sucesso escolar

que se encontram em territórios marcados pela pobreza e exclusão social” (op.cit.). O acesso das escolas a este programa faz-se a convite da Direção Geral da Educação (DGE) após uma análise dos indicadores de desempenho e características sociais do meio envolvente das escolas. Estes programas são importantes, no sentido de se criarem condições mais favoráveis à aprendizagem dos alunos de ambientes familiares com condições socioeconómicos desfavoráveis, com vista a uma diminuição do insucesso escolar e do abandono escolar. O trabalho de identificação dos problemas existentes nas escolas que se enquadram nestes programas deve ser exigente para se estabelecerem objetivos de melhoria exequíveis.

O Gabinete de Intervenção ao Aluno (GIA) surgiu no contexto do projeto Territórios Educativos de Intervenção Prioritária de 2ª geração (TEIP 2), no âmbito do despacho normativo nº 55/2008 de 23 de Outubro do Ministério da Educação e Ciência, como uma das respostas para se diminuir os fatores de risco de insucesso escolar dos alunos resultantes de contextos sociais debilitados em que as escolas se inserem.

Considerando-se, ainda os relatórios Eurodyce (2015) ao nível europeu e PISA OCDE (2015) constata-se que cada país tem uma política educativa particular, no que respeita à retenção escolar evidenciando ser uma matéria que tem uma influência cultural. Em Portugal, a cultura vigente no sistema de ensino, ao longo dos anos tem sido em se considerar que a retenção dos alunos é benéfica. Neste âmbito possibilita aos alunos uma consolidação das aprendizagens nas matérias, por mais um ano, bem como uma maior exigência no ensino de forma a impedir que o sistema seja permissivo.

No que respeita às implicações negativas da retenção dos alunos consideram-se os seguintes aspetos: psicológicos - a diminuição da auto-estima; problemas de comportamento - indisciplina e delinquência (Fonseca 2003; Lopes 2013:57, in Relatório CNE 2015:12); no plano social - abandono precoce da escolaridade, diminuição das expectativas de prosseguir os estudos superiores, rotulação dos alunos nas escolas, exclusão, baixa qualificação profissional e de cidadania, perpetuação da pobreza (Ribeiro et al. 2006:128, in Relatório CNE 2015:12). A retenção dos alunos nos vários níveis de ensino, particularmente no 9º ano de escolaridade, designadamente no fim do 3º ciclo do ensino básico (CITE 3, na EU e ISCED 2, na OCDE), tem consequências negativas, nomeadamente na continuidade dos

estudos para muitos jovens, comprometendo-se a frequência e a conclusão dos estudos do nível secundário e superior (Santiago et al. 2012)12.

A problemática dos alunos que pertencem a meios desfavorecidos terem mais insucesso escolar, do que os alunos que pertencem a meios mais favorecidos tem sido conceptualizada, do ponto de vista sociológico, segundo uma perspetiva das desigualdades de oportunidades das crianças e jovens no ensino. As características pessoais e sociais dos alunos repetentes, nomeadamente quanto à sua origem sociocultural e socioeconómica, sendo muitos deles provenientes de famílias carenciadas e de imigrantes, são fatores que dificultam a inclusão social destes alunos nas escolas. Deste modo, o insucesso escolar dos alunos em Portugal é um problema social, nomeadamente para os próprios alunos, famílias, comunidade educativa e sociedade, em geral.

As políticas educativas e sociais devem conceber um conjunto de medidas de descriminação positiva, como forma de atenuar as desigualdades sociais dos alunos e promover a igualdade de oportunidades no ensino. Neste âmbito, o estudo das razões ou causas do insucesso escolar e das suas consequências constitui uma matéria importante, no sentido de se adotarem medidas preventivas, nomeadamente no âmbito de programas, políticas de educação e políticas sociais.

No que respeita à influência das condições socioculturais e socioeconómicas do meio familiar dos jovens, na sua aprendizagem e insucesso escolar considera-se que o nível de instrução dos pais e as profissões que exercem (categorias profissionais agrupadas em classes sociais – alta, média, baixa) são algumas variáveis que podem estar associadas. A maneira como estas variáveis podem ser objetivadas, em estudos empíricos tem sido objeto de diversos estudos, segundo perspetivas de análise diferenciadas. Um estudo (Kellagham 1994) sobre a influência do nível de instrução e o nível socioeconómico dos pais, no insucesso escolar dos filhos

12 Santiago, P. et al. (2012), OECD Reviews of Evaluation and Assessment in Education: Portugal 2012, O relatório Pisa (OCDE 2012:32) menciona que pouco se sabe sobre as desigualdades sociais no sistema de educação em Portugal, não havendo análises sobre a performance dos estudantes em diferentes grupos, nomeadamente dos estudantes imigrantes, dos estudantes de famílias carenciadas e dos que vivem em localidades remotas. Neste âmbito preconiza a necessidade de uma maior atenção das políticas educativas à inclusão social e a equidade dos estudantes. Por outro lado refere-se, também que não existe em Portugal um sistema de avaliação dos estudantes coerente e integrado não tendo uma visibilidade dos diferentes componentes. Publishing. [Em linha] Disponível em: http://dx.doi.org/10.1787/9789264117020-en. (Consultado: 12/12/2013).

evidenciou uma pequena percentagem de variância explicada, de cerca de 10% a 15%. No entanto, outros fatores, nomeadamente a etapa de vida e de desenvolvimento dos sujeitos podem alterar estes resultados.

Segundo Desforges & Abouchaar (2003), o envolvimento dos pais, apoio parental e a educação familiar, na forma de “em casa bons pais” tem um impacto positivo no desempenho das crianças e dos jovens em contexto escolar, mesmo depois de se retirarem alguns fatores da equação.

Uma perspetiva sociológica desenvolvida nos anos 60, por Pierre Boudieu (1966), teve uma importância considerável, na explicação sobre a maneira como os fenómenos sociais são construídos socialmente. Neste âmbito, considera-se que as relações sociais podem ser objetivadas, através das posições que os indivíduos ocupam na estrutura interna de campos. No que respeita à análise das instituições considera-se que uma instituição funciona, através de processos autoativados que parecem gerar a sua própria dinâmica. Os processos permitem repor a regularidade e reproduzem a normalidade dos padrões existentes, através de recompensas ou sanções.

O estudo das perceções dos sujeitos, nomeadamente no campo educativo pode elucidar algumas das dinâmicas sociais existentes num determinado contexto ou organização. No campo cultural, sugere-se um mecanismo designado “homologia”, no sentido de se fazer uma correspondência entre a cultura e a classe social. Neste âmbito existe um padrão que caracteriza todas as formas culturais, em função da distância que ocupam relativamente à alta cultura. Neste sentido, o conceito de “habitus” permite reconhecer os espaços de ação de cada classe social, em função de determinadas disposições que são incorporadas pelos atores sociais. Por exemplo, no caso das classes populares considera-se que existe uma ausência de disposições culturais, tendo como consequência a incapacidade de produzirem julgamentos estéticos sobre um objeto. No âmbito cultural referem-se, ainda os campos de produção simbólica, segundo dois níveis: um campo dominante, num nível superior; um campo dominado, num nível inferior. No que respeita às classes sociais, também se estabelecem os mesmos campos (dominantes e dominados) considerando-se no campo superior, a alta burguesia e no campo inferior, as classes populares.

Esta teorização foi concebida, tendo em conta a ideia de que as sociedades contemporâneas são diferenciadas e que os seus membros estão distribuídos em campos. No que respeita ao campo económico, os indivíduos situam-se em diferentes classes sociais, no campo cultural pertencem a diferentes campos de produção simbólica. Um dos contributos positivos desta teoria consiste numa explicação acerca de uma diferenciação cultural e económica entre os grupos sociais, nomeadamente em dois níveis diferenciados da estrutura social (dominantes e dominados). No entanto, teve algumas críticas, relativamente a se conceber um certo determinismo das relações de classe, como sendo exclusivas das relações sociais, ignorando- se as ações estratégicas que os indivíduos desenvolvem, no sentido de mudar as suas condições de existência (Monteiro 1991).

No domínio educativo, o conceito de “habitus” é utilizado para reforçar a ideia, de que os pais têm diferentes conceções acerca da escola e da educação dos filhos e valorizam a aprendizagem escolar, segundo as posições que ocupam na estrutura social. Neste âmbito considera-se que quando os filhos de famílias desfavorecidas ingressam no ensino básico apresentam várias desvantagens, do ponto de vista cultural, social e económico, em relação aos filhos de famílias de níveis superiores.

Nos anos setenta, Bourdieu e Passeron (1970) demonstraram, através de vários estudos em França que o êxito escolar das crianças e dos jovens depende, em grande parte da familiaridade que têm com a cultura letrada, sendo esta referenciada pela cultura das classes dominantes e que o nível de escolaridade atingido pelos pais está mais fortemente e estatisticamente associado com o êxito escolar, do que com o nível socioeconómico das famílias (Benavente 1976: 24).

Uma outra teoria sobre o insucesso escolar, de cariz sociológica, do «handicap» sociocultural preconiza que o insucesso escolar dos alunos é justificado pela sua pertença social, pela maior ou menor bagagem cultural de que dispõem quando entram para a escola (Benavente 1990:716). A partir dos anos 70 houve um interesse sociológico pelos fatores institucionais, do funcionamento da organização escolar, no que respeita ao insucesso escolar. A corrente socioinstitucional sublinha a necessidade de diferenciação pedagógica pondo em evidência o carácter activo da escola na produção do insucesso; este é visto como o resultado de uma relação quotidiana entre as práticas escolares e os alunos de culturas não letradas.

Uma outra tese tem reforçado a ideia, segundo a qual existe uma relação entre a origem social das crianças e dos jovens e o insucesso escolar, através do seu desenvolvimento intelectual. No entanto, esta explicação não tem sido considerada satisfatória, na medida em que segundo Forquin (1982) quando o nível intelectual dos sujeitos é semelhante, permanecem as desigualdades no sucesso escolar dos alunos, considerando-se a origem social.

Um outro fator que tem sido considerado, nesta problemática, diz respeito à linguagem utilizada na interação entre os pais e os filhos de diferentes classes sociais. Na teoria desenvolvida por Bernstein refere-se, a este propósito que existem dois tipos de linguagem:

elaborada ou formal vulgarmente utilizada pela classe média; linguagem popular utilizada

pelas famílias de classes sociais desfavorecidas (Benavente 1976:25). Esta teoria tem sido objeto de várias críticas, nomeadamente por considerar como causa do problema do insucesso escolar das crianças e jovens o meio sociocultural e socioeconómico das famílias.

Num estudo sobre o insucesso escolar, no ensino primário (op. cit:19) defende-se que nesta problemática se devem ter em conta três realidades diferenciadas: o meio social, a criança e a