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CAPÍTULO II Os Principais Conceitos da Investigação

8. O Bullying: conceitos, especificidades e caracterização do fenómeno

8.4 Intervenção social e políticas públicas no combate ao bullying

A identificação de um comportamento de bullying não é uma tarefa fácil por diversos motivos, nomeadamente porque as crianças e os jovens gostam de brincar uns com os outros e até de um certo desafio e experimentação nas relações sociais com o(s) outro(s). Na infância e na adolescência, os jogos e brincadeiras individuais ou em grupo são uma forma de aprendizagem relacional, indispensável à vida social. Deste modo, um desafio, um jogo, uma luta entre os alunos necessita de um enquadramento social, nomeadamente no contexto em que ocorrem essas atitudes, situações e relações. Segundo Olweus (1996) dizemos que um aluno está sendo intimidado quando outro aluno, ou um grupo de alunos, dizem ou fazem coisas desagradáveis para ele ou ela. Também é bullying quando um estudante é provocado, repetidamente, de uma forma que ele ou ela não gosta ou quando ele ou ela é deliberadamente deixado de fora das coisas. Mas não é bullying quando dois estudantes que têm aproximadamente a mesma força ou poder argumentam ou lutam. Também não é bullying quando um estudante é provocado de uma forma amigável e na brincadeira,Olweus (1996).

Estes comportamentos podem ocorrer em vários contextos, nomeadamente nas salas de aula, nos recreios, nos blaneários, nos corredores e nas casas de banho. Nem sempre um adulto poderá estar presente, sendo que muitas vezes têm que se ouvir as partes em conflito e as testemunhas que tenham presenciado a(s) situação(ões). Quando os comportamentos de

bullying ocorrem na sala de aula, sobre a supervisão dos professores é necessário observar a

situação com alguma cautela. Neste âmbito, sugerem-se algumas medidas de intervenção primária e alguns procedimentos a adotar pelos professores e outros educadores, nas situações de bullying tais como: saber quem iniciou a agressão e quem foi agredido; perceber se a agressão envolve dois alunos ou mais; verificar se o problema teve origem nesse contexto ou é uma continuação de um relacionamento que tenha começado noutro local; compreender se o conflito surgiu pela primeira vez ou se já se repetiu noutras alturas e neste caso, quantas vezes ocorreu e durante quanto tempo; deve-se, também procurar uma motivação do comportamento agressivo, nomeadamente se é um conflito cultural, entre diferentes classes sociais, se existe na relação algum estigma ou preconceito negativo; diagnosticar se o agressor é potencialmente problemático e deve ser encaminhado para os técnicos de apoio social, psicólogos e outras entidades ou se é uma situação pontual e que pode ser reparada na altura;

delinear uma estratégia de comunicação com os encarregados de educação; procurar o apoio de outras pessoas da comunidade educativa, no sentido de se prevenir os comportamentos de

bullying dos alunos no futuro, entre outros aspetos.

Um estudo americano sobre as práticas de prevenção dos comportamentos de violência escolar e dos serviços de saúde mental nas escolas (Cawood 2010), foi realizado através de um inquérito online preenchido por 250 trabalhadores de Serviço Social, tendo a maioria um grau superior de mestrado. Os trabalhadores sociais responderam às questões relacionadas com as capacidades práticas, os programas de prevenção da violência escolar, o ambiente escolar, e as barreiras na implementação dos programas. Os trabalhadores identificaram algumas falhas nas práticas de prevenção que se devem, quase exclusivamente, aos aspetos académicos e falta de tempo para se implementarem as intervenções. As recomendações e os resultados tiveram uma influência nos programas e políticas desenvolvidos pelo Estado, nas escolas e universidades com vista à disseminação e uso de programas de prevenção da violência escolar.

O Estado, nomeadamente o Ministério da Educação e Ciência, as escolas, os professores e as famílias, têm uma responsabilidade direta na prevenção e resolução do bullying. Sendo os responsáveis pela educação das crianças e dos jovens, devem garantir o respeito pelos seus direitos fundamentais. Um exemplo a ser seguido, à semelhança de outros países ocidentais e orientais, consiste no apoio do Ministério da Educação e Ciência a investigações sobre os fenómenos de violência escolar e bullying. O apoio estatal é importante na implementação de medidas de intervenção política para se promover a aprendizagem dos jovens em segurança, o bem-estar das pessoas e um bom ambiente nas escolas.

A intervenção e prevenção dos comportamentos de bullying pode ser feita através de suporte de pares “peer support”. Num projeto desenvolvido por vários países europeus e não- europeus, nomeadamente a Holanda, Inglaterra e o Japão verificou-se que uma grande parte dos estudantes numa turma tinham atitudes negativas para com o bullying e sentiam vontade de ajudar os colegas que eram vítimas desses comportamentos (Murray-Harvey et al. 2010: 10). A intervenção de suporte de pares é uma estratégia de apoio e prevenção adotada nas escolas em vários países, nomeadamente na Austrália, Japão e Coreia (op. cit: 38).

Neste estudo acerca das perceções de alunos e professores sobre a indisciplina e violência escolar privilegiou-se uma perspetiva de análise deste problema, mais centrada nas opiniões expressas pelos intervenientes no processo educativo (Mayer & Leone 1999). Neste sentido procura-se averiguar a existência do problema, quantificá-lo e identificar, tanto ao nível teórico, como empírico as significações e as representações dos principais atores envolvidos no processo educativo nas escolas.

A prevenção precoce da violência escolar tem sido reconhecida como útil, por muitos países, tanto europeus, como não-europeus. Neste âmbito considera-se que estes programas devem começar no ensino pré-escolar e primário, podendo ter diversas formas, ideologias e metodologias. O ensino de competências emocionais, a educação para os valores e para a cidadania, a atenção na aprendizagem dos alunos, a relação com as famílias e com a comunidade local, são apenas algumas variáveis que se consideram em vários países. No entanto, as diferentes iniciativas de prevenção da violência escolar e de programas de intervenção atingem números surpreendentes na ordem das centenas, em muitos países como por exemplo no Quebéc (Blomart 2002:45).

Um programa de competências pró-sociais, nomeadamente de treino de crianças e professores decorreu em duas escolas primárias de Bruxelas durante dois anos. Este programa foi bem recebido pelas escolas, no entanto teve algumas dificuldades de continuidade, na medida em que os professores não assumiram sozinhos dar continuidade ao projeto. Os resultados alcançados, durante este tempo foram positivos, nomeadamente na adoção de comportamentos mais sociáveis entre os alunos e com os professores. No entanto, para se conseguir um resultado mais eficaz, salienta-se a necessidade de dar continuidade ao programa, no sentido de haver uma maior interiorização dos comportamentos de cooperação e de tolerância nas relações sociais. Este programa evidenciou a importância das interações sociais entre os professores e os alunos, no sentido de um maior diálogo, abertura, escuta “do outro” tendo implicações significativas nos comportamentos dos alunos, traduzindo-se em menor agressividade. Existem algumas dificuldades, por parte das escolas em assumirem uma mudança nas relações sociais que se projete no futuro, por diversas razões. Para que tal fosse possível era necessário que os programas fossem integrados nos currículos do ensino e neste sentido, os obstáculos são reais.

A violência em geral e a violência escolar, em particular pode ser equacionada como um problema de saúde mental, nomeadamente dos jovens. Alguns países europeus têm adotado programas de intervenção neste domínio, numa articulação entre os vários ministérios. Em Portugal, o Ministério da Educação e Ciência desenvolve alguns programas com outros ministérios, nomeadamente o Ministério da Saúde. O Plano Nacional de Saúde Mental (2007- 2016) aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros nº 49/2008 de 6 de Março, refere que “os problemas de saúde mental constituem, atualmente a principal causa de incapacidade e uma das mais importantes causas de morbilidade nas nossas sociedades”.31 Neste âmbito, o desenvolvimento de políticas públicas, nomeadamente de saúde dos jovens é um aspeto essencial para o seu bem-estar e das instituições.