• Nenhum resultado encontrado

PRIMEIRA PARTE

8.1 O Islã na atualidade

A noção econômica direcionada ao bem-estar social passa ser a tônica entre os grupos islâmicos. Assim, após a Segunda Guerra Mundial, quase todos os países de maioria muçulmana ficaram independentes da dominação estrangeira, graças aos sentimentos religiosos da grande massa popular que realizou batalhas em nome do Islã, constituindo-se no principal motivo de êxito.

Se evocarmos os legados independentes, veremos que a vigência da política européia no Oriente Médio foi intensa, e que o contexto da situação histórica postulava a necessidade de desafiar e romper com o esquema que tomou a liberdade e apagou o caráter legal da juridicidade islâmica. O registro dominante da França vai se quebrar na Síria e Líbano em 1946, no Marrocos em 1956, na Tunísia em 1956 e na Argélia em 1962. Basicamente, o domínio inglês é expulso do Egito em 1956; do Iêmen em 1967, e a Itália, da Líbia em 1951, além de outros. Eles contam com inúmeros problemas, mas os princípios religiosos foram duramente mantidos no seio coletivo, que não dispensou a doutrina e nutre, com muitos sacrifícios, a prática da Shari’ah Al Islamia na atualidade.

“De acordo com um porta-voz da comunidade muçulmana européia, houve uma explosão no número de muçulmanos que mandam seus filhos a escolas corânicas, em tempo integral ou de meio período. Muitos muçulmanos emigraram, por razões materiais, mas hoje reconhecem que isso não é suficiente. Estão preenchendo a lacuna religiosa e cultural”(212).

A reconstituição islâmica alcança, em primeiro lugar, volta da Shari’ah Al Islamia, (até a presente data não efetivada em todas as nações de maioria muçulmana), e por conseguinte, o retorno do Islã primitivo.

Esse fato motivou, por parte de alguns governantes ligados às forças imperialistas, repressão e o descaso pelas reivindicações das populações, tornando-se insensíveis à idéia de compartilhar, com o povo, o exercício da esfera religiosa em todas as relações internas e externas do Estado. No dizer de Aliman Abul A’la Maududi: “infelizmente, faltam a essas pessoas a necessária educação e preparo para exercerem um governo e uma administração eficiente nas condições atuais”(213).

Daí, estarem completamente desgastados os governos da Turquia e da Argélia e, ______

(212) Ahmad O’há: Organizações islâmicas. Voz do Islam. Brasília: CIB. Volume II, número 2, 1997, p.33.

enquanto lutam, os muçulmanos permanecem sem confiança nas autoridades governamentais que, como respostas, procuram diminuir a propagação dos grupos, tentando por todos os meios conduzi-los à degenerescência, permitindo a entrada de hábitos contrários aos princípios religiosos no país.

Cenas de violência e crueldade são repetidas, quase que diariamente, pelo exército paramilitar argelino, que trucidou centenas de grupos muçulmanos, golpeando, inclusive, mulheres, crianças e velhos. Segundo analistas locais sempre depois das chacinas, propaga como se fossem “atos dos grupos fundamentalistas”. A expressão refere-se a qualquer corrente religiosa que simbolize, “pela intolerância,” reação às mudanças nas fontes religiosas. Na realidade, o que aparece é a manifestação da mídia ocidental, repugnando a conduta dos muçulmanos, levando ao mundo uma imagem contrária ao bom senso e à verdade dos fatos. Mesmo com a representação de sangue, com que querem desintegrar as associações muçulmanas, o Islã é a religião que mais cresce na atualidade com um percentual de mais 16% ao ano.

Como definir a atração que o Islã exerce sobre a humanidade? As tentativas para desislamizar os povos do Oriente Médio há muito são promovidas. Em 1922, o governo turco de Mustafá Kamal Atatur dava péssimo exemplo de intransigência, mudando a lei, e renovando os costumes. Obrigou as pessoas, particularmente os homens, a cobrirem as cabeças com chapéu ocidental. Como não haviam estoques suficientes, “foram importados lotes rejeitados da Europa”(214). Por não concordarem com a mudança de hábito, milhares de muçulmanos foram assassinados.

Essa mesma Turquia, que conta com a maioria da população islâmica (com grande número de curdos), impõe inúmeras restrições, inclusive, às mulheres e às crianças, forçando ao máximo o povo a renegar a religião.

De maneira geral, o muçulmano perdeu a sua “identidade civil” com a repartição do império osmanita, fazendo com que emigrasse a outras nações. Apesar dos acontecimentos, tem conseguido, diante dos infortúnios, demonstrar, perante a ótica dos antagonistas, que o Islã não é simplesmente uma ideologia, mas um movimento religioso de ordem política e sócio-cultural que corrobora com a esperança de todos os povos.

A extensão das reivindicações políticas inerentes à humanidade, as quais o Islã realça no bojo jurídico da Shari’ah, favoreceu a rápida evolução da religião na atualidade, com vigoroso impulso entre as populações que condenam as fórmulas explorativas.

Há de se dizer, também, que os traumatismos das explorações históricas assinaladas ofereceram argumentos e instrumentação de defesa contra novas tentativas de ocupação ocidental, inspirando jovens do mundo inteiro a procurar conhecer de perto a força propulsora dos grupos culturais religiosos islâmicos, que lutam contra o falso slogan da “sombría esterilidad del Islam y la indolencia de las masas musulmanas”(215).

“Afastam-se o mais possível da “ciência ímpia” do Ocidente, insistindo em que todas as “boas ciências” provêm dos muçulmanos de séculos atrás”(216).

A partir desse entendimento, vislumbra-se, no mundo, o pensamento religioso e

______

(214) Idem, p. 58.

(215) Ali Merad: El Islam contemporáneo. México: Fondo de Cultura Económica, 1988, p. 103. (216) Ahamad O’há (nota 212), p. 35.

jurídico islâmico, revitalizado no interior das comunidades pela força tradicional. A manutenção à fidelidade da pureza religiosa formulou adeptos em muitas regiões longínquas da Arábia que condenam qualquer inclusão reformista, por acreditarem que a Shari’ah Al Islamia é o conjunto de deveres do homem para com Alá.

Na verdade, como o homem pode reformular o que lhe foi preceituado pelo Senhor do universo? Entendemos que qualquer modificação perde o vínculo com o sagrado. De Mohammad (S.A.A.W.S.), até nossos dias, Alá não enviou nenhum mensageiro para transmitir ao mundo alteração no texto islâmico, que foi o último a ser revelado. Logo, compreende-se que a Shari’ah Al Islamia é uma lei completa, ou seja, não há poder constituinte derivado ou de reforma, no Islã.

Por outro lado, os deveres de um ser para com outro apresentam-se em razão das relações recíprocas e da sua natureza. Na relação com Alá, o crente inspira-se na revelação e nas luzes da fé. Como contestar esta legitimidade ou manifestar a reforma de culto, abraçando realidades que não condizem com a moralidade religiosa? O corpo, que é parte essencial do ser humano, deve tributar a Alá o reconhecimento do seu domínio no mundo e proclamar a sua gloriosa eternidade.

Podemos concluir que os testemunhos reformistas contradizem a consciência religiosa, significando, em primeiro lugar, que essas pessoas não respeitaram a providência e o governo de Alá sobre o mundo e mais, a Shari’ah Al Islamia, por ser um engajamento completo, é totalmente conciliável com a modernidade.

A autenticidade da Shari’ah Al Islamia é um dos pontos fundamentais da propagação religiosa. A partir dessa apreciação, os muçulmanos árabes querem extinguir uma complexa forma, na qual se distingue do Islã tradicional o mundo muçulmano ainda com seqüelas do colonialismo.

Com efeito, a performance islâmica tem encontrado, apesar dos constantes bombardeamentos jornalísticos, expressivo desenvolvimento. Ela afirma a identificação progressista através da legislação, não separa o mundo de Alá e desperta no homem o progresso por meio do seu trabalho.

Para os ulemas, a doutrina islâmica não é quimérica. Numa época em que a incredulidade domina as pessoas, a ordem fundamental islâmica cresce, defendendo os princípios naturais, segundo os quais o homem foi criado. A modernização, que compreende mudança na sociedade, tem sido, em diversos aspectos, um processo destrutivo: “não somente foram destruídos governos, classes dominantes e sistemas de conhecimento e crenças, mas também instituições sociais, valores pessoais bem como, freqüentemente, a segurança psicológica do indivíduo tem sido minada”(217).

As elites modernas e ambiciosas, que desenvolveram um processo acelerado de transformação nos setores econômicos, destruíram os valores tradicionais. Com isso, as grandes sociedades deparam-se com sérios problemas.

Afastando o desvalor que alguns querem dar ao tradicional, os cientistas sociais da moderna sociedade islâmica têm-se preocupado com o processo de mudança, protegendo os valores da Shari’ah. Esse resguardo tem permitido que a cultura ocidental visualize a estabilidade e a adaptação à modernização, sem romper com os laços dos antepassados, que constituem a afirmação de um futuro promissor. O vácuo religioso em que se encontra ______

(217) H. S. Shafiuddin: O Islam e a modernização. Voz do Islam Brasília: CIB. Número 2, abril, 1985, p. 45.

a Europa, permitiu a especulação face à doutrina islâmica, e milhões de pessoas, cansadas do materialismo, estão professando a fé islâmica e outras centenas, diariamente, procuram as mesquitas para se inteirar a respeito da doutrina.

Evidentemente que o capitalismo moderno, que apressou a mudança social, dispensou os padrões tradicionais que revestiam e davam graciosidade à sociedade européia. Rompendo com as forças espirituais, desestabilizou as consciências religiosas que, gradativamente, passaram a reconhecer na estrutura religiosa islâmica, a recuperação da capacidade espiritual perdida.

É, então, errôneo pensar que a Shari’ah inibe a modernização para manter a sua perpetuidade. Gradativamente, tem elevado os padrões de vida à atualidade, sem conflitar com a tradição. Esta organização se deve aos ulemas, que adicionam à reforma a necessidade de manter o povo espiritualmente fortalecido, auxiliando-se mutuamente. Nessa disposição, a expansão continua, contrariando toda divulgação antiislâmica amplamente usada. A opressão da mídia enriquece o civismo muçulmano. É o que mostraremos no capítulo seguinte.