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INTRODUÇÃO: Se considerarmos que é através da linguagem que somos capazes de interagir socialmente, com o outro e com o mundo que nos rodeia, diferentes possibilidades de comunicação emergem. Valiosas formas de linguagem como a linguagem corporal, a linguagem gestual, símbolos ou imagens como os utilizados na Comunicação Suplementar e/ou Alternativa (CSA), que não dependem de língua oral, surgem como recursos lingüísticos facilitadores da comunicação. Justifica-se a escolha da temática da CSA devido a resistências dos pais ao uso da prancha de CSA na interação com seus filhos, seja por falta de conhecimento do recurso ou por relatarem “saber” o que seus filhos desejam apenas pelo olhar e que estabelecem um “jeito” particular de se comunicar. A pesquisa tem por objetivo analisar fatores favoráveis e desfavoráveis ao uso da comunicação Suplementar e/ou Alternativa (CSA) no contexto familiar, enfocando a prancha de CSA, por ser o único recurso utilizado pelos alunos da escola especial, onde foi realizada a coleta de dados. Esse estudo, baseou-se no pressuposto de que o sujeito é sócio-historicamente constituído e a linguagem é responsável por tal constituição e que a participação da família é fundamental no acesso e no uso dos recursos da CSA, pela criança.

COMUNICAÇÃO SUPLEMENTAR E OU ALTERNATIVA: A Fonoaudiologia vem utilizando os recursos da CSA para proporcionar maior autonomia a pessoas com limitações significativas da linguagem oral. Segundo Chun (2002), o uso dos recursos da CSA vem lentamente se expandindo no Brasil, mas ainda não constitui prática de amplo conhecimento na área da Fonoaudiologia, sendo ainda pouco explorado e difundido em nosso país. Recorrendo à definição de Panhan (2001):

A Comunicação suplementar e alternativa pode ser definida como um conjunto de instrumentos que permitam a “fala” não- oralizada, fala dita no “apontar” dos sinais gráficos. A CSA reúne material gráfico, entre eles conjuntos de sinais gráficos (PCS, BLISS, PIC etc.), desenhos, fotos, palavra escrita, alfabeto e ainda compreende uma série de estratégias na elaboração e acesso aos sinais gráficos dispostos em pranchas de comunicação.

O uso da CSA como recurso expressivo na escola facilita o processo de aprendizagem do aluno sem fala articulada. Permite que esse aluno se torne locutor, participador ativo do processo de aprendizagem. Nesse quadro, a

Figura 1: Pranchas de comunicação adotadas na Escola Especial Vivian Marçal em Curitiba

Foto: Simone Krüger

CSA se coloca como um instrumento significativo para a inclusão escolar e social, pois propicia a sujeitos com graves comprometimentos de fala a tão almejada inclusão escolar. Usando os recursos da CSA na sala de aula, essas pessoas passam de espectadores a “falantes do apontar” no caso de usuários de pranchas de comunicação não computadorizadas e “falantes do mostrar”, no caso de usuários que utilizam displays de diferentes tipos de computadores e/ou vocalizadores. Além de torná-los participantes, os recursos da CSA proporcionam melhoras na interação do aluno não falante com o professor e demais alunos, pois esses passam a expressar suas opiniões e a realizar escolhas em sala de aula. Através do uso dos recursos da CSA, o professor é capaz de elaborar estratégias educativas, pois passa a confeccionar materiais que favorecem o ensino do aluno que não fala.

FUNDAMENTOS ACERCA DA LINGUAGEM E A IMPORTÂNCIA DA PARTICIPAÇÃO DA FAMÍLIA NO PROCESSO DE APROPRIAÇÃO DA LINGUAGEM: Adotou-se para este estudo a perspectiva sócio-histórica, partindo-se do pressuposto de que a linguagem é dialógica por natureza e constitutiva das relações sociais, do mundo e dos sujeitos em suas diferentes dimensões, quanto da ênfase atribuída ao outro, nos processos de apropriação da linguagem. “Eu não posso me arranjar sem o outro, eu não posso me tornar eu mesmo sem um outro: eu tenho de me encontrar num outro por encontrar um outro em

mim” (BAKHTIN,1961, p.287). A fim de compreender as práticas dialógicas entre os familiares e usuários de CSA, o quadro teórico de Bakhtin (1997) é considerado no presente estudo. Mikhail Bahktin define uma pessoa como resultado de relações sócio-históricas, sendo estas responsáveis pela formação da linguagem, e essas relações dialógicas responsáveis pela constituição da linguagem. Como o desenvolvimento social e cognitivo depende da comunicação e da linguagem e essas são moldadas por episódios sócio-históricos, a família é um dos primeiros grupos sociais responsáveis pela apropriação da linguagem. Os familiares têm uma missão importante na seleção de sistemas de CSA e também na escolha dos símbolos pictóricos mais necessários (Figura 1) para a comunicação, porque na

maioria das vezes é nas interações verbais que ocorrem na família que a língua é apropriada (PERRONI, 1992). Os pais devem ser considerados como as pessoas- chave, com quem a criança irá estabelecer os seus primeiros contatos.

MATERIAL E MÉTODO: Foi realizada uma pesquisa de campo, cuja amostra intencional se constitui de 20 pais de crianças inseridas em uma escola especial de Curitiba, destinada a indivíduos com deficiências motoras e múltiplas e é a principal instituição educativa em Curitiba e sua Região Metropolitana que aplica a CSA. As famílias escolhidas para o estudo de campo têm seus filhos utilizando CSA na escola. Dois grupos de pais foram definidos: o Grupo G1, composto por 9 sujeitos que utilizam CSA no contexto familiar e o Grupo G2, com 11 sujeitos que não a utilizam. O instrumento de coleta de dados baseou-se no uso de questionários semi-estruturados em torno de questões identificando fatores que interferem no uso e no não- uso da prancha de CSA pelos entrevistados. Quanto à caracterização dos sujeitos, 50% dos pais se encontram na faixa de renda familiar de 1 a 3 salários mínimos, 45% de 3 a 5 salários mínimos e 5% acima de 5 salários mínimos. Quanto ao grau de escolaridade, 5/9 mães do G1 apresentaram o segundo grau completo, enquanto 7/11 mães do G2 apresentaram o primeiro grau incompleto. A situação escolar dos pais apresentou-se mais heterogênea. Para análise dos dados, adotou-se para a análise qualitativa a metodologia denominada

Discurso do Sujeito Coletivo (LEFEVRE e LEFEVRE, 2005), que consiste em analisar o discurso a partir da seleção das figuras metodológicas que são as expressões- chave e idéias-centrais extraídas de cada discurso. Para análise quantitativa, utilizou-se o programa estatístico Sphinx, que facilitou a organização dos dados coletados em tabelas e gráficos.

RESULTADOS E ANÁLISE: Os resultados apontaram para o seguinte:

- Quanto à finalidade do uso da prancha de CSA na escola: 5/9 pais do G1 afirmaram que a prancha serve para que seus filhos possam se expressar melhor, facilitando sua compreensão. 3/11 pais do G2 afirmaram que serve para que seus filhos possam se comunicar com pessoas fora do núcleo familiar, bem como 3/11 pais afirmaram que serve para que seus filhos possam conversar na escola.

- Quanto às razões da contribuição do uso da prancha: 5/11 pais do G1 afirmaram que a prancha permite que seus filhos se coloquem; 4/8 pais do G2 afirmaram que a prancha permite maior compreensão de seus filhos, sendo que 4/11 pais do G2 não referiram qualquer contribuição.

- Ambos os pais dos dois grupos tiveram preparo acerca da CSA, sendo que 8/9 pais do G1 tiveram mais de uma vez e 9/11 pais do G2 apenas uma vez.

- Leituras acerca da CSA: de todos, apenas um pai do G2 as realizou.

familiar: 4/9 pais do G1 relataram que usam para que seus filhos se coloquem melhor e 4/9 relataram que usam para compreender melhor seus filhos.

- Situações de uso no contexto familiar: 7/9 pais do G1 relataram que usam para conversar, dialogar com seus filhos.

- Motivos do não-uso da prancha de CSA: 5/11 pais do G2 relataram primeiramente que não usam por entenderem bem seus filhos. Em segundo lugar, 4/11 não usam devido à falta de tempo.

- Tentativa de uso: 10/11 dos pais do G2 tentaram usar em casa, mas 2/11 desistiram, afirmando que entendem melhor seus filhos sem a prancha. 1/11 desistiram, devido à falta de tempo em usar a prancha; 1/11 devido à falta de funcionalidade da prancha; 1/11 devido à resistência do uso por parte do filho; 1/11 devido à dificuldade motora do filho. 2/11 continuam tentando sem resultados e 2/11 tentam sempre nas férias. - Interesse dos pais do grupo G2 no uso futuro: 5/11 pais do G2 afirmaram ter interesse em usar para que possam compreender melhor seus filhos; 2/11 pais para que os outros possam compreender seus filhos e também 2/11 para melhorar o aprendizado escolar. - Impacto da situação econômica e da escolaridade dos pais no uso da CSA: no cruzamento entre renda versus uso/não-uso da CSA há uma tendência de uso da CSA conforme o aumento da renda familiar. Igualmente, no cruzamento entre escolaridade dos pais versus uso/ não-uso da CSA, há uma tendência de uso da CSA

entre os pais com maior grau de escolaridade.

Análise qualitativa: Foram identificados os seguintes aspectos favoráveis ao uso da CSA no contexto familiar: • frequência de preparo dos pais para o uso da CSA; • reconhecimento da CSA como recurso lingüístico; • reconhecimento da dificuldade de interpretar e atribuir sentido às manifestações de linguagem; • entendimento de que a CSA favorece o desenvolvimento da oralidade;

• uso da CSA para atendimento das necessidades básicas;

• uso da CSA para facilitar as interações fora do contexto familiar.

Os aspectos desfavoráveis ao uso foram os seguintes: • os pais alegam compreender seus filhos sem necessidade do uso da CSA;

• a CSA não atende às expectativas dos pais; • falta auxílio e preparo para o uso da CSA;

• os pais e usuários restringem o uso da CSA à função escolar;

• os pais apontam para dificuldades e limitações motoras de seus filhos;

• há falta de tempo por parte dos pais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS: Considera-se com esse estudo a importância de fortalecer o entendimento da CSA como um recurso lingüístico mediador das interações a partir da qual o usuário e seus interlocutores ampliam possibilidades de significar/interpretar a e pela linguagem. Aponta-se para uma perspectiva de

trabalhar com famílias que potencialize sua condição de cuidadores de seus filhos, especialmente no que se refere às formas de participação nos processos de apropriação da linguagem. Evidencia-se a importância de um trabalho multidisciplinar que ofereça elementos teórico-práticos que auxiliem o uso efetivo da CSA no contexto familiar. Afirma-se a necessidade de estudos

e intervenções que democratizem recursos alternativos de linguagem, viabilizando desta forma modos de participação social com maior autonomia.

Palavras-chave: comunicação suplementar e/ou alternativa; inclusão escolar; discurso do sujeito coletivo; linguagem.

REFERÊNCIAS

BAKHTIN, M. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 1997.

BAKHTIN, M. Para uma releitura do livro sobre Dostoiéviski. In: Problens of Dostoevsky´s poetics. Appendix II, 1961,p.287.

LEFÈVRE, F.; LEFÈVRE, C. M. A. Discurso do sujeito coletivo: um novo enfoque em pesquisa qualitativa. Caxias do Sul, RS: Educs, 2005.

PANHAN, H. M. S. Fonoaudiologia e Comunicação Suplementar e Alternativa - método clínico em questão. Dissertação (Mestrado em Distúrbios da Comunicação) Pontifícia Universidade Católica, São Paulo, 2001.

DESENVOLVIMENTO DE APLICAÇÕES TECNOLÓGICAS PARA GRÃOS DE