• Nenhum resultado encontrado

MANUAIS DE REDAÇÃO: UM OLHAR SOBRE AS ESTRATÉGIAS DE OBJETIVAÇÃO E SUBJETIVAÇÃO NO JORNALISMO

INTRODUÇÃO DA PARTE 1 EM BUSCA DA IDENTIDADE TEÓRICA

A TRILHA DA EMOÇÃO, ESTRATÉGIAS DE SUBJETIVAÇÃO

1.4 MANUAIS DE REDAÇÃO: UM OLHAR SOBRE AS ESTRATÉGIAS DE OBJETIVAÇÃO E SUBJETIVAÇÃO NO JORNALISMO

Dicas importantes sobre como atingir tantas façanhas estratégicas de objetivação e subjetivação com o texto noticioso estão explicitadas nos Manuais de Redação e Estilo, fonte importante para quem deseja decifrar as estratégias narrativas do jornalismo contemporâneo. Ao fornecer orientações para os jornalistas, os Manuais explicitam a dimensão estratégica do texto noticioso. Evidentemente não são publicações acadêmicas, não contêm um víeis reflexivo, mas são fontes importantes para mostrar que a teoria não divaga e está baseada no concreto do fazer redacional - nas matérias examinadas na pesquisa da Tese várias dessas regras manualísticas ficam evidentes nas reportagens assinadas pelos dois mestres da escrita.

Chaparro já destacara em Pragmática do Jornalismo (2007) a importância dos manuais na definição de um ambiente cultural próprio em cada redação. Em suas palavras,

“os manuais normativas acabam dando substância à pragmáticas particulares que, além de motivar as intenções jornalísticas alcançam comportamentos e propósitos de fontes e leitores” (p.109).

Boa parte dessas regras manualistas escancaram pretensões sedutoras, caso do Manual

de Redação da Abril (1990), deliciosamente escrito pelo jornalista Carlos Maranhão, para

quem “perder um leitor” é uma tragédia e a melhor maneira de evitá-la é cumprindo os ensinamentos do Rei do País das Maravilhas: “começar pelo começo, ir até o fim e parar” (p.11). Os textos, segundo Maranhão, devem ser bem escritos, atraentes e legíveis:

Tudo o que for impresso – da reportagem de capa à menor nota de serviço – precisará apresentar quatro qualidades básicas: clareza, precisão, bom gosto e simplicidade (...) sempre recordando, como diz Voltaire, que uma única palavra fora do lugar, estraga o pensamento mais bonito (MARANHÃO, 1990, p.11-15).

Não cabe aqui discutir se as publicações da Abril cumprem os manuais da Abril. Nossa intenção, a seguir, é apenas comprovar que as empresas jornalísticas reconhecem que o narrativas das matérias está amparada em estratégias narrativas de objetivação e subjetivação. Examinamos alguns dos manuais dos principais veículos impressos brasileiros. As observações da autora da Tese estão em negrito. Os textos retirados dos manuais estão como citação, devidamente creditados. A ordem dos verbetes foi escolhida a partir da ordem hierárquica de leitura da imprensa: manchete-foto-título-olho-legenda-texto (MARANHÃO, 1990).

Títulos fortes e olhos impressionistas: o início do flerte é emocional. A titulação tem que impressionar, roubar o olhar, surpreender e informar.

Eles formam um único conjunto. Quando bom, um leva ao outro. O título é a chave. Para funcionar, precisa ter impacto. Sem impacto, não chamará a atenção. Sem chamar a atenção, será inútil. Procure construir seu título com curtas e poucas palavras (EDITORA ABRIL,1990, p. 22).

Abertura forte e concisa: primeiro efeito de real. Se o leitor não gostar, abandona o texto. O lead deve informar, impressionar e empurrar para o resto da noticia.

A abertura segue uma lei inviolável: deve agarrar o leitor na hora. Em qualquer texto – reportagem, relatório ou carta de amor – o mais importante é o primeiro parágrafo. No primeiro parágrafo, a primeira frase. Na primeira frase, as primeiras palavras. Se você começar dizendo que vai ensinar o leitor a enriquecer – e disser isso bem -, é quase certo que ele irá acompanha-lo com interesse. Mas se você fizer a mesma promessa com jargões, clichês, linguagem torturada ou termos obscuros, ele virará página ou deixará a revista de lado (...) É antiga, utilíssima e insuperada a regra de que o lead – ou pelo menos a parte inicial de uma matéria – deve incluir os indispensáveis o que, quem, quando, como e por que (EDITORA ABRIL,1990, p. 26).

Sublead sem floreio nem rodeio: a atração já não é suficiente. O segundo parágrafo tem que ter conteúdo, argumento e clareza nas ideias.

Adote como norma a ordem direta, por ser aquela que conduz mais facilmente o leitor à essência da notícia. Dispense os detalhes irrelevantes e vá diretamente ao que interessa, sem rodeios. A simplicidade do texto não implica necessariamente repetição de formas e frases desgastadas, uso exagerado da voz passiva (será

iniciado, será realizado), pobreza vocabular, etc. (O ESTADO DE SÃO PAULO.,

1997, p.15, grifo do autor).

Frases objetivas: O leitor não deve fazer grandes esforços para entender o texto jornalístico. Períodos curtos ritmizam o texto e facilitam a leitura.

Seja claro, preciso, direto, objetivo e conciso. Use frases curtas e evite intercalações excessivas ou ordens inversas desnecessárias. Não é justo exigir que o leitor faça complicados exercícios mentais para compreender o texto. Construa períodos com no máximo duas ou três linhas de 70 toques. Os parágrafos, para facilitar a leitura, deverão ter cinco linhas em média, e no máximo oito. A cada 20 linhas, convém abrir um intertítulo (O ESTADO DE SÃO PAULO, 1997, p.15).

Narrativa impessoal, sempre na terceira pessoa do singular: a invisibilidade do narrador causa a impressão de objetividade e de que o fato fala por si mesmo.

A notícia deve ser redigida de forma impessoal, sem que o jornalista se inclua nela ou adote a primeira pessoa do plural em frases que a dispensam...Não confunda esta restrição com os casos, legítimos, de editoriais, artigos, anúncios, comentários e outros em que a primeira pessoa do plural pode ser usada sem maiores problemas (O ESTADO DE SÃO PAULO,1997, p.142).

Números e Estatísticas: dados impressionam, passam ideia de precisão e rigor apurativo. Comparações numéricas aproximam o texto do leitor.

Embora não se costume ouvir isso nas redações, saber fazer contas é tão necessário, para um profissional, quanto o domínio da regras gramaticais. Afinal, a exemplo da conjugação dos verbos, números não são meras minúcias secundárias ou pequenos detalhes com os quais não se perde tempo na hora do fechamento. Números são informações – nove vezes em dez, informações essenciais(...).Para lidar com eles, bastam três requisitos: conhecimento das quatro operações, atenção e bom senso (EDITORA ABRIL, 1990, p.31).

Descomplicar assuntos difíceis: a clareza é a roupa da sedução jornalística. Quanto mais complicado é o tema, mais clara deve ser a matéria.

Escrever é verbo transitivo. Quem escreve, escreve para alguém. Nós escrevemos para o leitor. Queremos que ele leia e entenda o texto. Mais: que aprecie a leitura (...) No dia-a-dia da Redação, somos poliglotas na nossa Língua. Mas, seja qual for o dialeto escolhido, o texto precisa atender o requisito essencial – a clareza. Montaingne, há 400 anos, disse que o estilo de ver ter três virtudes. A primeira: clareza. A segunda: clareza. A terceira: clareza (SQUARISI, 2005, p.31).

Palavras acessíveis: a notícia é como o amor, não escolhe o leitor. Ele que a escolhe. O texto tem que ser atraente a toda plateia, da mais culta à mais ingênua.

A simplicidade é condição essencial do texto jornalístico. Lembre-se de que você escreve para todos os tipos de leitor e todos, sem exceção, têm o direito de entender qualquer texto, seja ele político, econômico, internacional ou urbanístico (...) Em

qualquer ocasião, prefira a palavra mais simples: votar é sempre melhor que sufragar; pretender é sempre melhor que objetivar, intentar ou tencionar. (O ESTADO DE SÃO PAULO, 1997, p.15)

Frases curtas e ordem direta: leitor memoriza com mais facilidade a informação apresentada em sentenças pequenas e afirmativas.

A psicologia prova. A pessoa só consegue dominar certo número de palavras antes que os olhos peçam uma pausa. Testes sobre a legibilidade e a memória demonstram dois fatos. Um: se o período tem a média de 200 toques, o leitor retém a segunda metade pior que a primeira. Dois: se tem 240 ou mais, grande parte do enunciado se perde. Daí a importância da frase curta e de ordem direta (SQUARISI, 2005, p.35).

Teria, seria, faria, são sinônimos de dúvida sobre o acontecimento e por isso seu uso não é recomendado.

O condicional só será usado quando a apuração não for suficiente para que o jornalista consolide uma convicção (GLOBO, 2011, p.6).

Matérias pequenas: o espaço do jornal custa caro. O tempo do leitor também. O uso de expressões compostas deve ser evitado.

Tenha sempre presente: o espaço hoje é precioso; o tempo do leitor, também. Despreze as longas descrições e relate o fato no menor número possível de palavras(O ESTADO DE SÃO PAULO,1997, p.15).

Poucos termos técnicos e voz passiva: a língua do jornalismo é simples, mas sem pobreza vocabular. Leitor não gosta de texto pedante nem infantil.

A simplicidade do texto não implica necessariamente repetição de formas e frases desgastadas, uso exagerado de voz passiva (será iniciado, será realizado), pobreza vocabular, etc. Com palavras conhecidas de todos, é possível escrever de maneira original e criativa e produzir frases elegantes, variadas, fluentes e bem alinhavadas. Nunca é demais insistir: fuja, isto sim, dos rebuscamentos, dos pedantismos vocabulares, dos termos técnicos evitáveis e da erudição (O ESTADO DE SÃO PAULO,1997, p.15).

Informação decrescente, argumento crescente: a cadência do flerte com o leitor deve gerar uma tensão curiosa que o leve até a conclusão do texto.

O jornalista deve expor seus argumentos em um crescendo, para tirar proveito da tensão criada pelo texto e facilitar a conclusão para o leitor (FOLHA DE SÃO PAULO, 1996, edição eletrônica do Manual).

Analogias facilitam argumentação em matérias analíticas: o leitor de matérias analíticas quer textos interessantes com dados, graça e fontes consagradas.

O jornalista só deve tentar escrever uma análise depois de checar se dispõe de informações suficientes para sustentar suas conclusões. (…) Deve utilizar números e estatísticas para dar mais credibilidade e objetividade às observações (…) Para tornar seus argumentos mais claros, deve utilizar analogias (…) Para que o texto de análise não fique desinteressante, deve recorrer a declarações inteligentes, famosas ou engraçadas sobre o assunto (...) Deve, para que a análise tenha êxito, chegar a uma conclusão original (FOLHA DE SÃO PAULO, 1996, edição eletrônica do Manual).

Palavras devem informar: expressões como “até porque”, “via de regra”, “antes de mais nada” são cacoetes que cansam o leitor e tem baixo valor informativo.

Evite expressões pobres de valor informativo e portanto dispensáveis em textos noticiosos: antes de mais nada, ao mesmo tempo, pelo contrário, por sua vez, por outro lado, via de regra, com direito a, até porque ((FOLHA DE SÃO PAULO, 1996, edição eletrônica do Manual).

Exatidão: quando mais exata for a descrição de algo, mais efeito de real ela provocará no leitor. Desmentir um dado macula a credibilidade do veículo.

Informação inexata é informação errada. A busca das informações corretas e completas é a primeira obrigação de cada jornalista. Um jornal só firma seu conceito de credibilidade junto ao seu público quando é conhecido pela fiel transcrição das opiniões que colhe e pela exatidão de dados que apura e publica (FOLHA DE SÃO PAULO, 1996, edição eletrônica do Manual).

Aspas enriquecem: Declarações aspeadas compartilham o testemunho e a análise do acontecimento. Elas conferem veracidade e polifonia ao texto.

A reprodução de declarações textuais (entre aspas) é importante e valoriza o texto. E principalmente mostra ao leitor que houve preocupação do repórter em recolher opiniões ou frases originais, expressivas, marcantes (O ESTADO DE SÃO PAULO, 1997, p.86).

Aspas não combinam com obviedade: a voz dos personagens da notícia deve ser valorizada. Eles não devem falar o que qualquer um falaria.

Reproduzir declarações confere credibilidade à informação, dá vivacidade à reportagem e ajuda o leitor a conhecer o personagem da notícia. Reproduza apenas frases importantes e espontâneas. Informações de caráter universal ou de fácil averiguação não devem ser atribuídas a alguém, mas assumidas pelo jornalista: A água ferve a 100ºC e não "A água ferve a 100ºC", informou o químico. (FOLHA DE SÃO PAULO, 1996, edição eletrônica do Manual).

Aspas servem também para confirmar versão do repórter. O leitor confiará mais na notícia, se o jornalista aspeia a verdade na voz da fonte.

O texto conta uma história e usa a personagem para lhe dar veracidade. O leitor tenderá a confiar mais nas informações se não é só o repórter que está dizendo aquilo, se outra pessoa está confirmando a informação (...) Uma aspa por parágrafo é uma boa medida e ela funciona quase como uma testemunha que confirma o fato que o repórter quer levar ao leitor. (O ESTADO DE SÃO PAULO, 1997, p.86).

Aspas editadas: declaração não é transcrição

Nunca se esqueça de que o jornalista funciona como intermediário entre o fato ou fonte de informação e o leitor. Você não deve limitar-se a transpor para o papel as declarações do entrevistado (...) faça-o de modo que qualquer leitor possa apreender o significado das declarações. Se a fonte fala em demanda, você pode usar procura, sem nenhum prejuízo (...) Abandone a cômoda prática de apenas transcrever: você vai ver que o texto passará a ter o mínimo indispensável de aspas e qualquer entrevista, por mais complicada, sempre tenderá a despertar maior interesse no leitor. (O ESTADO DE SÃO PAULO ,1997, p.16).

Ouvir outro lado, protocolo ético que confere polifonia narrativa e credibilidade.

Na apuração, edição e publicação de uma reportagem, seja ela factual ou analítica, os diversos ângulos devem ser abordados. O contraditório deve ser sempre acolhido, o que implica dizer que todos os diretamente envolvidos têm direito à sua versão sobre os fatos e à expressão de seus pontos de vista (...). Não quer dizer que o relato e/ou a análise de fatos serão sempre uma justaposição de versões. Ao contrário, o jornalista deve se esforçar para deixar claro o que realmente aconteceu, quando isso for possível. (GLOBO, 2011, p.6).

Ironias com prudência: recurso indica ceticismo em relação aos fatos e fontes, mas pode irritar leitor e ridicularizar o autor.

Convém cautela na utilização desse recurso; a ironia em excesso tende a irritar o leitor e ironia deselegante, canhestra ou forçada ridiculariza o autor. É recomendável que o jornalismo seja cético, mas o ceticismo não exige necessariamente a ironia (FOLHA DE SÃO PAULO, 1987, p.84).

Conclusão é tão importante quanto o lead. Leitor que chegou ao final merece um encerramento que amarre o texto com informação e emoção.

A última impressão é a que fica (...) O fecho constitui uma parte crucial de qualquer texto. Você atraiu o leitor com o título, seduzi-o com o olho e soube agarrá-lo com a abertura. Depois, graças à qualidade da apuração, da redação e da edição, conseguiu que fosse até o final da matéria. Não ponha tudo a perder a agora...O leitor ficará agradecido e eventualmente se interessará em ler outras coisas que você escrever. (EDITORA ABRIL, 1990, p.37).